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HGOYER INSTITUTION
cn War t Revolution, and Peace
FOUMOED BY HfRBERT HOQVER. 1919
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J. 0. 6. de jSousa ,8 Faro Mor
1900 - 1902
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APR 2 l 1962
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J. B C. de Sousa e Jíaro Júnior
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1900 — 1902
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59, Roa do Jardim do Regedor, 41
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INTRODUCÇÂO
O presente trabalho, sóbrio e despretencioso em es-
tylo, visa a demonstrar o disvelo e sollicitude que me
mereceu o desempenho do cargo de governador da
Zambezia, durante um período de cerca de dois annos,
contados de 1 5 de julho de 1900, período esse que,
comparado com o das gerências transactas, se pôde
considerar como longo.
Para tal fim, a minha única ambição será publicar
em resenha singela, mas clara e precisa, a minha ad*
ministração ; apresentar á consideração individual pre-
clara algumas concepções suggeridas pelo estudo ap-
plicado ás condições e circumstancias excepcionaes da
tão vasta e promettedora região da Zambezia ; fazer
emfim uma apreciação franca e respeitadora ao mesmo
tempo, das doutrinas, cousas e pessoas.
Delineei pois em secções, correspondendo aos assum-
ptos mais importantes, que constituem a complicada re-
de de administração publica colonial, tudo o que diz res-
peito á nossa Zambezia. E considerando-se o que n'ellas
exponho poder-se-ha concluir: o que encontrei; o que por
minha iniciativa se modificou e executou dentro da ai-
cada das minhas attribuições e tomando por base a le-
galidade e moralidade; o que propuz á approvação su-
perior em prol dos progressos cívicos da região; e, fi-
nalmente, o que a meu ver é instante que se faça para
que a questão administrativa surja sob novos e melho-
rados auspícios.
Gomo procedimento inicial tratei: de examinar todos
os ramos de administração em exercício, de aquilatar
em consequência os recursos existentes, e de prescru-
tar emfim todas as condições de ordem moral e mate-
rial que imperavam no modo de ser do território. Foi
esse um dever que considerei imprescriptivel e cujo
cumprimento só confiei de mim próprio.
Na realisação do que acabo de expor depararam-se-
me alguns ramos de serviço publico em andamento
normal e em perfeita observância dos preceitos regu-
lamentares; outros necessitados de reforma radical pára
beneficio, não só do geral da população como também
dos reditos da Fazenda Nacional ; outros merecedores,
pela sua acção inútil e pela sua existência illegal, de eli-
minação ; e outros por fim revelando no seu exercício
manifestos abusos que foram extirpados, por eversivos
da boa ordem, tacitamente tolerados desde longa data,
em manifesta discordância antagonista com os eternos
e indeclináveis princípios de justiça, direito e humani-
dade.
Occupo-me na primeira secção da orohydrographia
d'esta vastíssima região, que não obstante a antigui-
dade da sua occupação, não tem sido perfeitamente di-
vulgada em todas as suas circumstancias e condições.
Estou crente de que resultara para o leitor um conhe-
cimento mais franco da importância real do território,
habilitando-o sobremaneira a julgar dos progressos mo-
raes e materiaes existentes e em via de realisação. Al-
gumas indicações sobre a ethnologia, geologia, fauna e
flora, que constituem as riquezas naturaes de qualquer
região, completarão o estudo, proporcionando uma idéa
geral, que certamente será lisongeira para a possessão
aAfrica oriental a que ella se refere.
A situação politica será descripta por uma forma que
não poderá deixar duvidas acerca da verdade real e po-
sitiva referente á soberania nacional e seu exercício de
facto. Será precisado que alguma cousa se fez durante
a minha gerência em prol da pacificação e occupação,
€ que mais algum beneficio se diligenciou realisar no
mesmo sentido, propondo-se superiormente os meios
de levar a effeito emprehendimentos pouco dispendio-
sos, e cujos resultados se provaram dever ser de van-
tagem real e immediata.
Na segunda secção trato de diversos assumptos con-
siderados de importância primaria, que se condensam
nas duas denominações genéricas, «colonisação» e «ex-
ploração», e representam indubitavelmente os verdadei-
ros factores da civilisação.
Na Zambezia de ha muito que começou a alvorecer
a aurora do progresso. Descerrem- se as sombras de um
passado não muito remoto e notarse-ha, frisante e evi-
dente, que sob a acção vivificadora do contacto obri-
gado com o elemento europeu, definiu-se uma suavisação
nos costumes bárbaros do seu povo, a ponto d'elle se
ter tornado maleável á operação de todas as emprezas.
Não obstante a destreza para a manufactura, Índole ca-
racterística do indígena, incontestavelmente de grande
valor local, um dos defeitos capitães a vencer n'elle é
a indolência innata. Eis um problema que á primeira
vista parece complexo, mas que tem solução, senão rá-
pida, pelo menos franca. E não tendo eu a pueril pre-
sumpção de querer erigir em dogmas as minhas opi-
niões, não tenho comtudo duvida em affirmar, que re-
side na forma porque se exige do indígena o trabalho,
o accentuar se a boa ou má disposição para este.
E' necessário pois que, não só haja quem instrua
esse povo especial no trabalho manual, e que esse al-
guém esteja animado de paciência e dotado de conhe-
cimentos dos diversos misteres, como quem o saiba
guiar na execução do trabalho.
Instruir o colono da Zambezia é pois um acto indis-
pensável, e deve ser a sua pratica um disvelo de todos
que governam e queiram tomar a peito a prosperidade
e o esplendor do território.
Para esse louvável intuito advogo a existência de
missões de trabalho, dignamente representadas por es-
colas de aprendizagem de artes e omcios. Ahi se açcen-
tuará um contacto forçado entre europeus e indígenas,
que redundará n'uma affeição por parte dos últimos a
um trabalho regular educado, e por tal productivo, e a
uma imitação de modo de vida que lhes suscite o esti-
mulo de uma elevação social ; e esta, obrigando-os á sa-
tisfação de necessidades creadas, os incite em conse-
quência a renegar a ociosidade e os hábitos selvagens,
pelas emulações despertadas.
Julgo que por estes processos se chegará mais rapi-
damente á definição de um progresso moral n'estes povos
africanos do que só contando-se com as missões reli-
giosas.
Indague-se a verdade com o entendimento despreve-
nido de systematicas idéas, e deduzir-se-ha que os mis-
sionários, entidades dignas do máximo respeito, teem
na Africa um papel moralisador, grandioso pela essên-
cia, sublime pela gloria, o qual consiste na diffusão da
doutrina evangélica como emanação divina. Mas o ver-
dadeiro campo de acção unicamente religiosa affigura-
se-me não ser nas cidades e villas já constituídas, onde.
o commercio actua e onde as grandes industrias labo-
ram, mas sim no matto que seja preciso, romper para
n'elle semear a referida doutrina a fim de guiar a huma-
nidade selvagem no caminho da sua perfectibilidade.
E para que o sentimento sublime, perenne de abne-
gação e altruísmo, de que devem estar animados os
missionários no exercício d'essas tarefas árduas de in-
sinuação dos princípios salutares da civilisação em âni-
mos rudes, actue eficazmente pela propaganda religiosa
como um apostolado de primeira educação, é indispen-
sável que esse sentimento caminhe isoladamente e não
seja deslustrado pela cubica dos interesses materiaes a
que arrasta o mercantilismo.
Tendam pois a um fim mais positivo as missões, e
procure-se nacionalisal-as o mais possível ; daremos as-
sim um passo gigantesco para a obra da civilisação da
nossa Africa.
Com uma instrucção geral do indígena adequada ao
seu destino de raça, e com uma administração hábil e
circumspecta que se disvele em attrahir os elementos exte-
riores de civilisação, por forma que uma affluencia de
numerário se defina em beneficio das localidades onde
a acção civilisadora já tenazmente pacifica impera, ga-
rantir se-ha in fal li vel mente a colonisação com todos os
seus attributos.
A agricultura e a industria, considerados, como são,
verdadeiros agentes de exploração d'um território e
principaes factores da sua vitalidade, são também tra
tados n'esta secção.
São apontadas as verdadeiras causas da decadência
da primeira numa região como a Zambezia, excepcio
nalmente dotada com um solo ubérrimo e feracissimo,
onde a natureza ostenta todo o luxo da sua fecundi-
dade ; assim como são consideradas as riquezas do sub
solo, como não tendo, por emquanto, pelas fracas pes-
quizas operadas, um valor intrínseco, que defina uma
attracção de capitães para sua exploração, e arraste
grandes elementos de colonisação.
Conclue-se, portanto, que é bastante a agricultura
generalisada, aproveitando a fertilidade do solo, para
garantir em pouco tempo excepcional prosperidade á
região ; e por tal facto deve ser o incitamento ás em-
prezas agrícolas uma gloriosa missão dos poderes pú-
blicos.
As industrias em acção actual na Zambezia são por
sua natureza importantes e terão um desenvolvimento
concumitante da agricultura, porque laboram com os
seus productos especiaes; sendo naturalíssimo pois
que os benefícios e revezes que incidirem sobre a ul-
tima se reflictam nas primeiras. E sendo as fabricas ver-
dadeiros monumentos do progresso material no paiz
onde estão estabelecidas, a sua existência local impÕe-
se como argumento vivo para que por todos os meios
seja auxiliado o seu desenvolvimento.
Graças ao regimen dos prazos implantado na Zam-
bezia, o progresso d'esta região avança; comtudo jul-
guei dever apresentar algumas considerações sobre o
IO
seu regulamento, que a pratica de já tão longa vigên-
cia tem suggerido, e .que se me affiguraram ser de
molde a determinar-se uma ascendência moral e mate-
rial no modo de ser do território.
O commercio e a navegação, ligando-se por uma con-
nexidade de relações, proporcionadas pelos dois impor-
tantes elementos concorrentes ao interesse vital de qual-
quer paiz, como são «a exportação e importação», oc-
cupam um logar proeminente no mundo colonial ; em
virtude do que tratei com o necessário desenvolvi-
mento: das condições de navegabilidade dos portos da
Zambezia ; dos melhoramentos introduzidos e a intro-
duzir n'elles para facilidade do seu ingresso pelos na-
vios do commercio ; da forma de navegação para cada
porto, consoante as exigências do serviço em harmonia
com as leis vigentes, e igualmente da situação commer-
cial em toda a Zambezia, demonstrada pelas estatísticas
da alfandega.
Aponto as causas de paralysação nos rendimentos
aduaneiros, lembrando alvitres propostos em tempo á
consideração da auctoridade superior da provincia de
Moçambique, uns que se me affiguraram de molde a
produzir-se uma fiscalisação mais efficaz contra o exer-
cício do contrabando, e outros que julguei de melhores
auspícios para o desenvolvimento commercial.
Com respeito á situação económica da Zambezia tra-
tei de reunir em maior numero as informações que
poude colher d'esta esperançosa região, em que a civi-
lisação surge praticamente escripta nos monumentos
do progresso material que se patenteiam á vista. N'esta
exposição especifica diligenciei fazer prevalecer a ver-
dade sobre preconceitos vãos, que teem desejo de im-
perar, postergando os dictames da realidade e do bom
senso.
.Occupa-se a terceira secção de um thema de pri-
meira importância : Situação financeira. Para satisfazer
a elle apresento uma demonstração de productividade
das diversas receitas cobráveis, resultando d'ella bem
patente a civilisação económica da Zambezia, radiante
e. progressiva.
A existência de elementos superabundantes ás neces-
sidades normaes, e por outro lado, a voz imperiosa
da vitalidade activa, a cuja obediência necessariamente
tem por dever uma colónia que tanto produz, clamam
porque entreluza a esperança de ver prevalecer a be-
néfica realisação na Zambezia dos commettimentos di-
gnos e á altura da sua civilisação actual, tenazmente pa-
cifica, sobre quaescjuer razões de outra ordem.
Para se conseguir esse desideratum bastaria a appli-
cação ao progresso material das localidades, de parte
da receita geral que fosse excedente ás necessidades
inadiáveis indicadas pela tabeliã orçamental, pois que
quanto a recursos geraes e a encargos puramente ad-
ministrativos, a verdade dos factos surge radiante a at-
testar peremptoriamente o grande ascendente dos pri-
meiros sobre os segundos.
Examinadas as cousas á luz de factos bem aprecia-
dos divisa-se n'esta região, não obstante a versatilidade
das cousas mundanas inherente ao meio de acção, um
fundo de persistência nas lides da ambição e rivalidade,
afanosas por sua natureza.
É pois indicativa a coexistência dos progressos finan-
ceiros geraes e do desenvolvimento moral e material
da Zambezia, não obstante constantemente se pleitea-
rem as ambições pessoaes, entrechocando* se por vezes
por opposição de interesses.
Emfim, provo que a situação da Zambezia é desafo-
gada, financeiramente considerada, e que continuaria
na senda progressiva se alguma largueza nas attribui-
ções do governador tivesse existido, para decidir en-
trada nos cofres de receitas atrazadas de seis annos,
e para promover affluencia de outras cuja opportuni-
dade se recommendava.
Na quarta secção são considerados os difFerentes ra-
mos de administração do governo da Zambezia, e pela
exposição feita se poderá aquilatar da forma constitui -
tiva de cada um d'elles.
Bastas razões concorreram para uma porfiada (mas
infelizmente infruetifera) insistência junto da auetoridade
superior da Província, para elevar os serviços em geral
ia
á altura a que as circumstancias espcciaes da situação
da Zambezia, geographica e politicamente consideradas,
reclamam de longa data. Essas razões são perfeita
mente receptiveis, se se considerar que o systema ado-
ptado teve em mira advogar causas, cujo espirito incide
directamente no próprio Estado,. obediente á voz impe-
riosa dos interesses creados á sombra das leis ; impos-
tas algumas d' estas, como se sabe, pelos tratados e con-
venções com a nação ingleza.
Nas quatro secções enunciadas esbocei a traços lar-
gos a razão d'ordem que presidiu á confecção do pre-
sente livro.
Diligenciei n'este modesto trabalho enumerar e syn-
thetisar todas as forças que concorrerão para o engran-
decimento do districto da Zambezia, apontapdo ao mes-
mo tempo as causas da paralysação actual.
Destina-se pois este livro, única e exclusivamente, a
elucidar quem se interesse pelos destinos da Zambezia,
apresentando a maior somma de esclarecimentos sobre
tão esperançosa região, e ao mesmo tempo patentear o
nimio desejo que sempre tive de ser em alguma cousa
útil ao paiz.
Lisboa, 10 de março de jgo3.
SECÇÃO I
Da Zambezia — Situação politica— Soberania
—Clima
CAPITULO I
Da Zambezia
A vastíssima região de que se vae tratar, embora
tenha uma vez ou outra sido assumpto de publicações
diversas, estas apresentam-n'a sob um aspecto que fran-
camente tem deixado uma impressão de verdade muito
áquem do que é real e positivo. Portanto, descrever a
Zambezia por fórmá que não subsistam após duvidas
sobre a sua importância real, filha da natureza que lhe
prodigalisou elementos superabundantes de vitalidade,
é um dever ;e é era obediência a tal imposição que se
deligenceia apresentar uma resenha descnptiva, soo uma
forma genérica embora, mas da qual se julga resultará
evidente e -palpável o grande valor do território.
Em um Imoral de 240 milhas de extensão, marcadas
desde a foz do rio Quisungo ou Ligonia, ao norte, até
á do rio Melambe, ao sul, e com uma área territorial
de cerca de 1 65 :00o kilometros quadrados para o inte-
rior do continente africano (quasi duas vezes a de Por-
tugal), tendo por confins a Oeste as regiões centraes
d* Africa sob o protectorado britannico ; ao Norte os ter-
ritórios sob a administração soberana da companhia do
u
Nyassa (cuja fronteira é indicada pelo parallelo i5.°
até á intersecção com o rio Lurio, e depois o curso d'este
rio até ao lago Chirua e sua margem oriental) ; a Leste
o districto de Moçambique, confinante pelo curso do rio
Quisungo oú Ligonia (cuja origem é nos picos Namu-
li), e ao Sul os territórios sob a administração directa
da Companhia de Moçambique *, jaz encravado o flo-
rescente e promettedor districto da Zambezia, grande
na extensão como no valor progressivo.
Este vastíssimo território apresenta no seu conjuncto
altitudes diversas, desde um máximo de 2000 metros
cm serranias alpestres, como que pendurados sobre ex-
tensas planícies, até ás baixas alagadiças dos valles do
Delta. Essas altitudes são por vezes uniformes, consti-
tuindo planaltos de grande extensão, perfeitamente ca-
racterisados.
Quem percorrer a região em todos os seus recôndi-
tos cançar-se ha de encontrar contrastes a cada passo ;
terrenos d'alluvião nas baixas e duros de contextura schis-
tosa ou granítica, de quartzo ou basalto, nas alturas. Em
quasi todos esses terrenos se alegra a vista com uma
vegetação luxuriante, por vezes densa, apresentando
cambiantes de cores, desde o verde sombrio ao rosado
hilariante; porém nas regiões que constituem o alto
Zambeze para alem de Téte e aos confins do Zumbo,
o interior é d'uma inferioridade na natureza vegetal, que
entristece.
Toda esta extensa região é excepcionalmente favore-^
cida pelo elemento húmido ; indicam n'o, entre outros
característicos de menor importância, a grande plêiade
de extensos caudaes que caprichosamente a recortam,
serpenteando desde as origens sitas nos confins até ao
littoral. São elles designados respectivamente de Este
a Oeste pelos seguintes nomes : Quisungo ou Ligonia,
1 Que tem começo ao longo da margem direita do rio Luenha,
affluente do Zambeze, e seguindo até ao mar pela margem direita
d'este ultimo rio e pela boca denominada Melambe.
i5
Tejungo ou Moniga, Mazembe, Raraga, Mabala, Ly-
cungo, Makuze, Quelimane, Linde e finalmente o Zam-
beze, Ghire e Ruo.
Diversos mananciaes na cordilheira magestosa que
inicia no monte Inágo (situado a nordeste nos connns
do Lomué) e se estende para Oeste, apresentando nos
a serra Namuli abruptamente surgida da grande planí-
cie do Gurué ; a serra Mulumbo, sobranceira ao lago
Ghirúa ; a grande cordilheira formada pelo Milange,
Tumbine e Meloza ; as serras da Chinga, de que a Mur-
rambala é a culminância, definem as vertentes dos
nove primeiros cursos d'agua (alem de muitos outros
de menor importância), que descendo em torrentes e
catadupas vão fecundar, banhando, o solo que atraves-
sam.
O Zambeze, como se sabe, tem uma origem muito
remota no coração da Africa, comtudo as serranias de
Senga próximo do Zumbo concorrem com o seu tributo
para lhe alimentar a impetuosa corrente ; quanto ao Chire r
tributário d'este, vive especialmente dás aguas do grande
lago Nyassa, e o Ruo, seu affluente, contribue para elle
com as aguas da sua vertente, que é Milange.
Três portos se acham abertos á navegação geral e
satisfazem plenamente ás exigências do trafego no ter-
ritório ; são elles por ordem de importância : Queli-
mane, Chinde e Tejungo. Uma descripção ligeira de
cada um d'estes portos é necessária para se aquila-
tar da grandeza da sua importância como vias de pe-
netração, que facilitam o egresso de todos os elementos
que concorrem para a vitalidade da região e para o seu
progresso evolutivo.
Mas sendo obvio que existe connexão verdadeira e
incontroversa entre os movimentos commercial e marí-
timo, e accentuada a questão de que este ultimo, carac-
terisado pela navegação geral, necessita ser exercido efi-
cazmente e com todas as garantias para segurança dos
indivíduos e dos materiaes affluentes, será considerada
para cada um dos portos citados a questão importante
relativa ás facilidades proporcionadas á sua boa navega-
bilidade.
O porto de Quelimane, aberto entre as duas pomas
de terra firme, de nomes Tangalane e Olinda (que dis-
tam entre si uma milha), offerece aos navegantes uma
barra de onze pés de profundidade em baixamar e vinte
e três na preamar, referidos uma e outra ás aguas vi-
vas. O fundo augmenta consideravelmente depois de
transporta a barra, seguindo-se pelo canal navegável
encostado á margem leste do lado de Tangalane até
alcançar-se o canal transversal denominado Militão, que
conduz á margem oeste do rio. Paralielamente a essa
margem, em uma extensão de dez milhas correndo ao
norte, conduz-se ao porto, que proporciona um anco-
radouro seguro em frente da villa, a qual se ostenta na
margem esquerda do rio de Quelimane, alvejante de
casaria entremeada de arvoredo verdejante e alteroso.
Como é concludente este porto é de fácil accesso
a narios que calem até dezoito pés, e as estatísticas
officiaes teem accusado frequentemente entradas de na-
vios com mais de quatro mil toneladas de arqueação.
A balisagem existente garante a transposição da bar-
ra com toda a segurança, sem necessidade de piloto, e
este, por não possuir embarcação própria, nem sempre
pelas más condições do mar pôde ir fora tomar os na-
vios, aguardando os então logo á passagem do banco
da barra para os conduzir pelos canaes interiores. A
balisagem interior é deficiente por falta absuluta de ele-
mentos materiaes para a effectuar, mas os pilotos sup-
prem a falta satisfazendo as necessidades occorrèntes,
e nenhum caso de sinistro se tem dado, o que é bas-
tante para provar a regularidade existente no serviço
de pilotagem.
Este porto de Quelimane, onde os navios encontram,
para se abastecerem, toda a qualidade de provisões vin-
das do interior e do exterior para o commercio local,
está pelas suas excepcionaes condições geographicas e hy-
drographicas destinado, n'um futuro próximo, a trans-
formasse n'um verdadeipo empório onde se degladiarão
interesses de diversos. É abundantemente servido de
vias de communicação fluviaes, navegáveis em grande
numero e extensão, estabelecendo interiormente a con-
«7
tinuidade na navegação entre outros portos também ac-
cessiveis pelo mar, e dando serventia ás regiões longi-
quas que formam o coração da Zambezia.
N4sto tudo, na accessibilidade do seu porto, na na-
vegabilidade dos canaes fluviaes que fazem communicar
entre si rios profundos cjue banham porções do territó-
rio onde os progressos intestinos campeam em honrosa
emulação, e na sua situação geographica excepcional que
permute poder centralisar todas as evoluções inheren-
tes ao pequeno mundo civilisador e colonisador, está
caracterisada a riqueza natural de Quelimane, que pro-
vém das circumstancias hydrographicas.
Percorra-se com a vista o mappa geographico onde
esteja traçada a Zambezia até aos confins ; consideran-
do-se em primeiro logar de Quelimane para o norte : de-
para-se com a região recortada por veias liquidas nu-
merosas, onde os caudaes extensos impõem a necessi-
dade da sua ligação entre si para beneficio das regiões
que fecundam.
O primeiro com que se depara é o Makuze, cuja
boca dista apenas 28 milhas da de Quelimane e cuja
barra rivalisa em praticabilidade com a d'este ultimo
porto. Desde a sua origem nas cordilheiras do Tum-
bine patenteia-se um serpentear em longa extensão,
fertilisando a região do Borôr e correndo em leito largo
e fundo desde o Nhamacurra (principal estação da Com-
panhia do Borôr) até á foz, isto é, cerca de 3o milhas
navegáveis para navios que calem até 8 pés.
A natureza caprichosa já se encarregou de estabele-
cer communicação interna d'este rio com o de Queli-
mane, pela fusão operada ha bastantes annos na planície
do Musello, entre o Muanange, affluente do Makuze, e o
Liquare, affluente do Quelimane (oil dos Bons Signaes
segundo Vasco da Gama), constituindo-se em canal de
marés denominado do Musello, constantemente utili-
zado pela navegação de lanchas.
A seguir encontra-se o Lycungo, que apresenta uma
extensa veia liquida, nascente da enorme cordilheira da
Namulia, e descendo d'aqui em catadupas por sobre
um formigueiro pedregulhento, que o torna innavega-
i8
vel em continuidade apreciável. A sua barra é quasi fe-
chada, por conseguinte inaproveitável á navegação ma-
rítima, e quanto á propriamente fluvial limita-se a
emboques de uma para outra margem, em diversos
pontos mais limpos de pedras.
Um seu affluente na margem direita próximo da foz*
denominado Puade, faculta um canal navegável em al-
guma extensão ; o seu curso vae confundir-se na origem
com uns charcos extensos situados no interior. Ao en-
contro d'este riacho parte da margem esquerda do Ma-
kuze o Tunguluni, navegável para lanchas grandes
numa extensão de sete kilometros, a partir da confluên-
cia; segue- se a esta primeira parte uma outra, exten-
sa de oito kilometros até ao encontro acima referido*
a qual devidamente profundada estabeleceria a com-
municação fluvial entre o Makuze e o Lycungo. 4
Na margem esauerda do Lycungo um outro affluente
existe, de nome Mariangoma, que estabelece commu-
nicação navegável entre aquelle rio e o seguinte, de no-
me Mabala.
E' o Mabala um rio que vem desaguar também no
oceano, formando uma barra accessivel a navios de pe-
queno calado.
A sua origem ignora-se, mas não deve ser muito lon-
giqua. Na sua margem esquerda apresenta um afflu-
ente de nome Erive, que na direcção nordeste vae en-
contrar a grande lagoa da Maganja da Costa, com a
qual communica na época da cheia annual dos rios*
este riacho é navegável durante todo o anno até uma
distancia pequena da referida lagoa, que se pôde calcu-
lar em dois kilometros, e n'estas circumstancias, sobre-
maneira favoráveis, um aprofundamento n*essa peque-
na parte torna-se recommendavel para a continuidade
nas communicações.
1 O reconhecimento hydrographico do rio Tunguluni foi feito,
por minha determinação, pela lancha -canhoneira Pedro Annaycc^
do commando do i.° tenente António Pinheiro Silvano, que n'elle
se houve com decedido zelo e boa vontade.
>9
Proseguindo na costa do mar em observação encon-
tra-se o Raraga, cuja origem é também nas serranias
da região Namuli, e que, semelhante ao Lycungo, as
suas aguas correm despenhando-se de pedra em pedra
até desaguar no mar, differindo comtudo d'este rio em
formar uma boca accessivel á navegação, exactamente
nas mesmas circumstancias do Mabala.
E' na sua margem direita que existe um canal nave-
gável, em communicação com a bella e extensa lagoa
da Maganja.
Em seguida encontram-se os rios Mazembe e Te-
jungo ou Moniga, communicando entre si pelo canal
Murriade (Edugo), navegável para lanchas grandes. En-
tre os dois rios, o canal e o mar, jaz uma ilha de nome
Edugo ou Quisungo, relativamente extensa, e cujas pon-
tes de Oeste e Este concorrem para formar as bocas
do primeiro e segundo rios ; estes são accessiveis a na-
vios de pequena tonelagem, principalmente o Tejungo,
que é o que se acha hoje mais estudado.
Na margem direita do Mazembe, que é o primeiro
rio que se encontra depois do Raraga, foram infructi-
feras todas as pesquizas effectuadas para se descobrir
uma via de communicação para este ultimo rio, o que
seria o desideratum para a possibilidade de se conse-
guir uma via fluvial navegável, em perfeita continuidade,
desde Quelimane até ao extremo occupado e pacifica-
do, que é o Tejungo. 4
Terminado está o estudo hydrographico de Queli-
mane até ao Tejungo. Tenham-se em vista todas as
circumstancias excepcionaes que concorrem na hydro-
graphia da região correspondente, e apresentar se-ha
por uma forma evidente a necessidade, que se revela
inadiável em face da praticabilidade deductiva, de se
conseguir, por meio de uma ligação dos diversos ele-
mentos líquidos enunciados, uma via fluvial contínua.
1 Os estudos no rio Mazembe foram feitos pela lancha-canho-
neira Diogo Cão, sob o com mando do 2. tenente Carlos Marian-
no de Carvalho, que n'elles empregou bastante sollicitude e zelo.
20
Essa via, realisavel de Quelimane ao Raraga numa ex-
tensão territorial de 140 kilometros na direcção de
Oeste para Este, quasi parallelamente á costa maríti-
ma, serviria de incalculável benefício ás terras que já
estão em exploração activa, pela facilidade de commu-
nicações que com o porto commercial de Quelimane
seriam facultadas.
Foi em attenção ao bom resultado que adviria para
a Zambezia da realisação de um melhoramento de tal
quilate, que á auctoridade superior da Província sub-
metti em princípios do anno de 1901 uma proposta para
a sua execução, que seria levada a cabo n'um período
máximo de dois annos, sem encargos de espécie alguma
para o Estado, não tendo este mesmo de dispender um
real em tempo algum.
A companhia portugueza do Borôr, aue explora por
arrendamento alguns prasos da região designada, com-
promettia-se a effectuar a ligação entre o Tunguluni e
o Puade, aprofundando os oito kilometros do primeiro
rio. Corriam pela dita companhia todas as despezas, com
a condição de o governo lhe permittir, por uma exploração
exclusiva durante um prazo de tempo limitado, só o re-
sarcir-se dos fundos desembolsados, submettendo-se em
tudo e por tudo á fiscalisação do governo; este utilisar-
se-hia livremente do canal aberto, cuja propriedade não
lhe era tirada, e os particulares pagariam á companhia
uma taxa fixada por uma tabeliã previamente appro-
vada superiormente.
Como facilmente se vê, os legítimos interesses do Es-
tado eram assegurados, e ao commercio proporcionava-
se-lhe uma facilidade e economia importantes no trans-
porte geral das mercadorias, as quaes, ás costas dos in-
dígenas, ainda se effectuam por uma forma bastante
onerosa e morosa. Uma tal obra é por sua natureza e
fins incontestavelmente benéfica ao serviço publico e
ao Estado ; não obstante, á data da minha retirada da
Zambezia não foi dada solução á proposta effectuada.
Consideremos agora a hydrographia partindo de Que-
limane para o Sul. Teremos em primeiro logar o rio
de Quelimane ou dos Bons Signaes, que é formado
21
pelo affluxo das aguas de três rios mais interiores, que
são o Pingaz (ou Quaqua), o Luala e o Liquare, nas-
cendo uns e outros em diversas lagoas disseminadas
pelo interior. O primeiro, attingindo os valles das ser-
ras de Chimuára e Murrambaía, recebe as aguas pro-
venientes d'ellas e do escoamento das do rio Chire, que
corre do outro lado das referidas montanhas; os segun-
dos originam nos charcos extensos do Borôr.
Em tempos idos acontecia que nas grandes cheias o
Zambeze communicava com o Quaqua por um canalete,
que a força das aguas rompeu nas alturas da povoação
do Vicente ; essa via, na actualidade, é apenas um mo-
curro * de nome Muto, que pouca agua tem, mesmo
na época das chuvas, datando de muitos annos este es-
tado de cousas, naturalmente occasionado por alteração
profunda havida no curso do Zambeze, facto vulgar
n'esse tão caprichoso rio.
Por conseguinte ha muito tempo que o rio de Que-
limane não tem connexão alguma com o Zambeze, po-
dendo-se affirmar affoutamente que não é braço doeste
tão importante rio.
O Quaqua é navegável durante as cheias até Mopêa
(sede de uma antiga villa hoje extincta), e portanto
n'uma extensão de cerca de 100 kilometros. De Mopêa,
hoje estação principal da Companhia portugueza do as-
sucar, parte uma linha férrea de systema Decauville, que
conduz á margem esquerda do Zambeze, no ponto de-
nominado Vicente, em duas horas de percurso. Está por
essa forma estabelecida a communicação de Quelimane
com o Zambeze, em continuidade a via terrestre com a
fluvial; e embora na época das séccas, em consequên-
cia de se reduzir a extensão navegável do Quaqua a um
mínimo até ao ponto Mogurrumba, não seja pratico
o aproveitamento da mesma via férrea, esta representa
um melhoramento local a considerar-se.
Seguindo agora a costa marítima para o sul de Que-
1 Mocurro é uma valia para escoamento cTaguas dos terrenos.
22
limane encontra-se o rio Linde, cuja boca dista da do
primeiro apenas dez milhas.
A origem d'este rio deve ser a mesma dos rios visi-
nhos já citados, e a sua navegabilidade effectua-se em
grandes fundos, n'um percurso de cerca de cincoenta
e cinco kilometros praticáveis por navios que deman-
dem até dez pés de calado d'agua; a sua barra é tão
funda como a de Quelimane e francamente praticável.
Um braço do Linde atravessa as terras d'este nome na
sua margem esquerda e vae entrar no rio de Quelimane,
no sitio denominado Olinda, próximo da barra d'este
ultimo porto, formando assim naturalmente um canal
navegável para lanchas, n'uma direcção parallela á li-
nha da costa.
Estão assim ligados interiormente os dois portos por
uma via fluvial, e quasi que terjnina assim a connexão
que pelo elemento licjuido existe para o sul de Queli-
mane; pois o rio Mahindo, que se segue ao Linde, não
dá entrada pelo mar, e quasi se confunde ifiteriormente
com este um pouco a montante de Micahune, princi-
pal estação do prazo Mahindo, e até ao Chinde existe
uma serie de mocurros e charcos sem importância real
para a navegação. As condições especiaes d'esta zona
talvez n'um futuro próximo convenha aproveitar, com
o fim de ligar por uma via fluvial navegável os dois
portos importantes, Chinde e Quelimane, se uma certa
transformação politico- administrativa (de que adiante tra-
tarçi) tivesse efleito.
É o Chinde um porto formado pela bacia do rio do
mesmo nome, que, como se sabe, é um dos braços do
Zambeze, e aquelle que melhores condições offerece á
navegação marítima, embora essas sejam sobremaneira
deficientes. A sua barra pertence á cathegoria d'aquel-
las que são sujeitas constantemente á acção açoriante das
areias abundantes arrastadas pelas impetuosas corren-
tes do rio, e as cheias do Zambeze produzem em con-
sequência uma mutabilidade annual no seu eixo, neces-
sitando por esse facto a balisagem do porto de cons-
tantes correcções, produzindo por tal um serviço fati-
gante e dispendioso.
23
Comtudo dá accesso em aguas vivas a navios que
calem até doze pés.
Para se fazer uma idéa das más circumstancias d'este
porto basta dizer-se que no anno de 1900 foi cffectuada
uma balisagem completa, demarcando-se com quatro
bóias o canal navegável e rectificando-se a posição das
balisas do enfiamento do eixo da barra; ficou por assim
dizer bem balisado, e a facilidade do ingresso aos na-
vios attestava a efficacia do trabalho effectuado pela
canhoneira Chaimite. Nos princípios do anno de 1901
o estado da balisagem era deplorável : o eixo da barra
tinha-se deslocado, por effeito da cheia do Zambeze,
fhuito para o sudoeste ; das bóias collocadas tinham des-
apparecido duas, por terem arrebentado as respectivas
amarrações pela força das correntes de vasante.
A. importância d'este porto data do anno do convé-
nio com a Gran Bretanha, por ser o melhor das bocas
do f Zambeze.
É o que serve as enormes artérias Zambeze e Chire,
consideradas internacionaes para o uso das suas aguas,
arvorando ali as embarcações as bandeiras das suas na-
cionalidades respectivas.
A navegação dos referidos rios tem augmentado consi-
deravelmente nos últimos tempos, a ponto de se notar
hoje em serviço activo um total de cento e cincoenta em-
barcações de diversos systemas (a vapor, vela e remos),
que sob diversas cores exercem o trafico de transpor-
tes de mercadorias, materiaes e passageiros, quer para
a Africa central ingleza, quer para as margens portu-
guezas e vice-versa.
Finalmente é o ultimo porto aberto á navegação no
anno de 1900 o do Tejungo, formado pela parte orien-
tal da ilha Quisungo (Edugo) e a occidental do cabo
Fitzwilliam; apresenta uma barra, que sendo formada
de recifes e de pouca profundidade, só deve ser prati-
cada em boas condições de tempo.
O máximo fundo ultimamente encontrado pela ca-
nhoneira Chaimite é de 18 pés em preamar d'aguas vi-
vas. O rio do mesmo nome é navegável em muito pe-
*4
quena extensão, em consequência da profusão de rochas
de que está coalhado o seu leito.
Distante vinte e cinco milhas d'este porto, e para o
norte, existe o Muebazi, porto mais franco e offere-
cendo melhores condições de navegabilidade que o an-
terior.
Serve elle de bacia de convergência a diversos rios
do interior, navegáveis, os quaes banham as regiões de
Este do districto, onde a rebeldia é manifestamente
real. Por todas estas circumstancias está elle indicado
para substituir o Tejungo com vantagem para a occu-
pação do território e para a navegação. *
Dos rios ainda para o norte d'este nenhum garante
a accessibilidade pelas suas barras, inclusive o Ligo-
nia ou Quisungo *; o qual, apesar do extenso caudal
3ue ostenta desde a sua origem nas vertentes da cor-
ilheira do Namuli e Inago, até ao desaguamento no
mar, a sua boca não permitte o ingresso de navios; e
pena é, porque a sua situação terminus seria de grande
efficacia para a occupação-da região e para a sua admi-
nistração consequente.
Descripta, julgo que convenientemente, a hydrogra-
Shia do grande districto da Zambezia até aos seus con-
ns, é concludente que o porto de Quelimane pôde ser
considerado como um centro de navegação, pela con-
vergência fluvial existente e por aquella que as neces-
sidades instantes do desenvolvimento territorial para o
norte e sul resolverão a ser estabelecida num futuro
que se me afligura muito próximo. Compete pois ao
governo a gloria da iniciativa para a execução das obras
indicadas no decurso d'esta exposição, que se revelam
1 O Muebazi foi recentemente estudado pela canhoneira Chat-
mite, sob o commando do i.° tenente Gabriel Portelja, e foi do
resultado d'esse estudo que tirei parte das conclusões enuncia-
das.
* Deve ser considerado o curso d'este rio como limite orien-
tal do districto da Zambezia por disposições legaes datadas do
anno de 1862, publicadas no Boletim òfficialda Provinda de Mo-
çambique, n.° 1 2 do mesmo anno.
25
de grande alcance, e pelas quaes as prosperidades crés*
centes no território clamam.
"Villas da Zambezia. — A Zambezia, geo
graphicamente considerada, pôde ser dividida : em alta-
Zambezia, abrangendo as regiões acima do Cabora-
bassa até ao Zumbo e ás fronteiras inglezas da North-
Charterland e Rhodesia, e as situadas abaixo das refe-
ridas cachoeiras, comprehendendo Téte, Makanga e
Angonia ; e em baixa-Zambezia, referindo-se ao restante
território marginal do Zambeze até ao littoral, e cor-
rendo para o ENE. até ao Ligonia.
Em todo o território existem constituídas as antigas
villas de Quelimane, Téte e Zumbo, e a mais moderna
do Chinde, embora esta ultima localidade não tenha
ainda consagração official na cathegoria a que tem di-
reito.
A Quelimane está augurado? pela sua situação espe-
cialissima, uma grande prosperidade futura, pois é a
verdadeira e a mais segura testa da linha de penetra-
ção para o interior, ou seja para a região dos lagos,
Suando for levada a effeito a construcção do caminho
e ferro ao Ruo, ou seja para a alta Zambezia, apro-
veitando-se as vias fluviaes correctas e augmentadas.
Téte jaz n'uma phase de esmorecimento desoladora,
è as causas são deduziveis da sua situação geographica
só permittir que sirva de entreposto coramercial, cujo
desenvolvimento dependerá decerto dos progressos que
se operarem na exploração geral das regiões da alta
Zambezia adjacentes, que infelizmente, por emquanto,
não apresentaram um vislumbre de actividade.
E' de crer, sem duvida, que n'um futuro próximo se
produza um renascimento, pois elementos bastante di*
gnos de uma exploração dedicada existem, avultando
3'entre elles : os jazigos carboníferos das margens do
Revugo, cjue lhe estão fronteiros ; os filões auríferos de
Senga, ainda pouco pesquizados ; o commercio e por
fim a agricultura.
Só fundamentada uma dedicação intensa á actividade
26
que acabei de suggerir como mais efficaz, é que Téte
poderá attingir, ou mesmo exceder, a grande impor-
tância que em tempos remotos alcançou de parelhas
com a sua irmã Sena. As duas villas eram os dois cen-
tros d' onde irradiavam caravanas numerosíssimas em
procura do ouro, ao principio, e mais tarde, do mar-
fim, explorações essas que ao tempo em que os sertane-
jos eram senhores de milhares de escravos, eram iniciadas
sem grande despeza de capital. Hoje, como os tempos
mudaram com a implantação dos princípios da huma-
nidade e direito, é necessária uma intervenção mais sé-
ria da actividade, coadjuvada pelo emprego dos capi-
tães sob uma administração mais circumspecta.
A antiga villa do Zumbo teve uma vida, por assim
dizer, ephemera; foi creada n'um ponto da margem di-
reita do Aruangua, mas nunca teve o desenvolvimento
necessário para poder perpetuar-se. Mais tarde a con-
venção com a Gran-Bretanha, estabelecendo o rio Aruan-
gua como limite á expansão portugueza para Oeste,
obrigou a deslocar a sede para a margem esquerda, onde
hoje figura muito modestamente, mercê da ausência
absoluta de elementos constituitivos.
O. Chinde, como se disse não é ainda officialmente
considerado na cathegoria de villa, comtudo encerra em
si, pelo seu incremento actual, elementos de vitalidade
superabundantes que lhe dão jus áquelle titulo. Da con-
venção com a Gran-Bretanha, que nos impoz a chamada
concessão interna a Harry Jonhston (para fins de trans-
bordo e armazenagem de mercadorias destinadas á
Africa central ingleza e d'esta para o exterior) data a
transformação do extenso areal, que era d'antes, n'um
prospero centro commercial, onde a população europêa
cosmopolita abunda, e em consequência a construcção
de edificações progride, embora sob o emprego econó-
mico de material de folha de ferro ondulado e madeira.
m Riquezas da Zambezia. — As principaes
riquezas naturaes do território inherentes ao seu solo e
subsolo, são dignas de menção, não só pelo que em si
2 7
encerram, como pela necessidade, que se impõe, de se
determinar uma attenção especial em prol da sua utili-
sação e desenvolvimento pela acção do homem o que
é deduzivel do conhecimento que existe das suas boas
condições de vitalidade.
Borracha. — Encontram-se diversos exemplares, im-
portantes pela percentagem de sueco leitoso que pro-
duzem, e de sobra conhecidos no mundo botânico. As-
sim, abundam as Landolphias e a Kikxia da família
vegetal das apolynacias.
As primeiras são plantas trepadoras por sua nature-
za, de caule glabro, vegetando em grande abundância
nas altitudes medias, entrelaçadas e emmaranhadas pe-
las arvores das florestas ; as segundas são arvores alte-
rosas que abundam na mesma região. Encontram se
também magnificos exemplares do Ficus-elasticus, da
família das Urticaceas, nos terrenos ressumbrados de
humidade, mas não pantanosos. Mais alguns exempla-
res das diversas famílias da borracha existem, mas so-
bretudo falta-me competência para os conhecer e clas-
sificar.
Accrescentarei ainda que o indigena explora unica-
mente a Landolphia e parece não ter conhecimento das
propriedades das outras espécies; e exultemos por tal
facto, porque o processo da extracção do látex empre-
gado por elles arrancando as raízes conduziria a uma
devastação geral.
Madeiras de construcção. — Encontram-se espécies
varias, dispersas pelo território, com applicação vanta-
josa para as diversas phases da carpinteria. Assim
abunda a Ambila, muito largamente empregada na cons-
trucção de casas e embarcações, sendo inatacável pela
formiga branca (muchan); o Metondo, que é arvore de
grandes dimensões e que fornece a melhor madeira
para cavernas de embarcações; o Messecosse, que dá
boa madeira avermelhada, consistente e própria para
28
trabalho de marcenaria; o Mepinque, madeira preta ; o
Muconite, que é ébano aromático ; o Mugonha, arvore
magestosa de que se fazem almandias (embarcações
fluviaes indígenas) de quatro a cinco bancos.
Além d'estas existem muitas outras espécies, cuja
nomenclatura e applicação não estou verdadeiramente
informado.
Caça. — O gue vulgarmente se denomina caça grossa
abunda em diversas regiões da Zambezia, apresentan-
do- se as espécies seguintes: Nos carnívoros, apparece
o leão, tigre, hyena e chacal ; nos jumentados, a zebra
e rhinoceronte; nos porcinos, o porco selvagem, javali
e hypopotamo ; nos ruminantes, o inhacosse, búfalo e
veado ; nos proboscidos, o elephante, que apparece so-
mente nas regiões do Milange, Namuli, Lomué, Ango-
nia e alto Zambeze.
Mineraes. — O ouro tem sido encontrado nas areias
do alto Zambeze, em percentagem insignificante; ulti-
mamente consta ter sido descoberto um filão na região
do Senga, perto do Zumbo.
O ferro é o minério que mais abunda, principalmente
na região Milange-Lomué, onde elle é bem utilisado
pelo indigena para o fabrico de machados, zagaias, fa-
cas, etc, e empregando os processos primitivos para a
sua extracção dos terrenos onde abunda.
Os jazigos carboníferos sitos nas margens do Revugo,
na região da makanga, até hoje apenas explorados su-
perficialmente, attestam a existência do carvão de pe-
dra, cuja qualidade por emquanto não é boa, certa-
mente por não terem sido profundadas ainda as pes-
quizas.
Solo e população. — A verdadeira riqueza da Zam-
bezia é sem duvida demonstrada por dois argumentos
vivos de incalculável valor : a fertilidade do seu solo
2 9
nas diversas regiões em que se divide aquelle território,
e que são apropriadas a todas as culturas, e a densi-
dade da sua população indígena. Com as indicadas li-
beralidades da natureza tem progredido a Zambezia, a
ponto de se considerar como sendo o districto da Pro-
víncia de Moçambique onde o desbravamento das ter-
ras pela agricultura se evidenceia, e em consequência
onde a população aborígene demonstra mais faculdades
de trabalho.
Os géneros e artigos de exportação consistem em
amendoim, gergelim, copra, borracha, cera, gomma-
guta, pelles, arroz, marfim, ébano, gado suino, bovino
e caprino e fructos de toda a espécie.
Existe uma notável diversidade de habitantes no terri-
tório povoando as regiões especiaes. Assim temos ao
Norte e Leste o angurú ou alómue ; a Oeste, no alto
Zambeze, os marave e tavallas, machindas e muzuzu-
ros, e no centro o maganja. A linguagem differe um
tanto de uns para outros, permittindo comtudo que se
comprehendam entre si á maravilha.
Não faço um estudo ethnologico, apenas apresento
uma parcella de conhecimentos adquiridos por obser-
vação ligeira na occasião de percorrer o território. De
maneira que a diversidade de tatuagens, na testa, peito,
ventre e pernas; as formas caprichosas que empregam
no uso do cabello, ora rapando-o á navalha em diver-
sas direcções seguindo um contorno de desenho, ora
usando-o muito crescido para poderem entrançal-o se-
gundo uma forma particular, produzindo uma grande
profusão de tranças muito delgadas, ora deixando ape-
nas na frente um penacho comprido de cabello e usan-
do o resto da cabeça rapada; o uso de rodelas ou pe-
quenos recipientes de madeira ou metal, que pôde ser
estanho, prata ou mesmo ouro (segundo o grau de ri-
queza de cada individuo), em orifícios praticados ou
nos lóbulos das orelhas ou no lábio superior, tudo isto
concorre para representar os principaes característicos
differenciaes entre os diversos povos que habitam este
vastíssimo paiz.
De resto existem verdadeiros e definidos pontos de
3o
contacto, como, por exemplo, a constituição da família;
tendo em geral a mulher no seio do lar um papel bas-
tante inferior, sendo considerada mais como escrava do
que como esposa e tendo como missão cultivar as ter-
ras e fornecer filhos. O homem forma assim ás vezes,
sem grande trabalho, uma propriedade vendavel, pois
os filhos que lhe forneceu a mulher, e esta própria, são
considerados bens venaes.
CAPITULO II
Situação politica e soberania nacional
A Zambezia, politicamente considerada, apresenta-
nos em todo o seu território duas situações perfeita-
mente antagónicas, definidas pelo modo de ser cios seus
povos aborígenes, em relação com a soberania nacio-
nal. Ostenta-se bem caracterisada uma região central
onde se respira uma atmosphera de pacificação abso-
luta, que estimula francamente aos progressos moraes
e materiaes ; e em perfeito contraste existem regiões*
3uasi circumdantes á primeira, onde os povos se ufanam
e viver ainda ao sabor da sua natureza selvagem e
bruta, mercê da não effectividade de dominio que ahi
reina.
N'uma, as artes, as industrias e o commercio, refri-
gerados por assim dizer pelas auras da liberdade e fir-
mados pelas garantias de segurança, tomam alento e
prosperam tranca e audaciosamente ; os seus povos na-
tivos educam-se pelo exemplo do trabalho e serão os
verdadeiros obreiros n'um futuro não muito longiquo.
N'outra, a insubmissão de facto, manifestamente pre-
tenciosa, constitue um desdouro para a soberania, e
32
representa uma ameaça de perturbação constantemente
suspensa sobre os elementos pacificados.
São duas e completamente distinctas as regipes onde
a rebeldia existe ; e marcam ellas verdadeiras barreiras
extremas por situação local, onde a civilisação da Zam-
bezia termina; não por serem ellas materialmente im-
praticáveis, mas apenas porque o moral apathico da
administração tem obstado a serem postas em pratica
iniciativas tendentes ao fim salutar da occupação terri-
torial.
Essas regiões são as que limitam a Oeste e a Leste
o território da Zambezia : ambas são infelizmente ex-
tensas, abrangendo a primeira quasi toda a área que
vae de Téte ao Zumbo, e a segunda uma área circum-
dante á Maganja da Costa e Borôr, cujo contorno in-
terno inicia na margem esquerda do Tejungo e vae até
Milange.
Vou considerar em separado as duas regiões diver-
sas, expondo para cada uma o projecto (opportuna-
mente proposto á auctoridade superior da Província)
de levar a effeito seguro e sem grande dispêndio de
fundos a sua submissão definitiva.
A primeira é constituída territorialmente pela região
das duas Maravias e pelas de Senga e Chindima, que
partem das duas margens do Zambeze acima das ca-
choeiras de Caborabasa, reunindo-se em extensa pla-
ga, como que formando um mundo novo inexplorado e
de pacificação problemática. A sua situação politica
apresenta uns cambiantes, de maneira alguma indicati-
vos de installação effectiva da nossa auctoridade, mas
sim representando a implantação tacita de predomínios
de outrem, que a apathia administrativa tem deixado to-
mar incremento, a ponto de ser necessário actualmente
o emprego de alguma força militar para a aniquilar.
Comtudo data de longos annos, remontando mesmo
aos fins do século XVI, que audaciosas explorações,
tendo por fito a pesquiza do ouro, mais tarde a da prata
(que se apregoava em fama existir, mas que se reconhe-
ceu não passar de supposições mal fundamentadas), e
depois á procura do marfim, deram logar a uma defi-
33
nida penetração europêa. D'ahi derivou necessariamen-
te algum conhecimento da região citada, mesmo até aos
confins do Panhame, pelos portuguezes, que então af-
fluíam á aventura, attrahidos pelas informações (mais
ou menos lendárias) das riquezas naturaes do subsolo.
E não obstante essas incursões terem sido infructi-
feras debaixo do ponto de vista da obtenção das riquezas
mineraes, umas, como o ouro, que era muito traba-
lhosa e por conseguinte dispendiosa extracção, outras,
como a prata, cuja existência era pura lenda, foram el-
las de salutar effeito para a terra, pois permittiram o seu
conhecimento e posse senhorial, manifestada esta ulti-
ma pelo assedio em aringas que existiram de facto nas
duas margens, próximo de Chicôa e em outros locaes
ao longo das margens do Zambeze.
E' concludente pois que houve um inicio remoto de
acção occupadora, ao qual se seguiu, depois da convic-
ção de que a existência dos mineraes era puro ludibrio,
um abandono completo da região á supremacia de al-
guns naturaes transformados pela civilisação em Mu-
zungos (senhores), cuja auctoridade indubitavelmente era
bem acceite pelos povos. Os descendentes desses exis-
tem ainda hoje, appellidados Lobo (Mataquénhas), Xa-
vier (Garizamimba), etc, e representam ainda a influen-
cia actual como consequência da não implantação da
nossa auctoridade em tempo competente.
E' em virtude d'essa situação anormal que os indí-
genas de cada uma das numerosas partes em que se
divide a região, só julgam dever obediência ao seu mam-
bo ou muzungo, representando este um poder occulto
guardado e defendido por assim dizer pelos próprios
indígenas, que vêem n'elle o seu oráculo.
Julgam- se assim a coberto de invasões extranhas, pois
além de terem um chefe da sua egualha possuem bem
occultos depósitos de pólvora e armamentos que ficaram
das antigas expedições zambezianas, cuja triste historia
é bem conhecida.
O resultado fatal d'este estado de cousas é patente
pelos latrocínios á mão armada succedidos com fre-
quência, por actos de selvageria, de requintada malva-
3 4
dez, mesmo inquisitoriaes, de acontecimento vulgar ; e
apezar de tudo os povos preferem obedecer aos mu-
zungos a entregar-se livremente ao governo, por esta-
rem convencidos da fraqueza da nossa auctoridade ahi
e da pouca probabilidade de occupação eflectiva, mercê
da liberdade de que gosam ha longos annos sem inter-
rupção.
Aproveitando esta situação os aventureiros inglezes,
3ue residem tanto no território britannico do norte conce-
ido á North Charterland & C°, como no do sul (Rho-
desia), affluem em busca, no nosso território, das ri-
quezas que elle encerra, por as não encontrarem na sua
própria região, sobremaneira mais pobre. Para esse fim
teem empregado em seu proveito os costumados processos
suasórios, incutindo até ã convicção, no animo indígena*
que as terras não são do governo portuguez por ser
evidente que este nunca as occupou. E' isto o que se
passava principalmente na região do Undi, incontesta-
velmente portugueza, onde me constara que a North
Charterland tinha desde muito tempo feitorias estabe-
lecidas com consentimento do poderoso mambo das
terras; a illegalidade na existência de taes estabeleci-
mentos decidiu-me a ordenar a sua evacuação, para o
3ue encarreguei de tal commissão em agosto do anno
e 190 í o 2. tenente da armada António Júlio de Bri-
to, residente da Angonia.
Na região Aruangua, que encerra em si os mambos
importantes de nomes Qiauaro e Muçandaluz, e nas
restantes do norte e sul do Zambeze, nada consta acerca
da existência de estabelecimentos commerciaes impor-
tantes, nem mesmo da companhia daZambezia, a quem
no anno de 1892 foi pelo governo concedido o arrenda-
mento do mussôco em todos os pequenos prazos em
que se divide todo o território da alta Zambezia.
E' de crer que o ultimo facto tenha explicação plau-
sível na forma de exploração empregada pela referida
companhia concessionaria, sem o cunho de intervenção-
directa em quasi todos os prazos. O processo do sub-
arrendamento (quasi obrigado pelas circumstancias des-
criptas anteriormente com respeito á supremacia terri-
35
torial), a individualidades que são os próprios mambos,
de longos annos vegetando pela região, succedendo-se
de gerações em gerações, e considerando-se d'ella se-
nhores absolutos, frisa a deficiência na acção explora-
dora.
Emfim, é verdadeiramente accentuada a carência de
occupação territorial pelos elementos de exploração par-
ticular ; infelizmente o mesmo se mostra com a acção
da nossa auetoridade, que vae pouco alem das suas
duas residências nas margens do Zambeze : a primeira
em Cachombe e a segunda na confluência do Aruangua
com aquelle grande rio.
Considerando a auetoridade em Cachombe, é ella
installada na margem esquerda do Zambeze, sob a
forma de um cominando militar, cuja jurisdicção não
pode, pelas cercanias insubmissas de facto, embora com
apparencias de humildade na presença, ir além de uma
limitadissima área. Para a direita esbarra-se com as
terras de Ignacio de Jesus Xavier (o Carizamimba), po-
tentado ha muito tempo militarisado pelo governo e até
armado, possuindo uma aringa em Chicôa, principal
ponto estratégico de toda a margem e muito superior
ao nosso de Cachombe, e dispondo de centenas de es-
pingardas. Accrescenta-se ainda, para confirmar o va-
lor da posição, o facto de ser pelas suas terras a via
obrigada para a sede do commando e para o transito
das caravanas commerciaes. Pará a esquerda deparas-
se com os chabongas e mataquenhas, dirigidos por
Araujos Lobos. E finalmente pelo sul encontram se os
poderosos mambos do Inhamcombe, o Gossa e o Bo-
roma, que formam os chamados machingas, invasores
e desacatadores da auetoridade.
Foram os últimos que em janeiro de 1901 se colliga-
ram para atacar as estações da companhia da Zambe-
zia, encetando as suas correrias no praso Chabonga.
O seu administrador foi atacado a tiro de espingarda,
assassinado e decapitado, não obstante na localidade
existirem alguns elementos materiaes para defeza, for-
necidos pelo governo á mesma Companhia, isto é, 20
espingardas Snyder e cerca de 5oo cartuchos.
36
Faltara, ao que se presume, pessoal para se utilisar
dos citados elementos de defeza, o que leva a crer que
a victima fora abandonada pelos seus serviçaes, facto
este explicado pela pouca sympathia de que elle gosava
entre os colonos, pelo seu génio violento.
Felizmente as providencias por mim ordenadas, re-
forçando os postos militares com os elementos milita-
res disponíveis para uma defensiva, e com uma poli-
cia eftectiva dos caminhos commerciaes para segurança
no transito das caravanas, obstaram a que a revolta
passasse da margem esquerda, localisando-se no refe-
rido prazo Chabonga.
A nossa auctoridade no Zumbo, também sob a forma
de commando militar, ainda está em peiores condições
de installação do que a primeira, pela maior dificul-
dade que existe nas communicações terrestres. Tem
apenas a via fluvial com relativa segurança ; de resto é
cercado por povos insubmissos da região de Senga e
outros, que não pagam tributo e não obedecem senão
aos seus mambos.
Posto isto, é concludente que a grandeza da insubmis-
sao dos povos que habitam o vasto território de alem
Téte é um facto real deduzivel da ausência de occu-
pação.
A minha opinião (que foi expendida por diversas ve-
zes á primeira auctoridade da Provincia de Moçambi-
que) é cjue são necessários bastantes meios de acção
para se iniciar a obra de implantação da nossa auctori-
dade. A soberania tem de ser sustentada em postos mi-
litares no interior e nas margens do Zambeze, simulta-
neamente com o trilho incessante effectuado por escol-
tas, que sensatamente policiem as vias de communica-
ção que será necessário rasgar entre os diversos assé-
dios.
Na mente de toda a gente de bom critério decerto
surgirá, que na actualidade são indispensáveis, para um
emprehendimento efficaz da natureza do aue acabo de
insinuar, bons núcleos europeus de pessoal militar gra«
duado, embora a quasi totalidade das forças seja com-
posta de indígenas convenientemente militarisados e ins-
truidos. Em conformidade urge, a bem da pacificação
de toda a região, que se comece por occupar os seguin-
tes pontos: No território da margem esquerda do Zam-
beze dirigir-se a Chimuára, na região do Undi, predi-
lecta da North Gharterland C°, devendo-se n'aquelle
ponto estabelecer um bom commando militar que só
deverá ser confiado a um official prestimoso e sensato,
com o cjue muito se ganharia, por ser a região do Undi
fertilissima e bastante densa de população. Um outro
posto militar no Missale, situado na fronteira norte, e
que serve de passagem ás caravanas da Makanga, com-
pletará a occupação effectiva da Maravia Oriental. Na
Maravia Occidental e região de Senga abater-se-ha o
poder dos mambos, instalíando-se outro commando mi-
litar da mesma natureza do Ghimuara no Chincôco, o
qual será de consequências immediatamente efficazes
sob o ponto de vista politico, e de todos o mais urgente
e importante ; não se deve pensar porém em o fazer
muito pacificamente, porque Chigaga,- o mambo supe-
rior da região, que em 1898 foi batido mas não captu-
rado, está perto e restaurado com forças de defeza.
Abatidos os dois, Chincôco e Chigaga, é de presumir
que toda a plêiade de pequenos mambos do Pimbe nos
reconheça, sem mais delongas nem contestação, a nossa
auctoridade; e a não se eífectuar o que acabo de expor
não ha tratados possíveis nem palliativos a empregar
com elles, que são apontados d'entre todos os insubmis-
sos como o symbolo da desobediência.
Na margem direita do Zambeze elimina se o Cariza-
mimba, occupando a sua aringa de Chicôa, que, como
disse, domina terras por onde é obrigado o transito
das caravanas ou expedições commerciaes que de Téfe
vão buscar Mepézene, ou a região dos lagos, além de
ser o melhor ponto estratégico de toda a margem. Es-
tabeleçam-se de seguida mais três postos militares no
Inhatereza (Barura) a leste, no Daque ao sul, e um ou-
tro na fronteira de oeste que se escolherá devidamente
na occasião.
Com a realisação do exposto projecto de occupação
e mais com a presença de uma lancha canhoneira nas
38
aguas do Zambeze, a montante das cachoeiras, conse-
guir-se ha que os indígenas vejam que nos podemos
manter em supremacia effectiva, ficando pelo mesmo
facto convencidos de que as suas bravatas não nos as-
sustam. E assim tudo leva a crer que a obra se com-
plete por meios pacíficos, que certamente será processo
mais profícuo n'esta zona d'Africa do que uma guerra
de extermínio, que sempre conclue por transformar em
verdadeiros desertos regiões d' antes exuberantes de po-
pulação.
Duas regiões annexas ao extenso território de que
acabei de tratar, merecem também uma informação
precisa para se avaliar do seu grau de pacificação : são
ellas a Angonia e a Makanga. Confina a primeira com
o território inglez de Africa Central, jazendo como que
encravada n'elle; a segunda é uma sequencia da pri-
meira até á margem esquerda do Zambeze, mesmo a
jusante das cachoeiras.
Em ambas, até princípios do anno de 1900, não ha-
via sombras de auctoridade constituída, de maneira que
tudo caminhava ao sabor da vontade dos mambos, c}ue
se arrogavam senhores de tão vastos e ricos domínios.
A creação de uma residência do Governo na Ango-
nia em fins de 1899 e a posse dada á companhia da
Zambezia d'essa região constituída em prazo da Coroa,
concorreram eficazmente para o estado actual de paz
e concórdia.
Ao 2. tenente da armada António Júlio de Brito foi
confiado aquelle cargo official, e devido á sua actividade
e bom senso, em setembro de 1900, firma va-se por
uma politica hábil a supremacia do Estado na região,
com o bom effeito das prisões dos régulos mais impor-
tantes que se declaravam em manifesta desobediência.
São elles o Pemba, a Mlangeni, o Mandala, o Mu-
cauira, o Zissane, o Cabango, o Junga, dos quaes o
mais importante era o Mandata, que se suicidou duran-
te o trajecto para Téte, para onde era conduzido jun-
tamente com os restantes sob custodia, dirigida directa-
mente pelo tenente Brito ; dos outros apenas a Mlan-
geni está ainda em Quelimabe na cadeia civil, tendo
os mais seguido para Lourenço Marques e Moçambi-
que para servirem nas companhias de guerra.
O effeito moral d'estas prisões foi grande e imme-
diato ; a do Mandala sobretudo, por dispor de eran^e
numero de gente e ter o prestigio que lhe produziu o
facto passado em 1898 de não ter sido vencido pelos
inglezes armados de metralhadoras. A submissão geral
dos angonis foi um facto consequente devido ao as-
sombro, que a rapidez e o silencio nas operações pro-
duziu no animo indígena, naturalmente supersticioso.
Houve um verdadeiro golpe de mestre, cuja boa exe-
cução audaz, só por si, faz gloria ao official que a le-
vou a effeito discretamente e sem ostentação. Coube-
me apenas a honra de ter sanccionado uma operação
que evitou uma guerra futura, de consequências nefas-
tas certamente para a região, que se despovoaria im-
mediatamente em beneficio dos nossos visinhos inglezes,
além de ser bastante dispendiosa para o governo.
Na região da Makanga as cousas caminhavam pela
mesma forma, sob uma rebellião latente mantida pelo
regulo mais importante, Muzungo Caetano Pereira (o
Chassinga), mais ou menos apaniguado por alguns in-
divíduos influentes de Téte.
As dificuldades a vencer na Makanga para se im-
plantar o dominio da auctoridade do governo, affigura-
vam-se a todos os velhos zambezianos como invencí-
veis, sem uma expedição militar dotada de elementos
de força europêa em quantidade. Felizmente para a
causa da soberania nunca foi essa a minha opinião, tal-
vez suggerida pelo bom êxito da occupação da Ango-
nia pelos processos pacíficos, mas enérgicos.
Em conformidade com essas idéas, de novo encarre-
guei em segredo o tenente Brito (que para esse fim fiz
que viesse a Quelimane em princípios do anno de 1902)
da missão de prender o Chassinga, julgando assim (de
accordo com o mesmo official), que com tal facto pra-
ticado de improviso e auxiliado com os cypaes bem dis-
ciplinados da Angonia, seria dado novo golpe no pode-
rio dos mambos, e a nossa auctoridade seria mais uma
vez reconhecida e implantada sem mais delongas.
4 o
Assim succedeu conforme tinha previsto, e a prisão
e morte do potentado vingou ultrages antigos feitos a
pessoal do governo. A supremacia do Estado deu mais
um passo ovante, e mais uma vez se firmou á eviden-
cia, que para a pacificação da Zambezia não são ne-
cessários grandes núcleos de força europêa, bastando
uma grande maioria indígena militarisada, adestrada e
bem dirigida por officiaes de prestigio local.
Vou considerar de seguida a região de Leste da
Zambezia, que, como disse anteriormente, circumda a
Maganja da Costa e Borôr, iniciando na margem es-
querda do Tejungo, e indo parar a Milange. Está ella
comprehendida entre os cursos dos rios Quisungo ou
Ligonia e Licungo, e ahi a rebeldia dos povos predo-
mina também ainda infelizmente.
Descrevendo a traços largos essa vastíssima região,
é ella accidentada, chegando a ser montanhosa em
grande altitude ; o seu solo apresenta-se ubérrimo, sus-
ceptível de toda a espécie de cultura inter-tropical, e
exhuberante n'uma vida vegetal variável com os cam-
biantes do terreno.
No trajecto pelas veredas sinuosas que o instincto
indígena abriu em transito obrigado, a nossa vista ora
esbarra com espessos matagaes formando como que
anteparas impenetráveis, ora se alonga por extensas
clareiras abertas pelas necessidades agrícolas do povo,
e onde se depara com abundantes machambas ' de man-
dioca, milho, nhemba \ que juntamente com a cultura
do arroz nos terrenos mais baixos e húmidos, consti-
tuem a exploração vegetal em todo o território. Afora
as culturas indicadas com destino a supprir as necessi-
dades alimentícias, o indigena explora a borracha extra-
hindo a, pelos processos de esmagamento e decocção, das
landolphias, que nos ribeiros são exhuberantes em trepa-
deiras de grande espessura e abundância de látex, cons-
tituindo aqui e alli matto denso e emmaranhado. O ca-
1 Plantações.
2 Espécie de feijão frade.
41
fezeiro silvestre também abunda, offerecendose para
permutação o seu fructo de pequena grandeza, em tudo
semelhante ao conhecido e especial café de Inhambane.
Em minério parece ser pobre a região, pois nem a
tradição indígena affirma a existência de qualquer das
espécies de maior acceitação no mundo commercial em
quantidade que possa definir uma riqueza natural bem
caracterisada^comtudo observa se abundância de quartzo
com vestígios de ferro.
O indígena nativo apparenta robustez e destreza, no-
tando-se em grande parte da população aborígene al-
guns traços evidentes de cruzamento árabe que lhes
dá um tom de intelligencia e audácia. A raça predomi-
nante sobre a grande diversidade de habitantes oue ve-
getam por toda a região é a denominada alomue.
Prestadas as informações geraes acerca dos caracte-
rísticos da região passarei a expor as suas circumstan-
cias politicas.
Toda a região, condensada, como já se disse, entre x
os cursos dos rios Quisungo ou Ligonia e Licungo, está
dividida e subdividida por mazambos e muenes á , e en-
cerra em si dois elementos oppostos em relação á so-
berania nacional : um representa uma submissão abso-
luta, outro uma rebeldia systematica. Os povos do ele-
mento discordante cercam os do primeiro, oppondo-se a
qualquer incursão, mesmo de caracter pacifico ; e esses
impedimentos são reforçados por constantes invectivas
e bravatas como as do theor seguinte : iQue não pro-
curam o branco e que não querem que este os procure.»
Descriminemos a verdadeira situação: Dez mazambos
(cathegoria dada aos coripheus) consideram-se senho-
res da região, tendo-a dividido entre si por zonas, abran-
gendo as terras de um certo numero de muenes que se
lhe declaram adeptos e por tal lhes pagam tributo. D'es-
i O mazarabo é a auctoridade indigeha local considerada su-
prema, tendo ingerência em um agrupamento de terras. Os mue-
nes são immediatamente inferiores em importância ; são os donos
de terras que pagam tributo ao mazambo. s
42
ses mazambos seis estão já avassallados com todos os
seus muenes, em consequência da expedição de 1898,
tendo-se-lhes aggregado voluntariamente em fins do anno
de 1900 mais outro mazambo importante.
Esse effeito deve-se especialmente á occupação effe-
ctiva da Maganja da Costa e Bajone em 1899 e do Mu-
geba em 1900, situações estas verdadeiramente domi-
nantes.
O primeiro anno em que se effectuou um recensea-
mento mais rigoroso dos povos avassallados foi o de 1900,
tendo -se iniciado simultaneamente a cobrança do im-
posto de capitação (mussôco), que foi levada a effeito
sem surgirem difficuldades de espécie alguma, yu^ - ^
Em nns de 1900 effectuei o percurso de toda a re-
gião avassallada, fazendo previamente reunir na sede
do commando militar, na antiga aringa da Maganja da
Costa, todos os magnates submettidos, que sem fal-
tar um só accorreram pressurosos a cumpnmentar-me.
N'essa occasião exhortei-os a estimular os povos ao tra-
balho em obras publicas, agricultura, etc, e a virem
mesmo a Quelimane para tal fim, o que foi executado
pela primeira vez, estabelecendo-se uma corrente de
^affluencia de obreiros em busca de trabalho remune-
rado. Ficou por essa forma demonstrado o verdadeiro
symptoma de pacificação, que é conveniente aproveitar
ainda com certa diplomacia emquanto se não conseguir
^o complemento da occupação na região circumdante.
Vejamos agora em que consiste o Lomué rebelde:
estende-se este ainda por uma vasta região que limita
a jurisdicção districtal por Leste até ao curso do rio
Quisungo ou Ligonia, cuja origem é nos montes Na-
muli, e por norte até ao do rio Lurio, nascente nas ser-
ras do Liaze e Mulumbo. Constitue uma grande facha
(circumdante ás regiões pacificadas do Borôr, Mucuba,
Maganja da Costa), de representativa insubmissão, e
habitada por povos aborígenes que querem pôr um di-
que á corrente incursionista da occupação. Dois mazam-
bos poderosos, de nomes Ossua-muno e Regula-muno,
a quem são aggregados os grandes da região Milange-
Namuli (como são o Nhamarroi, o Gurué, p Tacuana,
etc), intitulam-se únicos possuidores do referido terri-^
tório. A escravatura ahi é negocio corrente ; formando
tal trafico o verdadeiro característico social que estabe-
lece a distincção entre os grandes indígenas e o resto
da população, considerada esta, pela sua condição in-
ferior relativa como o principal artigo de permutação.
Esses dois potentados'possuem aringas fortificadas em
situações que tratei de conhecer por informações seguras,
e gente armada em numero que a informação indígena
necessariamente exaggera, mas que apesar de tudo se
deve suppor importante. O armamento e pólvora que
elles teem obtido por troca de escravos effectuada no
interior de Angoche e Moçambique (nem por sombras
ainda occupado), onde domina o celebre Farlai e o não
menos Imbameíla ou Morlamuno que ahi dão a lei, di-
zem ser importante em numero. *"'
Não obstante a preponderância que os dois citados
régulos exercem nos diversos muenes, cujas terras cons-
tituem pela sua ligação territorial a indicada zona de
rebeldia, consegui em fins de 1900, como consequência
immediata da installação por mim ordenada dos postos
militares no Mugeba e Mucuna (o primeiro situado a
cento e vinte kilometros para o norte verdadeiro da
arinça da Maganja da Gosta e o segundo a igual dis-
tancia do Bajone sito na margem direita do Tejungo),
a vassallagem de mais alguns muenes, a despeito das
imprecações, suggestões e ameaças dos ditos potenta-
dos contra tal resolução dos seus antigos adeptos.
Comtudo, a acção da soberania nacional, apesar de
ter sido um tanto ampliada com a indicada penetração,
continuava a resentir-se da falta de elementos de oc-
cupação, que apesar de serem requisitados com instan-
cia superiormente, nunca vieram em auxilio do bom
desejo que me animava. Os factos passados durante o
anno de 1901, em tempo opportuno levados ao conhe-
cimento superior, vieram confirmar a rebeldia dos po-
vos, a par de uma audácia pasmosa ; os quaes, infeliz-
mente para o nosso prestigio, tiveram de ficar sem o
devido correctivo.
O primeiro facto teve logar em Pebane, posto situado
44
na margem esquerda do Tejungo, destinado á lancha-
canhoneira que estaciona permanentemente no mesmo
rio, e onde existiam umas pequenas installações neces-
sárias para depósitos de mantimentos e material. Pois
os rebeldes, dirigidos por Regula, aproveitando uma
curta ausência da lancha-canhoneira, qi^e fora ao rio
Mazembe em commissão de serviço útil, queimaram
as referidas installações, roubando previamente tudo o
que encontraram, e capturando três marinheiros indíge-
nas que o commandante, o 2. tenente da armada Cas-
queiro, ahi deixara de guarda.
Depois d'esta proeza, elles, esperando justamente se-
vero castigo, reuniram-se na sua máxima força com as-
sedio nas margens do Molai, de onde fizeram alarde de
que estavam ahi f aguardando a guerra». Com os ele-
mentos de pessoal e material disponiveis fez-se uma
tentativa de lhes dar um correctivo : com esse intuito
seguiu a canhoneira Chaimite a tentar a entrada do tal
rio Molai, que infelizmente tinha uma boca impraticá-
vel; e a deficiência de soldados impediu-me de tentar
um ataque por terra, decisivo, ficando por esta forma
saldado com a impunidade o commettimento dos re-
beldes.
Dois mezes mais tarde, o mesmo regulo incitou o
Nhamarrói, grande chefe dos povos habitantes da re-
gião Milange Namuli (condensados especialmente nas
margens do Licungo desde o Lugêlla aos Picos Namuli
e alastrando- se para Leste e Oeste), a sacudir do seu
território os brancos que então estavam explorando a
citada região como empregados da companhia da Zam-
bezia, d'ella concessionaria. Sublevados os povos ata-
caram de seguida alguns pontos onde estavam installa-
dos os ditos europeus, pondo-os em debandada e ma-
tando um ou outro empregado menor, filho do paiz \ no-
tando-se que no progresso da incursão guerreira ficaram
incólumes as sedes dos commandos militares de Milange
e Angurus.
Esta nova sublevação dos povos ficou também sem o
conveniente correctivo, pelos mesmos motivos que im-
peraram na solução abstensiva dada ao facto anterior,
mercê da falta de providencias sollicitadas superiormente
e por motivos que ainda ignoro não satisfeitas.
Analysados os factos conclue-se que a rebeldia no
território deixou de estar latente para se tornar demons-
trativa, e a abstenção por nosso lado em castigal-a de-
certo foi interpretada pelo mundo sublevado como medo.
Lembro-me de ter previsto, e mesmo annunciado ofi-
cialmente em tempo competente, que apoz a época das
colheitas do mantimento, os rebeldes redobrariam de
audácia, estimulados sem duvida pelo bom êxito conse-
guido com o affastamento dos brancos dos seus domi-
nios, e pela opinião de fraqueza em que fomos tidos,
pouco lisongeira para o nosso prestigio.
Infelizmente factos muito recentes passados na mesma
região, de ferimentos feitos a europeus, e algumas mor-
tes de indígenas, vêem corroborar o que já se achava
previsto com respeito á repetição dos actos anterio-
res.
Expostas pois as circumstancias em que actualmente
se manifesta o extenso território evolvente ás terras
avassalladas da Maganja da Gosta e Borôr, tenho oc-
casião de repetir mais uma vez (o que expuz em tempo
oficialmente), que é necessário e inadiável o effectivo
de uma occupação para prestigio da bandeira e benefi-
cio da administração publica. Isto tem o cunho caracte-
rístico d'uma exigência imperiosa, imponente á sobera-
nia nacional, affectada pelas continuas bravatas e latrocí-
nios á mão armada dos povos insubmissos, pela escrava-
tura considerada por estes como negocio corrente, pela
perspectiva de uma ameaça invasora para as terras do
sul e finalmente por outro facto não menos importante,
que consiste na emigração já definida dos colonos d'estas
ultimas terras avassalladas para aquellas onde se não
exige o mussôco, que por conseguinte são consideradas
pelo indígena como mais hospitaleiras, o que tudo con-
vém sobremaneira evitar.
Para esse intuito propuz á auctoridade superior da
província, em principios de outubro de 1901, levar a ef-
feito a occupação e pacificação de toda a região rebelde,
apenas com os elementos militares dados ao districto
4 6
da Zambezia pela organisação militar da província de
Moçambique.
Tornava-se apenas necessário e indispensável um ef-
fectivo completo nas companhias de guerra, que apre-
sentavam lacunas importantes no seu pessoal ; e essa
modesta força militar julguei- a e julgo-a, auxiliada por
um pequeno núcleo de força europêa para manejo de
artilhena de pequeno calibre, suficiente para implan-
tar num pequeno período de tempo a pacificação
geral.
Um plano de operações bem detalhado foi submettido
á consideração superior, e tinha por inicio precursor a
implantação de um commando militar nos Picos Na-
muli, de grande effeito moral para os povos da circum-
visinhança. Uma lancha-canhoneira, percorrendo todas as
vias fluviaes que affluem ao Muebazi (rio este que dista
do Tejungo apenas trinta e cinco milhas para o norte),
garantiria immediatamente a tranquillidade no sul, pois
as suas margens são nada menos do que os velhacoutos
consagrados aos dois potentados.
A modéstia da quantia a dispender extraordinaria-
mente com a pequena expedição 4 deveria ter sido um
influente de summa importância para se decidir por uma
vez a aniquilação da rebeldia systematicamente acin-
tosa d'estes povos, mas o silencio da auctoridade supe-
rior expressou a pouca sympathia que lhe merecia o pro-
jecto, que nem sequer apresentava assomos de audácia.
Conclui a resenha de indicações acerca da situação
das duas regiões onde a rebeldia é bem patente. Se-
guirei a considerar a outra onde se condensa a pacifi-
cação desde longos annos, mercê do systema adminis-
trativo conducente á disseminação territorial da aucto-
ridade do governo, pela installação de commandos mi-
litares em diversas localidades.
Actuam os commandos militares, ou, por assim dizer,
como guardas avançadas para a occupação pacifica das
1 A despeza não excedia, segundo cálculos effectuados com se-
gurança, a cifra de vinte contos de réis.
regiões, ou como pontos de apoio á manutenção das pa-
cificações effectuadas. O papel que desempenham é de
tal maneira importante na civilização geral, que julgo
de inteira conveniência trazer ao conhecimento as cir-
cumstancias que mais imperam em cada um dos com-
mandos existentes, e relativas á sua situação local, aos
elementos componentes, ao seu modo de ser conside-
rado politica e economicamente e finalmente ao que a
necessidade de melhoramento impõe que se faça para
bem do serviço publico.
Começando de oeste para leste temos em primeiro
logar o commando militar do Zumbo, instituído em su-
bstituição do antigo governo do districto, que teve uma
existência, que além de ephemera era pouco real.
A sua junsdicção administrativa abrange a região da
Maravia de oeste, tendo por limite norte a fronteira in-
{;leza, sul o curso do rio Zambeze, leste a Maravia de
este e oeste o rio Aruangua ; região que, como se vê,
é extensa bastante. Comtudo a situação local do com-
mando na margem esquerda do Aruangua e por conse-
guinte quasi no extremo do território da circumscripção^
e acerescendo a esse facto ainda a deficiência de ele-
mentos de oceupação e defeza, como se verá adiante,
concorrem para que a sua existência pouco tenha in-
fluído no desenvolvimento local, que por esse facto pó-
de-se dizer ser nullo. Por vezes o pessoal do commando
se compõe de um sargento e alguns soldados, por falta
absoluta de officiaes; cm contraposição os inglezes crea-
ram recentemente um posto militar no seu território da
margem direita do Aruangua, no sitio denominado Fei-
ra á , tendo um official como commandante, o qual ne-
cessariamente quererá e deverá manter relações cor-
deaes e diplomáticas com o commandante portuguez, o
que não será bem realisavel quando o ultimo não tenha
patente de official.
As installações d'este commando são regulares, pos-
1 Situado no antigo prazo Mandombe e antiga sede do com-
mando do Zumbo antes da convenção luso-britannica.
4»
suindo edifícios de alvenaria, que segundo informações
officiaes estão bem conservados.
A pequena distancia do commando está situada a
missão de S. Pedro de Claver, subsidiada pela de Bo-
roma, a qual julgo tem prestado bons serviços á loca-
lidade.
Segue-se o commando militar de Cachomba, instal-
lado na margem direita do rio Zambeze, a i85 kilome-
tros de distancia de Tete; e, cousa curiosa, na escolha
da posição predominou a infelicidade, a ignorância, ou
qualquer motivo de força maior, porque estando, como
está, abeira rio, parece que deveria ser algum local do-
minante, de condições estratégicas para as circumvisi-
nhanças ; mas para cumulo de irrisão foi construído um
pseudo forte, sede do referido commando, num local
baixio, dominado pelas alturas circumdantes.
Julgo que n'esta escolha houve receio de desgostar
um celebre negro Ignacio de Jesus Xavier, vulgo Cari-
samimba, a quem as auctoridades de então dispensa-
vam grande consideração, a ponto de lhe terem con-
sentido a construcção de uma aringa em Chicôa, ponto
de maior altitude, e que domina a nossa posição.
Tal aringa, como um attestado vivo da má orienta-
ção tomada, ainda hoje existe, juntamente com o s*u
proprietário, impando de satisfação pelo respeito que
julga infundir, proclamando a sua independência pela
impunidade em que teem ficado continuados actos de
selvageria e latrocínios á mão armada praticados.
Era este o local que se deveria ter escolhido para o
commando, o qual realisaria todas as condições de de-
feza e abastecimento que escasseiam infelizmente na
actual situação.
A jurisdicção d'este commando abrange a região ao
sul da margem direita do Zambeze até ás fronteiras in-
glezas da Rhodezia, mas de facto, attenta a má dispo-
sição dos povos para a pacificação, incluindo a ameaça
constante da aringa do Carisamimba, a "influencia da
auctoridade pouco excede a área das installações.
E já que falíamos de installações direi que estas são
apenas próprias para servir de aquartellamento ao des-
49
tacamento importante que ahi reside, mas de maneira
alguma o seu conjuncto pode ter a denominação de for-
taleza, pois se salienta a ausência dos elementos mais
importantes que caracterísam construcções desta natu-
reza.
A falta de officiaes tem produzido nos últimos tem-
pos uma permanência pouco duradoura ahi dos diver-
sos commandantes, facto que é manifestamente contra-
producente para a regularidade na sequencia da admi-
nistração local, que muito seria para desejar manter-se
n'um período mais longo, para que uma attracção da
parte dos indígenas arredios se defina, para alargamento
de occupação pelos meios pacíficos.
O commando superior de Téte substituiu, com a or-
ganisação do distncto da Zambezia, o antigo governo
do districto do mesmo nome. Nenhuma alteração di-
gna de menção se tem produzido com o caracter de
melhoria n'esta sede de administração da região do alto
Zambeze, antes algum decrescimento tem tido logar,
principalmente nos edifícios públicos.
Abstenho-me n'este capitulo de produzir uma descri-
pção das installações do Estado, porque esse assumpto
será tratado na secção respectiva com algum desenvol-
vimento.
Direi apenas que o edifício do commando militar está
quasi em ruínas, e que a 5. a companhia de guerra se
acha aquartellada convenientemente no forte D. Luiz,
situado á margem do rio e em altitude correspondente
á efficacia da de fez a local. Existe um outro fortim mais
para o interior, chamado de S. Thiago, o qual está
ameaçando ruina e a sua reconstrucção não se impõe
á necessidade.
O commando militar de Chiranga, creado pelo Go-
verno Geral de Moçambique em maio de 1900, serve
uma região até então abandonada á mercê das incur-
sões dos indígenas do Barué ; existe verdadeiramente
encravado entre os territórios sob a administração da
Companhia de Moçambique por leste e a fronteira in-
gleza da Rhodezia por oeste. As suas installações são
ainda um tanto á moda do paiz, aperfeiçoada pelo sys-
5o
tema de construcção com terra maticada, o que dá uma
apparencia mais acceitavel á vista.
A continuação d' esta occupação recommendava-se, já
pela visinhança dos inglezes, já pela fiscalisação do per-
feitamente caracterisado transito commercial, composto
especialmente de gado; e já finalmente pela proximi-
dade das regiões rebeldes dos Macombes, a quem pela
sua attitude rebelde era necessária uma demonstração
effectiva e constante de forças para os conter em res-
peito, a distancia.
O commando militar de Massangano foi por ordem
do Governo Geral mandado entregar á companhia de
Moçambique, que até á data da minha retirada se re-
cusou a recebel-o por motivos que oficialmente ignoro»
Está installado n'uma fortaleza construída numa emi-
nência da região na margem direita do Zambeze, e pró-
ximo da embocadura do Luenha. É um ponto estraté-
gico de valor, pela sua altitude sobranceira a uma ex-
tensa planície, que se prolonga até á região dos Ma-
combes e que quasi o circumda.
O commando militar de Milange está installado na
forte do mesmo nome ; a sua situação na baixa panta-
nosa e alagadiça do valle da cordilheira Tumbine é de-
plorável. Patenteia-se a velha usança (talvez filha da in-
dolência vulgar nestes climas inter-tropicaes), de occu-
par as pequenas altitudes contentando-nos com a facul-
dade de se poder d'ellas observar a perspectiva das
alturas, embora essas eminências sejam convidativas
para melhor acondicionadas installações.
Parece ser este exactamente o caso que se dá com
o forte de Milange, cuja construcção, considerada em
si e no seu conjuncto, embora não seja muito perfeita*
satisfaz comtudo ás necessidades da defeza. Na posição
é que é notório o crime de leza- consideração pelas emi-
nências próximas, como também o desprezo imperdoá-
vel pela salubridade, que só é costume ter logar em
casos urgicos de occupação provisória.
Ha uma dezena de annos, quando as fronteiras ainda
não eram conhecidas por delimitação, foi installado o
commando militar no monte Milange, supponho que
5i
em boa altitude e melhor situação. Um pouco mais tarde
accordou-se com os inglezes em ser o rio Meloza (que
separa aquelle monte aos montes Tumbine) a linha di-
visória da fronteira, ficando o monte Milange conside-
rado em território inglez; por esse facto naturalmente
foi mudado o commando militar para o interior da mar-
gem esauerda do Melola, affluente d* aquelle rio, situa-
ção infeliz em que hoje se encontra, positivamente na
baixa que intervalla os dois montes Tumbine e Mi-
lange.
Se por occasião da escolha de local para mudan-
ça de installação, se tem olhado para a defrontada
cordilheira do Tumbine, observar-se-iam quebradas con-
vidativas, principalmente no monte Bisa (distante da
posição actual apenas 19 kilometros para o norte), pro-
porcionando local em muito boas condições geraes para
a construcção do forte e instituição do commando mi-
litar. Mas preferiu-se a escolha do actual logar húmido
e insalubre, que nada recommendava, nem mesmo a
proximidade das aguas potáveis, pois as que fornece o
rio Melola são de péssima qualidade, a ponto de nem
serem aproveitadas pelos indígenas *, e comtudo a serra
tem sempre agua corrente em profusão.
O commando militar está em communicação com
Chilomo por uma linha telegraphica e por uma estrada
direita de 87 kilometros de extensão, correndo na direc-
ção norte-sul. Tem como commandante um official,
que tem sob as suas ordens um destacamento da 4.*
companhia de guerra. Serve uma região, que é a dos
Tacuanas, a qual em grande extensão para leste está
em estado de rebeldia.
O commando militar dos Angurus, instituido em prin-
cipios do anno de 1900, está provisoriamente installado
em Mulumbo, ponto dominante da região. A sua dis-
tancia do de Milange é cerca de 90 kilometros para o
NNE. d'este, com o qual está em communicação por
uma estrada recentemente aberta, que passa pelos pon-
1 Suppõe-se que tenha saes de cobre em dissolução.
52
tos notáveis: Bisa, Pandaminga, Samicua e Nhama-
lumbe.
Está a cargo de um official, que também tem sob
suas ordens um destacamento da 4.* companhia de
guerra.
A existência d'este commando, embora de recente data,
tem produzido effeito salutar sobre a occupação da região
áquem da margem leste do lago Chirua, comprehendendo
os montes Liazi e Muluma, e tem contido a distancia res-
peitosa os rebeldes das regiões Gurué-Namuli e Nha-
marroi, auctores das recentes incursões ás estações com-
merciaes da companhia da Zambezia. Observa-se na
região as ruinas de um edifício que dizem ter sido cons-
truído pela Industrial Mission de Blantyre e que foi
abandonado pelos missionários, suppõe-se que por oc-
casião de serem delimitadas as fronteiras, em virtude
do que ficou o local em território portuguez; comtudo,
do exame das referidas ruinas conclue-se que o edifício
não foi completado, o que talvez arraste como conse-
quência o poder affirmar-se que não chegou a estar em
exercício a mesma missão na localidade.
Estes dois últimos commandos militares representam
o inicio da occupação de uma região, por assim dizer,
inexplorada, e de que apenas recentemente se conhece
alguma cousa das suas riquezas naturaes, que pela sua
excellencia incitam na prosecução para leste da acção
dos elementos pacificadores do Governo.
Vou considerar agora na região leste do districto, que
é o território vastissimo que vae da Maganja da Costa
aos confins do Lomué, a sua occupação actual:
O commando militar da Maganja da Costa foi creado
logo apoz a conquista da região effectuada auspiciosa-
mente em 1897 pela força das nossas armas; foi instal-
lado juntamente com a 3. a companhia de guerra dentro
da aringa dos rebeldes, onde já existiam algumas edi-
ficações de alvenaria. A sua situação, embora não seja
no local de maior altitude, satisfaz como sede de con-
centração de forças militares. A serie de communica-
53
ções, umas naturaes outras estabelecidas para os diver-
sos pontos do interior, todas convergentes á aringa, re-
commenda a sua conservação, pelos menos emquanto
a pacificação se não generalisar ás regiões Lomués de
norte e leste, ainda não avassalladas. Não é pois um
verdadeiro ponto estratégico, nem actualmente ha ne-
cessidade de selo, por estar centralisando uma área já
enorme, pacificada, de cujos povos nada ha a recear.
Como dependência d'este commando foi creado um
posto militar no Bajone, localidade na margem direita
do rio Tejungo ou Moniga, convenientemente installado
numa casa de ferro, encerrada dentro de um recinto
murado de terra amassada, que constitue a aringa de
defeza. Este posto é importante, porque marca no rio
Tejungo, essencialmente caracterisado por margens bai-
xas e alagadiças, o local onde a elevação do terreno é
mais notável e o mais francamente accessivel pela na-
vegação ; por esses factos poderá vir a ser um entreposto
commercial de grande importância futura, servindo as re-
giões interiores, ainda de pacificação problemática actual-
mente. O Bajone está directamente ligado com a sede
do commando militar, não só por uma estrada quasi
recta de cerca de 68 kilometros de extensão, como tam-
bém por uma linha telegraphica de muito recente cons-
trucção e aberta á exploração em fins do anno de 1901.
Em setembro do anno de 1900 foi, a minhas instan-
cias, creado em Mueeba outro posto militar. Dista este
local da aringa da Maganja da Costa cerca de 120 ki-
lometros, contados n'uma direcção approximadamente
norte verdadeiro d'este ultimo ponto.
A sua situação geographica exactamente nos confins
da região pacificada e defrontando com os velhacoutos
consagrados aos povos rebeldes do alto Lomué, por si
só serve de justificação á medida tomada. São eloquen-
tes as circumstancias que concorrem na localidade es-
colhida: dominando peta sua altitude, excedente á dos
arredores também alterosos, uma grande área territo-
rial, isto a par de uma abundância existente de recur-
sos de toda a ordem e de uma salubridade a toda a
prova; tendo aos pés o curso do Raraga, de margens
54
verdejantes, e a agua brotando das vertentes dos mon-
tes, correndo a engrossar a veia liauida d'este rio, que
só se torna caudaloso na epocha chuvosa. Finalmente,
a grande distancia a que estavam do commando os po-
vos de alguns muenes submettidos e a proximidade a
que estes estavam da região rebelde (facto este sobre-
maneira pernicioso á influencia do Governo, a ponto de
ser difficil cobrar-lhes o mussôco), impunha a implanta-
ção de uma auctoridade no seu centro, que iniciasse o
contacto salutar á conservação da pacificação onde ella
existia, e attrahisse os rebeldes também á submissão.
Foi construída ahi uma aringa de terra guarnecida de
arame farpado, e no interior d'ella edificaram- se duas
casas de madeira e zinco para alojamento do destaca-
mento composto de um sargento e vinte praças da 3. a
companhia de guerra.
Termina assim a descripção dos elementos que actual-
mente concorrem para se conservar a pacificação do
districto em toda a região onde ella foi já effectuada,
podendo dizer-se afoutamente que nos pontos occupados
nunca foi alterada a ordem publica. Falta proceder-se
á conquista do resto da rogião para n'ella ser em se-
guida implantado o mesmo regimen administrativo.
CAPITULO III
Do clima
Vou considerar a traços largos as condições naturaes
de salubridade com que se depara no território da
Zambezia, bem como aquellas que accidentalmente
teem concorrido para que o europeu, n'uma região que,
como esta, tem todos os predicados para ser insalubre,
encontre um clima, se não de uma pureza absoluta, ao
menos accomodavel á sua estabilidade ahi durante al-
gum tempo.
E' incontestável o principio acceitavel de que a salu-
bridade de um território depende em especial das suas
circumstancias geographicas e meteorológicas.
As primeiras, por serem facultadas pela natureza e
por conseguinte abrangiveis no seu conhecimento pelas
incursões humanas representativas do desenvolvimento
colonial que ultimamente tem tido logar, são do domí-
nio da actualidade. Assim, a Zambezia, com o seu pla-
nalto que se extende da Namulia a Milance e á An-
gonia, terminando na Murrambala (o qual é uma se-
quencia do grande planalto da Africa central, advin-
do de regiões mais ao norte), como que abatendo-se
56
fradualmente por socalcos successivos até constituir a
aixa de terrenos, proveniente de sedimentação antiga,
em extensa planície que vae morrer no oceano, apre-
senta diversos cambiantes de salubridade no seu cli-
ma.
Attente-se bem na geologia e orographia das diversas
zonas territoriaes, e isto, conjuncto á experiência de
longos annos, accentuará por uma forma indiscutível a
excellencia dos climas do planalto á adaptação da raça
europêa em explendidas condições do viver inter-tropi-
cal.
E' essa zona o futuro foco de colonisação que de-
finirá uma era mais avançada no progresso do dis-
tricto.
Na planície humosa e húmida, profusa em charcos
pantanosos, alguns de grande extensão kilometrica,
onde está concentrada a vitalidade da Zambezia, a sa-
lubridade depende ainda do saneamento dos terrenos
pelo processo de drenagem, único que se tem empre-
gado na villa de Quelimane, e que bastante tem con-
corrido para uma melhoria sensível nas suas condições
climatéricas. Mas o numero de valas de esgoto ainda
é pequeno, o que é comprovado pela grande accumu-
iação de aguas na época das chuvas torrenciaes de de-
zembro a janeiro que se observa nas ruas e nos terrenos
livres de construcções. A razão d'esse estado de cousas
reside na falta de capital que tem a camará municipal do
concelho para produzir um systema de valas e canali-
sação que dê vasão para o mar a todas as aguas plu-
viaes, evitando-se assim por completo os pântanos den-
tro da área da villa.
Na villa do Ghinde, natural ponto de salubridade,
existem condições especialíssimas para um verdadeiro
sanatório.
A natureza do terreno de areia solta, a situação á
beira mar recebendo em primeira mão os ventos cons-
tantes do oceano, dão-lhe a primasia na offerta do local
apropriado á vida europêa. Gomtudo as aguas da chu-
va, depositando-se nas baixas do terreno, produzem
uma vaza que o torna impermeável, obstando assim ao
esgoto natural pela absorpção; e estes pântanos, que
talvez sejam mixtos pelo affluxo das aguas das marés,
concorreriam para prejudicar as condições benéficas do
clima, se os ventos constantes e quasi sempre frescos
não operassem como que uma limpeza continuada no
ambiente, varrendo para sotavento os miasmas deleté-
rios.
E' pois indispensável ajudar-se a natureza na sua
obra bemfazeja, fazendo-se uma drenagem geral nos
terrenos onde assenta a villa. Para esse fim uns estudos
prévios do processo a empregar são necessários, pois
a natureza movediça do terreno, redemoinhando pela
acção dos ventos e formando dunas, deve merecer uma
attenção especial, pela grande influencia que deve ter na
execução efficaz de taes trabalhos.
Em Téte, a villa, assente em altitude elevada, não é
influenciada por pântanos próximos ; é por esse motivo
relativamente saudável. Devido talvez á aridez dos ar-
redores, á quasi ausência de arvoredo, o sol produz um
grau tão intenso de calor, principalmente nos mezes de
outubro e novembro que precedem a época chuvosa,
que nem o cafre pôde resistir, sendo frequentes as in-
solações. N'estas circumstancias parece que se deveria
pensar em constituir florestas n'estas regiões, que de-
certo concorreriam efficazmente para uma alteração na
temperatura atmospherica, como também seria um po-
deroso auxiliar á regularisação das chuvas, que n'esta
zona territorial são incertas, dando logar por vezes a
séccas terríveis, que teem produzido perda completa de
culturas indígenas.
No resto do districto, que se acha retalhado em pra-
zos administrados por particulares, bastante já se tem
feito no sentido de se melhorarem as condições do sa-
neamento, com o desbravamento dos terrenos para a
agricultura ; e o grande incremento que esta necessa-
riamente deverá ter n'um futuro próximo será um im-
58
portante factor para a salubridade de cada uma das
referidas circumscripções e por conseguinte para toda
a Zambezia.
Relativamente ás circumstancias meteorológicas nada
posso avançar respeitante á influencia das alterações
atmosphericas sobre a salubridade, pois nunca se fize-
ram observações nem estudos na Zambezia n'este ramo
scientifico.
E' por si mesmo evidente a utilidade que derivaria
para este paiz das referidas observações reduzidas a es-
tatísticas habilmente formuladas : e esse trabalho servi-
ria, não só para se indagar dos agentes que concorrem
para a salubridade, como também seria de louvável
auxiliar áquelles que se interessassem pela agricultura
das diversas espécies vegetaes lucrativas no mundo
commercial.
Existem vestígios de se ter montado no alto do edi-
fício das obras publicas em Quelimane, em tempos, um
posto meteorológico, existindo ainda hoje alguns instru-
mentos adequados ao fim ; parece deduzir-se pois que
já houve uma iniciativa que infelizmente não vingou,
talvez por falta de observadores.
Em conclusão é justo, e julgo de toda a conveniência,
que se preste a este assumpto a attenção que elle
merece pelos considerandos apontados. E' pois de-
ductivo que para uma salubridade permanente no vasto
território da Zambezia se apresenta como necessário:
uma drenagem geral nas planicies, um desenvolvimento
de arborisação, arruamentos e abertura de mais estra-
das de communicação, e attender-se finalmente ás con-
dições accidentaes que resultam do systema de cons-
trucção de edifícios.
A maior parte das edificações, de tijolo cafreal e
barro amassado (materiaes que entram na construcção
geral), produzem habitações húmidas, sem conforto e
quasi sempre infectas, accrescendo a isso o facto de
59
serem a maior parte dos edifícios existentes, de rez-do-
chão, a começar pela residência do Governo. Deve-se
pois pensar também em submetter as construcções par-
ticulares a uns preceitos hygienicos, que podem come-
çar pelos materiaes a empregar, e por se elevarem
aquellas o mais possivel acima do nivel do terreno onde
se edificarem.
SECÇÃO II
Colonisação — Instrucçâo— Missões — Exploração
— Prazos da coroa — Sitaaçao económica—
Agricultara — Gommercio — Industria — Naie-
CAPITULO I
Colonisação
Os nossos domínios africanos são as venerandas re-
líquias das nossas glorias, que cumpre conservar com
ufania, pondo em acção simultânea os máximos esfor-
ços para que o seu nivel moral e social se eleve. Cons-
tituindo-se esses domínios em reflexos evidentes da mãe-
patria e garantindo se nelles pontos de apoio ás diver-
sas alavancas instigadoras de toda a actividade humana,
será firmada a acção colonial.
Surge pois a colonisação como pensamento funda-
mental para se consolidar a civilisação de paizes, cuja
existência representa esforços sobrehumanos dos nossos
maiores, que em luctas titânicas de diversa espécie os
conquistaram, tornandose por este facto em territórios
subsidiários e tributários da metrópole.
Data de épocas muito remotas o espirito da expansão
colonial dominando os povos da antiguidade, gregos,
phenicios, romanos, etc, manifestando-se uns e outros
62
n'uma diversidade de tendências dimanadas do pensa-
mento inicial determinante da emigração. Os primeiros
abandonavam voluntariamente por completo o seu paiz
natal, correndo em busca de longiquas paragens, acam-
pando n'ellas e lançando-lhes o gérmen de novas po-
voações livres, cessando assim toda a ligação com a pá-
tria. Os segundos manifestando intuitos puramente ga-
nanciosos, egoístas e altruístas ao mesmo tempo, pela
propaganda commercial monopolisada entre os membros
da mesma raça, mas com o fim único de contribuírem
para o engrandecimento da metrópole, despediam- se em
caravanas numerosas á procura de região propicia. Os
últimos guerreiros e conquistadores por índole. ethnica,
tinham por divisa unicamente impor o jugo do vence-
dor. Não obstante a pouca analogia de forma, a cons-
tituição de colónias por cada um d'esses povos foi um
facto memorável.
No meio da evolução operada n'esses povos de diver-
sas origens, a historia antiga accusa a existência de co-
lónias florescentes invadindo o mundo com os seus pro-
ductos especiaes e definindo épocas de grandes pros-
peridades. Comtudo, apesar da firmeza que ellas appa-
rentavam, os vícios de origem concorreram para o fi-
nalisar da sua vitalidade, como succedeu por exemplo
aos phenicios, que no intuito aliás louvável de enrique-
cerem a mãe-patria, excluíam no exercício do commer-
cio, em absoluto, a concorrência de povos estrangeiros; e
não só isto como também na pratica d'aquelle altruísmo
extraordinário, não diligenciavam firmar a possessão
com monumentos de progresso material indispensáveis
á sua consolidação.
Hoje que as idéas liberaes caminham em contrapo-
sição aos princípios antigos, abertamente oppondo-se
aos monopólios nacionaes, á imposição da força na co-
lonisação, etc, a expansão colonial apresenta-se-nos
sob mais melhorados auspícios, conducentes a uma ct-
vilisação mais profícua, filha de uma administração mais
sabia. Deve pois a colonisação ser verdadeiramente o
mote e o credo de todos os que governam e tomam a
peito o explendor e a prosperidade da pátria.
63
Assentes no que deixamos exposto e bem conside-
rada a verdadeira metamorphose operada nos velhos
processos mundiaes de civilisação, tendo-se em vista
que na presente quadra em que o cosmopolitismo mo-
netário, manifestando-se em concurso aberto á obra da
expansão, dá em resultado uma tendência natural em
se facilitar o seu affluxo, considerado como auxiliar va-
lioso quando ha decidido retrahimento nos capitães na*
cionaes para o fundamento de emprezas coloniaes de
qualquer género; bem capacitados d'esta ordem d'idéas,
a colonisação da Zambczia inteira affigura-se me ser
emprehendimento manejavel, dadas as circumstancias
excepcionaes que concorrem em toda a sua região, e
que foram anteriormente descriptas.
Porém para entrar verdadeiramente no assumpto,
applicado ao território em questão, vou proceder por
um systema deductivo á indicação dos elementos essen-
ciaes, uns já preponderantes na região e outros a refor-
mar e introduzir no seu modo de ser administrativo,
para que a sua civilisação não pare ou retrograde, mas
progrida.
A designação genérica de possessões é dada aos ter-
ritórios de que um Estado é proprietário, e ellas, por
sua natureza essencial, apresentam aspectos diversos
pelos quaes podem ser encaradas. Assim ha territórios
onde uma população indigena existe manifestando uma
vitalidade própria e progressiva, já trabalhando e pro-
duzindo por si mesma, já pagando imposto, e já final-
mente concorrendo com elementos para formação de
forças militares para a policia e defeza local. Outros
territórios ha, que embora povoados de indígenas, estes,
por indole de raça, são desprovidos da iniciativa neces-
sária ao desenvolvimento da região, offerecendo por esse
caso á actividade europêa terras em disponibilidade para
a agricultura.
Nos territórios considerados sob o primeiro aspecto,
em que o modo de ser é real sem intervenção extra-
nha, em que a agricultura e industria prosperam com
64
os elementos intestinos aborígenes, os colonos europeus
geralmente são pouco numerosos e esses mesmos estão
sempre animados do desejo de regressarem um dia á
Europa.
Nos do segundo aspecto ha a attender ás suas con-
dições climatéricas, isto é, se estas permittem ou não a
adaptação da raça branca com todos os attributos inhe-
rentes ao viver, reproducção, povoamento emfira. No
primeiro caso definir se-hia uma absorpção com a im-
?>lantação de uma grande população nacional, que trans-
òrmaria esses paizes em nova pátria; e a constituição
da colónia, na verdadeira accepção da palavra, seria
um facto incontestável. No segundo caso haveria neces-
sidade imperiosa em se conservar a todo o transe a po-
pulação indigena, e assim as possessões ficariam desti-
nadas a conter simultaneamente indígenas e colonos.
A Zambezia apresenta-se-nos como possessão onde
os indígenas são os verdadeiros senhores do campo do
trabalho agrícola e industrial, pelas suas aptidões in-
natas que apenas necessitam de aperfeiçoamento e es-
timulo, pela barateza da sua mão d'obra, pela humil-
dade na obediência, e, finalmente, pelas más condições
climatéricas da região.
O obreiro da raça branca não pôde, pelas más con-
dições do clima, expor-se á natureza tao francamente
como o indigena, assim como não lhe podem ser for-
necidos salários em proporção com as suas necessida-
des e pretensões ; além de que não se presta a concor-
rer em camaradagem com o indigena para o mesmo
mister; admitte apenas a condição superior do mando,
e essa repugnância instinctiva é tão caracterisada que
se tem visto europeus preferirem mendigar a acceitar
as mesmas condições que os indígenas locaes.
Reconhece-se pois na Zambezia como elemento in-
dispensável o obreiro indigena. E' portanto deductivel
de tal verdade, a necessidade, que se impõe, do exer-
cício de uma boa administração da população abo-
rígene, firmando-se para execução uma politica especial
que reconheça os direitos e os deveres entre os habi-
tantes indígenas e os patrões europeus, baseados nas
65
differenças de raça, aptidão, aspirações e necessidades,
que naturalmente existem entre uns e outros.
Por um lado o colono europeu é muito necessário
como verdadeiro factor da civilisação ; mas para este
effeito deve-se attender muito especialmente á sua qua-
lidade. Deve se estabelecer uma corrente de affluencia
de commerciantes, industriaes e agricultores, muni-
dos com capitães suficientes para proporcionarem aos
indígenas trabalho devidamente remunerado, e bem
compenetrados de que será necessária uma boa dose
de paciência para que proficuamente possam tirar re-
sultado de um ensino prévio dos diversos misteres em
aue o indígena pôde ser empregado, proporcionando-
Ine ao mesmo tempo pelos deveres de humanidade e
justiça um cuidado benéfico.
Por outro lado está de ha muito provado que n'esta
região os indígenas realisam o êxito das melhores aspi-
rações lucrativas, quer para o governo, quer para o
commerciante, quer para o agricultor, quer para o in-
dustrial.
Para melhor explicação admittamos que se produzia
uma evacuação do elemento indígena no território : des-
appareceria por completo em consequência o principal
contribuinte para o governo •, o negocio não teria campo
de acção ; os emprehendimentos agrícolas e as fabricas
estacavam por falta de braços, e, por conseguinte, a pro-
ducção geral seria nulla. Eis um resultado fatal que a
todo o transe se deve evitar para que as possessões
avancem para o progresso moral e material.
Impõe se pois como evidentemente necessário que se
cuide do indígena, cuja existência abundante n'este solo
da Zambezia é uma verdadeira riqueza natural ; mas
que se pense n ? esse sentido por uma forma que o ge-
ral da população aborígene, confiante na justiça e equi-
dade, se considere protegida em absoluto nos seus ha-
veres, remunerada no seu trabalho, e tolerada no seu
systema peculiar de vida; ter-se-ha assim bem garan-
tido o seu apego á terra natal. Accrescente-se a isto
uma educação incutida um tanto technicamente, em es-
colas de artes e officios devidamente organisadas, de
66
maneira a formar-se n ellas o operário, o mechanico eo
agricultor indígenas. Insinue-se-lhes assim uma civilisa-
ção especial, consentânea com o papel puramente auxiliar
que os indígenas teem a desempenhar, e com os cara-
cterísticos de uma raça que desde séculos está subor-
dinada a uma civilisação superior; teremos por uma
forma bem clara realisado os desígnios do século actual,
cuja missão é essencialmente civilisadora, e está provado
que só instruindo se civilisa. Que essas escolas sejam
fontes d'onde dimanem os obreiros, que espalhados por
todo o território, nos locaes onde se trabalhe, concor-
ram com as suas aptidões diversas para o desenvolvi-
mento das iniciativas ; eis o verdadeiro desideratum para
benefício da colonisação.
Em resumo :• a Zambezia, apesar de vasta, não ne-
cessita para se definir e garantir a sua prosperidade, de
uma emigração abundante de colonos da metrópole
[)ara o seu território, mas apenas de uma emigração
imitada . e escolhida, dotada de elementos intelligentes
e activos, bem munidos de capitães para a exploração
geral, e a par d'isto tudo uma boa administração das
populações indígenas, que são os verdadeiros elementos
productores e que pagam imposto.
Está bem provado pelo conhecimento que actualmente
existe, perfeito e verdadeiro, de todos os focos explo-
ráveis do território, que o colono europeu, qualquer
que seja o ramo de actividade que pretenda pôr em
pratica, quer seja agricultura, como industria ou com-
mercio, tem necessidade absoluta de capitães próprios
disponíveis ; pois, como disse anteriormente, a natureza
deletéria da região não lhe permitte trabalhar por suas
mãos, mas sim dirigir o trabalho indígena.
Comtudo, forçoso é dizer-se que no caso do colono
advindo isoladamente tentar fortuna por qualquer for-
ma de exploração, pôde surgir, por casos fortuitos de
doença ou morte, uma situação deveras critica para os
capitães empregados, que ficam ameaçados de grave
compromisso pela falta de direcção de parte interessa-
da. Mas para obviar a esse inconveniente ha a faculda-
de das associações de capitães e indivíduos, ou então
^
um mais forte factor de colonisação, que é o resultante
de muitos capitães associados sob a tórma de socieda-
de anonyma ; género associativo que se torna bastante
recommendavel na Zambezia, pois determina mais af-
fluencia de capitalistas pela confiança mais segura que
proporciona a união.
Fundamentado na ordem d'idéas, acabada de expor,
poderei affirmar que a Zambezia caminha, graças ao
regimen dos prazos (regulado pelo decreto de 18 de no-
vembro de 1890) numa senda progressiva de colonisa-
ção, que a transformaria em breve n'um verdadeiro em-
pório se maior affluencia de capitães se definisse, com
o fim de alimentar grandes emprezas agrícolas, com-
merciaes e industriaes, que encontrariam no seu vas-
tíssimo território grande campo de acção.
O citado regimen administrativo, fructo de uma alta
concepção, satisfazendo em espirito os desígnios inhe-
rentes ao modo de ser territorial, proporciona um con-
juncto de facilidades para attracção de elementos de
fora, que advindos com aptidões definidas, concorra
para a obra civilisadora da implantação do progresso
moral nas populações nativas, e material n'este solo
africano.
A influição benéfica que naturalmente se colherá d'um
contacto intimo entre europeus e indigenas, do qual re-
sulte bastante affeição insinuada por aauelles a estes ao
trabalho regular, fazendo crear aos últimos necessida-
des pelas quaes sejam alterados os seus modos de vida,
os hábitos ociosos e indolentes e o proceder ainda sel-
vagem, é também uma consequência do regimen em
execução.
O que se tem feito na Zambezia em prol da coloni-
sação, facultando- se o ingresso para o interior por
meio de estradas em diversas direcções, melhorando-
se as vias fluviaes, saneando-se os centros de movi-
mento, não completamente ainda, mas por uma forma
compatível com os recursos disponíveis, desbravando-se
Eela acção agrícola bastante extensão do terreno, civi-
s ando- se os povos indigenas pela applicação ao traba-
lho, finalmente coadjuvando a acção da soberania na-
6«
cional, é alguma cousa, e deve se sobretudo á implan-
tação do regimen dos prazos, tradicional na região des-
de 1760.
Comtudo, necessário será dizer-se : o que se acha
executado tem caminhado lentamente desde aquelle
inicio e sò os esforços dos últimos annos, provocados
pela benéfica reorganisação de 1890, conseguiram er-
guer um tanto o nivel do progresso moral e material.
Mas não obstante o lisongeiro aspecto na civilisação
do districto ha ainda muita cousa a fazer-se para garan-
tia dos interesses pessoaes de todos os elementos co-
lonisadores, e não só d'estes como também dos legíti-
mos interesses do Estado, a quem compete não descu-
rar as fontes das suas rendas principaes.
Torna-se superiormente indispensável, em primeiro
logar, que se facultem todas as facilidades ao emprego
do capital nacional ou estrangeiro, por forma que uma
attracção definida no numerário seja um symptoma de
confiança, absolutamente necessária para os progres-
sos da exploração nas diversas circumscripções territo-
riaes.
Quatro companhias de exploração industrial agrícola
e commercial já existem no districto: são ellas a da
Zambezia, a do Borôr, a do assucar de Mopêa, e a do
Luabo, as quaes teem contribuído bastante para a pros-
peridade geral patente no território. Mas, não obstante,
dentro das concessões territoriaes effectuadas, sobram
ainda vastos terrenos onde se possam applicar 'grandes
actividades; ainda ha muito solo a desbravar, onde a
humanidade precavida encontra elementos de fomento
ap trabalho remunerador. Compete pois aos concessio-
nários decidirem-se pela affluencia de mais capital, e aos
poderes públicos facilitar o exercício dos diversos ramos
da actividade humana o melhor possível, do que derivará
necessariamente uma prosperidade inabalável á pos-
sessão.
Com a affluencia de capital abundante o desbrava-
mento do solo feracissimo da Zambezia será em breve
um facto real de grande alcance económico, pela abun-
dância de productos de exportação que actualmente
6ç
escasseiam vergonhosamente ; porque alliando-se á vas-
tidão do solo uma numerosa população privativa de
cada prazo, o trabalho devidamente remunerado (pelo
menos segundo a regulamentação de 1890), abundaria
ao indígena, accorrendo este francamente, confiado
na exactidão e lealdade do seu arrendatário, que bem
dotado de recursos não pensaria em lograr o seu me-
lhor factor de exploração.
Todos aquelles que teem conhecimento d'estas re-
giões africanas poderão affirmar que o europeu nada
pôde sem o recurso da collaboração indígena ; este por
seu lado trabalhará de vontade, quando se lhe propor-
cionar trabalho remunerador, guando lhe permittirem,
por uma organisação bem definida da sua situação e
por uma leal cobrança do imposto de capitação, que
guarde para si os seus ganhos ; finalmente quando tenha
ao alcance onde dispenda o seu dinheiro livremente e
sem coacção, quer para satisfação de necessidades crea-
das, guer para o fazer fructificar como resultado de
trabalho para seu próprio proveito.
Por conseguinte é intuitiva a conclusão de que o pro-
blema a resolver deverá ser sempre, na Zambezia, as-
segurar por uma politica hábil a execução de um regimen,
gue tenha em mira firmar-se sempre a permanência do
indígena no seu paiz, onde a propriedade que elle crear
lhe seja garantida para todos os effeitos civis ; bem como
decidil-o a procurar trabalho remunerado prestando as-
sim valioso concurso ao arrendatário.
Ora satisfazendo o regulamento de 1890 a uma defi-
nição bem caracterisada e distincta dos direitos e deve-
res do arrendatário e indígena dos prazos, e devendo
ser o primeiro o verdadeiro factor da colonisação, advindo
forçosamente com recursos de toda a espécie para im-
plantar o progresso nas terras obtidas por concessão, é
lógico e evidente que só d'elle depende a própria pros-
peridade, que poderá ser indubitavelmente simultânea
com a do indígena local.
Mas como e d'uma conciliação acertada entre os me-
lhoramentos materiaes e moraes que brota necessa-
riamente a prosperidade geral (os primeiros advindo
70
dos capitães afluentes, os segundos nascendo positiva-
mente da instrucção que deve ter o indígena), é forçoso
3ue esta tenha uma orientação completamente differente
a adoptada até hoje, isto é, um ensino mais technico,
que sem esforço deligenceie incutir no seu animo a
idoneidade dos princípios benéficos da civilisação, afim
de se obter uma correcção nos hábitos inveterados, e a
convicção de que estes lhe são mais perniciosos á exis-
tência.
Em conclusão, consegue-se a colonisação completa da
Zambezia: explorando o território em todos os seus re-
cônditos, segundo os diversos factores da actividade hu-
mana; instruindo os povos selvagens segundo uma me-
lhor orientação tendente a tornal-o útil a si e á sociedade ;
dispondo todos os elementos terrítoríaes para concebe-
rem a invasão dos progressos materíaes que advirão
das explorações intensas ; firmando por uma adminis-
tração sensata das populações indígenas a permanência
d'estas no território, evitando-se a todo o transe a sua
emigração, e finalmente attrahindo a accorrencia de co-
lonos da Europa, munidos de bons capitães, e facul-
tando-lhes os processos da vitalidade.
CAPITULO II
Instrucção publica e missões
Nos tempos modernos a verdadeira missão é civili-
sar os povos, e é certo que só instruindo se civilisa.
Está indicada por forma axiomática a importância do
assumpto da instrucção publica, que num meio como
a Zambezia, dotado com um auxiliar poderoso na ma-
leabilidade dos seus povos, deveria ter já tido o desen-
volvimento necessário e adequado ás exigências da vi-
talidade.
A instrucção publica n'este districto, estando a cargo
das missões religiosas, explica o motivo porque sao
condensados no mesmo capitulo os dois assumptos, pela
connexão em que estão.
Existem rTeste districto apenas duas escolas para en-
sino de leitura e escripta ; uma em Quelimane e outra
em Boroma, a cargo dos missionários da Zambezia. A
sua frequência não é muito considerável e o retrahi-
mento explica-se pela pouca propensão d'estes povos a
essa espécie de educação, que elles consideram como
um serviço pesado. E' admirável comtudo, e digno da
7*
maior consideração, a paciência e dedicação dos missio-
nários em incutir n'esses ânimos prodigiosas compre-
hensões, com o desenvolvimento das faculdades intelle-
ctuaes que com gloria tem conseguido ; comtudo elles
1>roprios são os primeiros a queixar- se da negação abso-
uta que encontram na juventude cafreal para assim se»
rem polidos intellectualmente.
Não obstante estes resultados não sou da idéa de se
abandonar o indígena á sua natureza ; pelo contrario^
opino porque se alastre a instrucção, como processo fe-
cundo que é, para o progresso e civilisação; mas o que
é necessário e accentuar-se uma formula pratica no en-
sinamento geral, accommodativa á indole e costumes
ainda arreigados. As escolas d' artes e officios realisa-
riam a solução do problema de instrucção adequada a
este publico especial, as quaes poderiam ficar a cargo
de missionários, que com todas as habilitações soubes-
sem dirigil-as em prol de se obterem bons elementos de
trabalho.
Na região ingleza a Blantyre Mission, que tem uma
organisação idêntica á proposta, tem prestado enormes
serviços ; attestam-n'os a exhibição annual dos productos
3ue saem das suas officinas, em que se revela uma mão
"obra cuidada a , e esses resultados demonstram a sua
influencia civilisadora no meio em que vegetam. A or-
ganisação e o regimen instructivo d'esta missão, conjun-
cta á propaganda da religião christã, cuja excellencia
de doutrinas, cuja pureza de dogmas, e cuja significa-
ção de moral insinua a sinceridade, teremos uma mis-
são modelo que fatalmente concorrerá para se archite-
ctar a civilisação d'estes povos, ainda de costumes semi-
selvagens e sem crenças de espécie alguma.
Mas devemos ainda considerar um assumpto capital
que nas regiões a colonisar é de grande alcance espiri-
tual e moral : é elle a nacionalisação das missões, isto
é, serem ellas constituídas por um núcleo de colonisa-
ção puramente nacional ; conseguir-se-hia assim dar for-
ças á nacionalidade portugueza, alargando a sua in-
fluencia no mundo africano. Para esse fim é indispen-
sável previamente obter, por uma educação especial 7
V
padres ou missionários á altura de fazerem propagan-
da instructiva, segundo uma forma essencialmente te*
chnica ; abrir-se-hia ridente futuro, sobremaneira lison-
jeiro para a causa da civilisação e nacionalisação.
Mais mão d' obra; maior abundância de recursos; mais
commercio, consequência de mais necessidades creadas;
em conclusão: mais riqueza.
Temos considerado até agora essencialmente os pro-
cessos de educação da humanidade masculina, por ser
aquella que mais poderia concorrer com elementos pres-
táveis ao progresso material e moral do território; mas
não poderei deixar de admittir para complemento a edu-
cação do mundo feminino africano, que constituiria uma
elevação social e moral n*um meio como este, em que
os cruzamentos de raças teem operado grandes trans-
formações ethnicas.
A educação feminina está a cargo n'este districto da
sympathica congregação das Irmãs de S. José de Cluny,
mui dignas de apreço e respeito pela benemerência hu-
manitária da sua missão.
Perante estas sympathicas creaturas devemos cur-
varmo-nos aos seus actos revestidos do mais desinte-
ressado altruísmo, pois vão levar nos mais inhospitos
climas as consolações da fé christã aos que agonisam
longe da pátria, da familia e dos amigos, patenteando
um martyrio revestido da maior heroicidade, caminhando
escravas do dever sempre sorridentes para mortaes sa*
crificios.
É a estas entidades que o mundo feminino accorre a
receber a instrucção que lhes é peculiar, e é notável o
progresso obtido na classe escolar constituída em Que-
limane e Boroma, que consta de dezenas de alum-
nas.
Em setembro do anno de 1901 coube-me a gloria
honrosa de inaugurar em Quelimane uma exposição de
trabalhos femininos oas artes de bordados e costura \
os productos expostos excederam toda a expectativa em
perfeição. Seguiu-se a esse acto uma exhibição de reci-
74
tacões, canto coral e representação de singelas come-
dias pelas alumnas, e fiquei, e commigo todo o publico
selecto da villa que assistiu, francamente encantado com
o desembaraço das creanças e com a paciência das be-
neméritas ensaiadoras. Estes factos são eloquentes a
demonstrar o quanto se pôde conseguir d'este povo
pela instrucção ; basta adequar os processos ao papel
que ellas tem de vir a desempenhar rTeste mundo so-
cial africano; assim será concludente uma definida mo-
ralidade de vida e de costumes, que são certamente
succedaneos da educação instructiva.
Considerámos já a forma porque é ministrada a ins-
trucção publica na Zambezia, e as transformações que
julgo necessário se operem na essência d'essa instruc-
ção para que predomine a utilidade no modo de ser
d'estes povos.
Segue-se descrever a forma porque está organisado
o serviço das missões n'este districto para a propaganda
religiosa e instructiva, o que farei a traços largos :
Existe n'este districto uma missão religiosa que pri-
mitivamente foi instituída em Boroma, localidade si-
tuada na margem do Zambeze, acima de Téte, deno-
minando-se no seu inicio missão de Boroma. Mais tarde
a mesma missão, passando a denominar-se Missão da
Zambezia, veiu estabelecer a sua sede em Quelimane,
onde se acha desde o anno de 1802, disseminando-se
pelo território do districto sob a forma de delegações
no Zumbo, Boroma, Chupanga e Coalane, onde tem
feito construir casas para sua installação com egreja ou
capella annexa, constituindo assim propriedades regis-
tadas em nome de diversos missionanos. As installa-
ções de Coalane distam 4 kilometros de Quelimane e
estão ainda incompletas, mas em via de conclusão,
vendo-se alli numerosos operários indígenas exercendo
o seu mister ; promettem vir a ser importantes.
Por portaria do Governo Ecclesiastico de 5 de maio
de 1890 foi a delegação de Coalane denominada dos
Santos Anjos, dando-se incumbência da sua fundação
ao superior da missSo da Zambezia, a quem pela ci-
tada portaria é concedida jurisdicçâo para exercer todos
os actos parochiaes com poderes de delegar nos de-
mais funccionarios estas ou outras faculdades que já
tinha.
Investido d' estes poderes o mesmo superior entendeu
dever construir alli ha alguns annos um cemitério pri-
vativo da missão, sem annuencia das auctoridades admi-
nistrativas, e por conseguinte fora da vigilância e fisca-
lisação das auctoridades competentes, o que me levou
a intervir no assumpto.
A casa de Quelimane, com sua capella privativa, é
toda de alvenaria e vedada por um alto muro construí-
do do mesmo material; é um amplo e magnifico edifí-
cio bem situado na villa, e é n'elle que está installada a
escola do sexo masculino.
Em Chupanga a missão está installada n'um edifício
do Estado e já dentro dos territórios sob a administra-
ção da companhia de Moçambiaue.
Em Boroma teem uma installação quasi principesca
em edifício de dois andares, todo de alvenaria, erguido
no monte para moradia dos missionários; e uma egreja
também de alvenaria com todos os requisitos de luxo e
adorno usuaes em edifícios congéneres e muito supe-
rior á nossa egreja de Quelimane. Além d' estas ha ou-
tras construcções annexas para escolas.
No Zumbo teem em construcção uma casa de alve-
naria para sua installação definitiva.
A missão é composta presentemente de quatorze mis-
sionários, dos quaes apenas dois são portuguezes, sendo
um o superior e os restantes estrangeiros de diversas
nacionalidades.
Ensinam aos indígenas a ler e escrever a lingua por-
tugueza e a cafreal ; educam-n'os no canto coral, para
3ue demonstram grande propensão; e para facilidade
a cultura da ultima lingua teem feito publicar gram-
maticas, livros de leitura, e diccionarios dos diversos
dialectos cafreaes. N'esse systema de educação alguns
educandos indígenas teem feito progressos, que eu tive
occasião de observar, principalmente em Boroma, facto
? 6
este bastante lisongeiro para os educadores, e como a
maioria é refractária á educação litteraria, pena é que
as boas faculdades de ensino que os missionários pa-
tenteiam não tenham exercício no campo mais vasto de
artes e officios, ensinamento mais consentâneo com a
necessidade do progresso moral e material que tem o
território.
CAPITULO III
Exploração — Prazos da Coroa
Como tive já occasião de expor, é devido ao regimen
dos prazos applicado á Zambezia que se tem conse-
guido n'este território uma vitalidade própria e com ga-
rantias para um progredir intenso, se os capitães não
escaceassem para uma exploração geral, condigna com
as riquezas do seu solo feracissimo.
A explicação d'esta ultima situação reside, palpável,
evidente, na inútil immensidade dos domínios que ad-
vieram das concessões a algumas companhias africanas,
que não dispõem de capitães suficientes para assam-
barcar áreas territoriaes, cuja enormidade de exten-
são seria campo vasto para numerosos eraprehendi-
mentos de grande fôlego. Constituiu-se assim uma das
causas que deixará por muito tempo estéril grandes
parte das terras da Zambezia.
.Cocntudo essas companhias, tendo applicado o seu
capital e uma actividade compatível com os recursos
pecuniários a parte do agrupamento de prazos que tra-
zem de arrendamento, tem-lhes levantado o nível do
78
progresso material por uma forma que demonstra por
vezes o effeito de felizes iniciativas.
O capital individual também teve uma applicação de
resultados satisfatórios, embora acanhados pela deficiên-
cia de numerário em acção. As consequências relati-
vamente favoráveis para o prazo onde se exerceu certa
actividade, demonstram as Doas faculdades de trabalho
de alguns arrendatários europeus, iniciadores do regi-
men, caminhando na exploração, embora com a tibieza
filha da falta de recursos próprios, mas com confiança
plena no futuro dos emprehenaimentos.
O que é um facto irrefutavelmente claro e evidente
é a definida carência de capitães abundantes para virem
em auxilio da idéa grande insinuada pelo regimen de
1800.
Houve decidido retrahimento no inicio da execução
da referida lei, pois appareceram alguns indivíduos (sem
duvida arrojados), que tomaram a peito o encargo de
diversos arrendamentos de prazos, munidos apenas com
capitães aue quasi foram absorvidos no pagamento ao
governo das rendas respectivas por adiantado, e fiados
por conseguinte só na cobrança do imposto de capita-
ção a exercer-se no indigena.
O trabalho persistente, acompanhado de boa orienta-
ção de alguns dos iniciadores da execução do regimen,
suppriu em parte a deficiência de capital, apresentando
elles regulares extensões de terrenos cultivados, no fim
de dez annos de exploração, o que representa um vivo
symptoma de progresso agrícola, moroso embora, mas
positivo.
Estes resultados satisfatórios bastam para demons-
trar a efficacia do regimen do arrendamento dos prazos
no sentido da obtenção dos progressos na agricultura e
industria, nas diversas circumscripções territoriaes. Com-
tudo teem surgido opiniões adversas á mesma organi-
sação, baseando-se em diversos actos do arrendatário,
que pelo grau abusivo vieram dar pabulo a criticas mais
ou menos fundamentadas e por vezes impiedosas.
Com uma opinião firme pelo conhecimento absoluto
dos processos de exploração dos arrendatários, entendo
79
que se deve manter por todos os meios essa organisa-
ção na Zambezia, não obstante a tendência natural de-
finida para certos abusos ; por serem estes facilmente
coarctáveis por uma fiscalisação sensata, ou susceptí-
veis de transformação para uma phase de normali-
dade.
Os actos abusivos que mais considerações devera
merecer, são aquelles que concorram para o despresti-
gio da soberania nacional nos prazos, ou para o seu
despovoamento; são, portanto, de duas cathegorías r
qualquer d'ellas a mais interessante para a causa da
colonisação.
Considerando pois a nacionalisação, devendo ella ser
absolutamente garantida pelo regimen dos prazos, já que
este permitte que os arrendatários sejam indivíduos es-
trangeiros, é de toda a conveniência, afim de se mante-
rem os fins da organisação, que em grande maioria os-
empregados europeus de cada prazo sejam portuguezes.
E como pelo regulamento deve existir em cada prazo
um determinado numero de cypaes uniformisados e ar-
mados pelo arrendatário, organisando-se assim uma
força de policia local, accentua-se naturalmente no prazo-
em que o seu arrendatário seja estrangeiro, a necessi-
dade de que o agente de auctorídade seja de nomeação*
exclusiva do governo e devidamente pago por este, afim
de ficar em melhores condições de anoutamente cum-
prir as attribuições que pelo regulamento lhe são confe-
ridas, d'entre as quaes se destaca a organisação policial 1
citada.
Os vencimentos do agente da auctorídade pode-
riam ser satisfeitos sem encargo para o governo, com
uma simples percentagem addicional sobre a renda a
pagar.
Considerando agora o povoamento dos prazos pelo-
elemento indígena, apresentam-se dois factores que con-
correm para tal effeito, incontestavelmente benéfico não-
só para a região como para o arrendatário. São elles :
a forma da cobrança do imposto de capitação, e a re-
muneração do trabalho indigena.
Vou tratar do imposto de capitação denominado Mus-
8o
sôco^ cuja cobrança em cada prazo é a base fundamen-
tal do decreto de 1890.
Começou o imposto por ser a razão de 800 réis an-
nuaes por indígena adulto e mais um addicional de 5
<y o para receita das camarás raunicipaes. Porém em
princípios de 1899 os arrendatários, em pedido colle-
ctivo formulado á primeira auctoridade administrativa
<le então, conseguiram um augmento de 5o °/o na taxa
do mussôco, exigindo se desde então de cada indígena
i#>2oo réis annuaes e mais 5 °/ para o município, pre-
fazendo ao todo 1^260 réis.
Esta ultima taxa, que em princípios de 1902 os arren-
datários pugnaram para ser reduzida por reversão á
antiga, não é demasiada. Esta affirmativa baseia-se na
facilidade que encontraram os mesmos na sua cobrança
logo no primeiro anno do augmento do valor, empre-
gando para esse fim os processos mais brandos com
que diligenciaram captar o colono indígena, a fim de
conseguirem francamente um pagamento integral. Sem
grandes prodígios é concludente de tal facto que a fa-
cilidade do pagamento do mussôco está na razão di-
recta da lealdade de quem faz a cobrança; ousando
mesmo avançar que seria viável um imposto maior se
residisse np animo do indígena uma confiança extrema
no seu cobrador.
Ora um dos argumentos produzidos pelos interes-
sados para obter a reducção do mussôco, cifrava-se na
propensa emigração dos colonos indígenas para o ter-
ritório inglez, que estava sob um regimen mais hospi*
taleiro pela exigência de um imposto por palhota de 3
shillings annuaes, que em nossa moeda ao cambio mé-
dio d 'Africa equivale a i#obo réis. Mas um outro ar-
gumento se contrapunha, e esse era sobremaneira vivo,
observando-se o que se passava nos prazos Goma e
Mugovo (limitrophes ao território inglez do Chire), onde
o accrescimo de população era notório, a despeito da
mesma differença de taxas a cobrar, e da proximidade
convidativa a que se achava a região ingleza.
E os próprios inglezes tanto estavam convictos de
que a taxa reduzida de 3 shillings não era propicia á
8i
attracção de colonos indígenas para os seus territó-
rios, que pozeram em execução desde o primeiro de
janeiro do anno de 1902 um novo regulamento para
cobrança do imposto de palhota ; augmentando este a
12 shillings annuaes, isto e, 4^200 réis da nossa moeda,
com a espectativa de uma reducção a metade ao co-
lono indígena que comprovar por um certificado authen-
tico ter trabalhado cada anno, durante um mez, em ser-
viço de algum europeu. Julgo que esta ultima reducção
teve por fim estimular o indígena ao trabalho por es-
cassearem os braços ás diversas emprezas agrícolas
existentes no protectorado da Africa central ingleza.
Feitas estas considerações, repito que julgo não ser
de boa politica administrativa a reducção do imposto
do mussôco ; a questão magna reside na forma porque
é exigido do colono. Sobre este assumpto expendi ofi-
cialmente iguaes ponderações no sentido de elucidar os
altos poderes públicos, e honro-me por ter sido consi-
derada a minha opinião.
Com o fim de se fiscalisar melhor a referida co-
brança, vou apresentar a summula da proposta formu-
lada ao governo geral da Província :
O artigo 2. do decreto de novembro de 1890 tobriga
o colono indígena ao pagamento do imposto de capita-
ção, metade em dinheiro e metade em trabalho». Se a
alínea f ào § 2. do artigo 4. do mesmo decreto obri-
gasse o arrendatário também a facultar dentro d'um
anno a todos os colonos indígenas do prazo o trabalho
rural pago a razão de 400 réis por semana estaria pela
força da lei garantida a equidade na cobrança do im-
posto de capitação na sua totalidade. Mas infelizmente
para o indígena o arrendatário só tem sido ligado ao
compromisso do artigo 5.° do citado decreto de 1890,
que lhe impõe a obrigação de agricultar durante cinco
annos a terça parte da área de terreno aforada. Ora
sendo a totalidade do aforamento obrigatório arbitrado
apenas á razão de um hectare por cada dez indígenas
da população do prazo, torna-se bastante exígua a área
a agricultar pelo arrendatário por imposição legal, e por
este facto a proporção do trabalho remunerado a dar
8*
aos colonos indígenas é insignificante, ficando a maior
1>arte na impossibilidade de aproveitar as vantagens da
ei, na forma do pagamento da capitação em traba-
lho.
. Por outro lado o artigo io.° do regulamento de julho
de 1892 t obriga os arrendatários a receberem dos co-
lonos metade da importância do mussôco em moeda
corrente ou em géneros, conforme mais convier aos
mesmos colonos 1.
O espirito das leis citadas é claro e visa directamente,
pela sua combinação com o disposto no artigo 28. do
regulamento, a firmar a faculdade do colono para pro-
ceder ao pagamento do mussôco no total ou em parte,
em género, moeda corrente ou trabalho. Mas o animo
fraco do indígena e a sua indolência natural predis-
poe-n'o naturalmente á dominação do arrendatário, que
elle considera o seu senhor ; e a sua voz, sem valor,
reduzida a uma submissão, sem queixume, ás exigên-
cias do arrendatário, determina naturalmente a impo-
sição d'este na forma do pagamento do mussôco, que
nunca é em beneficio do colono, e sempre recae na ca-
pitação pa^a no género de maior valor ao mercado pela
sua carestia, facto este que define difficuldades a ven-
cer e determina geralmente a fuga do colono para ou-
tro prazo ou território que suppõe na occasião mais hos-
pitaleiro.
Foi pois, tendo em consideração o fundamento ver-
dadeiro dos factos apontados, e desejando concorrer
para obviar a uma expoliação sem limites e pôr assim
cobro ao despovoamento iniciado nos prazos, que eu
deliberei propor á auctoridade superior da Província,
em agosto de 190 1, uma alteração no regimen existente,
proposta que até á data da minha retirada da Zambe-
zia não fera attendida.
Era do theor seguinte approximadamente :
«E certo que se torna necessária uma intervenção
mais directa por parte da auctoridade administrativa na
cobrança do mussôco, para o que indispensável é pro-
duzir-se uma alteração no que se acha legislado, no sen-
83
tido de se evitar que o arrendatário imponha ao colono
a forma de pagamento.
cN'essa conformidade toma-se recommendavel um
prévio exame bem ponderado das condições alimentí-
cias de cada prazo depois de findas as colheitas, e de-
terminar-se em seguida para cada um d'elles, em es-
pecial, a forma de pagamento mais consentânea com
as suas circumstancias occasionaes, competindo exclu-
sivamente a determinação da forma de pagamento re-
lativa a cada prazo ao superintendente dos prazos da
Coroa.»
i
Tive pois a honra de propor á consideração superior
ue fosse alterado o texto do artigo io.° do regulamento
e julho de 1892 para o seguinte:
«Obriga os arrendatários a receber dos colonos indí-
genas a importância do mussôco em moeda corrente
ou em géneros de exportação, conforme for julgado
previamente pela supenntendencia dos prazos a melhor
conveniência para os mesmos colonos, attendendo-se
para cada época ás condições alimentícias de cada pra-
zo».
Julgo assim devidamente precisada a boa influencia
que terá no povoamento dos prazos uma cobrança de
imposto mais directamente fiscalisada pela auctoridade
local.
Vou considerar agora o assumpto «trabalho indí-
gena», cuja regularisação harmónica com os direitos e
deveres que as leis impõem aos diversos elementos
constituitivos dos prazos toma-se sem duvida n'um
grande factor para a manutenção das populações e seu
augmento progressivo.
Dada a índole dócil do povo zambeziano, a tarefa é
somente dependente do arrendatário, a quem não fal-
tará, se quizer, braços para qualquer operação labo-
riosa em que queira despender a sua actividade.
84
Essa índole característica é originaria talvez de um
certo estado de escravidão latente em espirito, que re-
side ainda arreigado no indígena sob uma forma rela-
tivamente nova e que é digna de attenção especial ;
sendo tal estado moral succedaneo certamente de an-
tigos usos que a implantação do trafico de escravos, to-
lerada durante tanto tempo, deixou inolvidáveis. E* in-
tuitivo pois que, em consequência de taes disposições
ethnicas, um aproveitamento sem abuso, segundo o be-
néfico regimen de 1890, de tão bons elementos, seria
sem duvida de enormíssimo alcance para a causa da
exploração territorial; mas infelizmente insinuaram ao
indígena o instincto da desconfiança, que se torna pre-
sentemente indispensável fazer desapparecer por al-
guma alteração nos processos.
Ora, tendo a natureza caprichado em povoar este
território por forma que não ha necessidade de impor-
tação de indígenas de outras regiões, cumpre a todos,
governo, funccionarios públicos, arrendatários e colo-
nos europeus, concorrerem para que elle se não des-
povoe, evitando por todos os meios o emprego de pro-
cessos funestos.
Ha pois obreiros em abundância, mas não basta a
sua existência local, é indispensável que se lhes apre-
sente trabalho devidamente remunerado; será este um
estimulante seguro á attracção do indígena a qualquer
espécie de trabalho, e n'esse thema se deve basear a
solução do problema da producção pelo indígena. Claro
está que na designação genérica de remuneração ao
trabalho está implícita, não só a mão d'obra do obreiro,
como também o pagamento por compra dos productos
próprios do indígena, fructo da sua iniciativa no emprego
dos seus haveres.
Surge então um novo problema a resolver, que é uma
boa organisação dos meios de transporte para os pro-
ductos indígenas aos mercados de compra ou permuta,
geralmente bastante affastados dos locaes de produc-
ção. E' então obvia a necessidade de se conseguir com-
facilidades uma barateza nos transportes.
Sendo os prazos uns verdadeiros centros de tra-
85
balho e população, a abertura de estradas e canaes, a
introducção rfelles de elementos de locomoção* que
conduzam rápida e economicamente para os locaes de
commercio os productos indígenas, e isto tudo ajudado
por uma leal operação mercantil, induzirá sem duvida
os colonos indígenas a agruparem-se em cada prazo em
povoações diversas, segundo as suas conveniências es-
peciaes, augmentando o numero de fogos, multiplican-
do-se, definindo assim uma prosperidade inabalável.
O indígena da Zambezia, no caminho da civilisação
a que tem sido impellido pelo contacto obrigado com o
elemento europeu, datando de longo tempo, tendo creado
já algumas necessidades de luxo, alimentação, etc, de
que não pôde prescindir, decerto procurará trabalhar
para obter recursos com que possa satisfazei os ; mas
não obstante, dada a sua indolência innata, é um facto
que elle só trabalhará de vontade quando a remunera-
ção fôr condigna e bastante para a satisfação provável
das mesmas necessidades creadas ; é pois recommenda-
vel que se tome na mais alta consideração a remune-
ração da mão d'obra por uma forma equitativa.
Com esse louvável intuito necessário se torna, dadas
as circumstancias actuaes dominantes na região, alterar
um pouco o que se acha regulamentado ; n'essa confor-
midade tive occasião em princípios de 190 1 de propor
superiormente uma norma a seguir pelo arrendatário ;
proposta que á data da minha retirada não obtivera so~
lução.
Era do theor seguinte :
cPelo regulamento dos prazos obriga-se o arrendatá-
rio a cobrar dos colonos indigenas metade do imposto
de capitação em trabalho rural, bem como a dar- lhes
trabalho remunerado. Ora é exactamente na remune-
ração de 400 réis por semana, legalisada pelas alíneas
f e g do § 2. do artigo 4. do decreto de 18 de novem-
bro de 1890, sufficiente na época da sua promulgação,
cjue em boa parte reside a reluctancia que apresenta o
indígena ao trabalho, pela sua exiguidade, consequência
do encarecimento dos géneros e artigos de primeira ne-
cessidade.
t Para remediara situação entendi como necessária a
regulamentação que passo a delinear:
ci.° Estipulasse como pagamento do trabalho rural
nos prazos, bem como nas obras do Governo, além da
teria legal de 400 réis por semana, uma ração diária
cosinhada de qualquer cereal ou legume.
«2. Que nos prazos, em vista da faculdade que tem
os arrendatários de cobrar metade da capitação em tra-
balho rural, e sendo esta de 600 réis, se dispense o abono
de ração (posso) ao colono quando este trabalhe para
o pagamento do mussôco durante um intervallo de tempo,
que será limitado a uma semana e meia.
t3.° Que a ração de géneros seja regular e em har-
monia com uma tabeliã discreminativa das diversas qua-
lidades e quantidades a applicar.
«4. Que a duração do trabalho seja do raiar da au-
rora até ás 1 1 horas do dia, nos mezes de dezembro a
junho, e até ás 1 2 horas nos restantes, e das duas horas
até ao entardecer, havendo um intervallo de tempo obri-
gatório das 11 ou 12 ás 2 horas destinado a descanço
e alimentação.»
Augmenta-se d'esta forma com a alimentação diária
o salário semanal do obreiro, o que julgo arrastará como
consequência maior continuidade no trabalho, evitando-
se fugas que sempre se teem dado, alem da affluencia
que necessariamente advirá se os colonos reconhecerem
o exacto cumprimento por parte dos arrendatários do
que se preceitua n'essa conformidade. Uma boa fisca-
hsação se tornará então necessária de principio para
capacitar os colonos de que terão apoio da auctoridade
todas as reclamações fundamentadas que apresentarem,
relativas a exigências demasiadas ou faltas de retribui
çÔes devidas.
Para auxilio da idéa exposta convém algum protec-
cionismo ao arrendatário, com o fim de o habilitar ao
disposto no § único do artigo 41. do regulamento dos
prazos, nos casos n'elle previstos de crise alimentícia
«7
superveniente ou imminente: N'essa conformidade juleo
que o auxilio a conceder-lhes seja a isenção de di-
reitos alfandegários, applicada ao cereal que se impor-
tar na sede do distrícto e destinado exclusivamente a
ser lançado á terra pelos arrendatários ou a habilitar os
colonos por cessão a produzirem as suas sementeiras.
Ainda um ou outro assumpto de capital importância
ha a tratar em referencia ao regimen dos prazos, mas
elles serão considerados no decurso d'este trabalho em
outras secções e capítulos que se referirão a uma situa-
ção geral económica ou financeira da Zambezia.
CAPITULO IV
Situação económica
Possue este rico território da Zambezia ura particu-
lar condão da natureza, que excita affectos de devoção
ao trabalho em quem penetra n^lle. Sendo a activi-
dade humana nas suas diversas manifestações, rami-
ficando-se segundo as tendências que são consideradas
mais conducentes ao fim civilisador, o grandioso factor
da prosperidade e explendor de uma colónia, vou dili-
genciar desenvolver a situação económica d'este dis-
tricto por uma forma em que entreluza a verdade, para
que com realidade se possa aquilatar do grau de des-
envolvimento a que chegou a região, e aquelle a que
deve elevar-se ainda, para que se defina um estádio na
perfectibilidade do seu progresso moral e material.
São três os principaes ramos da actividade humana:
agricultura, industria e commercio; a este está connexa
a navegação, como factor indispensável ao seu exercí-
cio.
.Agricultura.. — A principal riqueza da Zam-
bezia reside indubitavelmente no seu solo ubérrimo e
9o
feracissimo, utilisavel a toda a espécie de cultura, pois .
se encontram alli altitudes diversas coadunáveis.
Experiências varias demonstram o bom êxito que se
colherá de uma dedicação séria ao exercício da agri-
cultura, n'um solo cuja fertilidade já provada é uma
mais que suficiente garantia para determinar uma pros-
peridade solida e excepcional a esse extenso território.
Hoje em dia são o attractivo das explorações no ser-
tão africano as riquezas dos subsolos, traduzidas em
jazigos mineraes, em que o ouro, o carvão e os dia-
mantes imperem. Mas não serão esses ideaes de rique-
zas uma pura phantasia revelada pelas pesquizas in-
fructiferas dos mananciaes ambicionados ? Não repre-
sentarão essas explorações umas verdadeiras luctas in-
glórias, umas vezes contra o impossível, e outras contra
as dificuldades supervenientes á utilisação mercantil
dos productos ?
Parece-me que as circumstancias actuaes da Zambe-
zia poderão dar resposta devida, com os seus jazigos
carboníferos de Téte na margem do Revugo, onde a
pesquiza tem sido superficial, mercê da falta de capi-
tães da companhia exploradora ; e onde, a existir (o
que é de presumir) o minério em abundância e boa
qualidade, surge á consideração as dificuldades de
transporte que irão onerar o combustível destinado a
consumo. Egualmente os filões auríferos da região do
Senga e Muçandaluz no alto Zambeze e as areias do
Zambeze, teem sido até hoje verdadeiras utopias ; pois
as pesquizas eftectuadas ainda não accusaram a exis-
.tencia de percentagens d'ouro que garantam uma ex-
ploração lucrativa. Por estas e outras razões é neces-
sário que as riquezas mineraes, até ao presente não
descobertas em profusão, não sirvam de fundamento a
esperanças de uma exploração activa e lucrativa, em-
bora o exercício d'esta seja considerado como benéfico
ás regiões onde se applica, pela attracção de capitães
€ dos elementos de colonisação.
Attenda-se á compensação mais profícua e segura,
que se alcançará do arroteamento das terras da Zam-
bezia, onde a natureza luxuriantemente fecunda impõe
9»
á humanidade o pagamento de tal tributo ; e o benefi-
cio incalculável que se colheria com o aproveitamento
pela agricultura de todas as referidas terras, definiria
a verdadeira vitalidade da colónia assente em base
firme e duradoura.
Feitas estas considerações, vou traçar em resenha
descriptiva a situação agrícola do distiicto da Zambe»
zia, e implicitamente tratarei do regimen adoptado, que
a lei reguladora de tão importante fomento de trabalho,
fez applicar com o fim de incitar os povos ao desbra-
vamento das terras e á sua cultura.
A Zambezia hoje apenas produz em quantidades
apreciáveis os seguintes- géneros e artigos de exporta-
ção: amendoim, gergelim, copra, cera, borracha e mar-
fim ; prestando -se comtudo o solo a outras culturas,
como o arroz, trigo, canna saccharina, algodão e tabaco,
productos estes que teem enorme acceitação no mundo
commercial; e sendo manifesta a quasi nullidade na ex-
ploração d' estes géneros agrícolas, póde-se affoutamente
affirmar como definida a decadência agrícola do distri-
cto por carência absoluta de iniciativas.
A razão não consente desculpas de espécie alguma
ao grande definhamento que se encontra num ramo de
actividade que deveria ser a maior garantia para o pro-
gresso do território, quando é certo que o capital, em-
bora sem abundância, tem affluido desde a formação
das companhias e as leis estimulam bastante todos os
emprehendimentos agrícolas.
Attente-se no relatório que precede o decreto de 18
»de novembro de 1890 e deduzir-se-ha á fortiori a ele-
vada concepção do legislador, applicada á forma de in-
duzir o colono, tanto europeu como indígena, ao ama-
nho e cultura das terras ; mas infelizmente o colono
europeu appareceu de inicio no mundo da exploração
quasi sem capital para emprehendimentos de tolego, e
alguns mesmo apenas munidos dos fundos necessários
para satisfazerem de prompto ao Governo a renda por
que se comprometteram; aahi a necessidade de a todo
92
o transe obterem da cobrapça do mussôco o mais que
podessem para garantir a sua existência.
Assim, a cobrança do mussôco em género, que es-
tava no espirito do legislador como processo viável e
pratico para se definirem os progressos da agricultura
no colono indígena, deu um resultado perfeitamente
contraproducente, porque aquelle quasi que abandonou
o trabalho da cultura para si, preferindo trabalhar para
o arrendatário. Comprehendeu na sua lógica que por esse
processo lhe era menos exigente o mussôco, o qual,
pago em géneros, lhe absorvia o completo de todas as
suas culturas, porque o cobrador, que muitas vezes não
era o próprio arrendatário, tornava- se insaciável.
Não obstante estes factos passados affirmo que de
maneira alguma considero o arrendatário um elemento
inconveniente; pelo contrario, declaro-me pugnador
pela existência do regimen do arrendamento dos prazos
da Coroa; mas o que se deve desejar do arrendatário é
que elle se apresente munido de capitães bastantes,
afim de que possa ser um fiel cumpridor das leis re-
guladoras do regimen.
Ora, sendo um facto o retrahimento do capital indi-
vidual, applicado por si só a emprezas africanas, visto
3ue aquelle tira a sua segurança da duração da vida
o seu proprietário, que n'um clima tão deletério não é
garantida, torna-se recommendavel sobremaneira, como
já disse anteriormente, a substituição das emprezas in-
dividuaes por outras organisadas segundo a forma de
sociedades anonymas, que garantam a sequencia dos
emprehendimentos em qualquer circumstancia fortuita
de fallecimentos do director ou qualquer accionista,
além de permittir uma divisão de responsabilidades e •
temperar as impaciências, que são muitas vezes a causa
próxima de muitos erros de administração.
São d'este caracter as actuaes companhias de explo-
ração installadas na Zambezia, ás quaes poderá ser
augurado largo futuro se a falta de capitães em confor-
midade com a extensão territorial obtida por conces-
sões do governo, não impossibilitar os planos de uma
administração sensata.
93_
Como prova do que avanço nota-se que em geral a
decadência da agricultura na Zambezia é um facto, do
qual tem quinhão na culpabilidade o arrendatário, o in-
dígena, e o Governo também, que não tem concorrido
com todas as facilidades ao seu alcance para auxiliar os
emprehendimentos agrícolas. Reside n'estes auxílios a
forma de proteccionismo que assiste ao Governo conceder
aos arrendatários que queiram concorrer para execução
da idéa grande, cuja essência é o desbravamento das
terras. E uma das consequências d'essa decadência foi
amplamente demonstrada pela crise alimenticia do anno
de 1899 para 1900, a qual ainda influiu em parte no
de 1901.
Nunca na Zambezia deixou de haver importação do
cereal de maior consumo indígena, que é o arroz, isto
pelo simples facto de também nunca a agricultura local
d'essa espécie ter tido o desenvolvimento a que dão jus
a particularidade de vastos terrenos próprios existentes,
que todos com a necessária cultura produziriam o bas-
tante para occorrer ás necessidades de toda a provín-
cia, até ao supérfluo. Quanto aos outros cereaes de
consumo propriamente indígena, como são a mapira,
meixoeira, etc, além das leguminosas, feijão, ervilha,
nhemba, etc, não teem sido obtidos em tão grande
quantidade quanto seria desejável para o fim de sup-
prir as faltas que a deficiência da agricultura do arroz
quasi sempre tem alcançado.
A alimentação do indígena em toda a vastidão da
Zambezia é tão varia de localidade para localidade, e
por conseguinte de raça para raça, que julgo conve-
niente, para esclarecimento do assumpto em questão,
desenvolvei- a:
Nas altas regiões do Zambeze e Chire é assignalada
a preferencia ás farinhas de mapira (milho fino) ou de
meixoeira (painço), de nachenim (alpista), possuindo pro-
priedades mais alimentares do que o arroz. Na baixa
Zambezia, comprehendendo as regiões de Quelimane e
Macuse, encontra- se a predilecção pelo arroz. Finalmente
94
na Zambezia de Leste, representada pelas regiões da
Maganja e Lomué, predomina a affeição á farinha de
mandioca. Os legumes em geral não tem acceitação
como alimento só, mas sim em mistura acondimentada
com aquelles géneros.
N'esta diversidade precisarei que as regiões em que
na epocha atravessada a deficiência de producção mais
se manifestou, foram as comprehendidas entre o rio
Chire, baixo Zambeze e Macuse, território vastíssimo,
dividido em prazos administrados por três companhias
de exploração e outros arrendatários.
Notou-se então que a falta de producção de manti-
mento indígena não foi geral no território ; que a mor-
tandade importante em numero havida foi influenciada
por diversos agentes, entre os quaes predominou a epi-
demia da varíola, que dizimou indígenas, mesmo habi-
tantes das regiões de maior abundância alimentícia ; não
querendo com isto dizer que a fome não tivesse sido
também um grande factor na devastação de indígenas
de certa região, absolutamente refractários á obtenção
pelo trabalho de meios de subsistência, e que em ou-
tras os flagellos da avareza e avidez humanas, accres-
centandose ao flagello das seccas, também não tivesse
contribuído para tal facto.
Sendo pois um facto infelizmente verdadeiro a deca-
dência da agricultura, e, influindo esta necessariamente
na vitalidade da população indígena, impõe- se á razão
como necessário o emprego de processos que conjurem
e obviem a calamidades futuras de tal quilate.
Ora um dos problemas mais palpitantes a resolver é
sem duvida o desenvolvimento, em grande escala, das
culturas que interessem, não só a região productora e
a província de Moçambique, como também a metrópo-
le. Destaca-se para esse fim, d'entre as mais profícuas,
a cultura do arroz, que é o cereal de enorme consumo
colonial e também de grande extracção no nosso paiz,
onde a extincção dos arrozaes se vae definindo em be-
neficio da salubridade publica ; dando este facto como
resultado o accrescimo da importação do estrangeiro
do referido género, e o consequente aggravamento da
95
situação financeira com o augmento das importâncias
dos pagamentos em ouro.
A enormíssima quantidade de unidades que tem cons-
tituído annualmente a importação d'esse cereal em toda
a provincia de Moçambique, advindo elle maiormente
da índia ingleza, recommenda instantemente que se
aproveitem as vastíssimas planícies da Zambezia á sua
cultura, por forma a poderem servir de manancial apro-
visionador, pelo menos, do nosso próprio grande mer-
cado colonial.
Inerte- se a iniciativa particular a applicar e installar
os melhores processos de exploração agrícola adopta*
dos nos grandes centros para essa espécie cerealífera,,
induzindo-a a imitar os grandes systemas de irrigação-
adoptados na índia ingleza, já com o emprego de po-
tentes bombas elevatórias que aproveitem as aguas
correntes dos rios próximos, já utilisando as aguas dos
enormes poços abertos nos centros agrícolas affastados
das margens fluviaes ; ficará assim resolvido o proble-
ma agrícola citado por uma forma decisiva, e encon-
trada estará sem duvida a verdadeira solução para se
evitarem Crises alimentícias.
As actuaes companhias de exploração na Zambezia
commetteram um erro de administração não se ini-
ciando pelo desenvolvimento das culturas já reconheci-
das como coadunáveis ao terreno, antes mesmo de ten-
tarem estudar acelimações de outras espécies desco-
nhecidas no território e de dispenderem grande somma
de capital na construcção de fabricas de distillação al-
coólica. Menos álcool, mais irrigações e mais arroz.
E' pois obvia a necessidade que se impõe de dar
protecção á cultura do arroz, aproveitando-se as excep-
cionaes condições da Zambezia. Para esse fim, alem aa
isenção de direitos aduaneiros já anteriormente indicada
sobre a importação do cereal destinado a ser lançado á
terra, deve-se conceder para estimulo qualquer vanta-
gem, que premeie o agricultor que apresentar apoz a
colheita maior quantidade de arroz colonial, alem de um
certo numero de unidades, calculado previamente em
relação á área do prazo que traz de arrendamento. E
9 6
justo me parece que também se lhes proporcione o mer-
cado da metrópole a este producto; com este intuito
julgo recommendar-se a garantia do beneficio de 5o %
que é uso conceder-se aos productos coloniaes impor-
tados na metrópole ^ e finalmente, afim de evitar a con-
corrência, augmentar os direitos de importação que in-
cidem sobre o arroz da índia.
Ora como uma concessão d'esta ordem necessita,
para se evitarem fraudes ou erradas interpretações do
fim que com ella se visa, que uma direcção superior
presida á entrada e applicação do cereal importado nas-
sas condições especialíssimas, deverá todo este ficar á
disposição do Governo para superintendência na sua
distribuição, armazenado na alfandega logo apoz a sua
entrada, d'onde só sahirão as quantidades diversas por
meio de guias passadas pela auctoridade local depois
de bem precisado e approvado o seu destino agrícola.
No caso de ser destinado o género a cessão gratuita
aos colonos para obrigação de o semearem, essa dis-
tribuição será sempre feita na presença da auctoridade,
que fará ver aos mesmos indígenas a necessidade ab-
soluta de o lançarem á terra, estipulando-lhes para
garantia da execução do compromisso tomado o pa-
gamento ao arrendatário de uma percentagem na pro-
ducção depois da colheita. E ainda para se poder bem
exercer a necessária e indispensável fiscalisação, para
certeza de que as culturas foram effectuadas, aquella
distribuição será feita directamente aos muenes de cada
povoação indígena, que se responsabilisarão pelo exacto
cumprimento do que lhes for ordenado, demarcando-se
mesmo o terreno destinado a essa cultura para facilidade
de reconhecimento posterior. Por fim, disposições es-
peciaes para a policia dos diversos prazos obstarão á
tentativa de fuga dos colonos apoz a recepção das se-
mentes, o que é de presumir elles tentem de principio,
e por systema de se eximirem a tudo quanto seja tra-
balho a produzir.
A percentagem a cobrar ao indígena depois de ef-
fectuada a colheita do cereal cedido para cultura, não
deverá exceder nos primeiros tempos dez por cento
97
do producto d'esta, para o estimular a continuar, au-
gmentando-se-lhe de futuro á medida que forem ganhando
confiança no processo.
O arrendatário, por seu turno, indemnisará no final
das colheitas o Governo do beneficio concedido pela
isenção de direitos de importação, com uma parte da
colheita total correspondente ao valor dos mesmos di-
reitos.
O projecto que acabo de expor foi apresentado
em princípios do anno de 1901 á auctoridade superior
da província e representa um grande auxiliar, um grande
incentivo, uma grande protecção emfim a emprehendi-
mentos agrícolas de grande fôlego, que devem ser o
desideratum de todo aquelle que arrenda prazos na
Zambezia ; e o seu resultado satisfatório poderá com-
pensar simultaneamente o agricultor e o indigena pelo
seu trabalho, como também o Estado, que até se resar-
cirá dos benefícios concedidos. Não obtive até á minha
sahida da Zambezia solução de tal assumpto.
Fallei de cultura especialisando o arroz por ser o gé-
nero de maior consumo; e, pugnando pelo proteccionismo
ao desenvolvimento d'esta espécie agrícola, não quero
exprimir que as outras espécies alimentícias, como a
mapira, milho grosso, feijão, nachenim, etc, não devam
ser também tomadas em consideração, quando é certo
que estas constituem, como já expuz, a base alimentar
de alguns povos da Zambezia, habitantes das regiões
mais interiores. Entendo que, embora estas espécies não
tenham, como o arroz, uma acceitação geral no mundo
commercial, devem ter um desenvolvimento de cultura
muito superior ao que teem tido até hoje, para fazer fa-
ce ás necessidades alimentares próprias do districto e
evitar-se assim a sua importação.
Tratei da agricultura destinada essencialmente á ali-
mentação dos povos ; resta-me tratar de outras espécies,
que sendo de exportação, ou em si mesmas ou trans-
formadas, umas dão matérias primas das industrias
mais em voga, como são o coqueiro, o amendoim, o
98
gergelim, rícinos e mais oleoginosos, e finalmente o ai*
godão e a canna sacharina, e outras, como o café, bau-
nilha, borracha, etc, teem grande valor no mercado
commercial por constituírem mercadorias de necessidade
no mundo civilisado.
De todas as enunciadas espécies, a que se acha pro-
fusamente representada é indubitavelmente o coqueiro,
estendendo se pelo território em grupos compactos de
muitos milhares. E' este o elemento mais rico e o que
menos trabalho dá ao agricultor : basta semear o coco,
transplantar o arbusto e deixal-o vegetar e crescer ao
sabor da natureza ; obtem-se assim facilmente uma
propriedade rústica, valorisada, bastando um período
de sete annos para se iniciar um rendimento, que é
variável conforme é destinado á lavra a sura ou a ser
simplesmente fructifero.
A sura, ou é exposta á venda como bebida fermen-
tada, ou é transformada por distillação em aguardente;
e o coco é a maior parte transformado em copra depois
de secco, e a sua casca destina-se ao fabrico do. cairo.
Alem d'estas, outras mais applicações dos productos
das arvores surgem, mas basta a apresentação das ci-
tadas para se poder aquilatar verdadeiramente do valor
da cultura.
O amendoim, o gergelim, o rícino, juntamente com a
copra, constituem os oleoginosos que se exportam em
quantidade do districto, especialmente para Marselha,,
onde o mercado é mais favorável.
Ha uma espécie de cultura completamente abando-
nada no districto, não porque o solo se não preste,
porque as experiências effectuadas ha tempos provaram
sobejamente o contrario, mas talvez pela razão accei-
tavel da exhorbitancia do preço dos transportes que ab-
sorvem os lucros possíveis do agricultor. Refiro-me ao
algodão, cuja producção na costa occidental em Angola
tem attingido proporções enormes, porque os poderes
públicos teem tomado a peito promover a sua cultura, e
ao mesmo tempo assegurar aos cultivadores e exporta-
dores uma protecção definida e clara á collocação de
99
tal producto nos mercados da metrópole em condições
sobremaneira vantajosas.
N'esta colónia, que tem a considerar uma distancia
de milhares de milhas á metrópole e um frete de quatro
libras por tonelada em qualquer paquete da carreira,
parece-me utopia pensar-se em transportar tal producto
para os mercados da Europa, onde existem os centros
manufactureiros, por melhor que sejam garantidos os
interesses dos exportadores, porque o frete absorverá
todo o lucro. Assim pensaram os iniciadores na Zam-
bezia de tal cultura, e pena é que se não abalançassem
a empreza de maior quilate, porque a matéria prima
obtida era de primeira ordem em qualidade e quanti-
dade.
N 7 essa conjunctura sou de opinião que se devem apro-
veitar as excepcionaes condições do solo da Zambezia
para este cultivo-, mas para esse fim seria indispensá-
vel que surgisse a iniciativa da instituição de um centro
manufactureiro de tecidos, aue, attenta a barateza do
obreiro, e a abundância de braços, poderia satisfazer
plenamente ao enorme consumo que teem presente-
mente os tecidos d'algodão, não só em toda a província
de Moçambique, como na Africa central ingleza.
Sem duvida a formação de uma empreza ou compa-
nhia, nas condições bem patentes dos mercados de
Africa, sobremaneira vantajosos para a collocação de
taes productos manufacturados, será uma iniciativa aus-
piciosa que determinará um resultado lucrativo, depen-
dente apenas de uma exemplar administração e de uma
methodica exploração.
A cultura da canna saccharina tem já um desenvolvi-
mento regular nas regiões onde estão estabelecidas as
fabricas de álcool e assucar, que, como se verá adiante,
já são em numero suffi ciente para definir um progresso
fabril. Comtudo as áreas cultivadas durante o anno agrí-
cola de 1901 não se pôde dizer fossem tão grandes
quanto* deveriam ser, para correspondência proporcio-
nal com a capacidade productiva das fabricas; é de
esperar cjue novos emprehendimentos surjam em breve
a aproveitar a feracidade dos vastos terrenos do dis-
IOO
tricto e então um manancial perenne de sueco produ-
ctor do melaço definirá o progresso d'esta espécie de
cultura, de mais a mais contando os agricultores agora
com os mercados nacionaes pela proteção recente con-
cedida pelos poderes públicos ao assucar colonial.
Considerando agora as outras espécies agrícolas ci-
tadas anteriormente, como são o café, baunilha, bor-
racha, tabaco, etc, julgo que dos resultados obtidos
de diversas experiências feitas em grande escala pelas
companhias da Zambezia e Borôr, se deve concluir,
pela deficiência de produetos, a necessidade recom-
mendavel de mais aturado estudo sobre as condições
geraes de acelimação de taes espécies.
Comtudo está provado que nas regiões do Borôr e
Murramballa o café produzse bem, brotando dos mi-
lhares de arbustos que constituem as plantações cui-
dadas, e que offerecem á vista um esplendido aspecto.
Este satisfatório resultado decerto moverá os agri-
cultores a proseguirem com mais enthusiasmo n'essa
cultura puramente exótica, cujo produeto pelo seu sa-
bor especialíssimo terá favorável acolhimento nos mer-
cados europeus.
Na região ingleza da Africa central, os plantadores
de café, que ahi affluiram cheios de esperanças, estão
actualmente abandonando tal cultura, que se iniciara
sob tão enthusiasticos auspícios.
Os motivos de tal desanimo não são ainda bem co-
nhecidos por completo, mas consta que a grande falta
de braços não lhes permittiu regularisar conveniente-
mente as plantações, sendo as colheitas muito áquem
da espectativa. Alguns d'entre elles substituíram muito
recentemente a cultura do café pela do tabaco, de
forma que ainda se deve ignorar se resultou vantagem
com a troca.
No nosso território o tabaco só tem sido cultivado
pelo indígena para seu uso exclusivo. Um estudo sobre
a qualidade do produeto seria convenientíssimo para se
reconhecer se seria adaptável aos mercados exteriores,
mas até ao presente ainda nenhum agricultor pensou
em tal.
IOI
Quanto á baunilha, que é um producto de grande
valor, pouco tem sido cultivada; apenas a Companhia
do Borôr lançou á terra algumas sementes, ignorando-
se ainda o resultado.
Por ultimo, da borracha tem sido tentada a cultura
em quasi todos os prazos da Zambezia, das espécies
da America, principalmente a Maniçoba do Ceará (Ma-
nihot Gla\ziovil), cujas sementes teem produzido arvo-
res enormes, mas com muito pouco sueco leitoso. Pa-
rece d' esse facto poder-se deduzir que o solo não é
propicio ás espécies da America e que os cultivadores
se devem dedicar única e exclusivamente em desenvol-
ver as que abundam no solo zambeziano, isto é, as Lan-
dolphias (apocyneas), Ficus elástica, Kiçkxia, etc.
Termino assim a descripção do verdadeiro estado
agrícola da Zambezia. Com a possivel clareza precisei
as causas diversas que imperam no seu modo de ser,
e as suas consequências. Para finalisar o assumpto di-
rei ainda gue incitei os arrendatários á tentativa de
mais experiências de cultura com outras espécies reco
nhecidas como produetivas na ilha da Reunião.
A idéa não era nova, não era mais do que a execu-
ção de um dos artigos do regulamento dos prazos, que
sabiamente apresenta um dever que assiste á nação co-
lonisadora, de pesquizar por sua conta o que o solo é
susceptível de produzir. N'esse sentido o governo pouco
ou nada tem feito, de forma que cjuasi tudo o que se
sabe hoje das disposições agronómicas do solo da Zam-
bezia é frueto de trabalho dos particulares.
Encontrei pois da parte dos arrendatários, sem dis-
tineção, uma franca acquiescencia, tanto mais louvável
quanto era* facto que os cofres da Fazenda não eram
em nada onerados com a execução da idéa; pois as
despezas de acquisição das sementes especiaes seriam
pagas por elles pelo preço do custo, acerescentado com
o do transporte. Este ultimo seria económico, porque se
poderia aproveitar naoccasiãoo regresso d'uma canho-
neira portugueza que tinha ido á referida ilha em com-
missão de serviço.
109
Do governo geral da Província sollicitei a intervenção
para obter da nossa auctoridade consular na Reunião à
satisfação do fornecimento das sementes. Infelizmente
para a causa da agricultura não fui attendido.
Induntria. — As industrias manufactureiras en-
contram na Zambezia vastos elementos materiaes para
o desenvolvimento das diversas especialidades, bem
como numerosos obreiros indígenas com relativa des-
treza e habilidade para as executar. A quantidade da
obra puramente indígena não merece menção, pois pela
sua exiguidade e applicação não define movimento
commercial, podendo apenas considerar- se como curio-
sidades indígenas, o que comtudo demonstra o estado
de adeantamento do povo zambeziano. O que é evi-
dente e incontestável é que sobram as aptidões para
as industrias : ourives, tecelagem, esteireiro, ferreiro e
algumas mais que presentemente não me occorrem.
Posto isto considerarei as industrias fabris, que são
as que verdadeiramente caracterisam o proeresso de
uma colónia, pois representam nada menos do que fo-
cos d'onde irradia um incitamento civilisador, como
que uma propaganda viva da virtude do trabalho no
animo dos povos, não só aborígenes como adventícios,
que constituem a massa das populações nas terras de
Africa.
A Zambezia actualmente caminha ovante, ostentando
quatro grandes fabricas de distillação de álcool e qua-
tro pequenas distillatorias, uma fabrica de assucar, uma
fabrica de cairo, uma fabrica de debulha de arroz,
uma fabrica de sabão e óleos e finalmente marinhas de
sal, além de dois estabelecimentos fabris do Estado,
que são o arsenal de Quelimane e as officinas da es-
quadrilha fluvial no Chinde.
As localidades onde laboram estas industrias são res-
pectivamente :
Mopêa, onde está installada a companhia do Assu-
car de Moçambique, que fabrica assucar e álcool ex-
trahidos da canna saccnarina. A quantidade de assucar
K*
produzivel é dependente da plantação, pois ha elemen-
tos para a obtenção de grande numero de toneladas
daquelle artigo desde o momento em que não escas-
seie a matéria prima
Quanto ao álcool, o distillador, que é continuo e
com rectificador, pôde produzir diariamente 9:800 li-
tros.
Em Makuse tem a companhia do Borôr installada
uma fabrica de álcool também de systema continuo,
com rectificador, podendo produzir 8:000 litros diária*
mente.
No Marrongane, sito na margem esquerda do Ma-
kuse, tem a companhia da Zambezia montado um alam*
bique de distillação continua, com a capacidade para
produzir diariamente 3: 200 litros de álcool.
A mesma companhia levou a cffeito no anno de 1901
a construcção em Quelimane de uma fabrica de cairo
e outra para debulhar arroz. Ambas são, como disse, de
recente fundação, e apresentam disposições vantajosas
para uma producção enorme desde o momento em que
não escasseiem para a sua laboração as matérias pri-
mas privativas de cada uma.
A primeira utilisa a casca do coco, que até então era
desprezada por não ter applicação; a segunda deve
concorrer enormemente para a alimentação da Provín-
cia quando houver grande cultura de arroz na Zambe-
zia e se dispensar, como deve resultar, a importação
do mesmo cereal do estrangeiro.
São indubitavelmente dois factores do progresso fu-
turo do districto da Zambezia; o que é necessário é que
a mesma iniciativa que presidiu á sua installação con-
corra para que a agricultura especial tenha o incremento
devido; está n'isso o seu modo de ser.
A mesma companhia creou no Idugo, localidade as-
sente na margem direita do Makuse, junto á barra,
umas salinas que teem dado resultados satisfatórios,
não obstante estar essa industria sujeita ás irregulari-
dades frequentes nas chuvas que se dão annualmente
tfestas regiões.
Em Quelimane existe ainda outra industria, a do sa-
'ia*
bão e óleos, explorada pela Companhia francesa de
Huilleries et Savoneries, possuindo uma fabrica bem
montada, onde a producção tem sido enorme. A labo-
ração é feita com as matérias primas oleoginosas que
abundam no districto, como são a copra e amendoim,
representando o estabelecimento um verdadeiro consu-
midor de taes productos. Esta fabrica, que foi inaugu-
rada sob tão bons auspicios, pois tinha o mercado do
Transvaal favorável sobremaneira ao consumo do seu
sabão, paralysou em consequência da guerra anglo-
transvaaliana, por falta absoluta de consumidor dos
seus productos, porque o mercado da província é fraco
para garantir a sua vitalidade. Consta ultimamente que
ella vae ser transferida para a colónia ingleza do Na-
tal, coagidos os seus proprietários pela necessidade de
poderem continuar a ter o mercado do Transvaal favo-
rável, pois os inglezes só beneficiam a importação dos
productos das suas colónias ; infelizmente será este fa-
cto para Quelimane um acontecimento inevitável que
redundará no desapparecimento de um factor impor-
tante do progresso do districto.
No Mahindo possue a firma Corrêa & Carvalho um
alambique de distillação contínua, que pode produzir
diariamente 3 :20o litros de álcool.
De resto existem ainda uns pequenos alambiques sim-
ples, apenas em numero de auatro, nos prazos arren-
dados de nomes Marrai, Madal, Inhassunge e Carungo,
que poderão produzir cada um 5oo litros diariamente.
Ainda a companhia do Luabo apresenta um pequeno
descascador e algumas pequenas moendas de cereal,
movidas por uma locomovei, na sua estação da mar-
gem direita do Chinde denominada Sombo.
Nos terrenos da margem direita do Zambeze e no
sitio de nome Morromeu, ostenta-se a melhor fabrica
de assucar e álcool da província, administrada por
uma companhia franceza; e como essa margem do
Zambeze faz parte dos territórios da companhia de
Moçambique, abstenhome de fornecer informações
mais detalhadas por não interessarem ao districto da
Zambezia.
10$
Como se vê, as industrias são representadas por um
grande numero de estabelecimentos fabris, utilisando
matérias primas produzidas pelo solo da Zambezia.
A identidade dos productos determinará uma emula-
ção benéfica, e os resultados colhidos, provocando a
afluência de capitães necessários á formação de novas
emprezas, estimulará a agricultura, base solida da ri-
quezia do território.
Commercio e navegação. — Estes dois
elementos importantes andam tão connexos que o des-*
envolvei- os simultaneamente dará uma idéa da situação
real resultante da actividade humana applicada.
E' um thema assente geralmente n'uma verdade eco
nomica, que a prosperidade de um logar onde se
acha condensada uma parte da humanidade, está na
razão directa da differença da exportação sobre a im-
portação. Seguindo pois este axioma pode-se ajuizar
perfeitamente da prosperidade da Zambezia examinan-
do os números que designam os valores corresponden-
tes ao movimento nas suas duas artérias principaes,
que teem inicio nos portos de Quelimane e Chmde,
e em referencia aos dois últimos annos :
^*-HÈK2£-::::
a- de i*.) £*££:;;;;
Valores
766:914^674
478:417^970
65o:38i#872
274:183^626
Direitos
166:489^595
9:577«)822
120:885^097
6:268^477
Estes algarismos exprimem cathegoricamente a si-
tuação, notando-se que a exportação é muito inferior á
importação, e que tanto uma como a outra diminuíram
consideravelmente no anno de 1901. Para apontar as
verdadeiras causas de tal decrescimento ainda para
io8
de, que o contrabando pullula, postergando a fiscalisa-
ção aduaneira, que, como disse, é impraticável para
ser exercida por uma forma continua, como impõe a
necessidade.
A razão explicativa d'este caso está exactamente nos
elevados direitos exigidos ás mercadorias estrangeiras
pelas nossas pautas actuaes, filha essa exigência princi-
palmente do desejo que houve de dar larga protecção
aos nossos productos. E esse beneficio (não obstante
hypothetico) foi o único facultavel, na situação actual
de coacção em que estamos de dar transito a todas
as mercadorias que se destinam aos territórios estrangei-
ros limitrophes.
E' claro pois que, ainda dentro do mesmo systema
tributário, o maior proteccionismo aos productos na-
cionaes corresponde a uma maior taxa de direitos a
impor aos productos estrangeiros, e assim temos como
resultado o definir-se ainda em maior escala a rever-
são clandestina para o nosso território dos productos
que deram entrada em transito livre no território es-
trangeiro.
N esta conjunctura um enorme pessoal fiscalisador de
idoneidade reconhecida e bem remunerado é indispensá-
vel para zelar os interesses do Estado e do commercio
licito; mas por esta forma chegar-se-ha ainda a um re-
sultado illusorio com a absorpção em pura perda das
receitas que devem ser aproveitadas para as legitimas
e provadas urgências do Governo. O que se me afi-
gura como mais plausível e de effeitos mais salutares,
e que uma união aduaneira seja pactuada com os in-
glezes para vigência n'esta zona especial ; para o que
uma remodelação nas pautas de Moçambique deveria
ser feita no sentido de se conseguir uma uniformidade
no regimen aduaneiro zambeziano.
E' claro que os productos das nossas industrias vi-
nhateiras deverão ser previamente salvaguardados, con-
seguindo- se uma protecção e Efectiva á abundância dos
nossos vinhos, que é o único artigo de exportação de
Portugal que merece menção por poder competir com
os productos similares de outras nações.
109
Para se aquilatar melhor do valor doesta idéa basta
enunciar se que de Portugal só saem para a Zambezia
vinhos, calçado e conservas; de Inglaterra, algodão, te-
cidos e calçado ; da Allemanha, Suissa e França, teci-
dos, machinas e artigos de uso domestico; da Noruega,
materiaes de construcção, e de Bombaim, algodões,
outros tecidos e quinquilherias.
Em vista d'esta enorme concorrência ao commercio
de transito, que é o maior contribuinte ao desenvolvi-
mento commercial do districto, é uma verdadeira utopia
o pensar se que as mercadorias de origem nacional pe-
sem na balança do commercio geral.
Conseguida a suggerida modificação no regimen
aduaneiro, as vantagens immediatas advindouras serão
gravemente importantes. Assim reduzir-se-ha o pessoal
aduaneiro ao estrictamente necessário ás verificações
de mercadorias, visto que a fiscalisação tornar-se-ha
muito limitada, resultando d'ahi já uma economia notá-
vel para o Estado. Cessará fatalmente o contrabando
descarado, tanto o que resulta das reversões ao nosso
território das mercadorias que seguirem em transito li
vre para o território britannico e para o da companhia
de Moçambique, como também o que provém dos des-
caminhos que usualmente são effectuados no decurso
do enorme trajecto no Zambeze e Chire, pelos vapo-
res fluviaes. Ora tudo isto será consequência de des-
apparecer de vez o engodo para a fraude, provocada
pela grande differença de taxas aduaneiras existente
ao presente.
As mercadorias nacionaes, cuja acceitação nos mer-
cados, não obstante o proteccionismo pautal, tem sido
minima (em consequência da sua inferior qualidade al-
liada ao elevado preço de venda, em comparação com
productos similares estrangeiros, embora apresentados
ao consumo licitamente), poderão, com uma melhoria
nas matérias primas e na manufactura, concorrer fran-
camente com as de outras nações, pois que terminado
o contrabando nada deverá haver que defina uma pre-
ferencia na acquisição pelas populações diversas.
Todos estes factos concorreram evidentemente em
no
grande parte para a diminuição dos rendimentos adua-
neiros nos últimos annos, e é natural que a continuar-
se com este estado de cousas, uma receita tão impor-
tante se reduza a uma verba irrisória.
Continuando no desenvolvimento da idéa, direi ainda
que o porto de Quelimane, esplendidamente situado,
f^eograpnica e hydrographicamente considerado (con-
òrme foi descripto na primeira secção d'este livroj,
adquirirá forçosamente uma importância enorme guando
fôr levada a effeito a de ha muito projectada e já estu-
dada construcção do caminho de ferro ao Ruo, e ligan-
do-se ahi com a linha férrea também projectada pelos
inglezes para ligar o Chire com o Nyassa.
Será então Quelimane a via escolhida para servir a
região dos lagos, que indubitavelmente concentra ri-
quezas na fertilidade do seu solo e no valor do seu sub-
solo.
Aquelle advento da linha ferro-viaria e a superioridade
do porto de Quelimane ao do Chinde, que alem de
pouco profundo apresenta uma inconstância na direcção
dos seus canaes de ingresso, concorreriam para fazer
derivar Inevitavelmente para o primeiro porto toda a
navegação marítima, que augmentaria em tonelagem.
Restituir-se hia assim a Quelimane a importância de
navegação que tinha antigamente, e que na situação
presente era bastante inferior á do Chinde; o que é
concludente das estatísticas do anno de 1901, em que
se vê que os navios entrados em Quelimane foram 160
com 71:686 toneladas e no Chinde 212 com 117:864.
A conservação do porto do Chinde é sem duvida um
encargo que as exigências inglezas necessariamente tor-
narão pesado ao Estado, pois em breve querer-se-ha
naturalmente um serviço effectivo de dragagem contí-
nua e de trabalhos hydrographicos, tendente tudo a
melhorar as péssimas condições de navegabilidade para
ingresso dos navios do alto mar, o que tem sido as-
sumpto de graves ponderações, aliás bem baseadas,
das auctoridades inglezas locaes em attenção ás recla-
mações das agencias de vapores.
Em vista pois do ridente futuro de um porto como
Ill
o de Quelimane (para o qual a natureza foi sobrema-
neira liberal, e ao qual a actividade humana, no louvá-
vel intuito do progresso, projecta erguer a um nivel
bastante elevado), e apresentando-se quasi em contra-
posição um outro, cuja existência é insustentável sem
graves responsabilidades do Estado (grandemente dis-
pendiosas de manter e sem probabilidade de lucro
vantajoso), tornar-se-ha evidente que todas as tendên-
cias dos poderes públicos, depois de pactuada a sug-
gerida união aduaneira e depois de construído o ca-
minho de ferro de Quelimane ao Ruo, deverão resu-
mir-se em concorrer por todos os meios para o en-
grandecimento de Quelimane, considerado então por
justos motivos como a verdadeira via de penetração
para o interior da Africa.
As condições hydrographicas da Zambezia, já des-
criptas, prestam sobremodo o seu valioso concurso á
obra meritória da centralisação em Quelimane de todos
os factores para a sua elevação moral, social e econó-
mica. Bastaria estabelecer a communicação interna en-
tre os dois portos citados, por uma via fluvial (empreza
que juízo de fácil realisação por se limitar a ligar o
no Linde com o Chinde, aprofundando o leito de alguns
riachos intermédios), para se ter centralisada em Que-
limane, tanto a navegação maritima como também a
fluvial do Zambeze.
Alguém verá, como consequência da realisação pro-
jectada, inconvenientes, principalmente resultantes de
se tornar extensivo ao rio de Quelimane o regimen de
internacionalidade do Zambeze, imposto pelo convénio
com a Gran-Bretanha.
Para desvanecer essas idéas de inconveniência basta
dizer que uma das imposições de summa gravidade
Í>ara a soberania nacional que resultaram do convenio T
òi a chamada British concession, no Chinde, dada para
effeitos puramente commerciaes com o fim de servir
de entreposto á Africa central ingleza.
Ora tornando se Quelimane o porto d'onde irradie a
penetração para o interior d' Africa, quer de mercado-
rias e materiaes, quer de pessoas, aproveitando a seu
na
bello prazer qualquer dos meios de transporte que se
lhe offerecem, e peculiares ou á via fluvial, por intermé-
dio dos vapores, ou á terrestre, por intermédio da li-
nha ferro-viaria, é natural que as casas commerciaes
existentes na Africa central ingleza, que teem no Chinde
os seus agentes, se decidam, tanto por systema econó-
mico como por commodidade, a dispensar o transbordo
no terreno da concessão do Chinde, preferindo as faci-
lidades que lhe proporcionarão o despacho em transito
livre effectuado pela nossa alfandega de Quelimane.
E' claro que uma execução expedita dos processos
alfandegários se corna bastante necessário. Fará esse
fim, alem de bom pessoal aduaneiro, é recommendavel
a pratica da permissão (já ha muito tempo legalisada
mas ainda não iniciada) para o estabelecimento de ar-
mazéns alfandegados na villa de Quelimane a qualquer
individuo ou agencia nacional ou estrangeira.
Conseguir-se-ha talvez por esta forma uma deprecia-
ção na importância da concessão do Chinde, o que au-
xiliará o engrandecimento de Quelimane pelo accrescimo
que se definirá no seu movimento commercial.
Quanto a tornar-se extensiva ao rio de Quelimane a
liberdade de navegação do Zambeze, direi ainda que
essa permissão é inevitável pela letra do convénio, luso-
britannico. Não obstante, algumas restricções existem le-
galmente firmadas, considerando que se se levar a cabo
a abertura do canal de communicação entre o Linde
e o Chinde, será essa obra um serviço prestado á na-
vegação, o que, pela própria letra do convénio, permitte
que se cobrem taxas á navegação geral a titulo de re-
tribuição por um serviço importante que lhe foi prestado
e por outros que se continuarão a prestar forçosamente
com a conservação e limpeza da indicada via de com-
municação. De resto, a affluencia de navegação será de
certo um beneficio para as localidades percorridas pelos
diversos elementos materiaes.
Realisados os citados emprehendimentos nada poderá
contestar a affirmativa de que surgirá, sob grandes
auspícios, um verdadeiro empório em Quelimane, ser-
vindo a Zambezia inteira e as regiões da Africa cen-
n3
trai. A sua importância advindoura será incalculável. A
colonisação, encarreirando se, ha de explorar devida-
mente o território pelos três ramos de actividade hu-
mana : agricultura, commercio e industria.
O valor da exportação sahirá do torpor em que tem
jazido, por ausência de iniciativas, e definirá, pela pro-
fusão do seu accrescimo, o florescimento do commercio
geral.
Por fim a pátria considerará com ufania a sua pos-
sessão da Africa oriental.
SECÇÃO IH
Situação financeira— Dividas do districto
Sobras orçamentaes
CAPITULO I
Da situação financeira
Pela tabeliã annexa, indicativa da receita geral da
Zambezia, descriminando-se todos os rendimentos co-
brados no anno de 1901 segundo diversos títulos, se
verá o quanto são avultados os recursos financeiros do
districto, destacandose do avultado sommatorio de re-
ceitas realisaveis no valor de. 458:829^430 réis em
total.
As mais importantes verbas de receita, e que concor-
rem como base de numerário para a desafogada situa-
ção financeira do districto, são as rendas dos prazos da
Coroa adjudicados a companhias constituídas em socie-
dades anonymas e a particulares, sob o titulo de Ar-
rendamento da cobrança do mussóco, produzindo um
sommatorio de réis 127:704^771, bem como o rendi-
mento da alfandega, que no anno findo deu a cifra de
160:947^624 réis.
A seguir, por ordem de importância, ha a considerar
o producto das contribuições e do rendimento dos pra-
zos da Coroa, administrados directamente pelo Governo;
nò
as licenças para feiras nos prazos, e o rendimento li-
quido dos telegraphos e do arsenal de Quelimane.
Todas as outras receitas indicadas na tabeliã, embora
sejam garantidas, são de menor importância, e não
obstante pelo seu sommatorio concorrerem para a si-
tuação lisongeira indicada, são verbas que pelas cir-
cumstancias especiaes do districto não dão esperanças
de augmento progressivo, que pelo seu valor mereça
menção para um calculo de probabilidades a fazer -se
dos recursos financeiros futuros da Zambezia.
Vou considerar de per si cada uma das receitas an-
teriormente indicadas, para consignar as causas da sua
productividade maior ou menor, e assim aquilatar-se
melhor das circumstancias do thesouro n'este distri-
cto, que desde muitos annos é considerado o mais
productivo da província, e um dos que mais garantias
dá de n'um futuro próximo ser elevada a sua situação
financeira a uma prosperidade inabalável.
A primeira, indicada com o titulo de Rendimento dos
prados da Coroa arrendados, é uma receita que no anno
da implantação do regimen do arrendamento da cobrança
do mussôco, em 1892, era de 77:91 3#>524 réis, e que
presentemente se elevou á cifra de 142:393^267 réis
em consequência dos augmentos quinquenaes de 5 °/o
nas rendas de cada prazo, accrescidas do augmento da
taxa do imposto da capitação no indígena de 800 a
i#20o réis no anno de 1898.
Demonstra-se pelo augmento da receita em 64:479^743
réis a efficacia do regimen administrativo em beneficio
da Fazenda Nacional n'um espaço de tempo de dez
annos. E sendo notável que esta receita tem sido con-
seguida com quasi nullo dispêndio, para o Estado, pois
apenas o pessoal fiscalisador da superintendência dos
prazos absorvia annualmente uma parte minima de réis
8:202^)800, que pela exiguidade constitue como que
uma verdadeira gotta d'agua extraída d'um oceano,
mais se accentua o característico d'ella constituir o ver-
dadeiro recurso financial.
Os prazos arrendados são em numero de 23, classi-
ficados dtf segundo grupo, afora os da região de Téte
e alta Zambezia, os quaes sendo do primeiro grupo,
pelo seu ainda problemático estado de pacificação, con-
tribuem com uma renda ainda insignificante na impor-
tância de 5: 306^045 réis.
Alem das indicadas circumscripções territoriaes exis-
tem ainda duas de grande importância futura como
fontes de receita: a extensa região Milange Namuli e
o prazo da Angonia. A companhia da Zambezia ex-
plora a primeira, ainda não completamente em conse-
quência do estado de rebeldia em que jazem grande
numero dos seus povos; mas que uma pacificação
completa decidirá o arbitrar se-lhe de seguida uma
renda annual èm proporção legal com a capitação co-
bravel.
O prazo da Angonia, encravado em território inglez,
também explorado pela companhia da Zambezia, pos-
sue uma população densa, pacifica e laboriosa, da qual
a referida companhia tem auferido vantajosos lucros;
é pois de inteira justiça que haja uma repartição equi-
tativa dos referidos proventos com o Estado, o que
ainda até hoje não teve logar.
Esta região, recentemente pacificada, mercê de termos
mantido a nossa auctoridade desde princípios de 1900
com um oflicial da armada como Residente, e pelo ef-
ficaz concurso dos elementos de exploração territorial
da companhia concessionaria, offerece desde já garantia
segura para se poder exigir da administração particu-
lar que n'ella impera uma renda que deveria ser arbi-
trada, segundo a lei, por metade do valor dos mussô-
cos cobrados.
Ora apresentando a população recenseada uma reu-
nião de i6:5oo colonos e suppondo que só metade
d'esse numero tem satisfeito o imposto de capitação (o
que será áquem da verdade), arbitrando se ao prazo
uma renda annual de réis 5:ooo$ooo para inicio, con-
tinuando comtudo elle a ser considerado na cathegoria
do primeiro grupo, para faculdade de alteração futura
na mesma renda, consoante as melhorias advindouras
á sua administração intestina, conseguir-se-ha para o
Estado uma compensação. .
n8
Nos prazos Milangc-Namuli e nos agrupados na re-
gião (Talem Téte, em que a occupação n'uns e n'outros
é presentemente um mytho, a população é densa e de-
monstra a sua existência por uma contagem aos milha-
res, vivendo ao sabor da sua natureza, livre de inter-
venção civilisadora. As futuras rendas a exigirse da
companhia que está explorando essas feracissiqias re-
giões, quando n'estas a rebeldia e a insubmissão te-
nham desapparecido dando logar á implantação dos ele-
mentos colonisadores e civilisadores, constituirão um
accrescimo importante aos já de si importantes recur-
sos actuaes.
Considerando agora o rendimento da alfandega dò
districto peço a attenção para a tabeliã junta, em que
se acham descriminadas as phases porque teem passado
desde o anno de 1891 (primeiro da instai lação do posto
de despacho no Chinde) as receitas provenientes dos
direitos cobrados em toda a Zambezia, sobre os valores
commerciaes que teem evolucionado pelo território.
Nota-se com prazer um augmento brusco na affluen-
cia commercial do anno de 1891 para 1896 e lentamente
progressivo de 1897 até 1900.
Explicando melhor: no anno de 1891 a estatística
accusa na Zambezia e Chinde o seguinte movimento
commercial e alfandegário :
Valores
Direitos
Quelimaae
Chinde
1.207: 323 #987
J.iQ9#5oo
l38:g26^236
235 #340
Somma
1.210:523^487
139; 161 #576
estando n'essa época só estabelecido um posto de des-
pacho no Chinde. Porém no anno de 1900, em que já
tl 9
existiam postos de despacho em Mopêa, Missongue,
Chiuanga, Chilomo e Téte, accusou-se o movimento
seguinte :
Quelimane . .
Chinde
Mopêa
Missongue.. .
Chiuanga . . .
Chilomo
Téte
Som ma «
V*!ore»
1.410:368^614
1.226:038*786
140:045*800
86:oió*355
2:291*000
28:oi7^33o
145:740*280
3.048:418*165
Direitos
122:770^613
5o:39l #587
£7*120
3787*000
22*035
*:5o8*6o6
17:126*015
196:702*976
Nota-se pois no anno de 1900 uma differença para
mais de 1.837:994^678 réis em valores importados e
um correspondente accrescimo no rendimento na alfan-
dega de reis 57:641 #400.
O anno de 1901, penúltimo, apresenta uma pequena
baixa na importação comparada com o anterior de 1900
e por conseguinte uma diminuição de renda na alfan-
dega, representada pelos seguintes números :
1900
1901
Differença,
Valores
3.048:418$ i65
2.672:580*531
375:837*584
Direitos
106:702*076
160:947*624
35:755*352
Observando-se a estatística geral é notório que tal
diminuição é consequência de uma reducção na affluen-
cia de valores ao porto de Quelimane durante o anno
I20
de 1901, o que é symptoma de uma oscillação no com-
mercio local e nas regiões de Leste, que usam abaste*
cer-se d'este porto.
A principal causa da depressão no porto de Queli-
mane foi a grande falta de capital com que lutaram no
anno de 1901 as companhias e os arrendatários, em
cujas mãos reside todo o commercio local ; e ha ra-
zões para fazer suppôr que talvez uma peccavel admi-
nistração particular concorresse para tao depreciativo
resultado.
Ora accrescentando a esse facto as consequências
de uma falta de abundância de mantimentos coloniaes
próprios da região, que não permittiu ao indígena per-
mutar géneros em grande escala, temos assim perfeita-
mente definidos os factores da diminuição pronunciada
na receita da alfandega do anno de 190 j.
Na secção anterior já tive occasião de desenvolver
as causas do accrescimo lento que tem tido o movimento
commercial na Zambezia nos últimos seis annos, apon-
tando as providencias que julgo necessário tomar se,
para que o referido movimento attinja o grau elevado
a que dá direito a situação geographica dos seus portos,
e mormente o de Quelimane.
Tratando agora das receitas que adveem das contri-
buições, ha a considerar nas diversas classes a maior
ou menor facilidade no seu lançamento e cobrança, em
correspondência com as particularidades que residem
na extensa região onde aquellas teem de ser levadas a
effeito, sobre os elementos sujeitos a tributo.
Aquellas que teem mais concorrido para as receitas
do districto são as designadas industriaes fixas e variá-
veis e as de registo; e comtudo estas mesmas não teem
tido um lançamento e cobrança completos, devido este
facto talvez em grande parte á falta de pessoal de Fa-
zenda fiscalisador que possa ser distrahido da repartição
respectiva, para percorrer em visita todas as circums-
cripções territoriaes, onde clandestinamente se exercem
as diversas industrias tributáveis. E sendo certo que não
121
se circumscrevem ao âmbito das villas (conforme suc-
cede nos outros districtos d'esta província) os diversos
elementos que constituem o desenvolvimento industrial
e commercial da Zambezia, existindo mesmo localidades
a centenas de kilometros de distancia delias onde o seu
exercício é um facto, é obvia a impraticabilidade de
uma fiscalisação fazendaria efficaz, quando a repartição
respectiva não disponha de faculdades de trabalho e
actividade indispensáveis a uma rigorosa pesquiza.
Quanto ás contribuições das classes predial e renda
de casas, estas acham-se por lançar desde o anno de
1896 inclusive, isto é, ha seis annos que impera uma
incúria, que tem sido herdada e transmittida avolumada
pelos diversos escrivães de fazenda que teem servido
desde o primeiro anno em que se não effectuou a dita
cobrança.
O delegado de fazenda que serviu durante a minha
gerência, diga-se em abono da verdade, ponderou á re-
partição superior por diversas vezes esse cahotico estado
de cousas, sollicitando elementos necessários para levar
a cabo a realisação de uma cobrança, cujo sommatorio
attingia mais de 180:000^)000 réis. As providencias
que foram concedidas para aproveitar as boas disposi-
ções patenteadas pelo respectivo funccionario, em rea-
lisar um serviço tão útil aos cofres do thesouro, são
irrisórias, para não lhes dar outra qualificação mais em
harmonia com a indifferença da auctoridade superior
de Fazenda provincial pelo serviço publico. Limitaram-
se ellas a auctorisar em abril de 1901 uma verba de
i5o#>ooo réis para a organisação de todos os elementos
necessários á confecção das matrizes em todo o dis-
tricto !
Ora só uma indifferença propositada da parte do
então inspector de fazenda provincial, a respeito das
circumstancias particulares da Zambezia, isto é, dis-
tancias a percorrer, natureza dos transportes, duração
das viagens, grandeza territorial do districto, pessoal
existente na repartição respectiva, etc, poderá expli-
car como depois do que pessoalmente tive occasião de
pacientemente lhe elucidir na minha estada em Lou
122
renço Marques, perante a auctoridade superior da pro-
víncia, em abril do anno de 1901, sobre taes assum-
ptos, se tomou uma decisão daquellas, que pela im-
possibilidade absoluta de acção com tão parcos meios,
produziu, o que era fatal, a continuação do mesmo es-
tado de cousas até ér data da minha retirada da Zam-
bezia.
O meu ardente desejo de regularisar tão importante
arrecadação de reditos da fazenda, levoume a expor
ao Governo Geral em setembro de 1900 tal estado de
incúria, e em fins de março de 1901 a apresentar di-
rectamente a s. ex. a o conselheiro Governador Geral
o meu parecer sobre o processo a haver para a cobrança
das contribuições directas sobre as propriedades exis-
tentes no districto da Zambezia, atrazada desde 1896
inclusive. Baseava a proposta especialmente na falta
existente na província de pessoal de fazenda, gue po-
desse de prompto ser destacado para a Zambezia, para
extraordinariamente proceder á confecção dos elemen-
tos preliminares para o lançamento da contribuição res-
pectiva.
Assim no referido parecer considerei para effeitos de
cobrança : em primeiro logar as propriedades rústicas
e urbanas registadas na occasião da ultima cobrança
que foi effectuada no anno de 1895 ; em segundo logar
as propriedades constituídas depois d'aquella época,
cujas matrizes nunca foram organisadas; em terceiro
logar o serviço normal da cobrança apoz a organisação
do cadastro geral de todas as propriedades existentes
sobre que recaem as contribuições predial .e renda de
casas.
Para o primeiro e terceiro casos a repartição de fa-
zenda districtal deverá estar habilitada ao seu integral
cumprimento desde o momento em que se mantenha
sempre o quadro do pessoal designado pelo orçamento
no seu effectivo completo; e cumprida esta formalidade
não se deveria fazer esperar a cobrança das contribui-
ções directas sobre as propriedades já inscriptas no
anno de 1895, desde esta época também atrazadas na
sua arrecadação.
123
Para o segundo caso torna se indispensável o conhe-
cimento de todas as propriedades omissas na organi-
sação das matrizes do anno de 1895, porque a partir
d'esse anno bastantes se teem constituído, não só nos
diversos prazos da Coroa, como também nas villas,
sedes dos concelhos ou de julgado municipal. Para tal
fim é necessarip considerar que sendo grande a área
da Zambezia, é-lhe correspondente uma disseminação
de propriedades pelas suas diversas localidades; torna-
se por conseguinte necessário para um bom e rápido
arrolamento que se dispersem pelo território os infor-
madores louvados destinados a este fim.
Ora para isto a solução pratica residia na forma
porque era organisada a fiscalisação dos prazos, cons-
tituídos estes em quatro agrupamentos, formando cir-
cum se ri peões a cargo exclusivo dos fiscaes, que pelo
seu transitar continuado nas determinadas divisões da
área districtal, eram os funecionarios que em melhores
condições de occasião podiam satisfazer as informações
necessárias para a organisação d'um cadastro geral da
^propriedade existente.
Considerando ainda que nas quatro villas do distri-
cto, Quelimane, Chinde, Téte e Zumbo (aonde a agglo-
meração das diversas espécies de propriedade é mani$
festa numa área limitada ao âmbito de cada uma), a
organisação das matrizes apresenta maior simplicidade ;
k e tendo em attenção que a repartição de fazenda, em
consequência da deficiência no pessoal existente, tinha
grande quantidade de serviço accumulado, não podendo
nem devendo na occasião dispor do tempo útil senão
para pôr em dia a escripturação, para em seguinda at-
tender ao regular andamento do expediente normal,
apresentei a opinião seguinte :
Que ficasse directamente a cargo da secretaria do
Governo do districto o arrolamento geral de todas as
propriedades constituídas desde o anno de 1895, e para
a obtenção de todos os elementos necessários á organi-
sação das matrizes na conformidade da legislação vi-
gente, empregar se hiam, como informadores, os fis-
caes dos prazos para a acção n'estes exclusiva, ficando
124
as villas a cargo dos administradores do concelho de
Quelimane e Tete, intendente do Chinde e comman-
dante militar do Zumbo.
Com o fim de compensar o grande augmento de tra-
balho que adviria aos funccionarios referidos, que teriam
de percorrer grandes extensões kilometricas para exame
directo de todas as propriedades, dever- se-hia apenas
arbitrar-lhes uma ajuda de custo a titulo de gratificação.
A entrada nos cofres do estado de cerca de réis
200:000^000, que resultaria depois de eôectuado tão
importante serviço, era de sobeja recommendação para
que este se fizesse immediatamente nas condições apon-
tadas.
Para pôr em execução esta proposta seria necessária
a auctorisação de uma verba de i:56o#coo réis a
2:oco#ooo réis para pagamento aos louvados informa-
dores das ajudas de custo para uma rigorosa inspecção
directa aos prédios rústicos e urbanos existentes no dis-
tricto, serviço este que em três mezes estaria concluido.
Ignoro os motivos que presidiram á não execução do
citado parecer, lido por mim a s. ex. a o conselheiro
Governador Geral, não tendo sido apresentadas na oc-
casião objecções de espécie alguma ; é de suppor com-
tudo que algumas dificuldades supervenientes concor-
ressem a addiar a execução de um serviço de tão grande
utilidade.
N'esta conjunctura resta me desejar que em melho-
res tempos não se faça esperar a execução de um pro-
cesso administrativo que redunda em beneficio dos re-
ditos da Fazenda Nacional, que seriam augmentados,
depois de introduzida a normalidade na cobrança das
referidas contribuições, em cerca de 40*000^000 réis
annuaes, quantia que francamente não é para ser des-
prezada. E pugnando se para que o quadro do pessoal
da fazenda do districto seja a todo o transe completado,
para que da repartição respectiva se possa aftoutamente
exigir o integral cumprimento de todos os serviços que
lhe são inherentes, e nada surja a servir de escusa a
irregularidades commettidas, evitar-se-ha seguramente
de futuro a repetição de facto tão anomolo.
125
Considerando agora a receita dimanada do rendimento
dos prazos da Coroa administrados directamente pelo
Estado, direi, em primeiro logar, que as circumscripções
territoríaes sujeitas ainda a esse regimen limitam se ao
prazo Mucuba-Muno (encravado entre o Lycungo, Bo-
rôr e Lugella), e á Maganja da Costa, separada das
regiões arrendadas pelo curso do rio Lycungo. E' n'estas
duas regiões, cujos povos foram recentemente reduzi-
dos á çbediencia, que impera em absoluto a acção do
Governo, notando- se uma situação lisongeira na sua
administração.
Somente no anno de 1899 é que se começou a pro-
duzir alguma receita proveniente da cobrança do mus-
soco nas referidas terras, na importância de 4:1 14#>3 3o
réis, quantia ainda pequena, é verdade, mas deve-se
attender a que foi a primeira vez que taes povos pa-
garam o imposto de capitação. No anno seguinte, de
iooo, definiu-se algum incremento nas receitas, que se
elevaram a um total de réis 8:433#>75i, um pouco mais
do dobro do anno anterior, em consequência do con-
tacto obrigado do indígena com as auctoridades do Go-
verno e que deu em resultado o incutir-se n'aquelle
a confiança na nossa intervenção e d'ahi o pagamento
voluntário do imposto. No anno findo de 1901 a im-
portância total de 12:670^420 réis, obtida só da co-
orança do mussôco, representando mais de três vezes a
totalidade cobrada em 1899, dá indicios de um grande
ascendente obtido, graças a uma administração pacifica
por mim ordenada, e para esse resultado animador
decerto que contribuiu a minha visita effectuada em
fins de 1900 a toda a região, que foi percorrida, paten-
teando assim aos povos a vontade em que o Governo
está de conservar a pacificação effectuada, a todo o
transe.
Se accrescentarmos ainda á importância citada o pro-
ducto da agricultura, pela primeira vez reálisada por
conta do Governo, no anno de 1901, temos um au-
gmento de 3:ooo#ooo de réis aos 12:670^420 réis re-
presentantes de mussôco cobrado, ou seja o sommatorio
de 15:670^420 réis, indicando quasi o dobro do rendi-
120
mento do anno de 1900; resultado este que sendo
ainda áquem da espectativç dá comtudo esperanças
animadoras de augmento progressivo nos annos subse-
quentes, quando haja uma boa administração local.
Sendo certo que da essência de uma administração
circumspecta dependerá unicamente a abundância das
fontes de receita, tive occasião de propor á consideração
superior, em fevereiro do anno findo de 1901, dois pro-
cessos para se auferirem em beneficio do Estado maiores
lucros das terras de que se trata : ou a exploração ge-
ral da região em grande escala sob a immediata direcção
do Governo, ou o seu arrendamento a particulares sob
o regimen dos prazos. Não logrei obter resposta alguma
sobre tal assumpto.
No caso de haver carência de capital para uma ex-
ploração intensa de toda a enorme área do território,
necessário se tornará dividil-o em zonas administrati
vas ou prazos, para que a acção exploradora encontre
sempre meios coadunáveis aos seus recursos próprios,
visto que está provado ser o verdadeiro processo para
boa e profícua administração, quando os capitães não
abundam, a compatibilidade ou relatividade d'estes para
com a extensão territorial a explorar. Foi esse o alto e
salutar fim a que mirou o legislador quando installou
o regimen dos prazos na Zambezia : conseguindo que
o commercio se generalisasse e não monopolisásse ;
que o indígena iniciado e identificado com o modo de
ser administrativo e tratamento do patrão, conhecendo-
lhe o coração (segundo o vocabulário cafreal), se dis-
posesse sempre de motu- próprio ao trabalho, cheio de
confiança na justiça e equidade do mesmo; e final*
mente que a agricultura generalisada, desideratum de
todos aquelles que teem a faculdade de ter terrenos
propícios e braços em abundância para os arrotear,
fosse eflectuada sob a direcção do próprio arrendatário,
que por seu único interesse teria o máximo desejo em
desenvolvel-a.
Consideremos o primeiro processo em que o Governo
tem a sua acção directa na exploração das terras e sua
administração interna. Seria este para a Fazenda Na-
127
cional o mais proveitoso; mas para esse fim tornava-se
necessário que os poderes públicos sanccionassem, sem
escrúpulos nem desconfiança, o emprego de capitães
para desbravamento das terras e prosecução n'uma agri-
cultura variada e em grande escala, a que se prestaria
o território pelas suas excepcionaes condições, favorá-
veis para o desenvolvimento de todas as culturas tro~
picaes. Transformar-se-hiam aquellas terras n'um ma-
nancial sempre crescente para occorrer ás necessidades
alimentícias de outras regiões menos bem favorecidas*
e conseguir- se-hia uma colonisação séria nos seus povos
quasi virgens de contacto europeu e por conseginte em
condições de mais fácil assimilação no novo meio que
lhes é creado. Para a realisação d'este fim dividiria a
extensão territorial Maganja Lomué em três zonas de
exploração independentes, dotadas para esse fim de
meios de vida próprios, administradas respectivamente
por officiaes de reconhecida proficiência n'este genen>
de trabalhos, aos quaes se daria um vencimento fixo r
que com uma boa percentagem nos lucros geraes pre-
miasse o seu dedicado concurso ao progresso da região-
económico e politico.
E' facto que as colónias militares agrícolas pouco ou
nenhum resultado teem dado n'esta província, talvez,
por defeito de organisação. Sendo a região da Zambe-
zia em tudo differente de todas aquellas em que as re-
feridas colónias militares teem sido estabelecidas, não
sou todavia advogado da sua adopção no districto.
Opino pela administração do Governo como simples
particular sob o regimen dos prazos da Coroa, cujo
regulamento em todos os seus artigos seria cumprido v
os lucros a auferir seriam enormes na sua generalidade * r
garantir-se-hia o accrescimo da população laboriosa, fo-
mentando-se a inclinação para todos os ramos de tra-
balho, que se. desenvolveriam, e finalmente obter-se-hia
facilidade na cobrança de imposto de capitação.
Considerando o segundo caso, que é o arrendamento
dos prazos em que se dividir a região, mantenho ainda
a opinião, já por mim emittida superiormente quando-
tive de informar uma petição das companhias existen-
128
tes na Zambezia para ser posto em praça o arrenda-
mento de toda a região.
N'esse sentido manifestei a grande conveniência para
a exploração territorial, de serem excluídas do concurso
para o citado arrendamento as ditas companhias afri-
canas, pela única razão, que se deve affigurar plausível,
de já possuírem ellas enorme território concedido que
ainda jaz inexplorado por falta de capitães.
Em conformidade com o que acabo de expor deve-se
permittir somente a affluencia de gente nova, que, em-
pregando por necessidade todas as suas attenções e re-
cursos pecuniários na exploração da região especial,
tornai a-hão em breve mais productiva e valorisada.
Finalmente julgo de toda a conveniência administra-
tiva que a occupação effectiva do território deve ante-
ceder todo e qualquer acto de arrendamento a particu-
lares. As razões foram expendidas anteriormente, ba-
seadas nas circumstancias excepcionaes da situação
politica da região, onde impera uma rebeldia bem pa-
tente, que necessita ser aniquilada previamente, para
<jue a acção exploradora possa proseguir sem receio
de ficar exhausta de embaraços.
Vou tratar agora da receita proveniente da taxa de
licenças para o estabelecimento de casas commerciaes
nas cfeiras dos prazos». Passando em revista as verbas
d'este titulo, nos quatro últimos annos, observa-se que
só em 1900 e 1901 se declarou um pequeno accrescimo
n'uma receita, que por sua natureza deveria ser das
mais importantes n'este districto, essencialmente sujeito
ao regimen dos prazos ; e comtudo esse assomo de pros-
peridade na referida receita é devida unicamente aos
prazos administrados pelo Governo, para onde se de-
finiu alguma affluencia, que se espera vá crescendo con-
soante as facilidades que se facultarem.
As causas que concorreram para que decaísse o
negocio nas «feiras dos prazos da Coroa», em geral
prescripto pelo artigo 8.° do decreto de 1890 e regulado
pelos artigos 46. e 5i.° do, regulamento de 1092, e
1*9
ainda mais explicitamente pelo regulamento das feiras
formulado pelo commissano régio da provinda em 7
de outubro de 1892, são diversas, e entre ellas avulta
o nimio desejo do monopólio, que o arrendatário tem
procurado alcançar creando dificuldades aos negocian-
tes nas suas operações de permutação com os indíge-
nas.
As disposições da portaria provincial n.° 189 (Boi.
Of. n.° i5 de i5 de abril de 1899) vieram dar o golpe
de morte na affluencia dos feirantes aos diversos pra-
zos, o que redundou em beneficio do arrendatário, que
tem por seu lado a lei que lhe faculta a liberdade do
commercio em toda 3 área do prazo respectivo (artigo
5o.° do reg. de 1892), cuja cobrança de mussôco traz
de arrendamento. Para elucidação vejamos como se
passam as cousas.
O artigo 3.° e seus paragraphos do regulamento das
feiras, permittindo arrendamentos ou aforamentos de
terrenos nos locaes dos prazos onde ellas foram esta-
belecidas, desde uma área mínima de 25 ou 5o metros
quadrados a 2000 metros quadrados, facilitava pelo
preço insignificante da renda ou do foro ahi designado
a concorrência dos negociantes, a ponto de se apresen-
tarem florescentes algumas feiras antes da execução da
citada portaria, como, por exemplo, a do Missongue,
na margem esquerda do Zambeze, que chegou a pos-
suir grande numero de installações commerciaes.
A referida portaria provincial não só augmentou o
preço do foro annual por metro quadrado, como tam-
bém, o que foi peior, impoz a área de 2:000 metros
quadrados como única concessão, prohibindo simulta-
neamente a faculdade de arrendamento dos terrenos.
Consequência de tal medida : o negociante de pou-
cos haveres, que era o principal concorrente ás fei-
ras, tem a desembolsar pelo exercício de um anno
20o#ooo réis de foro, i4#5oo réis de medição de ter-
reno, 6o#>ooo réis de taxa da licença e 3o#ooo réis de
contribuição industrial, o que, prefazendo um total de
3o4#>5oo réis, é francamente exaggerado, a ponto de
ter determinado o immediato abandono por completo
130
das feiras em todos os prazos, com manifesto e justo-
gáudio dos arrendatários, por terem assim conseguido
um auxilio da parte do Governo aos seus projectos de
monopólio do commerçio, que exercem por todos os
processos com prejuízo dos reditos da Fazenda Nacio-
nal.
Ponderadas estas considerações, garantidas pela ver-
dade dos factos, surge a impor-se á attenção dos po-
deres públicos um dilemma : ou a resurreição das
feiras sob melhores auspícios, ou a legatisação do mo-
nopólio commercial exercido pelo arrendatário no seu
prazo.
O primeiro caso traria a enormíssima vantagem d*
concorrência de diversos indivíduos ao mesmo ramo de
exploração. Por conseguinte, da rivalidade que natural-
mente se despertaria entre elles se colheria necessaria-
mente grande beneficio para as populações indígenas,,
únicas concorrentes a taes mercados; d'ahi uma attrac-
ção seguida de apego á terra por mais um bem estar
que se lhes proporcionaria, com uma permutação mais
leal dos seus productos agrícolas e industriaes contra
artigos que lhe são de primeira necessidade. Com aquella
affluencia de commerciantes, facilitada o mais possível
pelo Governo, este grangearia rasoavel rendimento, alem
do beneficio material que resultaria da constituição de
mais propriedades nos prazos.
O segundo caso é necessariamente de incalculável
vantagem lucrativa somente para o arrendatário, tanto-
mais quanto a retribuição correspondente ao Eststdo r
seja, como é de facto, nulla; e julgo que só como con-
cessão especial do Governo, devidamente recompen-
sada, deve ser permittido tal monopólio, mas com res-
tricções tendentes a evitar a coacção sobre as popula-
ções indígenas ao mercantilismo local.
Dizendo isto advogo a existência das Feiras e pugno»
por gue se consiga a todo o transe um retrocesso em
condições mais benéficas para a administração publica^
n'essa conformidade tive occasião de propor em outu-
bro de 1901 o seguinte ao Governo Geral da Provín-
cia:
i3i
i.° Considerar nulla a portaria n.° 189, publicada no
Boletim official da Província n.° i5 do anno de 1899.
2. Ficar em vigor o disposto do artigo 3.°, suas alí-
neas; e paragraphos do Regulamento das Feiras, de 7
de outubro de 1892, com as alterações seguintes:
a) Para os arrendamentos o preço seja de 200 réis o
metro quadrado nas feiras de i. a classe, 100 réis nas
de 2. a e 60 réis nas de 3. a
b) Para os aforamentos o preço seja de 60 réis por
metro quadrado nas feiras de qualquer classe.
c) Que não sejam aforados terrenos de menos de 200
metros quadrados nos locaes das feiras.
Julgo ter caracterisado devidamente o processo a se-
guir-se para combater o monopólio commercial existente
nos prazos pela força das circunstancias ; e as altera-
ções propostas, juntamente com a faculdade commi-
nada pelo artigo 18. do regulamento de 7 de outubro
de 1902, de se estabelecerem feiras periódicas, tornan-
do-se a dita faculdade extensiva a todos os prazos, sem
distincção, onde a auctoridade administrativa entenda
dever estabelecer annualmente, a despeito de já ahi exis-
tir uma permanente constituída, tudo tenderá a decidir
uma affluencia dos feirantes aos diversos prazos e im-
plicitamente o augmento das receitas para o Estado.
Considerando agora o rendimento dos telegraphos
do districto ha a notar no anno de 1901 um total de
24:507^997 réis, que apenas serve de compensação par-
cial a uma despeza de 57:687^000 réis, inevitável para
a manutenção da rede telegraphica, e observando a ta-
beliã do anno anterior encontrasse um rendimento su-
perior. As causas da diminuição no anno de 1901, para
menos, de réis 6:140^498, são diversas, e entre ellas
avulta a economia, por parte das companhias e arrenda-
tários, havida no anno findo, em "consequência da crise
pecuniária que os assaltou, obrigando-os a restringir as
despezas.
132
Comtudo, comparado o rendimento da rede telegra-
phica d'este distncto, que tem uma extensão de linhas
avaliada em i:566 kilometros, com o da rede da pro-
víncia de Angola, que mede uma extensão de 1:610.
kilometros, isto é, apenas 5o kilometros a mais, diffe-
rença realmente pequena para uma extensão territorial
como é a d'esta província, muitíssimo superior á da
Zambezia, observa-se com pasmo que a estatística do
anno de 1900, para Angola, accusa um rendimento to-
tal de 10:181^964 réis, quando na Zambezia, no mesmo
anno, apresenta-se um rendimento total de 30:648^495
réis, isto é, mais réis 20:466^531 ; este facto só por si
revela-se significativo da importância real do serviço te-
legraphico d'este districto, superior ao de uma prospera
província como é Angola.
É de crer que com os melhoramentos, que indicarei
no capitulo respectivo, indispensáveis para serem intro-
duzidos na construcção importantíssima das linhas te-
legraphicas, e, com uma regular organisação no seu
pessoal, as receitas geraes tendam a augmentar propor-
cionalmente também ao desenvolvimento do território
que se está operando pelos elementos diversos de ex-
ploração; e então o serviço telegraphico internacional,
que apresenta já algum incremento no anno de 1901,
progredirá infallivelmente em consequência das relações
commerciaes que já existem entre os elementos da Zam-
bezia e da Europa.
O arsenal de Quelimane também é um dos elemen-
tos de receita districtal, que embora não apresente um
Hquido apreciável, demonstra não constituir um en-
cargo.
No anno de 1901 accusa-se uma entrada nos cofres
de réis 14:660^317, proveniente de diversos fabricos e
obras effectuadas no mesmo estabelecimento para o
Estado e particulares, e a sua despeza, orçando por
13:457^200 réis annuaes, mostra um resultado em be-
neficio do thesouro de 1:203^117 réis.
Na verdade o rendimento liquido não apresenta uma
i33
grande importância, comtudo revela, com as circums-
tancias actuaes, um estado de prosperidade financeiro
relativo, além do valor moral da sua existência, que é
recommendavel á attenção dos poderes públicos pelos
benefícios da educação dos colonos que d'ella tem re-
sultado.
Ha ainda uma fonte de receita que não foi conside-
rada e que reservei para ultimo logar; refiro-me ao im-
posto sobre a producção do álcool, decretado no anno
de 1900, cuja applicação no anno de 1901 rendeu ape-
nas pouco mais de três contos de réis. Diversas causas
concorreram para que n'um paiz como a Zambezia, em
que a aguardente tem um consumo importante, e por
conseguinte a producção alcoólica deve corresponder á
procura, as receitas auferidas para o Estado fossem
tão diminutas; entre ellas avulta a dificuldade insup-
peravel, com os elementos actuaes no funccionalismo,
em se exercer uma fiscalisação efficaz na producção,
que permitta obstar-se á venda clandestina a coberto
da interferência das auctoridades.
Foi em obediência á ordem circular do Governo
Provincial de setembro de 1900, publicada no Boletim
Official n.° 38 do mesmo mez, e ao mesmo tempo
para pôr cobro aos abusos com que os productores
contavam illudir o Governo para uma esquivança ao
pagamento do imposto, que em novembro de 1900
formulei para a fiscalisação um regulamento que fiz
apresentar á consideração do Governo Geral. Por esse
trabalho, elaborado despretenciosamente com o fim
único de prestar algum serviço útil, julguei resolver o
duplo problema de cobrança e fiscalisação do álcool
ou aguardente produzidos, com quasi nullo dispêndio
para a Fazenda Nacional, e exigindo se como auxiliar
a construcção de armazéns alfandegários nas circum-
visinhanças de cada distillatoria para maior facilidade
de verificação.
Attendia-se no referido trabalho principalmente á sim-
plicidade na cobrança, com o pagamento adiantado de
uma taxa de laboração mensal correspondente ao im-
posto de producção applicado ás quantidades que se
i3 4
propunham fabricar no mesmo intervallo de tempo, bem
como á maior efficacia do fisco sem grande augmento
de funccionalismo. Reconheceu-se que qualquer outro
processo de fiscalisação arrastaria como necessidade
imperiosa um accrescimo enorme de pessoal, o que se-
ria contraproducente, pois se alcançaria um resultado
por assim dizer illusono com a absorpção em puro dis-
pêndio das receitas, que devem ser aproveitadas para
as legitimas e provadas urgências de Estado.
Para melhor elucidação exporei ainda que as circums-
tancias concorrentes n'este districto, relativas ao seu
desenvolvimento, de maneira alguma se assemelham ás
de qualquer outro dos que constituem a província de
Moçambique, em que os estabelecimentos fabris exis-
tentes não excedem o âmbito das capitães respectivas,
sendo por esse facto nullas as difficuldades a vencer
ahi para uma inspecção rápida em beneficio da fiscali-
sação geral. N'este districto porém, incomparavelmente
mais adeantado que qualquer outro, mercê do seu re-
gimen administrativo peculiar, em acção effectiva, de
que tem resultado maior internação nos elementos ci-
vilisadores e de progresso, attingindo já situações bas-
tante distantes da sede do Governo, dá-se o contrario.
Por conseguinte a fiscalisação na Zambezia dos ne-
gócios da fazenda e alfandega (n'elles se ingloba a co-
brança do imposto alcoólico), segundo os dictames da
lei vigente, a cargo exclusivo das duas repartições re-
feridas, dotadas de um pessoal exiguo já de si na sua
normalidade effectiva, e reduzido desde algum tempo
pela ausência de empregados sem devida substituição,
ficou aggravada pelo accrescimo do fisco do álcool, isto
é, houve grande augmento de trabalho, sem o mesmo
sueceder aos elementos executivos com o necessário
para sua profícua realisação. E' pois evidente que no
enunciado estado das referidas repartições só se podia
e devia limitar o seu serviço próprio ás proximidades
das villas, onde já existe muito trabalho de fiscalisação
das diversas receitas do Estado, a que o funccionalis-
mo por vezes não dá vencimento.
Entretanto sabia-se extra-ofticialmente da existência
i35
de grossas partidas de álcool nas fabricas distantes, e
cujos proprietários, pela grande importância a pagar de
vez pela applicação do imposto de producção respecti-
vo, necessariamente tentariam subtrahir d'elle grande
parte á tributação, pelo processo dos descaminhos (im-
possíveis de evitar), já na forma do consumo local, já
nas sahidas para fora do distrícto pela profusão de por-
tos accessiveis a navios.
Mais outras razões se poderiam adduzir, mas julgo
essas bastante importantes para explicar devidamente a
essência de um projecto de fiscalisação que se me af-
igurou ser de molde a definir-se uma praticabilidade
de execução na Zambezia.
Posto isto, vou expor, o mais succintamente possível,
como, a despeito das minhas boas e leaes intenções,
teve execução a cobrança de imposto sobre o álcool.
Desejo frizar bem o meu modo de proceder, que,
por motivos particulares que me são conhecidos, julgo
como natural chegasse deturpado ao conhecimento dios
altos poderes, e até desse assumpto a um jornal da
metrópole, bem conceituado, para algumas considera-
ções menos bem cabidas a meu respeito, por ter tido
o arrojo de fa^er um regulamento provisório para a
Jiscalisação do imposto sobre o álcool.
Ora, como já tive occasião de precisar, a existência
de grandes quantidades de álcool armazenado nos pra-
zos das companhias de Borôr, Zambezia e Assucar de
Mopêa, em localidades bastante distantes das sedes das
villas e commandos militares da Zambezia, era um facto
verdadeiro; por outro lado a deficiência de funcciona-
lismo official para se poderem cumprir as ordens da
cobrança do imposto, dimanadas do Governo Geral
desde agosto de 1900, era também outra verdade.
N'esta conjunctura estudei um processo de fiscalisa-
ção e cobrança, e apresentei-o á consideração superior.
Entretanto, desejando dar cumprimento á ordem supe-
rior de pôr em execução provisória as medidas que
entendesse convenientes, a fim de levar a effeito a co-
brança do imposto, applicado não só ao álcool futuro
como ao já existente em deposito, e com o intuito de
i36
supprir a falta de instrucções (aliás pedidas com ins-
tancia), resolvi pôr em execução algumas medidas do
projectado regulamento, que se me afiguraram de ne-
cessidade imperiosa para a fiscalisação da producção
que ia ter logar immediatamente.
Attendendo pois á falta de pessoal para verifica-
ção do álcool existente nas fabricas das companhias
Borôr, Zambezia e Assucar, alem de outros depósitos
em 'diversos prazos arrendados, cuja quantidade e grau
precisava ser conhecida para inicio de fiscalisação, re-
solvi accorrer a um processo, que sem violentar o pro-
prietário, obrigando-o á fraude, tivesse por fim único a
manifestação com verdade, partindo directamente d'elle,
de todo o álcool existente nos seus armazéns e fabricas
distantes. Tal fim foi conseguido por completo apenas
com a minha promessa verbal de que o liquido produ-
zido antes de 7 de julho (que era em grande quantidade)
iria pagando imposto á medida que sahisse da fabrica
por exportação, ou por venda por grosso para o con-
sumo local, resultado aquelle que decerto não teria
obtido com os elementos de fiscalisação existentes^
nem com mais certeza, mesmo que podesse dispor de
pessoal devidamente remunerado.
Entretanto foi sahindo por exportação e por venda
local bastante quantidade de álcool, que produziu uma
receita de réis 3:3io#i45, entrada nos cofres da fazenda
á medida qne o liquido ia tendo consumo, sem ter pe-
sado assim no bolso do proprietário o pagamento do
imposto de producção respectivo.
A satisfação do imposto relativo ao álcool que tivesse
sido produzido antes de 7 de julho, ainda em deposito
nas fabricas, garantido por um termo de responsabili-
dade que seria lavrado na repartição respectiva, é a
essência da concessão que foi por mim effectuada em
7 de janeiro de 1901. Tive em attenção apenas a grande
importância pecuniária que teriam os proprietários do
álcool a desembolsar de prompto, para o que afirma-
ram não estarem habilitados, preferindo fazerem entrega
á alfandega dos milhares de litros de álcool que pos-
suíam sem destino de momento.
i3 7
Sem ter havido tempo de pôr em execução a delibe-
ração anterior, tomada para bem do serviço publico e
bem acceite pelos proprietários do álcool, foi recebida
no mesmo mez de janeiro a ordem peremptória, dima-
nada do Governo Geral, para proceder á arrecadação
immediata de todo o imposto sobre o álcool existente
na Zambezia, e para cujo cumprimento tive de previa-
mente annullar a minha concessão recente, certamente
de effeitos mais favoráveis para o thesouro, como se
verá.
Expirado o prazo de intimação, foram instaurados
pelo funccionano competente cinco processos de exe-
cução fiscal aos seguintes proprietários do álcool.
Companhia da Zambezia, em Quelimane, pela divida
de réis 3:198^390, representando o valor do imposto
applicadoa 19: 355 litros de álcool que tinha manifesta-
dos ; companhia do Borôr, em Quelimane, pela divida
de réis 5:289^000, imposto sobre 2i:5oo litros de ál-
cool manifestados ; companhia do Assucar em Mopêa,
pela divida de réis 18:196^500, imposto de producção
sobre 73:834 litros de álcool que tinha nos seus arma-
zéns.
Alem de outros instaurados a alguns vendedores es-
tabelecidos, por possuirem em deposito nas suas lojas
porções de álcool.
De todos estes processos consta a liquidação feita
pela repartição de fazenda districtal, sobre o total de
u6:65i litros de álcool encontrados com graduações
diversas e cuja importância do imposto de producção é
de réis 27:697^480.
Os citados indivíduos e companhias apresentaram no
praso legal os embargos contra o imposto que lhes era
exigido, oaseando-se em que o álcool era de producção
anterior a 7 de julho de 1900, data do decreto, e por
esse facto não se admittia efteito retroactivo da citada
lei, a despeito do disposto pela portaria provincial n.°447
de 10 de agosto do mesmo anno, que interpretava o de-
creto referido, tornando extensiva a applicação do im-
posto ao referido álcool.
N'esta conjunctura os mencionados processos de ar-
i3S
recadação do imposto foram interrompidos, nos termos
do Regulamento de 4 de janeiro de 1870, artigo 47. ,
obrigando- se comtudo os proprietários do álcool, nos
termos do artigo 667. da Novíssima Reforma Judicia-
ria, a depositarem no cofre da recebedoria d'este con-
celho as importâncias já citadas, e que muito legal-
mente lhes tinham sido exigidas.
Os processos e embargos submettidos immediata-
mente ao delegado do Procurador da Coroa e Fazenda
Íara os fins convenientes, subiram posteriormente ao
uizo, sendo por sentença d'este considerada a Fazenda
Nacional como não tendo direito a arrecadar o imposto
de producção sobre o álcool encontrado.
É' pois evidente que o processo de cobrança que eu
quiz adoptar sem precipitações, paulatinamente, á me-
dida que o liquido ia tendo Consumo, não teria decerto
conduzido ao desfecho judiciário claramente contrario
aos interesses do Estado.
Como facilmente se conclue, só em janeiro do anno
findo de 1901, baseando-me na clareza do texto da cir-
cular de 20 de setembro do Governo Geral, é que me
decidi, pelo inicio da laboração que ia ter logar nas di-
versas destillatorias do districto, a exercer, com o fim
de assegurar os reditos do Estado, uma fiscalisação na
producção, sem a qual certamente aquelles seriam il-
ludidos. N'essa conformidade quiz exigir o pagamento
da taxa mensal segundo o regulamento provisório sub-
mettido á approvação superior, cuja execução foi taci-
tamente consentida, o que mais tarde me foi confir-
mado verbalmente pela auctoridade superior da provín-
cia. Produziu tal exigência, como era de prever, celeu-
ma nos productores pelo único facto de ficarem assim
impossibilitados de se subtraírem a uma fiscalisação
rigorosa, e por conseguinte de se isentar do imposto
toda a aguardente que vendessem clandestinamente no
prazo ao indígena, o que representa uma quantidade
importante de liquido consumido. Resultaria d'ahi um
atropello immediato á essência do acto geral da con-
ferencia de Bruxellas, que teve por objectivo a restric-
çío ao consumo do álcool pelo indígena africano, e á
\3$
sua importação nas regiões visadas, como fins para a
diminuição de elementos conducentes a alimentar o vi-
cio da embriaguez.
E' natural que se me attribuam veleidades de ter que-
rido prejudicar os interesses dosproductores do álcool,
aggravando a sua situação, já de si critica pelo imposto
decretado a , mas essa accusação cahe pela base se se at-
tender no que tive occasião de expor superiormente em
agosto de 1900, isto é, logo em seguida ao conhecimento
da lei de 7 de julho, frizando claramente tque alguma
protecção se devia aos agricultores industriaes da canna
saccharína, quando esta fosse cultivada na região, e isso
para incentivo ao desbravamento das terras; de ma-
neira que se deveria favorecer unicamente a exportação
do álcool produzido pela canna saccharina, cultivada e
extrahida do próprio solo.t
Mas ha ainda um aspecto que também entendi de-
veria ter sido considerado ao decretar-se o imposto al-
coólico, na sua applicação á Zambezia, onde existiam
já fabricas de assucar e de distillação em plena activi-
dade.
Refiro me ao facto de não se ter preparado um pe-
ríodo de transição áquelles que tinham em execução, ou
em projecto bem determinado, o fabrico do assucar,
e para guem a distillação servia de grande auxiliar n'essa
industria por proporcionar um prévio estudo das me-
lhores qualidades de canna saccharina adequáveis á di-
versidade de terrenos do território e garantidoras de
maior percentagem do referido artigo.
Tive em mira, com todo o meu procedimento n'esta
questão, única e simplesmente cumprir pela forma mais
leal e franca as ordens superiores de fiscalisação e co-
brança do imposto; e se alguma pressão houve, essa
está já devidamente explicada na sua origem e conse-
quências, de maneira a illibar-me de qualquer respon-
sabilidade moral.
Finalmente ainda considerarei as receitas provenien-
tes das licenças para corte de madeiras, a qual, apre-
140
sentando um total de réis 920^160 em referencia ao
anno de 1901, mostra ser diminuta. A razão é obvia:
a Zambezia não é um paiz florestal por excellencia que
permitta uma exploração em grande escala das diversas
qualidades de madeiras, pois o arvoredo existente não
apresenta uma densidade que esteja em relação propor-
cional com a grandeza do território. Por esse factu, e
com o fim de difficultar a devastação que se estava ope-
rando no arvoredo, se promuigou em 26 de setembro
de 1887 um regulamento com uma tabeliã annexa de
S>reços a pagar ao Estado por cada viga ou vigota que
ôr cortada com previa licença. Acontece porém que a
devastação continua, principalmente nas regiões do Zam-
beze, onde as exigências na navegação reclamam com-
bustível para os diversos vapores que navegam pelo rio.
Era pois de toda a conveniência pôr-se peias a uma di-
zimação que, sem escrúpulos nem consideração pela se-
gurança das margens fluviaes, era feita no arvoredo que
se apresentava mais á mão para a acção destruidora.
Com esse intuito fiz aftixar um edital regulando a for-
ma e processo a seguir para a exploração da lenha co-
mo combustível, e assim conseguiu-se introduzir a re-
gularidade onde não a havia e obstar em grande parte
á corrosão das margens dos rios, a qual, sem a consis-
tência que lhe dava o arvoredo, era fatal.
Faltou-me na minha quadra administrativa propor uma
alteração na tabeliã de licenças para corte de madeiras
para construcção, porque isso merecia um estudo espe-
cial para o qual necessitaria tempo que me escasseou.
Essa lacuna contava remediala em pouco tempo, apre-
sentando á approvação superior a referida alteração e
a de alguns artigos do regulamento respectivo que se
me affiguraram de maior proficuidade geral.
Conclui assim o estudo analytico da situação finan-
ceira do districto consoante as circumstancias que se
offerecem á consideração actual; vou proseguir relem-
brando ainda uma proposta effectuada por minha ini-
ciativa á auctoridade superior da província, com o fim
1
Hi
de produzir novas receitas tendentes a augmentar os
recursos do districto.
Refere-se ella á tributação da bebida fermentada es-
pecial dá região, denominada sura. Para a basear ex-
puz que a industria do álcool, ultimamente onerada com
o imposto de producção* collocára os fabricantes exis-
tentes n'este districto na dura contingência de fecharem
as respectivas fabricas, se algum proteccionismo se lhes
não dispensasse, de maneira a facilitar o consumo local,
sujeito á rivalidade de preferencia dada pelo indígena
ás bebidas fermentadas de sura, sumo de caju, pombe,
etc, que mais lhes agrada ao paladar, e que pela ba-
rateza relativa em que ficarão pelos diminutos tributos
a que estão sujeitas, determinará a sua exclusiva ex-
tracção.
* A preferencia indigena é assignalada em máximo grau
á sura e ao sumo ou vinho de caju, pelo seu trago mais
adocicado, accumulativo ao effeito enebriante; estas duas
qualidades, associadas ao seu pequeno custo, incitam
ao consumo enorme de taes productos.
E' do conhecimento geral, que no preto é innato o vicio
de beber, e como regra a ingerição da bebida alcoólica vai
até á embriaguez. Não ha leis, por mais pezados encar-
gos que promulguem, por mais tributarias que sejam para
a bebida alcoólica, que consigam aniquilar o vicio, por
ser uma tendência do próprio organismo, que necessita
constantemente desse estimulante. Na impossibilidade
pois de regeneração, por ser um mytho, cumpre operar
por outro systema inquestionavelmente de melhores con-
sequências : augmente-se-lhes as necessidades encare-
cendo aquillo que mais consomem com caracter nocivo,
ca bebidai. A conclusão lógica, que também é pratica,
de tal medida, será indubitavelmente o accrescimo de
trabalho productor pelo incitamento á obtenção de fun-
dos que o habilitem á satisfação do prazer cafreal ; nada
se perde e alguma cousa se cria. Como deducção imme-
diata d'esta necessidade, manifesta-se um processo sim-
ples de onerar a bebida, indirectamente, tributando as
arvores d'ella productoras, que são o coqueiro quando
for lavrado a sura e o cajueiro.
142
Dir-se-ha talvez que este tributo arrastará consequên-
cias funestas para a agricultura das referidas arvores; é
um erro crasso, o que passo a comprovar, referindo-me
apenas ao coqueiro, porque quanto á outra o seu fru-
cto nem a qualidade alimentícia em si encerra para me-
recer algum proteccionismo.
A palmeiracoqueiro é uma arvore tão privilegiada
pela natureza aue encerra em si elementos superabun-
dantes para a laboração de varias industrias, a saber:
óleos, sabão, cordoaria, tecelagem, etc, alem da appli-
cação culinária do seu frueto bastante apreciado, princi-
palmente nos climas intertropicaes.
Com tão abundantes predicados, tanto mais desen-
volvidos quanto mais se evitar o seu enfraquecimento,
notável como consequência do exercício da lavra a su- -
ra, é da máxima conveniência para o agricultor e indus-
trial que se favoreça a longevidade da arvore, o que
se realisa immediata e simplesmente com o impedimen-
to á referida lavra, perniciosa por todos os effeitos.
Obter-se ha este desi der atum, concumitante ao favori-
tismo que se deve conceder á venda do álcool ou aguar-
dente de producção local, tributando as arvores produ-
ctoras das bebidas fermentadas; tal medida será um in-
centivo ao progresso da agricultura e industrias, embora
se não consiga com ella grande abstenção á lavra das
bebidas fermentadas; mas aiguma cousa se conseguirá
em prol, alem do augmento de receitas que o novo tri-
buto produzirá de uma maneira permanente.
As taxas deverão ser de 400 reis para cada coqueiro ;
e como os cajuaes em todo o districto existem, ou em
promiscuidade com os coqueiros, ou constituem em cer-
tas regiões afastadas da costa marítima (onde o coqueiro
não tem grande desenvolvimento) por vezes matto denso
cerrado e emmaranhado, ou accumulando-se em zonas
de uma forma regular, propondo a quantia de 32o réis
como tributação ao cajueiro destinado a produzir a be-
bida fermentada tenho por fim o favoritismo á venda
da sura depois de taxado o coqueiro lavrado.
Ha todas as probabilidades para se suppor que o tri-
buto do cajueiro determinará a distillação do seu fru-
»*>
cto, até hoje quasi desaproveitado no districto para o
fabrico de aguardente, com que se ganhará mais pela
applicação do imposto de producção.
Como não é de verdadeira justiça que o cajueiro apro-
veitado para o fabrico de aguardente por distillação do
seu fructo seja sobrecarregado com a taxa da arvore*
porque isso iria incidir como accrescimo ao imposto de
producção, dificultando por esse facto o seu aprovei-
tamento para a industria como se deseja, e como tam-
bém, se se dispensasse da taxa a arvore destinada a
esse único fim, este facto por si só determinava fatal-
mente uma serie de fraudes, alem das dificuldades que
acarretaria á fiscalisação a separação das arvores com.
destino á distillação do seu fructo ou ao fabrico da be-
bida fermentada, entende se como necessidade impre-
terível da fiscalisação da taxa do cajueiro que todas as
arvores sejam arroladas e egualmente tributadas, em
cada prazo, e que os arrendatários ou proprietários que
3ueiram empregar o sumo do caju de um certo numero
e arvores para a producçío de aguardente por distil-
lação percebam, por encontro com o pagamento do im-
posto de producção respectivo ao liquido fabricado, a
referida taxa já satisfeita. Para esse fim deverão ser
previamente feitas declarações ao governo em que fiquem
claramente descriminados o numero de arvores, sua si-
tuação e propriedade respeitante ás que se destinam á
distillação.
Evita- se assim o accrescimo de um pessoal para a
fiscalisação, a qual não seria efficaz, nem se poderia de
maneira alguma eífectuar attentas as circumstancias ex-
cepcionalissimas de situação e modo de ser da referida
agricultura.
Com respeito á fabricação da sura a sua importância
é enorme, concludente das grandes receitas que auferem
aquelles que se dedicam á sua venda. Para se fazer
bem idéa d'ella basta dizer-se que ha palmares que
rendem 3o#>ooo réis diários só de sura consumida pelos
colonos, e isto apenas com uma licença industrial annual
de 4#>ooo réis.
Descriminemos agora quaes são as vantagens pecu-
<44-
niarias para a fazenda, provenientes da tributação do
coqueiro lavrado. Até hoje tem entrado nos cofres do
districto, como receita annual de licenças industriaes de
venda de bebidas fermentadas, apenas um máximo de
3oo#ooo réis, quantia irrisória como tributo para uma
venda muitíssimo superior. Calcula-se como existente
cm toda a área d'este concelho um numero de palmei-
ras em estado de fructificação n'um minimo de um mi-
lhão ; considere-se d'esta quantidade uma parcella míni-
ma destinada á lavra de sura, sejam 100:000, o que re-
presenta uma percentagem insignificante de 10 °/o, que
necessariamente está muito longe da realidade; applican-
do- se-lhe a tributação proposta de 400 réis a cada uma
tem-se um rendimento seguro de 40:000^000 réis.
Considerando agora que o rendimento de cada pal-
meira lavrada a sura consiste n'um minimo de 2^)700
réis e n'um máximo de 5 #000 réis annuaes, a applica-
cão da referida taxa de maneira alguma sobrecarrega o
proprietário, pois ainda este auferirá um lucro enorme ;
por conseguinte obter-se-ha, sem esforço, uma reparti-
ção de lucros com o Estado. Claro está que necessário
será pára fiscalisação da taxa um arrolamento certo e
consciencioso de arvores; para esse fim um regulamento
especial prescreverá os processos mais efficazes de o
realisar, sahindo as despezas em percentagem pequena
da receita da tributação da arvore.
Consegue-se com este arrolamento conhecer-se os
verdadeiros donos dos innumeros palmares que existem
e cuja propriedade é sempre mais ou menos discutida;
é esta uma medida que até hoje nunca se conseguiu
realisar, apezar de haver no districto uma conservató-
ria do registo.
Na presente conjunctura a «surai, uma das princi-
paes matérias primas da distillação, deixou de ser trans-
formada em aguardente evitando assim o pagamento do
imposto legal, para ser apresentada á venda como be-
bida fermentada que é, e por um preço Ínfimo ao con-
sumidor. Reina pois infrene na turba-multa indígena o
culto ao vicio da embriaguez, pois todo o mundo, por
uma taxa insignificante de licença, expõe á venda tal
*4*
bebida em profusão, desafiando e attrahindo as inclina-
ções da animalidade que residem no indígena africano,
postergando e annullando os effeitos da civilisação.
Era vista do exposto considero como um dever cívico
e humanitário coarctar por todos os meios o exercício
da embriaguez.
Para analisar o assumpto das receitas do districto
direi ainda que foi o intuito de as augmentar que mo-
tivou o meu acto administrativo do exclusivo de nego-
cio nos prazos administrados pelo Governo : Maganja
da Costa e Mucuba. Tal facto não era novo na Zam-
bezia, pois já estava estabelecido o processo no anno
de 1899, com uma compensação pecuniária insignificante
para a Fazenda Nacional de 6oo#ooo réis. annuaes»
Obtive um muito maior beneficio, como adeante se
verá, e não obstante a impossibilidade de pelas taxas
ordinárias de licenças para negocio se obter tal resul-
tado, o referido acto administrativo soffreu a reprovação
absoluta dos altos poderes públicos, sem embargo das
razões ponderosas que expendi para defender o proje-
cto no interesse único de beneficiar os cofres do distri-
cto y cuja administração me fora confiada.
A explicação do procedimento administrativo posto
em pratica está na situação actual de rebeldia dos po-
vos do alto Lomué e do Lomué de Leste, de cujas re-
giões deriva todo o commercio, que o receio faz affastar
dos pontos occupados, sendo necessário ir-se effectuar
as permutações nos confins. E emquanto uma occupa-
ção geral do território não tiver logar, deve ser o exclu-
sivo de negocio o único processo administrativo a se-
guisse para se auferirem maiores receitas, e não ser
ludibriada a fiscalisação.
No primeiro de janeiro de 1901 auiz continuar com
a alteração ao antigo regimen de exclusivo, fazendo ap-
Í)licar as licenças industriaes na conformidade do regu-
amento respectivo. Deu em resultado que a fazenda
colheria apenas a importância de 6oo#>ooo réis, corres-
10
146
pondente a duas lojas, nos mezes de abril e maio, per-
tencentes a dois negociantes asiáticos, únicos que se
apresentaram a sollicital-a, se para evitar o logro não
tivesse determinado que as licenças fossem semestraes,
visto ser só nos referidos mezes que apparecem os gé-
neros e artigos do interior, em consequência do que se
augmentou a receita a i:8oo#>ooo réis.
A grande abundância de negocio que se effectuava nos
dois referidos mezes não representava pelo pagamento
effectuado uma equitativa repartição de lucros com o
Estado, e accrescia alem d'isso que os mesmos logistas r
fiados na impunidade, collocavam clandestinamente e
sem que se podesse ter conhecimento (por falta de oc-
cupação de território), succursaes em pontos do interior
onde não podia por falta de elementos chegar a acção
do Governo. De forma que não me conformei ainda
com o augmento pecuniário obtido e decidi me a voltar
ao antigo regimen de exclusivo em melhores condições
Cara a Fazenda, para experiência só até 3 1 de dezem-
ro de 1901, convidando por circulares todos os nego
ciantes do districto a apresentarem as suas propos-
tas.
Concorreram apenas um negociante asiático e a com-
panhia de Boró v sendo adjudicado ao primeiro por
8:000^000 réis o exclusivo de negocio da Maganja da
Costa desde junho a dezembro de 1901, e ao segundo
por 2:400^)000 réis o do negocio no praso Mucuba r
também no mesmo intervallo de tempo.
Faliam agora os números para confirmar o beneficia
que quiz obter para a Fazenda Nacional e que, infe-
Jizmente para esta, foi monospresado ; para esse fina
vou apresentar as receitas da proveniência, commercio»
nos annos de 1899, I 9°° e I 9° I :
147
18V9
1900
1901
Licenças industriaes
Exclusivo de negocio ....
6oo$ooo
6:400^000
1 :8oo$ooo
10:^00^000
Somma •
6oo$ooo
6:400^000
12:200^000
As licenças industriaes referem- se só á Maganja da
Costa, porque o prazo Mucuba não tinha procura.
Considere-se agora no anno de 1901 só as receitas
que adviriam se se applicasse o regimen das licenças
industriaes no máximo effeito productivo, que era a exi-
gência de pagamento adiantado por semestres, e com-
parando-as com as obtidas no anno de 1900:
1900 6:400^)000
1901 3:6oo#>ooo
A explicação da diminuição no anno de 1901 é evi-
dente e concludente do conhecimento adquirido pelos
commerciantes, por experiência própria no anno de
1900, em que foram engodados por não saberem das
circumstancias commerciaes que concorrem na região
respeitante ás épocas de negocio abundante, que se re-
sumem aos mezes de maio, junho, julho e agosto.
Posto isto compare-se a receita cjue adviria pára o
thesouro no anno de 1901, pela apphcação das licenças
industriaes de junho a dezembro (isto é, réis i:8oo#ooo),
com a proveniente dos exclusivos concedidos para o.
mesmo mtervallo de tempo (isto é, réis 10:400^000),
Depara-se com um accrescimo de receita no valor de
réis 8:6oo#>ooo do ultimo processo sobre o primeiro,
importância que o Governo não quiz ganhar pelo regi-
148
men por mim proposto. E alem da indicada vantagem
pecuniária perdida, quem attentar bem nas clausulas
dos contractos lavrados oficialmente com as firmas com-
merciaes concessionarias,, concluirá forçosamente os
grandes benefícios que o Estado colheria do exercício
de taes concessões, sobremaneira vantajosos, tanto sob
o ponto de vista material e económico, como moral e
politico.
Os contractos representavam para os concessioná-
rios um tão grande encargo que estes exultaram de
gáudio com a sua rescisão intempestiva.
E aqui fica devidamente explicado um acto adminis-
trativo projectado com a intenção mais franca e mais
leal de prestar algum serviço útil.
A reprovação de tal acto foi baseada oficialmente
apenas numa incompetência de attríbuições, que se
prova não ter cabimento ; porque não era aquelle mais
do que uma sequencia em muito melhores condições de
uma administração já em vigor e por conseguinte legi-
timamente firmada.
Feitas todas estas considerações, é evidente ser a
Zambezia o districto que apresenta uma área territo-
rial, que não obstante ser extensa tem uma occupação
effectiva, alcançando a centenas de kilometros do litto-
ral para o interior, a par de uma demonstração de des-
envolvimento pelos progressos materiaes que profusa-
mente existem. Deve pois ter encargos numerosos a
pezarem-lhe para o exercício da administração geral.
Esses encargos são de naturezas diversas, embora ten-
dam ao mesmo fim economico-civilisador, e assim ha a
considerar n'elles a manutenção de um funccionalismo
militar e civil idoneamente adequado á regularidade na
sequencia dos vários ramos de serviço publico, e os
elementos indispensáveis para se conseguir o deslisar
continuo dos progressos materiaes, que são os verda-
deiros monumentos de uma civilisação.
Para se conseguir uma accorrencia compatível com
as necessidades ingentes d'este grande districto, a ta-
149
bella orçamental que começou a ter execução no pri-
meiro de fevereiro de 1901 era exígua em certos capí-
tulos e artigos e em outros apresentava um supérfluo
de verba de despeza, notando-se comtudo que o excesso
d'estas ultimas não chegava para a satisfação por com-
pleto de todas as lacunas. N'esta conformidade tive
occasião de propor á approvação do Governo Geral,
em março de 1901, uma alteração nas verbas susceptí-
veis de tal, fazendo-se uma distribuição mais equitativa
da verba total orçamentada e propondo um pequeno
accrescimo ao mesmo total para occorrer por completo
ás exigências do serviço publico geral. Não fui atten-
dido.
Não querendo apresentar em detalhe a proposta de
alterações á tabeliã orçamental da Zambezia, dirigida
á primeira auctoridade da província, citarei comtudo
alguns títulos que se destacam com uma exiguidade de
verba não correspondente á importância própria que
advém dos encargos a realisar.
São elles o funccionalismo dos telegraphos, e a do*
tacão para acquisição de material; as dotações das
obras publicas e do arsenal de Quelimane; gratifica-
ções aos commandantes militares; as dietas do hospi-
tal de Quelimane, e outras de menor importância.
Na secção relativa á administração cerai da Zambe-
zia, sendo consideradas as necessidades de cada uma
das repartições publicas, virá implicitamente indicado
o augmento de verba correspondente para uma regular
sequencia nos diversos serviços especiaes.
Todos os capítulos e artigos da tabeliã orçamental
proposta produzem um sommatorio de 316:405^895
réis, e n'elle foi incluído uma verba de réis 6:5oo$ooo
destinada a sustento da Residência da Angonia e á crea-
ção de novos commandos militares nos Picos Namuli e
na região do alto Zambeze; sendo essas as únicas ap-
plicações introduzidas a mais da tabeliã antiga, como
convenientes á administração. O indicado sommatorio
satisfará por completo a todos os encargos do districto
da Zambezia.
Em conclusão: observada a tabeliã annexa onde vêem
i5o
designadas todas as receitas cobráveis no districto, apre-
senta-se um total realisavel de réis 458.829^430, que
demonstra á evidencia ser este o districto da província
de Moçambique que está logo a seguir ao de Lourenço
Marques em valor productivo para a Fazenda Nacional.
E se se attentar bem na minha exposição anterior, res-
peitante á creação de novas receitas que se propõem,
poder- se ha obter em bretfe um augmento de réis
45:ooo#>ooo, que sommado á importância acima, ac-
crescida ainda da receita a obter-se da contribuição
predial quando se introduzir a normalidade na sua co-
brança, offerece-nos um total de 5 1 3:829#>43o réis, que
é indicativo de uma prosperidade verdadeira na civili-
sação económica da Zambezia, representada pela sua
situação financeira.
E para se fazer melhor idéa d'esta basta considerar
<jue os recursos excedem muito os encargos, senão ve-
jamos :
Receita realisavel 458:820^430
Despeza obrigatória 316:40^895
Differença 142:423^535
Dando nos uma importância disponível de 142 142 3$ 5 35
réis todos os annos; e seria de inteira justiça que parte
tivesse applicação a melhoramentos materiaes, de que
muito necessita este rico e promettedor districto.
CAPITULO II
Dividas do districto da Zambezia
No mez de agosto de 1901 fiz chegar ao conheci-
mento das instancias superiores da província de Mo-
çambique, por uma forma descríminativa e bastante
explicita, a importância total das dividas do districto a
diversos fornecedores, a qual montava já á cifra de
cincoenta contos de réis, pouco mais ou menos.
A grande maioria cTaquelle sommatorio dizia respeito
ao anno económico de 1899 1900 (período anterior á
minha administração), e era correspondente, não só ao
fornecimento, eftectuado por alguns particulares e es-
tabelecimentos da metrópole, de materíaes e utensílios
indispensáveis para o arsenal de Quelimane, como
também á accumulação de outras pequenas contas de-
vidas a fornecedores da localidade. A parte restante,
muito minima, na importância de pouco mais de um
conto de réis, dizia respeito a fornecimentos por mim
auctorísados com destino também ao mesmo arsenal, e
constando principalmente de utensílios indispensáveis
ao funccionamento fabril das machinas já existentes no
l52
indicado estabelecimento do Estado, que se achavam
sem movimento efficaz por tal deficiência.
Nada tenho com os fornecimentos anteriores á mi-
nha gerência, que certamente foram auctorisados com
um nm utilitário, comtudo parece ter havido intenção
de avolumar a minha responsabilidade, attribuindo-se-
me, pela Secretaria do Governo Geral de Moçambique,
também a encommenda d'esse material. Apenas con-
siderarei o que se passou durante a minha administra-
ção, em que só auctorisei fornecimentos até uma data
bastante anterior á do conhecimento official da lei de
14 de setembro do mesmo anno, o que só teve logar
no districto da Zambezia em fins de dezembro.
A alçada que até então tinha o governador do dis-
tricto para proceder por seu próprio alvedrio em casos
urgentes, sem necessidade de prévia consulta á aueto-
ridade superior, foi permittida pelo ultimo commis-
sariado régio da provincia de Moçambique, attenden-
do-se á deficiência de communicações rápidas com a
sua sede. Essas attribuições estavam ainda em vigor,
por não revogadas, á data das minhas auetorisações
para os fornecimentos do material indicado, e por tal
clarão necessária explicação ao meu procedimento. A
responsabilidade que assumi foi, como se vê claramen-
te, limitadíssima.
Posto isto direi que se tornou deveras frizante, at-
tenta a antiguidade das dividas, a existência de uma
verdadeira incúria na repartição de fazenda districtal,
incúria que desde a data do primeiro fornecimento não
pago, reina.
Não obstante a quantiosa verba em debito, a habili-
tação dos cofres do districto a satisfazel-a era uma rea-
lidade ; n'essa conformidade, e ainda com o intuito de
suavisar por uma forma de pagamento em prestações
um desembolso tão importante, é que tive ensejo de,
na data já referida, propor á consideração superior um
processo de liquidar os débitos por aquelle systema
dentro do anno económico de 1 901-1902.
i53
O desejo de crear para este distpcto uma situação
liberta de encargos e normalisada ás necessidades or-
dinárias, é que me levou a insistir por diversas vezes
Sra uma solução favorável á causa dos credores do
>verno, que n'um período de oito mezes liquidariam
as suas contas, mas o silencio correspondeu á especta-
tiva de uma decisão qualquer em assumpto tão impor-
tante.
CAPITULO III
Sobras do orçamento de 1900-1901
No mesmo mez de agosto occorreu-me ponderar su-
periormente, que tendo sido liquidadas as despezas dis-
trictaes relativas ao anno económico findo de 1 900-1 901
com um saldo positivo, deduzido da tabeliã orçamen-
tal, e na importância de réis 14:378^380, era de toda
a justiça que a referida verba fosse applicada especial-
mente em melhorar as circumstancias materiaes das
duas villas, Quelimane e Chinde, produzindo-se traba-
lhos de reconhecida e inadiável necessidade.
Assim propunha a despeza de réis 5:ooo#ooo para
a construcção de uma egreja no Chinde, pois era irri-
sório cjue havendo na mesma villa um parocho este se
visse impossibilitado de exercer os officios divinos por
falta de edifício apropriado, e era ridículo aos olhos dos
estrangeiros, na sua maioria inglezes, que possuindo
elles uma egreja protestante nós lhe demonstrássemos
a incúria pelo culto da nossa religião. Propunha mais a
applicação de 5:ooo#ooo réis para se continuarem as
obras de captagem da margem do Chinde, que tinham
sido iniciadas sob os melhores auspícios em setembro
i56
de 1900, pelo engenheiro chefe da secção da Zambezia,
Theodoro de Macedo. Os resultados obtidos eram de
molde a considerar-se possível a segurança da margem,
não obstante a acção corrosiva das correntes fluviaes
incidentes directamente sobre ella. Finalmente que se
applicasse o restante da importância indicada a uma
obra de reconhecida utilidade publica, qual é a conti-
nuação da construcção do muro marginal de Queli-
mane, interrompida ha cerca de anno e meio por falta
de verba,
D' estas três propostas, a única que então mereceu a
consideração superior foi a segunda, que teve a devida
approvação, permittindo continuar-se uma obra de inte-
resse capital, quer para o próprio Governo, que tinha
o seu principal edifício (o da Intendência) apenas a 35
metros de distancia da margem, quer para todos os ne-
gociantes e proprietários da localidade.
No intuito de auxiliar o Governo na execução de taes
trabalhos de reconhecida utilidade publica, habilitando-o
a resarcir-se de despezas effectuadas e a effectuar, tive
occasião de em setembro de 1900 propor á approvação
superior um alvitre que me pareceu coadunavel com os
interesses geraes, e o qual era bem acceite pelos pro-
prietários do Chinde. Consistia elle na cobrança de uma
taxa de 20 réis annuaes por metro quadrado de terreno
já existente na posse dos particulares. O valor d'esta
proposta residia no calculo de uma área existente de
100:000 metros quadrados de terreno utilisado como
propriedade particular; ora applicando-se-lhe a taxa ci-
tada obter-se-hia uma receita annual de réis 2:000^000,
que em pequeno numero de annos amortisaria as des-
pezas do Governo, não entrando em linha de conta com
o accrescimo resultante de concessões futuras que advi-
rão da tendência definida para a expansão da villa.
No caso de se querer ainda maior concurso de re-
ceita poder-se-hia estabelecer uma taxa por tonelada
de arqueação aos navios que dão ingresso no porto, a
titulo cie retribuição por serviços prestados á navegação ;
faculdade essa que está prevista no tratado de 1891 com
a Inglaterra, e que já deveria estar em applicação como
i5 7
compensação das balisagens do porto do Chinde, por
diversas vezes effectuadas com grande dispêndio para
o Governo. Estendendose a referida taxa á navegação
fluvial sob o mesmo titulo, o que não se julga exigên-
cia demasiada, visto que os vapores inglezes já a sa-
tisfazem ás auctoridades inglezas de Chiromo ha cerca
de três annos, obter-se-hia um auxilio valioso e legal.
• Estas ultimas propostas não mereceram ainda, ao
que supponho, a minima consideração superior, no en-
tanto, cônscio de que pugno pelos interesses geraes do
distrícto, apresento-as ao conhecimento geral.
SECÇÃO IV
Administração cm geral — Delimitações
dos prazos da Coroa e das fronteiras territoriaes
Concessão portogoeza no Nyassa
CAPITULO I
Administração em geral
Todo o serviço publico no districto da Zambezia é
distribuído por diversas secções administrativas, cujos
títulos passo a designar: Secretaria do Governo do dis-
tricto e da Superintendência dos Prazos da Coroa; de-
legação da repartição de fazenda provincial ; delegação
do circulo aduaneiro ; secção das obras publicas ; dele-
gação de saúde ; direcção dos telegrapnos e correios ;
direcção do arsenal ; secretaria militar ; capitania dos
portos da Zambezia ; esquadrilha de policia e fiscalisa-
ção no rio Zambeze; ministério publico e justiça; culto
religioso e camará municipal.
Todos estes serviços estão installados em Queli-
mane, sede do governo districtal, á excepção da capi-
tania dos portos, que por lei especial está no Chinde,
tendo n'aquella uma delegação. Nas villas de Téte
e Chinde, sedes de circumscripções administrativas, a
i6o
cargo a primeira de um commandante militar superior
€ a segunda de um intendente, existem subdelegaçôes
de todos os serviços enumerados ; e, finalmente, com-
mandos militares installados em diversas localidades,
para garantia e demonstração da occupação, comple-
tam a grande rede do machinismo administrativo d 1 este
districto.
Vou pois tratar do modo como estão estabelecidos
todos os designados ramos de serviço publico.
i
Secretaria do Governo e da superintendência dos pra-
os da Coroa. — Pelo decreto de 1 5 de julho de 1896
bi englobado na secretaria do Governo todo o serviço
de expediente da antiga inspecção geral dos prazos,
que sendo já de si importante, deu em resultado um
augmento enorme no serviço da primeira sem augmento
de pessoal; este continua a figurar nos orçamentos no
numero de dois amanuenses, manifestamente exiguo
para se manter uma regularidade impeccavel e neces-
sária na organisação de um archivo importante em
grandeza e valor, e na confecção, não só de todo o
expediente propriamente do districto, que é enorme,
como também do exterior.
O archivo do districto que, como já disse, é volu-
moso em demasia, era de morosa consulta, sendo o
principal motivo o systema adoptado na sua coordena-
ção por datas ; adoptou-se a organisação em processos
para cada assumpto administrativo, devidamente nu-
merados e intitulados, e actualmente a rapidez da con-
sulta é uma demonstração frisante da boa ordem que
existe no principal serviço da secretaria.
De resto tudo caminha em circumstancias normaes.
CAPITULO II
Fazenda
E esta uma repartição em que os serviços precisam
a todo o transe de manter uma regularidade perma-
nente e indispensável aos seus fins, que são a arreca-
dação dos reditos do Estado, e satisfação dos débitos.
A falta de pessoal tem sido notória, a despeito de
repetidas ponderações feitas superiormente em diversas
épocas, o que faz suppor ter sido a deficiência geral
na província a causa da não satisfação dos mesmos pe-
didos.
N'um districto vasto como este é, e em que a fisca-
lisação da fazenda abrange áreas extensas, excedendo
em dezenas de kilometros os âmbitos das villas, é in-
dispensável manter-se um pessoal completo, ao menos
no quadro determinado, para que haja uma arrecada-
ção geral de impostos, e se obste a abusos que os pre-
cários meios de fiscaíisação fatalmente teem tolerado.
A falta de arrecadação de cerca de 200:000^000 réis,
importância de contribuição predial e de renda de ca-
sas a lançar desde o anno de 1896, manifesta, como
já disse anteriormente, elevado grau de incúria em se
n
1Ô2
zelarem os interesses do Estado, sendo difficil precisar
as causas d'onde deriva tão positiva anormalidade em
serviço tão importante.
O pessoal que existia durante a minha gerência pa-
rece ter illibada a responsabilidade da não cobrança
das receitas atrazadas, pelo simples facto, já apontado,.
.de ser em numero exíguo já de si para o serviço nor-
mal, e de não terem sido attendidas pela Inspecção de
Fazenda Provincial, por motivos que ignoro, as pon-
derações feitas pelo escrivão de fazenda sobre tal as-
sumpto.
Postos estes factos no p>é em que devem estar e ao
nivel da verdade que se impõe a attestar a culpabili-
dade de alguém n'este estado de cousas, repetirei a ne-
cessidade absoluta de se ter sempre o quadro do pessoal
de fazenda districtal no seu effectivo completo, e assim,
certamente será garantido o regular andamento dos ser-
viços normaes. Porém para o caso enunciado das re-
ceitas atrazadas na sua cobrança, já tratei na secção
anterior dos processos já propostos superiormente em
tempo competente para se conseguir a sua arrecadação
nos cofres públicos com positiva rapidez e pequeníssi-
ma despeza applicada a gratificações extraordinárias.
CAPITULO III
Obras publicas
/ Representa este ramo de serviço publico um grande
productor do progresso material na localidade ou loca-
lidades onde a sua acção edificadora se fizer sentir.
É triste que na Zambezia, onde o Governo tem um
grande papel civilisador a desempenhar, não sejam de-
vidamente aproveitados os bons elementos officiaes que
o quadro do funccionalismo technico proporciona para
se produzirem obras de reconhecida utilidade publica,
porque para tal realisação, cuja pratica todos os que
se interessam pelo progresso das colónias são unanimes
em reconhecer, escasseia o elemento mais importante ;
esse elemento necessariamente é uma dotação condigna
com o valor real e progressivo do districto.
Os orçamentos designam uma verba de 10:000^000
réis para se executarem dentro de um anno todas as
obras de que carece tão vasta região; essa quantia não
.chega para reparação nos edifícios do Estado existen-
tes ; e a prova do que avanço existe palpável na villa
de Téte, onde por falta de recursos da repartição res*
pectiva não foi possivel proceder-se á cobertura da re-
i<H
sidencia do commando militar, que por esse facto o
tempo se encarregará de destruir por completo.
A necessidade de edifícios públicos para exercício era
boas condições dos diversos ramos de serviço, impõe-se
á consideração dos altos poderes ; e se não basta a ra-
zão de crdem moral enunciada para justificar a asser-
ção, outra de ordem económica surge para consolidar
o argumento favorável, e se resume na cessação do pa-
gamento de rendas avultadas aos particulares para ins-
tallação d'aquelles serviços, cujo sommatorio de réis
2:5oo$ooo representa annualmente uma verba de des-
peza importante.
A realisação de algumas obras de utilidade publica
para saneamento das villas e melhoramentos materiaes
nas mesmas, é também uma necessidade digna de ser
attendida n'um território que, como a Zambezia, apre-
senta um desenvolvimento de exploração progressivo e
uma colonisação definida.
Não obstante a exiguidade na dotação orçamental,
algumas obras importantes se realisaram no período de
quasi dois annos que durou a minha administração, e
nas quaes o engenheiro Theodoro de Macedo, chefe
da secção das obras publicas do districto, desenvolveu
o máximo zelo e sollicitude, aproveitando o melhor pos-
sível as deficientes verbas auctorísadas.
Vou apresentar em summario as obras executadas,
durante a minha gerência e aquellas cuja realisação se
impõe como inadiável, para cujo effeito é sobremaneira
modesta a verba orçamental.
Em Quelimane construiram-se i3o metros correntes
de muralhas na zona do quartel da companhia do de-
posito, onde mais sensível era o desgaste do terreno
marginal. A conclusão d'esta obra, que contribuirá não
só para o saneamento e embellezamento da villa, mas
para a defeza das margens do rio sujeitas á corrosão,
pela acção continuada de fortes correntes fluviaes inci-
dentes e dos embates do vento, torna-se sobremodo re-
commendavel; são mais 220 metros de muralha a cons-
i65
truir, cujo custo não será inferior a 16:000^000 de réis,
segundo o projecto elaborado pelo indicado engenheiro.
No hospital militar e civil procedeu-se a reparações
frequentes e indispensáveis para a hygiene; adaptou- se
um compartimento para casa de banhos, que não exis-
tia ; construiu-se uma cosinha em substituição de um
alpendre desabrigado onde dominava a falta de aceio
indispensável, e effectuaram-se outras construcções ac-
cessorias, como dispensa, capoeiras, tanques de lava-
gem e diversas canalisações indispensáveis.
Construiu-se uma casa de autopsias e mortuária,
também necessária, porque taes operações eram fei-
tas ao ar livre e os cadáveres tinham de ficar expostos
nas enfermarias á vista dos doentes. Finalmente fez-
se uma vedação com um muro de alvenaria na cerca
do hospital, conseguindose assim manter n'ella o con-
veniente aceio. Recommenda-se pois, a bem dos servi-
ços hospitalares, que não devem ser descurados, n'um
clima tão inhospito e mau, uma ampliação*no estabe-
lecimento por íórma que se possam concentrar todos
os serviços inherentes, como são a pharmacia e a sede
das irmãs hospitaleiras; cujas installações são feitas em
casas arrendadas a particulares por preços fabulosos,
na importância total annual de 1:8009000 réis.
Para este fim devia- se auctorisar a execução do pro-
jecto de construcção de dois pavilhões isolados para
substituírem vantajosamente as duas casas arrendadas ;
não se dispendendo com tal obra quantia superior a
12:000^000 réis, que, comparada com a despeza do
arrendamento que se supprimiria, representaria um
juro de i5 °/o.
Mais outras construcções de menor importância são
necessárias, como uma enfermaria-prisão e mais um
pavilhão destinado a isolamento nas doenças de ca-
racter epidemico.
Todos os citados melhoramentos, de valor incalculá-
vel pelo beneficio que se colheria, poderiam ser levados
a effeito n'um pequeno período de dois annos.
No arsenal começou-se a construcção de um edifício
para installação da officina de fundição de ferro, e que
Ibò
teve de ser interrompida por falta absoluta de verba ,
é pois convenientíssima a conclusão d'essa obra, não
só pelos incalculáveis serviços que prestará á villa o
funccionamento fabril, como se evitará a deterioração
da parte já construída, que é importante pelo valor da
do material empregado.
As obras indicadas são consideradas de caracter ur-
?;ente, por conseguinte inadiáveis; as despezas a ef-
ectuar para a sua realisação, sendo por assim dizer
reproductivas, devem mover os poderes públicos a não
demorar a sua execução.
Além d'estas obras apresentam-se outras que são
menos urgentes, mas são egualmente precisas, a saber :
i.° Alargamento da rampa-caes da alfandega, que
tem apenas cinco metros de largura, sendo por tal in-
suficiente para o actual movimento commercial.
2. Conclusão do quartel ; pois não tem alojamento
para officiaes, nem disposições convenientes para aquar-
tellar praças europêas em terras d'africa.
3.° Fixação da margem que forma a ponta de Tan-
galane, á entrada do porto, afim de evitar que em cur-
to prazo de tempo se seja obrigado a deslocar o grande
pharol, teijdo por base uma grande construcção de ferro
com vinte e tantos metros de altura.
4. Drenagem da villa, obra de saneamento de gran-
des effeitos para a colonisação, pela salubridade que
d'ella derivará, e que se torna sobremaneira exigente.
A situação de Quelimane, em terreno n'alguns pon-
tos de cota inferior á attingida pelas marés craguas vi-
vas, confrontando pelo norte com terrenos baixos ap-
plicados aos arrosaes, por leste e oeste por Mocurros,
e pelo sul com o rio, que espraiando descobre uma lar-
ga facha de terreno lodoso, está a evidenciar a neces-
sidade de que se melhorem o mais possível as condi-
ções do terreno onde assenta.
5.° Uma ponte para embarque e desembarque de
passageiros.
ò.° Construcção de um edifício de primeiro andar
para a esquadrilha do Zambeze e capitania do porto.
7. Installação de um lazareto em Tangalane, e cons-
i<7
tracção de uma estrada de communicação de Quelimane
para aquelle ponto da costa marítima; melhoramento
este pelo qual clamam ha muito tempo os quelima-
nenses.
Consideremos agora o Chinde :
N'esta villa, pela sua situação especial, geographica
e hygienicamente considerada, ha duas obras que se
antepõem a todas em urgência, por serem de imperiosa
necessidade ; uma por garantir a própria existência da
villa, e outra por ajudar a natureza no que ella propor-
ciona de benéfico para os povos colonisadores.
A primeira resume-se na fixação da margem direita
do rio Chinde, junto á villa ; trabalho iniciado pelo en-
genheiro Macedo em outubro de 1900 e continuado no
decurso dos annos de 1901 e 1902. Resultou d'esse
trabalho enorme beneficio, por se obstar em grande
parte á corrosão da margem, que attingia antes annual-
mente grandes proporções, fazendo, a queda para o
rio do terreno marginal, encurtar a olhos vistos a dis-
tancia das primeiras edificações da villa ao elemento li-
quido.
A segunda é a construcção do sanatório, existindo já
dois pavilhões isolados, além dos annexos, como casas
de banho, retretes, cosinha, poço, etc. ; e uma enfer-
maria provisória para indígenas.
Recommenda-se o augmentar-se o estabelecimento
com mais uma enfermaria para brancos, completando-
se assim o projecto.
Além das duas citadas obras ha outras a executar a
saber :
i. a A construcção de um quartel para a policia do
Chinde, empresando o material usual na villa, madeira
<e ferro ondulado.
2. a Construcção de um armazém para a alfandega,
pois o movimento de mercadorias exige mais esse ac-
crescimo ás actuaes dependências.
3. a Drenagem da villa, que é necessária, a despeito
4o clima benigno, visto que as suas condições topogra-
i68
phicas permittem que se formem accidentalmente, e
por tempo limitado, pântanos mixtos na parte leste da
povoação.
Tratemos agora de Chilomo:
E' esta uma povoação que terá importância futura,
por ser o terminus indicado no projecto de construcção
cio caminho de ferro de Quelimane ao Ruo.
Por emquanto a única obra recommendavel, com o
caracter de urgência, é a construcção de um edifício a-
propriado a servir de estação telegrapho-postal, pois
esta funcciona numa palhota antiga e já em mau estada
de construcção, apresentando uma situação vergonhosa
perante os visinhos inglezes da margem fronteira.
Consideremos por ultimo a villa de Téte :
Os edifícios públicos d'essa antiga villa todos care-
cem de reparações importantes, a começar pela resi-
dência do commandante militar, que está em perfeita
ruina.
Uma outra obra que interessa sobremaneira á vitali-
dade de Téte, é uma melhoria nas vias de transito ao
commercio do interior, sendo esta villa (que é um ver-
dadeiro entreposto), d'entre todas as outras da Zam-
bezia, a que e menos servida a respeito de estradas de
communicação. E a razão é obvia e concludente da au-
sência de occupação, bem como de exploração, por
Sualquer dos ramos de actividade humana, tudo filho
a absoluta carência de elementos accionarios pró-
prios.
Ora o itenerario obrigado ás caravanas commerciaes,
mesmo as que dimanam do território inglez sob a ad-
ministração da Northern Charterland Exploration
Company^ é uma directriz partindo de Chimuala, ou
•Chimuará, situada na região do Undi, até Ghicôa, e
d'ahi a Téte, e apoz Umtali, na Rhodezia, ou então
Chinde, pela via fluvial. Ora o indicado percurso ter-
restre é praticado por caminhos abertos pelo indígena,
i69
e por tal tortuosos e irregulares, affastando-se eviden-
temente da linha recta.
Surge pois, como necessidade imperiosa, a abertura
de uma boa estrada carreteira, segundo a mesma di-
rectriz, que permitia uma rapidez nas communicações,
o que será de effeitos grandemente benéficos.
A citada companhia ingleza propoz effectuar á sua
custa a obra acabada de indicar. E' claro, que tal ofe-
recimento só provém da vantagem que a abertura da
estrada proporcionará ao trafico commercial da região
ingleza, que se realisará indubitavelmente em melhores
condições. E como de tal via de transito também re-
sultara vantagem para o território atravessado, obtém-
se de tal obra uma reciprocidade de benefícios.
Em contraposição, algumas razões de ordem politica
e económica devem ser consideradas para a concessão
em perspectiva, as quaes julgo de bastante peso para
merecerem alguma attenção.
O artigo n.° do tratado de 1P91 entre Portugal e a
Inglaterra dá faculdade a esta potencia para effectuar
a construcção das estradas atravessando o nosso terri-
tório, competindo a Portugal facilitar-lhe a acquisição
do terreno em condições razoáveis.
Por outro lado o artigo i3.° do mesmo tratado esta-
tue que às estradas construídas com o fim especial de
corrigirem as imperfeições da via fluvial devem ser con-
sideradas como dependências do mesmo rio, e por tal
só devem ser percebidas para sua utilisação pelos súbdi-
tos de ambas as potencias, as taxas correspondentes ao
custo da construcção, custeio, etc.
E' concludente, que sendo concedida á companhia
Northern Chaterland a permissão de construir no nosso
território a estrada em questão, fica tacita ou implici-
tamente consentida a cobrança das taxas devidas como
proventos aos iniciadores, custo da construcção, etc,
do artigo i3.°, o que equivalerá a sanccionar-se uma
invasão de soberania. E a formula usada actualmente
pela British Central Africa na exigência ao transito de
mercadorias pelas suas estradas de Chiromo á Antó-
nia e lago Nyassa, construídas egualmente com o fim
tjo
de corrigir as imperfeições da via fluvial, não é mais do
eme um direito de transito encapotado com o titulo de
Guarding and examining fees de 3 °/o ad valorem,
cuja traducção é Emolumentos a titulo de policia de es-
tradas e conferencia de mercadorias.
Essa exigência, não obstante elles dizerem que não
representa interferência alguma aduaneira, o que é dis-
cutível, é um facto a que se deve dar a máxima consi-
deração quando elle tenha de se dar em território por-
tuguez, exercido por inglezes que podem exigir a sua
applicação como cousa legal, o que será em detri-
mento do principio de nacionalidade.
Posto isto, a minha opinião é que a construcção da
estrada ligando a fronteira ingleza com Chicôa e fa-
zendo seguir a sua directriz por Chimuara ou Chimuala
(que incontestavelmente está situado em território por-
tuguez a 3o kilometros de distancia da fronteira refe-
rida), é sobremaneira recommendavel como beneficio
geral ; mas deve ser effectuada pelo Governo directa-
mente ou obrigando a isso a companhia da Zambezia,
concessionaria de toda a região; e que a applicação da
taxa de 3 °/o ad valorem, mesmo titulo que os in-
glezes exigem nas suas estradas carreteiras das mar-
gens do Chire, ao transito das mercadorias, resarcirá
talvez em pouco tempo as despezas effectua*das e per-
mittirá a conservação da estrada em questão ; não se
devendo alterar a taxa acima para não estabelecer di-
reito differencial, o que é previsto no tratado.
CAPITULO IV
Repartição aduaneira
N'este ramo de serviço publico ha a considerar em
primeira plana a fiscalisação, que é o elemento de pri-
mordial grandeza para se conseguir o exercício da le-
galidade nas operações commerciaes tomadas na sua
generalidade. N'este districto, pelo seu regimen admi-
nistrativo especial imposto pelos tratados internacio-
naes, ha a attender-se de uma maneira real ao exercí-
cio efficaz da fiscalisação aduaneira, tanto nos diversos
portos accessiveis, como nos rios de navegação inter-
nacional: Zambeze e Chire.
E' exactamente n'estas duas enormes veias liquidas,
coalhadas de ilhas em profusão, por entre as quaes se
côam os diversos canaes navegáveis, que o contrabando
pullula em liberdade; ahi não ha illusão ao fisco, por-
que este deve á impossibilidade no exercicio a sua qua-
si nullidade de acção.
Tal facto é claramente justificado para quem conhece
as circumstancias locaes e por tal se capacita da impra-
ticabilidade de uma fiscalisação assidua e útil por meio
de postos fiscaes, porque estes teriam de ser tão nu-
17»
merosos como as ilhas, e nas margens tinham de se
constituir em cordão continuo de postos situados a pe-
quena distancia uns dos outros, o que acarretaria fa-
talmente enorme despeza que nem ao de leve teria
compensação.
E' pois cathegorico que a fiscalisação aduaneira no
Zambeze e seus affluentes só será real e positiva quando
a repartição respectiva seja dotada de pessoal idóneo
na classe de guardas, bem remunerados e em nume-
ro necessário ás exigências do serviço, segundo os
dictames do regulamento de transito de mercadorias
de maio de 1892. E' este mesmo regulamento, que pre-
vendo a impraticabilidade dos postos fiscaes, define a
necessidade de fazer seguir em cada vapor que navega
um certo numero de guardas, facto este que até hoje
nunca se realisou pela absoluta carência do mesmo pes-
soal.
Continuando-se no actual regimen alfandegário, toma
um caracter urgente a necessidade de se elevar o qua-
dro do pessoal de guardas fiscaes a um numero que
satisfaça á fiscalisação exterior da concessão ingleza no
Ghinde, como também á que tem de ser exercida na
navegação dos vapores para obstar aos costumados des-
caminhos de direitos. N'essa conformidade tive occa-
sião de propor (sem resultado) á approvação superior
uma alteração no referido quadro, augmentando-lhe
vinte e cinco guardas europeus, especialmente destina-
dos a acompanhar os vapores que partem do Chinde
com mercadorias embarcadas na concessão e destinadas
a transito livre.
A não ser os serviços apontados que caminham irre-
gularmente sem culpabilidade alguma do pessoal da re-
partição respectiva, todos os outros serviços aduaneiros
encontram-se n'um estado lisongeiro.
Considerarei agora os edifícios, da alfandega; a forma
porque são armazenadas as mercadorias que affluem
por importação e exportação aos portos de Quelimane
e Chinde, as providencias tomadas por minha iniciativa
^
e as que é preciso realisar para melhoria de tão im*
portante serviço.
Em Quelimane um edifício construído de alvenaria,
vasto, bem situado, junto ao cães de desembargue e do-
tado de amplos armazéns, garante boas condições ge-
raes ao movimento commercial do porto; outro tanto
não succede no Chinde, onde a pequenez do edifício,
alliado ao material da sua construcção em folha de ferro
ondulado, não são condignos do já importante affluxo
de mercadorias. Devido á falta de armazéns, grande
parte dos volumes destinados ao consumo da vil la do
Chinde ficam expostos á acção do tempo se não forem
despachados em acto continuo ao seu desembarque. Os
armazéns alfandegados dos particulares supprinam em
parte esta falta, mas nem todos os desejam possuir.
Um facto de idêntica natureza se passava no ter-
reno marginal do Chinde, fronteiro ao edifício da In-
tendência e annexo ao da concessão interna ingleza: da-
tava de muito tempo que o referido terreno, pelas suas
condições de ligação entre o posto de despacho e a
mesma concessão, era destinado ao desembarcadouro
de grande quantidade de volumes e materiaes que cons-
tituem a carga dos diversos vapores e paquetes que
affluem ao porto.
N'este mesmo local pois se tem effectuado sempre a
separação dos volumes que se destinam á concessão
ingleza dos que tem de dar entrada na nossa alfandega,
serviço importante este, que, além de ter de ser feito
ao ar livre, e por conseguinte sujeitando o pessoal ofi-
cial á acção do sol e chuva (francamente nocivos ao or-
ganismo), a sua duração era de alguns dias, como con-
sequência, não só da quantidade, como também das
conferencias necessárias das marcas e contramarcas di-
versas, formalidades legaes indispensáveis.
N'estas circumstancias as reclamações dos importa-
dores eram constantes e justificadas contra a deteriora-
ção das suas mercadorias, jazendo em taes circumstan-
cias na espectativa da resolução official, que não podia
deixar de ser morosa com o diminuto pessoal que pos-
sue ; e por outro lado o publico em geral protestava
«74
com razão contra o transito obstruído pela grande ag-
glomeração de volumes na rua marginal, principal ar-
téria do movimento da população.
N'esta conjunctura, a necessidade de remediar tão
anómalo estado de cousas impunha se em voz impe-
Eeriosa, com suggestão á idéa de se fazer construir um
anear ou telheiro n'um local livre situado entre a in-^
tendência e a concessão ingleza, o mais próximo possí-
vel da margem; e com a existência de tão importante
elemento obrigar o desembarque de todas as cargas
para o seu interior e d'ahi, apoz executadas todas as
formalidades aduaneiras, effectuar-se a sahida por se-
paração de destinos. Foi esta uma questão que consi-
derei grave e momentosa, porque á sua resolução se
prendiam deduzidas vantagens para o serviço geral, in-
clusive o conhecimento mais perfeito do que dava en-
trada na concessão e por conseguinte a certeza de não
haver descaminhos n'essa occasião.
Os benefícios que pareciam resaltar da execução d'es-
ta minha idéa conduziram-me á consideração de que
era necessário pol-a em pratica sem delongas.
Diversas razões accumulativas tolheram a interferên-
cia completa dos elementos do Governo na construcção
do hangar projectado, e entre ellas avultou em primeiro
logar o facto positivo de estar exgotada a exígua verba
orçamental designada como dotação das obras publi-
cas ; em seguida tornou-se ponderável a consideração
das circumstancias locaes, para se levar a cabo por
conta do Governo a construcção de um edifício, que
pela sua natureza e fins deve estar o mais próximo pos-
sível de cães de desembarque. Por esse ultimo motivo
era obvio o a t tender- se á corrosão da margem, que se
estava operando dia a dia, pela acção das correntes flu-
viaes, pelo que convinha aguardar-se a certeza de que
a captagem do areal que se estava tentando era possí-
vel, para que o referido edifício permanecesse em se-
gurança.
Coincidiu esta situação com um requerimento apre-
sentado pelos agentes da companhia de navegação
allemã, Deutsche Ost Africa Linie, expendendo exacta-
175
mente o que anteriormente se disse respeitante ás cir-
cunstancias em que ficavam as cargas dos seus vapo-
res apoz o desembarque, e pedindo permissão para
a construcção de um hangar sob certas condições ex-
pressas. Entendi não haver inconveniente de espécie
alguma no deferimento de uma pretensão que de ma-
neira alguma affectava os interesses do Governo, e sim
beneficiava o commercio com a existência de um edifí-
cio, cuja utilidade tanto se recommendava, e de cujo
assentimento derivava um auxiliar á execução da minha
idéa com um argumento favorável, que era nada me-
nos do que o nullo dispêndio para a fazenda nacional.
Os termos do deferimento faliam claro, e cTelles re-
sulta co não impedimento ao uso de qualquer direito
que por parte das alfandegas assista •; assim como que
co Governo em si nenhum prejuízo soffre, porque até
o próprio terreno onde assenta a construcção continua
a pertencer-lhe, estando prevista a faculdade de em
qualquer tempo fazer apear a construcção quando d'elle
necessite sem indemnisação de espécie alguma •; que
co commercio geral foi em acto continuo beneficiado
com a cessação dos prejuizos materiaes que a exposi-
ção das mercadorias á acção do tempo produzia»; que
cos preliminares da pauta, bem como o regulamento
da navegação e transito de mercadorias pelo Zambeze,
de 18 de maio de 1892, em nada são affectados» ; e fi-
nalmente que co Governo conseguiu um beneficio ca-
Eital para a localidade, sem dispêndio, e que para si o
eneficio, além de ser de ordem material, é accrescido
pelo facto de se estar em melhores circumstancias de
aguardar, não só verba applicavel a uma obra de reco-
nhecida utilidade, como também a certeza da fixidez
da margem •.
Infelizmente este acto puramente administrativo, pra-
ticado na melhor das intenções, não teve uma interpre-
tação franca por parte do Governo Geral, de forma
que ainda fiquei em duvida se mereceu a sua approva-
ção.
Nas localidades Missongue, Chiuanga, Chilomo e
Téte existem installados também postos de despacho.
176
O primeiro, na margem esquerda do Zambeze, em si-
tuação quasi fronteira ao da Companhia de Moçambi-
que na Lacerdonia, está accommodado n'uma casa de
construcção á moda do paiz ; o effeito da fiscalisação é
quasi millo, pela impraticabilidade n'uma zona do rio
larguíssima, coalhada de ilhas, entre as quaes é facul-
tavel a navegação. O segundo, por disposição do tra-
tado com a Inglaterra, está situado na margem es-
querda do Chire, em local fronteiro ao inicio do terri-
tório inglez da margem direita; é este um posto impor»
tante pelo papel que tem a desempenhar, e está com-
tudo mal installado como o anterior, em casa construída
á moda do paiz. O terceiro, na margem esquerda do
Ruo, fronteiro ao Chiromo inglez, de pouca utilidade é
por. emquanto, devido ao pouco desenvolvimento local,
onde só a companhia da Zambezia tem casa de commer-
cio; está comtudo regularmente installado n'um edifí-
cio de alvenaria. O quarto, finalmente, serve um en-
treposto que deverá ter importância futura por ser o
ponto obrigado á affluencia de mercadorias do interior
e também do exterior, pela sua accessibilidade á nave-
gação fluvial; está convenientemente accommoda<tfc
como o anterior, em edifício d' alvenaria.
CAPITULO V
Serviço de saúde
A' salubridade está ligado o serviço de saúde appli-
cado á debellação das doenças predominantes nos paizes
quentes ; é pois de imperiosa necessidade que tal ser-
viço satisfaça, pela sua organisação, numa região con-
siderada insalubre, a todos os requisitos indispensáveis
para que os indivíduos em geral encontrem abundância
de recursos e em condições de lhes serem prestados
socorros de toda a ordem.
O serviço de saúde na Zambezia achava-se montado
nas três villas do districto por uma forma regular, exis-
tindo em cada uma um medico, um pharmaceutico e o
pessoal auxiliar indispensável, bem como medicamentos
em abundância.
Existe em cada uma um edifício do Estado destinado
-a hospital, com disposições para a affluencia das diver-
sas classes de indivíduos doentes.
Em Quelimane o hospital está installado n'um edifí-
cio apropriado, sendo comtudo já pequeno para a po-
pulação da villa, que tem augmentado nos últimos
tempos.
ia
178
O serviço interno a cargo das philantropicas irmãs
hospitaleiras da congregação de a. José de Cluny é
exemplar pelo disvelo e carinho com que são tratados
os doentes, a par do aceio sustentado no estabeleci-
mento.
Tornava-se notória a falta de uma casa em separada
do corpo do edifício para a realisação das autopsias,
operações que . eram executadas ao ar livre, no patea
e guasi á vista dos doentes e de todo o pessoal. Com
o fim de attender a tão urgente necessidade fiz cons-
truir pela secção d'obras publicas, erçi terreno livre na
mesmo pateo, um pequeno edifício, que depois de con-
cluído foi destinado a casa mortuária e de autopsias v
foi este um melhoramento, cuja execução entendi não
dever addiar.
Um outro facto se dava de maior importância ainda
para a hygiene e sanidade publica da villa, e consistia
na falta de isolamento dos colonos atacados de doença
contagiosa, a varíola, que no anno de 1900 teve grande
propagação no elemento indígena. Para obviar a esse
inconveniente fiz construir também pela secção d'obras
publicas, em terreno distante da villa e a sotavento
aesta, três barracas de dimensões regulares e em har-
monia com a afluência de doentes; por esta forma
conseguiu-se levar a cabo um melhoramento importante
de imperiosa necessidade.
Ainda sobre a doença epidemica, a varíola, que an-
nualmente nas épocas de junho a dezembro ataca de
uma maneira desoladora os indígenas, tendo-me sida
demonstrado pelo medico a vantagem que haveria para
a população do districto em se proceder a uma vacci-
nação geral nos diversos prazos da Coroa arrendados^
contratei, por intermédio da casa commcrcial da com-
panhia do Borôr, um fornecimento mensal de tubos
vaccinicos da mais recente fabricação; e assim, por
meio de vaccinação operada em todos os pontos do
districto onde foi possível chegar, conseguiu-se atalhar
em grande parte o terrível mal, pois na época passada
de 1901 o numero de atacados de varíola foi realmente
179
insignificante, o que é um symptoma favorável á bene-
ficiação do districto.
O serviço de pharmacia da villa é bastante lisongeiro,
porquanto além de um estabelecimento do Estado ha
um particular e ambos satisfazem ás necessidades do
geral da população.
Passando á villa do Chinde é esta, pela sua situação
geographica á beira-mar, o verdadeiro sanatório do dis-
tricto, consagrado por nacionaes e estrangeiros. Cons-
tante e persistentemente lavada pelos ventos puros do
oceano, respira-se ahi uma atmosphera salubre, cons-
tantemente renovada ; e n'esta evolução continuada dos
elementos aéreos, em que os miasmas deletérios, como
que não tendo tempo de estacionar, não existem, se pa-
tenteia a excellencia do clima, attestada pelo argumento
vivo da saúde das creanças europêas.
Aproveitando- se estas excepcionaes condições locaes,
d'um illustre meu antecessor partiu a iniciativa da cons-
trucção na costa do mar de um sanatório, tendo sido
elaborado por um distincto engenheiro o plano com-
pleto dos edifícios que o deviam constituir, e em se-
guida começada a construcção do primeiro pavilhão.
Coube-me a gloria de ver concluído este primeiro corpo
e de mandar iniciar o segundo, procedendo-se previa-
mente a algumas construcções annexas e de utilidade
para o serviço hospitalar. O que se acha feito é meta-
de do projecto, e consta de um pavilhão para doentes
de primeira classe, com quatro quartos amplos e bem
mobilados ; outro para doentes de segunda classe,
igualmente bem dispostos; os annexos são casas de
banho, cosinhas, retretes, etc, e para o completo falta
uma enfermaria geral, que a exiguidade da dotação das
obras publicas n'este districto não permittiu ainda ser
construída, conforme já expuz anteriormente.
Apesar de incompleto o edifício, e com o fim de at-
tender ás necessidades urgentes da localidade para soc-
correr doentes vindos do interior, na sua maioria es-
trangeiros, mandei proceder ás installações convenien-
i£o
tes na parte já construída, e abriu-se ao publico o sa-
natório, sob a direcção do medico da localidade. A
concorrência manifestada attesta as boas condições do
estabelecimento, que em vista das razões expostas me-
rece uma attenção especial dos poderes públicos para
que se vote uma verba especial para a sua conclusão.
As receitas advindouras necessariamente em profusão
quando se propague a excellencia do acolhimento que
terão os doentes, resarcirá em tempo não muito longi-
quo as despezas effectuadas.
Na secção respectiva a obras publicas foi incluída,
entre outros edifícios cuja construcção é recommenda-
da, a conclusão de tão importante melhoramento para
o districto, obra de execução inadiável e reputada de
necessidade imperiosa, para o que tive opportunidade
de sollicitar a consideração dos poderes superiores.
Considerando por ultimo a villa de Téte está o hos-
pital installado n uma casa do Estado, e posto que im-
própria para o fim a que se destina pelas suas dispo-
sições internas, comtudo satisfaz as necessidades da
população, que não sendo numerosa ha poucas exigên-
cias a satisfazer.
Na minha visita, em julho do anno findo, áquella lo-
calidade, melhorei as suas condições internas, auctori-
sando pequenas obras indispensáveis nos tectos, caia-
ção de paredes, e a acquisição de alguns artigos de
mobilia e utensílios, considerados de primeira necessi-
dade, para os quartos e enfermarias ficarem em cir-
cumstancias de receber doentes.
Examinadas as condições em que marcham os servi-
ços de saúde em todo o districto, não posso deixar de
frisar os exforços dos diversos delegados de saúde em
os manter a um nivel consentâneo com os interesses lo-
caes alliados aos do Estado. No aproveitamento da boa
cooperação de todos para um fim altamente humanitá-
rio, que tal é o que representa o presente ramo de ser-
viço publico, é de inteira justiça que se não regateiem
benencios que redundarão no bem estar d'aquelles que
da pátria vem concorrer com o seu tributo á colonisa-
ção.
i8i
K' esta uma causa sobremaneira sympathica que
todo o mundo advogaria sem escrúpulos, com o funda-
mento nos eternos princípios da justiça, direito e hu-
manidade.
CAPITULO VI
Telegraphos
É a Zambezia o único districto da província de Mo-
çambique onde a telegraphia apresenta um desenvolvi-
mento de linhas em effectividade de exploração, cons-
tituindo uma rede de grande importância, ligando as
localidades mais notáveis, e estabelecendo uma regu-
laridade de communicações entre todos os pontos da
região.
Esta rede telegraphica, em communicação directa com
a linha ingleza transcontinental que se dirige ao Cabo,
põe esta importante região em correspondência directa
com a Europa, facto este de incontestável alcance para
a vida social, económica e commercial d v esta colónia,
que sempre está prompta a bemdizer com o aprovei-
tamento todos os benefícios com que tem sido dotada.
Outros melhoramentos se conseguiram, consequên-
cia immediata das construcções das linhas telegraphi
cas, assegurando o transito terrestre do interior aos po-
voados pela abertura das estradas na directriz das mes*
mas linhas. O benefício que a existência de taes vias
de communicação proporciona á agricultura e commer-
i8 4
cio colonial é tão palpável, que basta ennuncial-o para
ser irrefutável.
São pois duas obras de reconhecida utilidade publica
que simultaneamente teem sido levadas a effeito, e que
constituem, pela elevada concepção, traduzida n'um in-
teresse vital para o paiz, uma verdadeira coroa cívica
aureolando os iniciadores e os impulsores de tão sym-
pathico commettimento.
N'esta conjunctura impõe- se como necessária uma
correcção que tenda a melhorar os elementos existen-
tes, para garantir uma perpetuidade impeccavel o mais
possível na sequencia de tão importante ramo de ser-
viço; refiro me ao material e ao pessoal de que adiante
tratarei mais detalhadamente, apresentando as propos-
tas que teem sido feitas superiormente no sentido de
se obter uma melhoria nos citados elementos.
A tabeliã junta a este livro accusa um desenvolvi-
mento de rede telegraphica no principio do anno de
1902 num total de 1.952:949 kilometros, dos quaes
3g6:3i7 kilometros foram construídos dentro do anno
civil de 1901 e princípios de 1902 ; esta ultima exten-
são representa o sommatorio de 328,319 kilometros de
linha construída de Téte ao Zumbo, com 67,998 kilo-
metros estabelecidos da Maganja da Costa ao Bajone.
Foram estas duas linhas beneficiadoras de duas re-
giões importantes, assumpto de minha proposta, de
cuja approvação immediata pelo Governo me vanglo-
rio.
Examinada attentamente a referida tabeliã nota-se
com toda a clareza o delineamento da rede telegra-
phica, com indicação precisa do numero e nomes das
estações, distancias kilometricas entre ellas e qualidade
dos postes empregados na construcção dos diversos
troços de linha.
E para se ajuizar da grandeza relativa d'esta rede,
basta comparal-a com a da província de Angola, que
tendo uma área territorial dezenas de vezes maior que
a da Zambezia apresentou comtudo no anno de 1900
um desenvolvimento total de linhas de 1:610 kilometros,
quando a da Zambezia no mesmo anno era de i:566,
i85
isto é, apenas menor em 5o kilometros do que aquella.
D'esta comparação resulta uma situação lisonjeira para
este districto, que por assim dizer rivalisa n'este ramo
de serviço publico em honrosa emulação com uma das
nossas mais florescentes colónias e de mais remota
prosperidade.
Afim de que o serviço internacional, a que a conven-
ção de S. Petersburgo e o tratado do anno de 1891 com
a Gran-Bretanha nos obriga a manter com toda a regu-
laridade, se dispozesse em melhores condições de ser
cumprido, deu- se começo no anno de 1901 á substitui-
ção dos obsoletos postes de madeira por postes de
ferro (que em tempo tinham sido adquiridos pelo Go-
verno), na linha do Vicente a Chilomo e na do Chinde
ao Sombo, ficando concluída esta ultima e em via de
realisação a primeira; e pena é que não houvesse maior
numero de postes de ferro para se conseguir uma
substituição total' que melhoraria consideravelmente o
serviço
Os postes de madeira, por mais resistente que seja
a sua espécie, estão completamente reprovados para
applicação a terrenos que, como os do delta do Zam-
beze, são sempre alagadiços e minados de formiga
branca (muchem). A melhor madeira, por mais dura-
doura, é a chamada pau ferro, que não é facilmente
encontrada ; e o custo da acquisição, transporte e im-
plantação de um poste d'esta madeira é superior ao de
um de ferro, accrescendo que a duração d este é vinte
vezes superior, como está experimentalmente compro-
vado.
E ainda mais : a acção do fogo das queimadas, fre-
quentes na época das colimas e sementeiras efectuadas
pelos indígenas, é completamente destruidora para os
postes de madeira ; a implantação d'estes em terrenos
sem consistência é pouco estável, devido ao seu muito
peso próprio e do fio que sustentam; tudo isto, actuado
ainda pelos ventos, dá em resultado a queda. As faís-
cas eléctricas também fornecem um contingente des-
truidor, tendo logar todos os annos.
De todos os enunciados inconvenientes estão isentos
i86
os postes de ferro, que além de uma estabilidade a toda
a prova pela sua contextura, teem disposições para uma
collocação fácil e rápida, e uma resistência que per-
mitte serem empregados em menor numero para uma
determinada extensão.
A vantagem immediata que surgirá se algum dia
se assignalar a substituição dos actuaes postes de ma-
deira por ferro, será uma economia importante nas
despezas geraes, além de se conseguir uma regula-
ridade no serviço dos telegraphos, que actualmente
não existe nem pode existir com as diversas causas
de interrupção que frequentemente tem locar. Senão
vejamos : a conservação dos postes de madeira, con-
siderada a sua implantação nos terrenos da Zambe-
zia, é sujeita a innumeros cuidados, que nem sempre
são compensadores pela forma de maior duração. As-
sim, além da despeza com a applicação de matérias
preservativas das acções nefastas inherentes ao solo,
ha outra maior ainda com a manutenção do pessoal de
guarda-fios, que tem de ser necessariamente numeroso
para haver compatibilidade com o excesso de serviço
que se lhe exige ; estes dispêndios serão quasi nu lios
com os postes de ferro. Por outro lado ha algumas es-
tações telegraphicas de pequena cathegoria que devem
a sua existência essencialmente á necessidade de fisca-
lisação e reparação das linhas actuaes montadas em
postes de madeira, e não porque sirvam localidades de
importância, nem tão pouco dêem rendimento; são, por
assim dizer, postos de vigia que se supprimirão por
desnecessários logo que o systema de installação das
linhas seja alterado em conformidade do que se acha
proposto.
Attente-se pois na veracidade do que deixo exposto
e considere se como um impulso feliz a realisação do
melhoramento predito; patentear-se-ha indubitavelmente
um monumento de progresso material n'este rico dis-
tricto, que bem o merece. A forma de conseguir tal
melhoramento poderá ser adquirindose annualraente
mil e quinhentos postes de ferro, e em dois annos ter-
se-hia a obra ultimada ; pois que são necessários ape-
187
nas três mil e duzentos postes completos, com consolos,
campanulas, espias, barras de tensão, etc, para a linha
actual.
Vou indicar agora a forma porque é effectuado tão
importante ramo de serviço publico n'este districto :
Os telegraphos da Zambezia estão actualmente divi-
didos em quatro circumscripções, ou agrupamentos de
estações em determinada zona.
A primeira circumscripção comprehende as estações
de Quelimane, Tangalane, Maquival, Villa Cândida,
Nhamacurra, Macuze, Mayer, Maganja da Costa, Ba-
jone, Inhassunge, Mahindo, Sombo, Chinde, Inham-
gombe, Vicente e Mugurrumba.
A segunda circumscripção tem as estações de Téte,
Massangano, Chicomo, Éarura e Chicôa até Zumbo.
A terceira circumscripção Mutarara, Chimuara, Villa
Bocage, Sinjal, Ankoase e Bandar.
A quarta circumscripção Chilomo, Netumbe, Chin-
dio e Milange.
Como se vê, a actual rede telegraphica é servida por
3i estações, das quaes seis para serviço interno e in-
ternacional, que são as de Quelimane, Mutarara, Téte,
Chilomo, Chinde e Vicente, competindo ás restantes
somente o serviço interno.
Parte d'estas estações estão installadas em edifícios
apropriados, outras em casas á moda do paiz, de palha
e por vezes maticadas, sendo estas actualmente em nu-
mero de quatorze.
O material de apparelho é de boa qualidade e ape-
nas ha necessidade, para a sua conservação, de ser
preservado das acções dos elementos exteriores, para
o que a substituição das palhotas por casas próprias de
alvenaria se recommenda.
E já que se fallou de material não posso deixar de
frisar o quanto é precária a situação actual, falha de
artigos de primeira necessidade para a manipulação te-
legraphica, como fita Morse, a ponto de para evitar a
paralysação do serviço n'algumas estações ter de se
utilisar o verso da fita já servida ; além d'este artigo
ha egual falta de pilhas, e de fio de ferro zincado para
1.88
substituições, por estar o que se acha empregado nas
linhas na maior parte completamente oxidado.
Urge attender a este estado de cousas, que ridicula-
risa e deprime a administração publica aos olhos dos
estrangeiros, que sempre são sollicitos em criticar os
nossos actos. Com o intuito de evitar a presente situa-
ção foi por mim enviada em tempo competente á sanc-
ção superior uma requisição completa de material de
telegraphia em que eram incluídos os citados artigos,
a qual não teve solução até á data da minha retirada
da Zambezia, não obstante me ter permittido instar
por diversas vezes pela sua satisfação manifestamente
urgente.
Considerando agora a parte activa e laboriosa n'esta
secção de serviços públicos, representada pelo funccio-
nalismo, começo por chamar a attenção para a tabeliã
junta descriminativa das profundas alterações que tem
tido o quadro do pessoal dentro do anno civil de 1901.
Nas três columnas de que se compõe a referida tabeliã
indica-se o pessoal existente em 1 de janeiro de 1901,
o que por deserções e demissões foi abatido ao effe-
ctivo, e finalmente aquelle que é necessário e indispen-
sável que exista para que tão importante repartição pu-
blica esteja á altura da grande missão que lhe está con-
fiada.
Os motivos que determinaram as grandes baixas no
pessoal em questão, condensam-se todos na falta de
meios para sé sustentarem, só com os parcos vencimen-
tos do orçamento, n'uma região onde os géneros de pri-
meira necessidade são caríssimos. Comtudo, ha males
que produzem beneficio, e este conhecido aphorismo
teve em parte a sua applicação (não considerando o
bem no sentido absoluto do termo, -mas n' aquelle em
que deve ser tomado, abstração feita da generalidade),
no facto de natureza salutar, de se ter evacuado o qua-
dro respectivo de alguns empregados de reconhecida
inépcia. Ficou-se assim em habilitação para se admitti-
rem em sua substituição funccionarios de provada com-
189
petencia, mas mais equitativamente remunerados, pois
só por esta forma se conseguirá o desideratum de se
obter um núcleo de pessoal, que concorra para se
manter a todo o transe a regularidade indispensável
nas communicações telegraphicas.
CAPITULO VII
Correio
O correio da Zambezia é um dos ramos de adminis-
tração mais complexos, pela grande extensão territorial
até onde tem de ser transitada a correspondência, não
só em satisfação ás exigências próprias da dissemina-
ção intestina da população europêa em todas as clas-
ses sociaes (consequência do estado da occupação real
do districto), como também ás necessidades creadas
pela nossa situação geographica em relação ás regiões
inelezas da British Central e South Africa.
Em virtude do exposto deve- se concorrer por nossa
parte, a exemplo do que fazem os nossos visinhos, com
todas as facilidades para que uma permutação de ser-
viços postaes entre as duas colónias limitrophes seja
effectuada com a máxima regularidade e garantia de
segurança. A realisação d'este desideratum representa
um grande ascendente moral, a que os progressos da
colonisação clamam como necessidade imperiosa, im-
pondo-se ao modo de ser administrativo, commercial e
industrial da população.
Foi baseado n'esta razão d'ordem que tratei de exa-
192
minar o processo por que se effectuava o serviço pos-
tal : deparou-se-me, não um estado cahotico, porque á
mingua de recursos o pessoal trabalhava com boa von-
tade consoante os limites estreitos das suas attribui-
ções, mas uma situação de pobreza deprimente á vista
de estrangeiros, e até ridicularisada pelos inglezes com
a ostentação do seu correio especial dentro do recinto
da concessão interna no Chinde, em exercício activo
com todos os seus attribútos, isto é, recepção de cor-
respondência geral do exterior directamente endere-
çada, expedição especial e independente, e venda de
estampilhas do correio inglez. Á luz dos factos bem
apreciados surge alguma culpabilidade a applicar-se
[>ela existência de uma anomalia de tal quilate, de
onga data tolerada (creio que tacitamente) em tão
importante serviço publico, que sendo um dos princi-
paes característicos de uma nacionalidade constituída
á face do direito das gentes, deve ser exercido por uma
forma legal e independente de interferências estrangei-
ras.
Considerando sob um aspecto geral, encontrei o ser-
viço do correio ligado ao telegraphico como repartição
Rublica annexa a esta ultima e sob a mesma direcção.
É este o único districto da província onde se encontra
esta accumulação de dois serviços egualmente de im-
portância primaria; e é de crer que este facto de fusão
obedecesse a um principio que se admitte perfeitamen-
te como racional, quando se considere apenas a econo-
mia útil que é traduzida pelas installações conjugadas,
pelo aproveitamento de alguns empregados telegraphi-
cos de reconhecida aptidão para o postal, isto é, elimi-
nação de despezas e reducção do funccionalismo ao
strictamente necessário ; mas a economia foi levada ao
excesso com a quasi ausência de pessoal propriamente
postal, principalmente nas estações principaes onde o
expediente abunda e onde grandes responsabilidades se
impõem.
Duas estações principaes existem em Quelimane e
Chinde, servindo os dois portos mais importantes do
districto. Operam como receptadoras e transmissoras
i 9 3
de toda a correspondência que afflue do exterior pelos
paquetes, e do interior pelas diversas estações telegra-
pho-postaes existentes. Na primeira, installada conve-
nientemente no edifício dos telegraphos, caminhou
sempre o serviço com regularidade e sem attritos,
posto que modestamente ; na segunda, pelo contrario,
pela situação do edifício em local bastante longe do
centro do movimento da villa e pelas suas más condi-
ções de installação, o publico nacional e estrangeiro
constantemente clamava contra as dificuldades de ex-
pediente, e quasi que menospresava o nosso correio
cm benefício da estação postal ingleza, collocada em
local mais convidativo.
Prendeu-me a attenção este estado de cousas e dili-
genciei fazer desapparecer o abuso intolerável da exis-
tência do correio inglez, facto contra o qual bradavam,
não só o interesse pecuniário da Fazenda, prejudicado
pela concorrência, como também a alta razão do pres-
tigio nacional.
Para esse fim julguei indispensável e inadiável, em
primeiro logar, a organisação do nosso correio em con-
dições de bem servir o geral da população. Para esse
fim mandei que pela repartição das ooras publicas fosse
apropriada uma pequena casa do Governo situada na
rqa marginal da villa próximo da Intendência do Go-
verno. Em pouco tempo abriu-se ahi uma estação pos-
tal, modesta mas conveniente, e dotada de pessoal idó-
neo para garantia do bom serviço. Tal advento contri-
buiu para reforçar a reclamação a fazer-se, pois se re-
bateu por essa forma um dos argumentos com que os
inglezes justificavam a existência do seu correio espe-
cial, o qual consistia no mau serviço e péssima instai*
lação do nosso.
Em seguida, conferenciando com o cônsul inglez no
Chinde, fiz-lhe ver a irregularidade que se estava dan-
do na concessão ingleza, levando-o em seguida á con-
vicção de que era necessário regularisar tão importante
serviço. Obtive então da mesma auctoridade consular,
Mr. Fletscher, a apresentação d'um modusvivendi, do
qual resultou, com diversas modificações por mim pro-
i3
194
Eostas, a suppressão do correio na concessão pela pro-
ibição absoluta da venda de estampilhas inglezas, fi-
cando a cargo do consulado apenas uma estação de
transito de correspondência para a Britsh Central
Africa, em franca communicação com a nossa estação
postal.
Este accordo foi depois confirmado pelo commissa-
rio britannico, residente em Zomba (capital da Africa
central ingleza), e representa uma victoria conseguida
sobre o uso illegal de um direito de soberania, que
nos tornava ridículos aos olhos dos estrangeiros, uso
que pelas auctoridades inglezas estava arreigado talvez
por uma confiança extrema na continuação da nossa
apathia.
Continuando no exame á forma porque se encontrou
o serviço postal direi ainda que o processo das expe-
dições das malas, além de moroso era de pouca con-
fiança para a segurança da correspondência, pois se
aproveitava a via terrestre em grande parte, e na
Zambeze irregularmente os transportes fluviaes, que
sendo estrangeiros na totalidade, era notória a má
vontade dos seus capitães na recepção e entrega de
malas portuguezas aos seus destinos. Este ultimo facto
é justificado pela ausência, por nosso lado, d'um subsi-
dio pecuniário egual ao que o Governo inglez paga ás
mesmas companhias de navegação, para se manter à
regularidade nas expedições da sua correspondência
postal.
Em harmonia pois com a ingente necessidade de se
remediar esta situação, decidi-me ao trabalho de elabo-
rar um regulamento para exercício no correio da Zam-
bezia, o qual julgo satisfaria ao fim utilitário da reor-
ganisação de tão importante serviço, beneficiando todo
o districto com as expedições das malas postaes em di-
versas direcções onde se entendeu necessário pelas cir-
cumstancias especiaes, e effectuando-se em correspon-
dência combinada com as auctoridades inglezas as per-
mutações nas fronteiras, obrigatórias para a manuten-
ção regular do serviço internacional.
O citado regulamento, cuja essência está em accordo
i 9 5
pleno com as intenções das auctoridades da África cen-
tral ingleza, em se effectuar um serviço combinado, e
do qual extracto no final d'este livro os seus principaes
artigos, tive ensejo de em fevereiro de 1901 o submet-
ter á consideração do Governo Geral da provincia.
Com o projecto em questão resulta um peaueno
augmento de despeza com o pessoal, que será de so-
bra resarcida pela grande receita advinda da maior
procura de estampilhas no Chinde com a suppressão
effectuada do correio inglez da concessão, e pelo ac-
crescimo resultante da emissão de vales postaes, facul-
dade que então só era dada a Quelimane e que re-
centemente (por minha proposta) se tornou extensiva
áquella localidade. Além d'isso ha a considerar ainda a
venda de estampilhas também em todas as outras es-
tações postaes creadas e por crear, cuja bem garantida
regularidade no serviço attrahirá a concorrência publi-
ca. Até á minha saida da Zambezia não foi dada solu-
ção ao citado trabalho.
Na secção respectiva á situação financeira foram con-
sideradas as receitas do serviço postal, e do quadro
apresentado no final concluir se-ha uma prosperidade,
que embora lenta é comtudo lisongeira.
CAPITULO VIII
Arsenal de Quelimane
Representa este estabelecimento fabril do Estado
um concurso continuado e de valor primacial para se
architectar a civilisação dos povos zambezianos, muito
predispostos, por suas propensões innatas, ás artes e
officios a que se dedicam com afan e gosto.
A sua installação não é muito remota : data de pouco
mais de uma dezena cTannos, e comtudo tem produzido
na classe puramente indígena artistas em todos os ra-
mos fabris, desde a carpinteria até á ferraria,' os quaes,
disseminados por todo o districto e emigrados para
outros, constituem bons auxiliares para o progresso
material das localidades onde applicam a sua actividade.
Tem havido da parte de quasi todos os meus an-
tecessores um interesse em desenvolver este estabele-
cimento, e com esse fim tem-se pouco a pouco conse-
guido melhoramentos materiaes com a acquisição de
utensílios mechanicos para os diversos misteres. Na
minha curta administração tive opportunidade de fazer
installar um bom motor e respectiva caldeira, uma ma-
china de serrar vigas, uma omcina de fundição de fer-
ig8
ro, um torno mechanico, elementos estes que contri-
buíram para o valor actual do estabelecimento, onde
manufacturas de obras importantes já levadas a cabo
com perfeição e relativa economia demonstram o seu
progresso. Estes factos ponderosos influem decerto em
consenso unanime á voz da natureza civilisadora, pro-
clamando a necessidade da existência de tal estabeleci-
mento, que tem actuado como pura escola de apren-
dizagem de indígenas.
Apezar dos bons auspícios que teem predominado no
arsenal de Quelimane, notei com magua que a admi-
nistração interna não correspondia á direcção technica,
confiadas ambas a um machinista naval de reconhecida
competência para esta ultima e com manifesta negação
para a contabilidade, que é um indispensável factor
Êara a organisação de qualquer estabelecimento fabril.
m resumo : prosperava o arsenal a olhos vistos, mas
de facto era impossível aquilatar do exame da escriptu-
ração do mesmo estabelecimento, em algarismos claros,
qual a grandeza d'essa prosperidade, isto pelo gravís-
simo erro de não ser moldada a uma impeccavel regu-
laridade a referida escripturação.
Começava a irregularidade existente pela falta abso-
luta de inventários do material, que se sabia abundar
em profusão, ao que dei prompto remédio nomeando
uma commissão em novembro de 1900 para proceder
com toda a urgência a tão importante serviço ; e tão
sollicitamente se houve a mesma commissão que em
janeiro de 1901 apresentava um inventario de todo o
estabelecimento, tendo devidamente avaliados os ma-
teriaes diversos n'uma totalidade de cerca de cem con-
tos de réis.
Procedi immediatamente á organisação do serviço
interno, destacando um official do exercito do reino
para dirigir a escripturação geral do estabelecimento,
tendo como ajudantes dois sargentos. Com o fim de se
definir uma orientação, formulei umas instrucções (que
vão annexas), em que se determinaram claramente os
processos a seguir para uma regularidade na escriptu-
ração, tanto da caixa como do material. Tive como único
i 9 9
fim introduzir a ordem onde não a havia, em conse-
quência dos factos apontados anteriormente ; para esse
fim confiei-me a administração superior do estabeleci-
mento, e quem attentar devidamente nos diversos ar-
tigos das instrucções por mim promulgadas, inferirá
<Telies, de facto, o exercício de uma fiscalisação a toda
a prova exercida directamente pelo Governador, por
medida económica e sem grande desperdício de tempo ;
tal é a forma porque entendi dever proceder a bem do
serviço publico.
Um outro facto se conseguiu com a alteração no re-
gimen, para o qual chamo a attenção, e é o seguinte :
o orçamento provincial supprimiu a verba para paga-
mento de férias a operários; é obvio que faltando a
um estabelecimento de natureza fabril o seu principal
elemento constituído pelos obreiros, a sua existência é
uma pura apparencia, que ao interesse administrativo
convém tornar real.
A tabeliã orçamental, intitulando em certo artigo,
tArsenal de Quelimane,» e destinando-lhe verba para
ordenado de um director e de um fiel de armazém,
sancciona a existência do mesmo estabelecimento; e
por tal competia á fortiori a quem governava o dis-
tricto estudar e pôr em execução immediata o verda-
deiro processo, para que o estabelecimento não fosse
fechado, como consequência da ausência de verba para
pagamento das ferias aos operários.
As citadas instrucções providenciaram em prol da
continuação em exercício do promettedor arsenal de
Quelimane, sem gravame para o orçamento e para
a fazenda nacional. Assim, por meio de uma organi-
sação de contas de receita e despeza mensaes devi-
damente documentadas, regularisaaas e escripturadas
para cada fabrico, em que é notória' a descriminação
do material empregado, seu valor e quantidade, nume-
ro e qualidade de operários empregados n'elle, numero
de dias e horas de trabalho de cada operário para cada
obra, férias vencidas para execução da mesma, e final-
mente o seu custo total com as percentagens normaes
para beneficio do estabelecimento, foi àttingido o desi-
200
deratum de se manter a normalidade nos serviços fa-
bris a par d' um conhecimento positivo e immediato em
qualquer occasião das circumstancias em que elles gi-
ram.
E para se fazer uma idéa da prosperidade actual do
arsenal basta olhar para a tabeliã annexa, que apre-
senta um sommatorio das receitas de todas as obras
efFectuadas durante os doze mezes do anno civil de
1901, primeiro da acção do actual regimen. Pena é que
por carência absoluta de escripturação regular nos an-
nos anteriores seja impraticável uma comparação para
melhor se ajuizar da grandeza do progresso havido. O
que é um facto concludente é a vitalidade garantida
com elementos próprios, que permitte a manutenção
f)or administração directa do (íoverno, de um estabe-
ecimento fabril, ao qual está destinado largo futuro de
desenvolvimento, concumitante dos progressos da villa
onde está installado.
Por estes considerandos, alliados á razão de ordem
moral da instrucção proporcionavel ao colono em gran-
de escala, em seu beneficio e da civilisação geral do
districto, assiste aos poderes públicos o dever de con-
correr o mais possível com mais elementos que vão
melhorar as condições materiaes do arsenal, o que re-
presentará um impulso classificado de feliz tributo á
colonisação e civilisação local.
Posto isto, direi ainda, para conhecimento geral, que
n'este arsenal está definida a laboração das diversas
artes e officios em officinas distinctas ; assim existe um
edifício de alvenaria, interiormente repartido, onde á
vontade se trabalha em serraria mechanica, forja, torno
e fundição de latão. N'um barracão annexo está instai-
lada a officina de carpinteria a branco e de machado,
bem como um estaleiro, que tem produzido dezenas
de embarcações até 5o m de arqueação; no mesmo edi-
fício trabalha-se em marcenaria.
Iniciou-se a construcção de um outro edifício de al-
venaria para accommodar uma officina de fundição de
ferro, que \á está montada com todos os seus petrechos,
e mais outras dependências para de futuro serem oc-
201
cupadas pela officina de marcenaria, que está tenda
grande desenvolvimento, e para installação da reparti-
ção administrativa e te eh nica; mas infelizmente a falta
de recursos pecuniários existente nas obras publicas
decidiu a sua interrupção até que melhores tempos sur-
jam para ser completada uma construcção de tão grande
utilidade e para o que uma verba de 3:ooo#ooo réis
chegaria.
Afim de se attender á necessidade de haver um lo*
cal apropriado onde as embarcações, não só do Estado
como particulares, que em grande numero existem no
porto, podessem soffrer o fabrico em boas condições
de trabalho, fiz construir uma grade de reparações que
pôde comportar embarcações até vinte e cinco metros
de comprimento e de um metro de callado de agua»
Foi esse um melhoramento que foi immediatamente uti-
lisado pela lancha-canhoneira Pedro Annaya^ da esqua-
drilha do Zambeze, que procedeu ahi á collocação de
um fundo novo. A despeza effectuada com a grade foi
insignificante, pois o material empregado foi exclusiva-
mentemadeira da terra.
Para finalsar este capitulo direi ainda que se acham
empregados no estabelecimento cerca de cem operários
indígenas nos diversos misteres, aos quaes não escas-
seia o trabalho, que afflue tanto das diversas reparti-
ções do Estado como dos particulares, e este facto
basta ser enunciado para que se produza uma sym-
pathia pela causa do arsenal de Quelimane, que bem
merece dos poderes superiores.
CAPITULO IX
Secretaria militar
Está a cargo d'esta repartição todo o serviço de ex-
pediente que se refere a assumptos propriamente mili-
tares e marítimos, e a fiscalisação em todas as unida-
des e commandos militares do districto, para o que o
pessoal designado pela tabeliã orçamental satisfaz a to-
das as exigências de taes serviços.
Tratando dos elementos de defeza com que pôde
contar a auctoridade, direi que a força militar na Zam-
bezia compõe-se de três unidades, que são a 3.% 4.* e
5. a companhias de guerra da província. Esta força, se
tivesse completo o effectivo das três unidades, seria
bastante para a segurança e policia geral do districto,
mas as falhas em cada uma d'ellas são numerosas e a
deficiência da força publica constitue de facto um em-
baraço á administração.
As três unidades acham-se distribuídas pela seguinte
forma :
A 3. a companhia, servindo a região de Leste do dis-
tricto, comprehendendo a Maganja da Costa (sua sede)
204
e a região insubmissa do Lomué, tinha a menos no seu
effectivo 6o soldados, i3 cabos e 4 officiaes.
A 4.* companhia, com sede em Quelimane, policia
esta villa e fornece destacamentos para Milange e An-
gurus, no districto, e ainda para o forte D. Carlos, em
Napulo, no território do districto do Nyassa ; para o
seu effectivo completo faltavam 36 soldados, 6 cabos e
2 officiaes.
A 5. a companhia, com sede em Téte, policia esta
villa e distribue o seu pessoal por toda a região do alto
Zambeze, desde a Lupata até aos confins do Zumbo;
para o seu effectivo completo faltavam 67 soldados, 2
cabos e 2 officiaes.
Como se vê claramente faltava um total de i63 sol-
dados, 21 cabos e 8 officiaes, imprescindíveis na espe-
cial situação da Zambezia, com duas regiões extremas
ainda insubmissas e manifestando a sua rebeldia com
actos de sublevação amiudados.
A' 3. a companhia de guerra, pela sua situação a Leste,
compete lhe conservar a pacificação da Maganja da
Costa, região já de si extensa; e por meio de uma po-
licia efficaz exercida em postos militares impedir as in-
vasões dos rebeldes Lomués que seriam inevitáveis sem
a demonstração da força militar. Com esse intuito tive
ensejo de propor ao Governo Geral, em agosto de 1900,
a creação d'um posto militar em Mugeba, a qual foi
immediatamente approvada, pelo que se procedeu á
sua installação na referida localidade, que dista do lit-
toral 120 kilometros, e cuja situação sobranceira ás re-
giões circumvisinhas, sendo por tal um ponto estraté-
gico de primeira ordem, é alliada á grande proximi-
dade em que está da fronteira rebelde, constituindo
assim para estes uma ameaça viva que os tem contido
em respeito e até produzido novos adeptos á submis-
são. Este posto, com o do Bajone já anteriormente es-
tabelecido e o commando militar na antiga aringa da
Maganja da Costa, mantém a paz em toda a região
avassallada e contém em respeito ao longe a rebeldia.
A 4.* companhia, como disse, concorre com o seu
reduzido pessoal para a guarda dos valores do Estado
205
em Quelimane e para a policia d'esta villa; e além de
manter a pacificação na zona territorial que vae de Mi-
lange a Angurus, em situação geographica fronteiriça á
região ingleza da British Central Africa, por intermédio
dos dois commandos militares installados nos dois re-
feridos pontos, ainda contribue para occupação fora do
districto com pessoal e material de guerra, guarnecen-
do o forte D. Carlos, em Napulo, sendo assim com*
pletamente subsidiado por este Governo.
A' 5. a companhia, situada na região Oeste do dis-
tricto, é-lhe destinado também um papel importante,
concorrendo para a administração da vasta região do
alto Zambeze e para a sua pacificação, frequentes ve-
zes alterada pelas correrias dos povos ainda não avas-
sallados. Distpibue o seu pessoal pelos commandos mi-
litares : de Massangano, na margem direita do Zam-
beze, local da conquistada aringa do celebre Bonga;
de Chiranga, n'uma região encravada entre a fronteira
ingleza da Rhodesia por Oeste e por Leste o rio Lue-
nha, cujo curso define um limite dos territórios da com-
panhia de Moçambique nos confins do Barué; de Ca-
chomba, sito na margem direita do alto Zambeze a
montante das Cachoeiras ; do Zumbo na margem es-
querda do rio Aruangua, affluente do alto Zambeze; e
finalmente pela villa de Téte, sede do commando mili-
tar superior e possuindo um forte que é por seu turno
a sede da companhia de guerra.
Do papel de importância primaria que na Zambezia
compete ás forças militares é concludente a necessi-
dade, que se impõe á consideração superior, de se man-
terem sempre completos os efifectivos das três unidades
com pessoal escolhido para se evitarem deserções.
Reiterados pedidos d'esta natureza tive occasião de
sollicitar superiormente em diversas épocas transactas,
com o intuito de se melhorarem as circumstancias da
segurança territorial, pessoal e material dos bastos ele-
mentos que se agrupam na Zambezia ; não tive a feli-
cidade de encontrar apoio ás propostas effectuadas a
bem do serviço, o que é facilmente deduzivel do silen-
cio, para mim incomprehensivel, que por assim dizer
20Ó
correspondeu á espectativa de soluções ambicionadas.
Vou apresentar em resenha succinta o assumpto de
uma das propostas, affirmando de antemão que não tive
na occasião, e mesmo presentemente não tenho, inten-
ção nem veleidades de impor uma orthodoxia em ma •
teria já muito debatida e estudada por intelligencias
superiores ; apenas intentei suggerir uma idéa que se
me afigurava acceitavel.
Em novembro de 1900 apresentava o projecto de um
regulamento para organisação das forças irregulares da
Zambezia (annexo) e juntamente em nota de serviço
adduzia diversos argumentos que se me afiguravam de
molde a justificar a razão da organisação militar pro
jectada. N'essa conformidade dizia que a Zambezia,
necessitando ser policiada, occupada e fiscalisada de
uma maneira effectiva, encerrava em si elementos vas-
tos na sua população para se conseguir esse desidera-
tum, e que encontrandose na própria legislação dos
prazos da Coroa, cujo regimen vigora, base fundamen-
tal para uma organisação militar peculiar ao districto,
bastava apenas para esse fim produzi r-se n'aquella al-
gumas modificações adequadas á boa ordem e direcção
superior.
Assim propunha-se a eliminação das três actuaes
companhias de guerra e para sua substituição sete com-
panhias de cypaes, constituindo um corpo armado e
disciplinado com um total de 3:5oo cypaes, que se dis-
seminaria pelos diversos prazos, sem permanência assí-
dua, o que foi regulamentado por disposições especiaes
no projecto em questão. A obrigação em que ncavam
os arrendatários de sustentar os cypaes que se desta-
cassem para o seu prazo para policia da circumscripção
territorial, era uma economia importante para o Es-
tado, a qual de maneira alguma era pezada ao mesmo
arrendatário, porque este sempre tem fornecido alimen-
tação aos cypaes do seu prazo, não existindo por este
facto novo encargo.
Foi esta a organisação de forças irregulares que pro-
puz e em aue se attendia egualmente á instrucção mi-
litar reduzida ao strictamente necessário á guerra indi-
1
207
gena, única a recear rfestes territórios ; assim era defi-
nido um adestramento no uso da arma, para o que se
estabeleceriam carreiras de tiro ao alvo nas sedes das
companhias em que seria obrigatório um exercício an-
nual de todos os cypaes.
Assentou- se em diversos princípios para a confecção
do projecto, e foram elles: em primeiro logar o obviar-
se á relutância dos indígenas pelo serviço militar, não
os affastando dos centros onde se condensam as suas
palhotas e família, ou quando se affastassem d'elles que
não fosse para fora do districto afim de se garantir re 7
fpesso seguro; em segundo logar attrahil-os com uni-
ormes vistosos e commodos, boa alimentação, dispensa
do pagamento do mussôco; conceder-se gratificações
aos chefes das terras por cada cypae que fosse neces-
sário, além de um determinado numero, ou antes para
garantia da apresentação de um certo grupo sempre
que lhe fosse exigido ; finalmente aproveitar- se a situa-
ção geographica de alguns dos commandos militares já
creados para sede de companhias das forças irregula-
res e para effeitos da instrucção a ministrar.
Depois do que deixo exposto dir-se-ha talvez que se
poderiam organisar as actuaes companhias de guerra
pela mesma forma com contingentes do districto. Para
destruir essa asserção basta me enunciar os argumen-
tos de que o indígena da Zambezia gosta de ser cypae
e não soldado ; não lhe apraz viver em quartéis, mas
sim em bairros com edificações á moda do paiz, onde
possam ter as suas mulheres e filhos; sujeitam-se a to-
dos os exercícios e serviços propriamente de policia e
guerra indígena, mas querem a liberdade de viver ao
sabor da sua natureza; e esta a orientação dos inglezes
da British Central Africa e com ella conseguiram um
corpo de milhares de cypaes devidamente adestrados e
convenientemente disciplinados.
Para attender a outros serviços também importan-
tes, como a policia das villas do districto e fiscalisação
aduaneira, ambos os quaes deixam muito a desejar pela
deficiência do pessoal, já em qualidade, já em quanti-
dade, julguei necessário crear-se uma unidade de pri-
208
meira linha, com a designação de Corpo de Policia Fis-
cal da Zambezia, composto de ioo praças europêas
escolhidas, accumulando os dois serviços acima referi-
dos.
Determinava-se em consequência a suppressão, por
inútil, da actual classe de guardas fiscaes e conseguia-
se com a manutenção d'um núcleo de força europêa,
um sustentáculo á boa ordem e pacificação, que a sua
permanência garantiria, alem das vantagens que daria
o prestigio da sua presença e o incentivo que produzi-
ria nas forças irregulares. E' por esta forma que Ana-
liso a exposição do projecto.
Tratarei agora da forma porque é exercida a policia
nas três villas do districto: em Quelimane está a cargo
do município do concelho prover á segurança dos indi-
víduos e das cousas da villa, para o que o Governo
concorre com um subsidio annual de i:ooo$ooo réis,
além de fornecer pessoal, que, como anteriormente já
disse, é destacado da 4.* companhia de guerra. Postas
estas circumstancias está o municipio habilitado para
uma efficacia de serviços, tendo a sua policia de Que-
limane organisada com um effectivo de 40 homens, in-
cluindo dois sargentos e dois cabos, e commandada por
um official do exercito; e para attender á guarda e se-
gurança de todos os elementos da villa, tanto indivi-
duaes como materiaes, foram installados três postos de
policia em casas apropriadas e situadas em locaes con-
venientes para bem do serviço.
A villa de Quelimane, possuindo uma população eu-
ropêa relativamente importante e com tendências a au-
gmentar, tem jus a ser policiada por elementos indivi-
duaes mais consentâneos com a civilisação. Assim é
indispensável, para se manter o prestigio da raça branca
sobre a indígena, que exista na policia local elementos
da primeira raça para garantia da ordem geral, que só
com indígenas é difficil, se não impossível, manter na
classe europêa, naturalmente desobediente á imposição
de indivíduos de raça inferior. E' obvia pois a necessi-
209
dade que se impõe á consideração, de reorganisar a
policia, introduzindo-lhe pelo menos quinze elementos
europeus em substituição de egual numero de indíge-
nas; e assim ficaria o referido corpo dotado convenien-
temente para occorrer a todas as exigências locaes,
que devem contribuir para a manutenção da ordem
publica.
No Chinde ha a considerar actualmente para effeito
de policia um meio bastante differente do da capital do
districto, proveniente este facto especialmente da sua
população, composta da parte europêa cosmopolita abun-
dante que constantemente accorre, tanto para provi-
mento de bastantes casas commerciaes da localidade,
como para % os estabelecimentos da região ingleza da
Africa central.
Por esta forma, além de uma população fixa, tanto
europêa de diversas nacionalidades como indigena, existe
definido um augmento temporário n'ella, pela perma-
nência por alguns dias aguardando transporte para as
regiões inglezas e vindos d'estas para o exterior, de nu-
merosos indivíduos. E accrescendo a esse núcleo de eu-
ropeus volantes em continuidade os numerosos obrei-
ros da concessão ingleza, muitos oriundos de Zanzibar,
e que residindo nos terrenos da extra-concessão pro-
duzem também augmento temporário de população in-
digena, devem todos estes factos, pela continuidade de
evolução, ser levados em conta de uma média nume-
rosa para o censo geral e para effeitos de policia local.
N'um meio tão heterogéneo, e por tal susceptível de
bastas complicações, persiste ainda, para se attender á
segurança individual e á manutenção da ordem, uma
organisação policial, que embora consentânea na forma
é deficiente na quantidade de elementos, chegando ao
ponto de ser irrisória. Assim a tabeliã orçamental de-
termina para o Chinde um pessoal composto de dez
praças brancas e de dez indígenas, quadro que no
anno de i8g5 era suficiente, mas que nas circumstan-
cias actuaes já descriptas é de uma exiguidade mani-
festa.
Com o fim de ser em alguma cousa útil á causa da
«4
2 IO
promettedora villa do Chinde, tive occasião de, em se-
tembro de 1900, apresentar á consideração superior
uma proposta para se augmentar o quadro da policia
local ; assumpto que, se chegou ao conhecimento das
instancias superiores, não logrou obter solução.
Mais tarde, em março de 1901, formulei de novo
um quadro para a mesma policia, fixando em 23 o nu-
mero de praças europêas e em 20 o de indígenas, por
entender ser mais correspondente ás circumstancias lo-
caes este novo projecto ; parece que igual indifferença
teve também esta proposta.
No intuito porém de providenciar dentro dos acanha-
dos limites do orçamento, no sentido de se obter uma
melhoria no numérico do pessoal, auetorisei a admissão
na 4.* companhia de guerra de i5 cypaes escolhidos,
cujo vencimento sahia das sobras da mesma companhia,
provenientes das falhas no seu effectivo; e destinando
aquelles a engrossar o corpo de policia do Chinde fi-
cou elle em circumstancias mais favoráveis para se
manter a ordem na villa. A deficiência no pessoal eu-
ropeu foi-me impossível remediar, porque isso acarre-
teria grande augmento de despeza, que certamente não
seria sanecionado superiormente.
Afim de evidenciar o mais possível a necessidade da
existência de uma boa policia local, firmei a minha pro-
Eosta para a sua remodelação com um argumento de
astante peso e que deduzirei no decurso d'este capi-
tulo.
As lacunas que a nossa administração colonial, obe-
decendo por umas vezes ao espirito rudimentar da
economia e por outras á indifferença, tem deixado em
diversos serviços públicos de importância capital, des-
pertaram da parte das auetoridades consulares ingie-
zas (que se teem suecedido no Chinde desde a data
do convénio luso-britannico) o desejo de provei -as por
actos próprios. Ora os referidos actos teem tendido,
pela forma representativa adoptada no seu exercício, a
uma manifestação de soberania, imprópria sem duvida
do local de acção. A existência da estação postal (que
considerei. n'um capitulo anterior) era um d'esses
2 11
actos ; referirei agora outro de não menos importância
e que caminhava de mãos dadas com o primeiro : era
um corpo de policia ingleza em activo serviço na con-
cessão interna do Chinde, bem uniformisado e armado,
implantado ha alguns annos, supponho que sem aucto-
rísação expressa das nossas auctoridades, e mantido
como legal sem rebuço nem contestação.
Com esse estado de cousas deparei, quando em vi-
sita ao Chinde em setembro de 1900, notando com
pasmo a transformação de um terreno que fora conce-
dido para fins commerciaes, n'um quasi estado inde-
pendente.
As auctoridades inglezas não estavam dispostas a
estacionar ainda n'essa situação, que naturalmente se
lhes affigurava da maior legalidade possível ; e assim
uma proposta do commissario interino e cônsul geral
da Bntish Central Africa, o tenente coronel do exercito
inglez Manning, surgiu quasi na mesma epocha, afim
de que a sua policia da concessão interna podesse tam-
bém tornar-se extensiva ao terreno da extra-concessão,
2ue, como se sabe, atravessa inteiramente a villa do
Ihindé.
Representava a dita proposta nada menos do que
um estendal de acção policial ingleza na própria villa,
a qual foi rejeitada em absoluto como afirontosa á au-
ctoridade portugueza. A base da proposta era concebida
na deficiência da nossa policia, o que infelizmente era
um facto verdadeiro, mas não obstante entendi que de-
via ser rejeitada, porque a sua acceitação corresponde-
ria a declinar-se por nosso lado de todas as prerogati-
vas e attribuiçôes que competem á soberania portugueza
em território só portuguez. Tanto mais que a conces-
são externa, não podendo usufruir nenhumas immu-
nidades, nem convencionaes nem á face da razão, a re-
ferida proposta ia chocar-se por antagonismo com as
boas doutnnas do direito das gentes, que não permitte,
sob forma alguma, que qualquer nação intente subtra-
hir os seus súbditos á vigilância e protecção das leis e
auctoridades do paiz onde residem. E não só procedi
pela forma indicada repudiando a proposta de extensi-
212
bilidade da acção da policia da concessão interna,
como também fiz ver áquella auctoridade superior in-
gleza a illegalidade e anomalia da existência da mesma
policia armada e equipada.
O resultado colhido rfesta questão puramente diplo-
mática foi todo em beneficio das prerogativas da sobe-
rania portugueza, pois em fevereiro de 190 1 era orde-
nado pelo commissario da British Central Africa, Mr.
Sharpe, ao vice cônsul, no Chinde, o desarmamento
completo da policia ingleza da concessão interna, facto
este que demonstra uma satisfação dada pelo exercício
illegal durante bastante tempo de um direito que nunca
deveria ter sido tolerado; e encho-me de prazer por
ter tido a iniciativa e por ter por mim só pugnado para
que a nossa soberania affectada ficasse illibada.
Resta-nos agora o dever de manter no Chinde uma
policia á altura de fazer face a todos os encargos, com
pessoal idóneo e bastante para esse fim.
Em Téte a policia da villa é exercida por trinta cy-
pães, numero suficiente para as necessidades próprias
da localidade, que actualmente possue um meio bas-
tante restricto e^em as contingências a que arrasta o
cosmopolitismo da população, que não existe.
Foi necessário attender se a uma policia de outro gé-
nero, para a qual não chegavam os elementos da poli-
cia uroana; refiro- me ás estradas que servem de per-
curso ás caravanas commerciaes. O policiamento d'el-
las era sobremaneira exigente pela segurança affectada
dos diversos valores, que da extensa região das Mara*
vias e da região ingleza da North Charteland Company
affluem a Téte e vice-versa, e que teem por caminho
obrigado as referidas estf adas, que vão de Cachomba a
Téte, continuamente infestadas de ladrões indígenas da
raça Machinda, verdadeiros salteadores e assassinos.
Com o fim de occorrer á defeza do commercio, prin-
cipal fonte de riqueza d'esta região do alto Zambeze,
faltavam os elementos de força na 5. a companhia de
guerra, cujo reduzido effectivo mal chegava para se at-
tender convenientemente á guarnição dos commandos
militares, Massangano, Chiranga, Cachomba e Zum-
2\á
bo, que não devia ser descurada. N'essa conjunctura
auctorísei o alistamento de 56 cypaes na referida com-
panhia de guerra, especialmente destinados a acompa-
nharem, nas estradas referidas, os commerciantes e
seus valores, obstando- se assim aos latrocínios á mão
armada, que eram factos correntes.
Foi este um benefício que se entendeu conceder ao
commercio da região, do qual, tendo resultado a segu-
rança do transito, resultou tomarem maior affluencia
de mercadorias.
CAPITULO X
Capitania dos portos
Este ramo de serviço publico, instituído no anno de
1895, tem a seu cargo, como é intuitivo, todos os ser-
viços marítimos inherentes aos diversos portos, rios e
canaes navegáveis da Zambezia.
A organisação interna é especialisada por ser a sede
da capitania no porto do Chinde a cargo do Intendente
do Governo n'esta localidade, sendo por esse facto a
única repartição publica não installada em Quelimane,
capital do districto. Motivos de ordem económica pre-
sidiram necessariamente a esse modo de ser, que não
tem exemplo em nenhum outro districto d'esta provín-
cia, e que na situação actual julgo não se justificar pie*
namente, como adiante delinearei.
O pessoal superior, além do capitão dos portos, com-
põe-se : de um delegado em Quelimane, cargo que com-
pete ao commandante do navio de guerra ao serviço do
districto estacionado no mesmo porto, e que presente-
mente, por ausência d'este, está sendo desempenhado
pelo patrão-mór da barra; e de outro delegado no Te-
21 6
jungo, que é o commandante da lancha-canhoneira que
ahi está em serviço permanente.
Este ultimo porto foi aberto á navegação ha cerca
de dois annos, por ordem do Governo Geral da Pro-
víncia.
Para o cabal desempenho de todos os serviços na-
vaes inherentes a cada um dos portos accessiveis, aos
rios e canaes navegáveis que profusamente recortam a
região em diversas direcções, é notória a deficiência,
não só no pessoal inferior auctorísado pela tabeliã or-
çamental, como também no material naval existente.
Actualmente as exigências do commercio apenas
teem permittido a abertura de três portos, que por
ordem de importância são: Quelimane, Chinde e Te
jungo, dos quaes já se deu uma descripção na pri-
meira parte cTeste livro.
Um dos meus primeiros actos administrativos foi a
nomeação, em julho de 1900, de uma commissão de
officiaes da armada, então ao serviço do districto, para
proceder a uma balisagem no porto de Quelimane.
Àproveitaram-se os elementos materiaes de que se dis-
punha, os quaes, sendo sobremaneira exíguos, permitti-
ram comtudo, com a boa diligencia empregada pelos
referidos officiaes e com o auxilio da canhoneira Chai-
mUe, a collocaçãp de bóias onde a necessidade mais
recommendava a sua existência.
N'essa occasião foi amarrada fora do banco da barra
a bóia de espera do porto; orientaram-se conveniente-
mente as balisas do canal Militão e collocou-se uma
outra bóia dentro do porto para indicar a orla de um
banco, que era o attractivo de todos os navios que sa-
hiam sem piloto. Melhoraram-se assim muito as condi-
ções da navegação ; e mais não se poude então fazer,
estando-se, como se estava, á mingua de recursos, com
a falta sensível de bóias, amarras, ancoras, etc, acces-
sorios indispensáveis.
Com o fim de dotar o districto com um pequeno de-
posito de material de balisagem, instei com uma firma
commercial, a quem o meu antecessor no Governo já
o tinha encommendado, para apressar a sua remessa ;
%l 7
esta só muito tarde teve logar e não completamente,
em fins do anno de 1901, salientando-se ainda n'esta
occasião a falta de amarras e ancoras em numero suf-
ficiente para uma balisagem completa.
Ao Governo Geral também se requisitou por vezes
idêntico material, que á data da minha retirada da Zam-
bezia não foi satisfeita.
Quanto ao Chinde, tendo reconhecido pelo mau re-
sultado de balisagens anteriores, que o systema de bóias
é inconveniente para tal porto, cuja entrada é sujeita
aos caprichos das fortes correntes fluviaes e a outras
contingências, para as quaes não ha material fluctuante
que resista á sua acção destruidora, determinei ao ca-
pitão dos portos que procedesse a uma balisagem do
porto, empregando apenas balisas em terra, e amoví-
veis, para facilidade de rectificações futuras.
N'este mesmo porto se procedeu no anno de 1901 á
montagem de um posto semaphorico na costa do mar,
utilisando-se para esse fim uma armação de ferro, alta,
encimada por uma plataforma (que se achava erguida
dentro da villa, sem utilidade reconhecida), a qual fiz
transportar para o local indicado, d'onde a sua visibili-
dade permitte ser utilisado para recepção e transmissão
de signaes do e para o exterior. Foi esse serviço so-
bremaneira importante para a navegação e commercio,
o qual estava monopolisado por um pontão inglez fun-
deado no porto, que para esse fim se servia dos seus
mastros. Falta agora o complemento, que é uma liga-
ção por telephones com a sede da capitania dos por-
tos, apparelhos que foram requisitados superiormente
e nunca satisfeitos.
O porto do Tejungo serve as regiões Leste do dis-
tricto ; a margem esquerda do rio representa o termi-
nus onde a acção do Governo se exerce nos povos, por
ser ella problemática no interior da região, que conti-
nua dominada pelos Lomués.
Para esse porto, com o fim de facilitar a entrada da
barra, mandei collocar em terra, num morro denomi-
nado Febane, duas balisas altas, que dão o enfiamento
do eiç o da barra, e passada esta encontram-se enormes
2l8
fundos até ao ancoradouro, que é um pouco desabri-
gado dos ventos do sul.
Communica este porto com o de Masembe por um
canal de nome Murríade (Edugo), aue foi estudado
pela lancha-canhoneira ahi estacionada e que se reco-
nheceu ser navegável para lanchas que demandem até
4 pés d'agua. O porto do Masembe é da mesma natu-
reza do primeiro, apresentando exactamente as mesmas
condições de abrigo e navegabilidade.
A hydrographia do grande districto da Zambezia até
aos seus confins, explicada julgo que convenientemente
na primeira parte aeste livro, fornece a intuitiva de-
ducção : de que ao elemento liquido se deve a pacifi-
cação actual, bem como a manutenção do que n'este
sentido se conseguiu, em grande parte do território,
para bem da administração, e de que o mesmo ele-
mento nos proporciona ainda meios de concorrer efi-
cazmente com parte importante para uma occupação
geral. N'esta conformidade é de toda a justiça que os
serviços inherentes sejam melhorados, elevando-os a
uma altura consentânea ás circumstancias locaes, at-
tendendose á não homogeneidade no regimen- existente
dos serviços marítimos, em referencia ás zonas fluidas
de Quelimane e Chinde.
E' pois concludente a necessidade de uma remodela-
ção nos serviços marítimos da Zambezia, de maneira a
definir-se uma maior regularidade a exigir-se dò pes-
soal, a cujo cargo está tão importante ramo de serviço
publico.
Foi com o fim único de ser em alguma coisa útil á
causa administrativa, que em outubro de 1900 tive a
honra de submetter á apreciação do Governo Geral um
trabalho elaborado por uma commissão de officiaes da
armada, de que também fiz parte como presidente 1 ;
o qual, com o titulo de Regulamento Geral da Capi-
1 Os officiaes eram : o primeiro tenente Anthero do Nascimen-
to Trigo e os segundos tenentes Filippe de Paiva e Ernesto Vi-
lhena.
a i9
tanta dos Portos da Zambe\ia, foi destinado a substi-
tuir o deficiente e inapplicavel antigo Regulamento
Geral das Capitanias dos Portos de Moçambique, de
i8q3.
Notava-se n'este ultimo regulamento uma manifesta
omissão e controvérsia em algumas phases da sua con-
sulta, para resolução immediata de alguns factos marí-
timos e fluviaes vulgarmente occorrentes, pelo simples
motivo de elle ter sido elaborado para applicação dire-
cta no porto de Moçambique e bahias annexas, que
são portos marítimos em tudo e por tudo differentes
das circumstancias da Zambezia.
Para se encetar a confecção do novo regulamento
attendeu-se em primeiro logar á forma porque a natu-
reza distribuiu pela região os elementos marítimos e
fluviaes, segundo o regimen anteriormente descrípto; e
assim concertou se em dividir os portos da Zambezia
em dois grupos dissimilhantes pela sua organisação
interna, e necessitando por esse facto de formula espe-
cial nos direitos e deveres a exigirse e a cumprir-se.
Num grupo, pois, se condensaram os portos da Zam-
bezia não sujeitos ao regimen internacional, oriundo este
dos tratados e convenções officiaes, e n'outro grupo os
obrigados a esse regimen ; divisão esta que de ha mui-
to estava imperiosamente recommendada, pelas neces-
sidades diversas peculiares á essência de cada grupo
citado.
Postas estas considerações, accordou-se em que a
capitania dos portos da Zambezia tivesse a sua sede
em Quelimane, e abrangesse em jurisdicção directa to-
dos os portos comprehendidos no littoral que vae do
rio Tejungo ao Mahindo, em vista da connexão exis-
tente entre elles.
A singularidade, na separação, em que está o núcleo
de portos, rios e canaes indicado, em. relação com os
rios do sul (de que o Chinde é o principal), mercê da
falta de communicação accessivel pelo elemento liquido
entre aquelle e o Zambeze, justifica cabalmente o pro-
jecto elaborado.
O grupo formado pelos portos do Sul que ligam com
220
o Chinde farão parte de uma delegação ou outra capi-
tania com sede n'esse porto, e com regulamentos espe-
ciaes, a que obriga a forma administrativa sujeita ás
imposições da internacionalidade. E sendo a esse gru-
po, pela sua especialidade, inapplicavel regulamento
algum dos publicados até hoje, nem mesmo o presen-
te, necessário se torna que, a exemplo do que fizeram
as auctoridades inglezas em Chiromo, se formule tam-
bém um especial, descriminativo e do mesmo theor do
que elles já fizeram publicar e pôr em execução na sua
zona de acção no Zambeze.
A dependência em que, desde a creação da Inten-
dência no Chinde, estava d'este porto o de Quelitna-
ne, constituindo uma sua delegação, não se justifica
pelas razões retro expostas, acerescidas ainda pelo fa-
cto d'esse estado de cousas ir de encontro ao espirito
que preside em geral á formação das delegações, de-
vendo estas ser estabelecidas em portos de importân-
cia inferior e não superior, como é o caso presente. Na
mesma organisação dava- se uma anomalia, que não foi
prevista, e que se tem repetido por diversas vezes ; re-
firo-me ao facto de serem incumbidos (por disposição
legal) das delegações de Quelimane e Tejungo, os
commandantes mais antigos dos navios da armada ac-
cidentalmente ao serviço nos dois referidos portos, e
acontecer, por vezes, serem esses officiaes mais gra-
duados ou mais antigos do que o Intendente e capitão
dos portos, e por conseguinte verem-se na contingência
de receber ordens de serviço naval de um inferior.
Apresentada a justificação do trabalho elaborado,
passarei a expor a essência do projecto para se poder
aquilatar das suas vantagens presumíveis.
As attribuições inherentes ao cargo de capitão dos
portos da Zambezia vêem indicadas em capitulo espe-
cial do novo regulamento. 1 Suggere-se a sua aceumu-
1 O original do regulamento projectado deve existir na secre-
taria geral do Governo Geral da província de Moçambique, e um
exemplar foi recentemente entregue á direcção geral do ultra-
mar.
23 i
laçáo com o logar a crear-se de Inspector do arsenal
de Quelimane, recommendado pela importância actual
d'este estabelecimento do Estado, que é revelada pelo
incremento que nos últimos tempos elle tem tido em
material e em pessoal laborador, o que tudo demanda
já uma direcção superior intelligente.
Mais ao capitão dos portos incumbe o trabalho scien-
tifico de observações meteorológicas na região, capri-
chosa, como é, nas suas diversas evoluções atmospheri-
cas, o que convém prescrutar para conhecimento geral.
A utilisação económica, para serviço de tão subida im-
portância, do official da armada que desempenhar o
cargo referido, redundará em benefício geral, e inclu-
sive d'aquelles que empregam a sua actividade no des-
bravamento das terras pela agricultura.
Propõe-se pelo mesmo regulamento melhorar o ser-
viço, até hoje detestável, da transmissão para a villa
de Quelimane das occorrencias marítimas, que é effe-
ctuada actualmente pelo posto semaphorico de Tanga-
lane, por intermédio da linha telegrapHica, que bastas
vezes é tardia e pouco clara.
A melhoria consiste na montagem d'um posto sema-
Íioríco na villa, em correspondência directa com o de
angalane, por uma communicação telephonica a cargo
exclusivo da capitania; e por aquelle posto, que deverá
ser de altura conveniente, serão conhecedores os habi-
tantes da villa inteira, em pequeno intervallo de tem-
po, de todo o movimento marítimo. Deixará assim de
succeder o facto frequente de se annunciar, de Tanga-
lane, o apparecimento d'um navio ao longe e a rece-
pção do boletim respectivo em Quelimane coincidir exa-
ctamente com o fundear do mesmo no porto interior, o
que representa pelo menos três horas de atrazo de no-
ticias. Ora sendo estas de interesse grande para o
commercio e para as repartições publicas, deve-se ter
d'ellas conhecimento rápido. Como economia ter-se-hia
immediatamente a da suppressão da estação telegraphi-
ca de Tangalane, que nenhuma receita dá ao Estado, e
cuja despeza orça por 4530000 réis mensaes, e ainda
como accrescimo económico, a reducção do quadro de
boletineiros ao strictamente necessário ao serviço nor-
mal puramente telegraphico.
Considerado também o serviço de pilotagem, que n'es-
te porto, pelas dificuldades do seu ingresso, merece um
cuidado especial, o mesmo regulamento, confiando a
direcção da navegação a pilotos hábeis e bem conhece-
dores do seu mister, reduz- lhes o quadro respectivo ao
indispensável ás exigências do serviço naval. E assim
ficará elle constando apenas do patrão-mór e sota-
patrão-mór, que são também pilotos, e a quem, além
do serviço da sua especialidade, incumbe a responsabi-
lidade do exacto cumprimento das suas attribuições no
serviço do porto em geral. A reducção de um logar de
piloto constitue a economia a efifectuar-se.
As condições em que estas duas entidades deverão
ficar com respeito a vencimentos, para garantia da sua
permanência e para segurança do serviço de pilota-
gem, percebendo as importâncias devidas pelos navios
que affluem ao porto, collocal-os-ha em condições de
bem servir.
O vencimento correspondente ao piloto extincto ser-
virá para compensar em parte o augmento de pessoal
de cabos de mar, indispensáveis como fieis da execução
do regulamento no porto de Quelimane, que apresen-
tando de longa data bastante movimento nos seus cães
demanda a permanência d'essas auctoridades.
Finalmente, dos emolumentos cobráveis destina-se
parte como receita do Estado, para compensação das
despezas a effectuar com a balisagem do porto e sua
manutenção em effectivas condições de permanência.
Eis a summula da reorganisação que se promette
com o regulamento, especialmente destinado aos por-
tos da Zambezia do primeiro grupo.
Para o Chinde e mais boccas do Zambeze, presente-
mente, o exercício da auctoridade marítima está peiado
pela ausência completa de disposições, especialmente
coadunadas a poder-se fiscalisar a navegação n'uma
extensão fluvial enormíssima, que os rios Zambeze e
Chire apresentam. Para o referido elemento liquido, o
convénio luso-britannico determinou a forma de utilisa-
223
cão, pela liberdade que assiste aos navios de todas as
nações de navegarem n'elle sem retribuição alguma
por esse uso.
Os inglezes, no anno de 1900, formularam e poze-
ram em execução um regulamento com o titulo Ship-
ping regulations, destinado a fiscalisar a navegação
nas suas aguas territoriaes e ao mesmo tempo auferin-
do de cada embarcação usando bandeira ingleza, uma
taxa annual, variável de duas a quatro libras, a titulo
de registro.
Por consequência as embarcações que navegam no
Zambeze e Çhire, pertencentes a companhias inglezas,
acham-se já registadas e numeradas em virtude do ci-
tado regulamento.
Entendo pois que se deve imitar os inglezes n'essa
pratica, formulando sem demora, também a titulo de
retribuição por serviços prestados á navegação, taxas
annuaes sobre as embarcações que naveguem, partin-
do do porto do Chinde, qualquer que seja o systema e
bandeira.
CAPITULO XI
Esquadrilha de policia e fiscalisação
no rio Zambeze
E' incontestável a afirmativa de que a esquadrilha
do Zambeze, desde a sua organisação, tem desempe-
nhado ininterruptamente um papel importante, contri-
buindo, por uma forma sobremaneira honrosa, para a
manutenção da soberania portugueza e para uma pro-
tecção efficaz ao commercio geral. Tem ella pois con-
corrido para a elevação do prestigio nacional e para a
pacificação geral dos povos, pela presença dos seus di-
versos elementos constitutivos, que são as lanchas-ca-
nhoneiras commandadas por officiaes da armada e tri-
puladas por praças brancas, em zonas liquidas exten-
sas de dezenas de milhas, banhando territórios onde
anteriormente a rebeldia era um facto.
Sendo o território da Zambezia essencialmente re-
cortado por innumeras veias liquidas navegáveis que se
communicam entre si, é palpável a importância enorme
que tem para o modo de ser do districto, a existência da
esquadrilha em condições de ser eficazmente utilisada.
Para tal fim os materiaes devem corresponder ás ne-
22Ô
cessidades ingentes que dos encargos nascem, os quaes,
pela elevada concepção moral em que são tidos, preci-
sam de ser cumpridos com o desassombro e imponên-
cia a que tem jus a representação nacional, inherente a
cada um dos elementos navaes constituídos.
E' indubitável a sublimidade do sentimento altamente
patriótico, profundamente nobre, que guiou em feliz
impulso os poderes públicos á creação e organisação
d' esse núcleo de força naval, que infunde no indígena
o terror a par de respeito e que tem contribuído em
grande parte para a prosperidade actual da região. E
se alguém, que certamente ha, mal informado, pozer
em duvida a necessidade da existência da referida força
naval, pergunte- se lhe, a despeito da idéa que natural-
mente reputou feliz, o que será a Zambezia sem a es-
quadrilha? ou antes: quaes são os meios que empre-
gará, mais económicos e mais efficazes, para operar a
substituição de elementos tão positivos nas suas mani-
festações e tão rápidos na sua acção evolutiva ? Esse
alguém labora n'um erro crasso, que nem mesmo a
ignorância completa das circumstancias da Zambezia
desculpará; tão funestas serão as consequências advin-
douras.
Considero a esquadrilha um dos esteios de mais va-
lor que consolida a administração d'este vasto districto,
e julgo escusado encarecer mais os serviços prestados
por ella desde a sua instituição, porque são de sobra
conhecidos, e deve estar no animo de todos a convicção
de que as vantagens conseguidas são-lhe devidas em
grande parte.
Postos estes considerandos resta- me pugnar para que
os poderes superiores attendam ás circumstancias pre-
cárias em que se acha presentemente o material da es-
auadrilha, quasi decrépito por um labutar constante
urante doze annos em serviços aturados, já em de-
monstração de soberania, já utilisado em transportes
de pessoal e material do Estado.
Tive occasião de expor superiormente, por duas ve-
zes, uma em dezembro de 1900 e outra em fins de
1901, o estado de conservação de cada uma das lan-
227
chas-canhoneiras, apresentando simultaneamente os al-
vitres que me pareceram mais razoáveis para uma me-
lhoria nas suas condições geraes, a par da possível
economia nas despezas a enectuar-se. Foi em parte at-
tendida a minha proposta, pois se acham em construo-
ção pela industria particular nacional duas lanchas-ca-
nhoneiras para o Zambeze.
Actualmente a esquadrilha é constituída por sete
lanchas-canhoneiras, de nomes Cuama, Chertm, Gra-
nada, Obu\, 'Pedro Annaya, Chuabo e Diogo Cão.
As quatro primeiras estão em serviço nos rios Zam-
beze e Chire, attendendo á policia e físcalisação cTestes
rios. A Cuama acha-se no estado de completo desarma-
mento, por ter sido reconhecida por uma commissão de
vistoria a sua innavegabilidade, em attenção á sua decre-
pitude e a despeza a fazer-se com o seu fabrico ser enor-
me, correspondendo quasi á acquisição de uma lancha
nova. A Cherim, do mesmo typo e dimensões da pri-
meira, calando dois pés d'agua, movida a rodas á popa
e armada com um canhão-revolver HH Z*]™** e duas
metralhadoras Nordenfelt 1 1"™, vae caminhando para o
mesmo estado limite. A Granada e a Obu\, de typo
mais pequeno do que as duas primeiras, movidas a ro-
das lateraes e armadas também com um canhão-revol-
ver HH 37 mm , estão em regulares condições de conser-
vação.
A quinta e sexta lanchas estão ao serviço dos rios de
Quelimane, nos quaes exercem também a policia e fís-
calisação. A Pedro Annaya soffreu no anno passado
importante fabrico no fundo, consistindo na substituição
completa das chapas nas obras vivas ; operação a que
se procedeu no arsenal de Quelimane. Depois de con-
cluído taf concerto ficou como nova, em vista do bom
estado de conservação do restante material. Esta lan-
cha, do typo da Granada, mais aperfeiçoada na ma-
china e caldeira, é movida também a rodas lateraes, e
armada com uma peça HH de tiro rápido de 37 mm de
calibre e uma metralhadora Nordenfelt de n"". A
Chuabo está soffrendo fabrico na caldeira, findo o qual
ficará também em bom estado para o serviço; é de
228
typo muito mais pequeno, movida a hélice, e armada
com uma metralhadora Nordenfelt de n"".
Finalmente a sétima, Diogo Cão, está destacada nos
rios Tejungo e Masembe, onde mantém a pacificação dos
povos marginaes ; é do mesmo typo da Pedro Annaya
e como ella offerecida ao Governo pela benemérita com-
missão da subscripção nacional ; o seu estado de con-
servação é regular, tendo soffrido ultimamente impor-
tante fabrico no fundo e achando-se actualmente em es-
tado de navegabilidade.
Como se conclue da descripção anterior, o estado de
conservação do material empregado nos rios Zambeze
e Chire é notavelmente precário ; e é para elle que cha-
mei a attenção dos poderes superiores em diversas oc-
casiões, afim de se evitar que n'um futuro muito próximo
cesse a representação nacional nos referidos rios. Pelo
regimen politico imperante nas suas aguas navegáveis,
é exigente uma effectividade de demonstração soberana,
para que o respeito á bandeira portugueza prepondere
como até aqui tem succedido.
Aproveito a occasião para expender de novo a opi-
nião, que entendo como mais racional, para uma regu-
laridade impeccavel na policia e fiscalisação de todo o
Zambeze, incluindo o alto Zambeze para montante das
cachoeiras de Cabora-bassa, onde a acção do Governo,
que nunca se fez sentir eficazmente, é reclamada pela
rebeldia existente nos povos marginaes.
Para o baixo Zambeze bastam em serviço effectivo
três lanchas-canhoneiras, devidamente armadas e tripu-
ladas e commandadas por officiaes da armada. Para
tal fim é urgente a acquisição, por emquanto, de duas
lanchas novas do typo da ingleza Mosquito, para subs-
tituir a Cherim e Cuama, que, como disse, estão con-
demnadas; ficar* se- ha assim habilitado em melhores
condições de representação nacional e para se attender
eficazmente aos serviços especiaes.
Para o alto Zambeze^ a occupação definitiva dos ter-
ritórios banhados e servidos pelas suas aguas reclamam
outra lancha-canhoneira, do mesmo typo Mosquito, ar-
tilhada com duas peças de tiro rápido e duas metralha-
229
doras e calando um pé e meio d'agua o máximo ; a
caldeira deve ser do systema de tubos d' agua, para
maior facilidade de transporte pela via terrestre, desde
Chicocômo, termo da navegação do Zambeze a juzante
das cachoeiras, até Cachombe, inicio da zona liquida
navegável a montante d'aquelles obstáculos.
O restante material existente actualmente satisfaz ás
necessidades da administração publica nas zonas em
que estão empregadas em serviço effectivo.
Como verdadeira dependência da esquadrilha, exis-
tiam no Sombo (principal estação do prazo Luabo sita
na margtem direita do rio Chinde) as officinas de repa-
ração das canhoneiras fluviaes, tendo como annexo um
plano inclinado.
Tendo sido resolvida superiormente a transferencia
das indicadas installações para o Chinele, tive o prazer
de ter conseguido durante a minha permanência na
Zambezia tal realisação, sem augmento de despeza
para a fazenda nacional, além da auetorisada pela ta-
beliã orçamental.
Tal facto permittiu o proporcionar- se um grande me-
lhoramento para a villa do Chinde, determinando um
acerescimo na sua importância, sobretudo proveniente
da existência do plano inclinado, onde qualquer embar-
cação poderá ser reparada com o auxilio das officinas
regularmente montadas.
CAPITULO XII
Justiça
A administração da justiça n'este districto, em que
se pleiteiam ambições pessoaes em geral oppostas entre
si ; em que as propriedades constituídas são em grande
numero, e em que o censo accusa um crescendo impor-
tante em todas as classes sociaes, é bastante trabalhosa,
tanto no eivei como no criminal.
Comtudo raras vezes suecede o facto de haver em
exercício na Zambezia um juiz de direito e um dele-
gado do ministério publico ; pois é frequente estar na
posse da vara judicial um substituto e da delegacia um
interino; o que, afora a boa vontade e reconhecido zelo
patenteado nos últimos tempos por alguns substitutos
do juizado, tem sido de incontestável prejuízo ao exer-
cício de poder tão importante em comarca tão vasta.
Abstenho-me de fallar da forma intrínseca por que
presentemente é administrada a justiça, porque estando
a vara judicial confiada a funecionarios de competência
profissional, deve existir por esse caso uma garantia
segura para a applicação integral dos princípios de re-
ctidão, consoante a legislação vigente, ao julgamento
das varias causas occorrentes.
232
Vou porém considerar a essência da legislação, por-
que é exactamente em virtude d'esta que a adminis-
tração da justiça sobre os indígenas, segundo as morosas
e complicadas formalidades do processo commum em
acção nos tribunaes, deixa muito a desejar ; e as ra-
zões adduziveis para tal affirmativa são obvias e con-
cludentes da attribuição aos colonos africanos de todos
os direitos civis e politicos, garantias e liberdades, que
o código constitucional portuguez consigna aos indiví-
duos.
Labora-se n'um circulo vicioso, provocado pelas pró-
prias leis sociaes ; e tendendo estas, necessariamente, a
captar para os povos em contacto uma homogenica
communidade no bem estar, é indispensável, para tal
se conseguir sem obstáculos, que a legislação mire o
estado de civilisação, Índole, necessidades e costumes
dos povos para quem aquellas são promulgadas. Assim,
considerado o estado de semi-selvageria do indígena da
Zambezia, é concludente a necessidade da existência de
um código especial para a administração da justiça em
taes elementos de raça, que, pelas suas qualidades de
rudeza, ignorância e humildade, devem ser sempre tu-
telados; e pela incapacidade quasi absoluta que se lhes
reconhece em geral para um proceder segundo as nor-
mas da civilisação, deveria a liberdade individual ser
correspondente ao grau da educação adquirida.
Observe-se o indígena africano no seu existir, e no-
tar-se-ha que vive tfum estado tal, que mesmo quando
em contacto com os elementos civilisadores das villas
e cidades não perde a feição característica cafre, e con-
serva-se arreigado aos seus usos e costumes, que estão a
maior parte das vezes em manifesta incompatibilidade
com o modo de ser civil, numa fácil mutabilidade na
residência de local para local, desapparecendo por ve-
zes sem deixar vestígios da sua passagem quando não
possue propriedade fixa que garante a sua permanên-
cia, e sempre dotado de uma apathia fatalista á prova
de todas as inclemências fortuitas ou occasionaes a que
possa ser sujeito. Conclusão : por todas estas particula-
ridades é impossível admittir-se á face da razão, que o
233
indígena africano, em regra, esteja apto para gosar de
todos os direitos, immunidades e franquias que a
constituição portugueza consigna aos seus povos.
Pesando bem estas considerações e accrescendo ainda
a ellas, que o effeito moral das penas é tanto maior,
quanto mais Ínfimo fôr o intervallo de tempo entre
o delicto e a punição, principalmente nos indivíduos
incultos, é obvia a necessidade de que tanto no eivei
como no criminal, applicado aos indígenas africanos,
haja o emprego de processos o mais summarios e rá-
pidos possível, afim de que a acção da justiça não só
possa attingil-os, como lhes possa produzir effeitos
correccionaes.
E' necessário finalmente moldar-se a legislação ao
meio inculto, semi-selvagem, em que vegetam os indí-
genas ; não quero bem dizer com isto que se produza
alteração na lei penal, applicando aos indígenas outras
penas mais corporaes; o que é recommendavel é a
substituição dos processos morosos por processos prá-
ticos, para que se evite o facto de com um insignificante
delicto, como por exemplo um roubo pequeno, um fe-
rimento sem importância, factos occorrentes diariamen-
te, se seguirem os mesmos tramites que num crime de
grande vulto, castigando por sua vez os empregados
da justiça que nem o custo do trabalho recebem.
Alem do exposto, ha ainda na organisação judicial
muito a considerar, mas falta-me a competência para
desenvolver assumpto que não é da minha especiali-
dade.
CAPITULO XIII
Culto religioso
O culto da religião do Estado encontra-se diffundido
pelas três villas do districto por uma forma regular e
consentânea com as condições materiaes que residem
nas referidas localidades. Em Quelimane existe uma
egreja parochial em edifício de alvenaria, tendo como
padroeira Nossa Senhora do Livramento ; celebram-se
ali os officios divinos e todas as festas religiosas. A
pompa é compatível com os recursos da confraria, que
sob o mesmo titulo da padroeira citada está legalmente
constituída na referida villa.
Em Téte houve em certos tempos também uma
egreja, que actualmente jaz em ruínas quasi por com-
pleto, restando apenas a frontaria como cjue a clamar
pela sua reconstrucção ; á falta de edifício próprio os
officios divinos são celebrados em uma casa pertencente
ao Estado.
No Chinde só muito recentemente foi augmentado
ao seu funccionalismo um parodio, que por ausência
absoluta de egreja ou capella na localidade, limíta-se
236
a resar missa aos domingos e dias santificados no edi-
fício da Intendência do Governo.
Julgo pelo exposto estar perfeitamente definida a for-
ma porque n'este districto se exerce o culto religioso,
sendo notória a falta de edifícios apropriados nas duas
localidades, Téte e Chinde, onde a religião possa ser
representada condignamente. E sendo as egrejas os
verdadeiros monumentos symbolicos que attrahem os
povos ás manifestações da fé religiosa, e que represen-
tam uma glorificação permanente ao fundamento da
religião que celebram, são estes argumentos de bastante
peso para que os poderes superiores sanccionassem
com a sua approvação as propostas por mim feitas de
se construírem nas duas referidas villas os edifícios em
questão, propostas que não foram attendidas.
A propaganda religiosa ganhará adeptos com a exis-
tência de egrejas ou capellas, nas localidades onde o
indígena africano está já um pouco polido e acceita de
boamente as celebrações do culto, embora as suas
crenças sejam ainda tíbias e vacillantes ; e á população
civilisada europêa faculta se-lhe com a presença dos
templos o não esquecimento da religião catholica.
CAPITULO XIV
Gamaras municipaes
O espirito municipal, na sua verdadeira concepção,
define a energia popular que pelas diversas phases da
sua applicação ao desenvolvimento das localidades re-
presenta um vivo affecto dos habitantes aborígenes ou
adventícios á terra em que se fixaram.
E' indispensável pois, para se determinar uma tal
coexistência entre a acção e o espirito do povo, que
1>arte d'este seja culto, e achando-se ligado á terra pe-
os seus interesses próprios, comprenenda a necessi-
dade de tomar a peito o seu explendor e a sua prospe-
ridade.
Crearam-se para esses fins as instituições camará-
rias, que infelizmente n'esta parte da Africa não teem
produzido effeitos salutares tão grandes como seria
para desejar- se.
A razão d'este facto está em que a communidade de
interesses, n'uma população cuja maior parte (adven-
tícia de diversas origens) se compõe de funccionarios
públicos, commerciantes de diversas nacionalidades, e
existem apenas ligadas á terra as raças indígenas quasi
238
incultas ainda, é uma pura ficção, quando se deseja
2ue os munícipes concorram para o bem das localida-
es onde residem pela força das circumstancias ; pois
que todos os elementos validos d'esse núcleo de popu-
lação teem um único fito, que se resume no sentimento
egoista dos seus próprios interesses, os quaes desejam
ver realisados no minimo tempo para que o regresso á
metrópole d'origem não se faça aemorar.
Comtudo, não obstante a grande falta de elementos,
a instituição camarária na Zambezia apresenta algumas
tradições de longa data, principalmente em Quelimane ;
mas o pouco que existe feito de reconhecida utilidade
foi executado ha muito tempo, sendo quasi nullo o pro-
gresso havido nos últimos doze annos. A causa d'este
estado de paralysação está na não existência da base
moral, indicada anteriormente, para se determinar um
incentivo que excite a prosperidade local.
Talvez a única solução ao problema do progresso
das villas fosse confiar a administração municipal a uma
commissão da presidência do Governador; esse facto
teria vantagens certamente, porque a referida entidade,
tendo por acrisolado interesse e dever a consecução
de melhorias, havia forçosamente de timbrar na crea-
ção de receitas para applicação a benefícios locaes, e
por conseguinte dos munícipes. Mas estando, como
está, o Governador sobrecarregado com a administra-
ção de todos os serviços públicos, mal lhe sobraria o
tempo para cuidar de mais um, que por sua natureza
precisa de uma attenção especial.
Feitas estas considerações vou indicar a forma por-
que está organisada a administração municipal nas três
villas do districto da Zambezia :
Em Quelimane está instituída uma commissão muni-
cipal composta de três membros ; em Téte houve em
tempos outra commissão municipal, que foi dissolvida
e substituída por uma edilidade a cargo da primeira
auctoridade local ; no Chinde succedeu o mesmo.
As receitas actuaes do município são de quatro fon-
tes apenas : licenças de casas de venda, multas por in-
fracções de posturas, imposto sobre contribuições di-
23g
rectas do Estado e percentagem sobre o mussôco. Vê-
se pois que a receita total não é abundante, mas outras
se poderiam obter, como por .exemplo um imposto so-
bre a bebida fermentada denominada a <sura,t que se
vende baratíssima, embebedando o preto por pequena
quantia ; novas posturas sobre licenças ; impostos sobre
as contribuições industriaes, etc.,e com este accrescimo,
que seria importante, auxiliado ainda com um pequeno
empréstimo, conseguir-se-hiam elementos para occorrer
a innumeras obras de inadiável urgência, como aterros,
macadamisação das ruas, construcção de um mercado,
valias de esgoto para saneamento das villas, etc.
A cargo do município de Quelimane está, como já
anteriormente expuz, a policia urbana, composta de
quarenta praças de uma das companhias de guerra, sob
o commando de um official do exercito ultramarino. O
Governo, subsidiando annualmente a camará com um
conto de réis, concorre assim com grande auxilio para
habilital-a a desempenhar se d'esse importante en-
cargo.
Por disposições legaes de longa data estão também a
cargo das camarás municipaes os cemitérios e os en-
terramentos.
N'este districto tem havido uma certa atteirção pelo
sentimento de respeito aos mortos, havendo nas três
villas cemitérios com o espaço necessário ás necessi-
dades locaes. Em Quelimane, por minha intervenção
auxiliar, está a camará procedendo á construcção de um
novo cemitério em condições correspondentes ao actual
desenvolvimento da população, porque o antigo, deno-
minado da «Saudade», está já dentro do âmbito da
villa e alem d'isso acha-se replecto. E' esse um melho-
ramento incontestável de grande alcance e que se deve
á iniciativa da commissão municipal que geriu no anno
de 1901 ; e o novo cemitério, não só pela sua grande
área como também pela sua situação fora da villa, está
em proporção com a importância da localidade que
serve.
A viação na área municipal de Quelimane teve um
grande melhoramento com a concessão feita á compa-
240
nbia da Zambezia no anno de iqoi para construir
uma via-ferrea, systema Decauville. Essa linha ser-
ve as principaes ruas d'aauella viila e estabelece com-
municação directa e rápida com a margem direita do
rio Makuze, no sitio denominado Maquival, n'um per-
curso de 28 kilometros em estrada direita.
No Chinde, não obstante os fracos recursos da edi-
lidade, bastante se tem trabalhado no sentido de me-
lhorar o mais possivel as condições do transito pessoal,
fazendo-se arruamentos bem alinhados e arbonsados o
melhor possivel, abrindo-se uma estrada da villa para
a contra-costa, e produzindo-se nivelamentos no terreno
da villa, cuja natureza movediça necessita constante-
mente d'estes trabalhos. Para tal se conseguir concor-
reu bastante a actividade desenvolvida pelo intendente,
o 2. tenente da armada Pinto Cardoso.
Em Téte a ausência quasi absoluta de receitas não
permittiu a execução de obras de utilidade, comtudo,
conseguiu-se a conclusão do cemitério da villa, que ficou
em boas condições.
CAPITULO XV
Delimitações — Fronteira»
— Concessão do Nyassa— Isenção
de direitos aduaneiros
Um serviço importante a pôr em pratica na Zambe-
zia é o das delimitações das diversas circumscripçÕes
administrativas. Obvia-se com a sua execução, ás con-
tinuadas questiúnculas entre os arrendatários limitro-
phes, provocadas pela cobrança do mussôco nos povos
indígenas habitando as zonas divisórias, e deixa de ser
incommodada a auctorídade local que despende o seu
tempo precioso em pacientemente levar á conciliação
os queixosos das invasões, sendo estas muitas vezes
mutuas.
Ora determinando a lei dos prazos de 1890 que se
montasse na Zambezia um serviço de agrimensura para
se proceder ás delimitações entre as referidas circums-
cripçÕes territoriaes, essa clausula tem sido letra morta,
o que tem dado logar a aue também se feche os olhos
aos conciliábulos particulares entre os diversos arren-
datários acerca dos limites de exploração respectivos.
Em outubro de 1000 fiz ver este estado de cousas ao
Governo Geral da Província, apresentando simultanea-
mente algumas propostas tendentes a iniciar-se a execu-
16
24*
ção de tal serviço, de inadiável urgência. Não fui atten-
dido. E' provável que com a recente creação da Com-
missão das terras, com todos os seus elementos acces-
sorios, se possam effectuar as demarcações dos prazos,
com o que muito ganhará a administração territorial.
Com respeito á linha de fronteira com a Gran-Breta-
nha, parte d'ella tem sido demarcada em diversos tem-
pos por commissarios especiaes nomeados pelo go-
verno da metrópole; de forma que presentemente está
ella traçada, desde a costa do lago Nyassa até Chi-
lomo e desde a Angonia até á margem direita do rio
Chire, em frente da povoação portugueza de Chiuanga.
Durante a minha permanência á testa do governo
do districto, foi effectuada pelos officiaes da armada,
primeiro tenente Gago Coutinho e segundo tenente
conde da Ponte, a demarcação da fronteira entre a
Zambezia e a Africa central ingleza, desde o forte Me-
lingeni 4 , continuando para o sul pela linha divisória
das aguas do Chire e Zambeze, passando pelos mon-
tes pnncipaes M'vale, Sangano, Aipangula, Tambani,
de. altitudes entre 1:400 e 1:900 metros; prosegue de-
pois desde o ultimo monte, para a planície entre Chi-
kuaua e Téte, de uma altitude máxima de 3oo metros,
a qual é atravessada pela linha teleeraphica ingleza
que do forte Salisbury vae ao lago Nyassa. Essa pla-
nície continua até ás alturas de Cnilomo, em frente do
qual surgem os montes Matundo, formando uma crista,
que, desde a linha divisória das aguas na fronteira, se
eleva até um máximo de 1:000 metros sobranceiro a
Port-Herald (na margem direita do Chire), e vae mor-
rer junto ao Zambeze, na Mutarara.
No decurso d'esse trabalho apenas surgiu uma única
divergência entre os commissarios dos dois Governos,
provocada pela descoberta do rio N'Dinde, cujas aguas
correm para o Ziu-Ziu, que é parte integrante do Zam-
1 Posto inglezna fronteira e a i5 kilometros de distancia appro-
ximada do posto portuguez Mikosa-kosa, sede da residência da
Angonia.
24 3
beze e não do Chire. Essa questão está sendo resol-
vida diplomaticamente na Europa entre os dois Gover-
nos.
A extensão delimitada pelos indicados officiaes orça
por uns 3oo kilometros, assignalados em geral por
meio de marcos provisórios de pedra solta; excepto na
ultima parte, que é o parallelo que passa por Chiuanga
e que vae d'aqui aos montes, onde se ergueram pila-
res de alvenaria. Este serviço importante foi effe-
ctuado nos mezes de outubro, novembro e princípios
de dezembro de 1900. E além dos trabalhos indicados,
levados a cabo, com a costumada proficiência e activi-
dade dos encarregados especiaes já citados, foi levan-
tado pelo tenente Gago Coutinho, com o auxilio de uma
lancha-canhoneira da esquadrilha do Zambeze, uma
carta do Chire e Ziu-Ziu e parte do curso médio do
Zambeze, de grande valor e merecimento para a geo-
graphia de zona tão importante.
Um outro trabalho se realisou no mesmo período de
tempo e pelos coesmos elementos officiaes. Foi a de-
marcação e medição da concessão portugueza na costa
do lago Nyassa, em território inglez, da mesma natu-
reza e para os mesmos fins da concessão ingleza do
Chinde, o que é derivado da letra da convenção luzo-
britannica.
O terreno medido pelo commissario portuguez, em
cumprimento exacto das ordens do Governo da metró-
pole com respeito á sua posição local entre o rio Mlin-
gosi e a povoação Tchipoza, apresenta 400 metros de
praia por 25o metros de fundo, e está situada na costa
oeste do lago em latitude sul de i3° 58'.
Algumas considerações são necessárias para uma ver-
dadeira elucidação, acerca do que as circumstancias
locaes possam proporcionar de útil ou prejudicial para a
causa do emphiteuta, que é a nação portugueza.
Esta parte da costa do lago, onde foi medido o ter-
reno, é muito baixa, apresentando só uns três metros
acima do nivel médio actual; o solo é arenoso e por
»44
tal idêntico ao da concessão interna do Chinde, cons-
tando que ha alguns annos esteve toda a zona coberta
de agua por extravasamento do lago.
Tem ella a única vantagem de ser atravessada pelo
rio Mlingosi, que forma um pequeno porto interior que
poderá servir de abrigo a batelões e a pequenos vapo-
res durante a estação má do lago, isto é, durante a
monção de Sudoeste.
De resto, o seu merecimento encarado pelo lado da
utilisação para fins commerciaes, isto é, como entre-
posto, é quasi nullo, como provarei, pela sua situação
geographica em relação com as regiões portuguezas,
para as quaes deveria uma concessão no lago ser de
fácil e viável aproveitamento.
Essa concessão, segundo a lettra da convenção, não
é mais do que o effeito d'uma reciprocidade, em com-
pensação do terreno aforado do Cninde, estando bem
explicito que o usofructo para fins de descarga, arma-
zenagem e baldeação de mercadorias, deve ser egual
para ambos os emphiteutas nos terrenos respectivos.
Ora a margem do Chinde foi escolhida pelos ingle-
zes pelas facilidades advindas da navegação geral, que a
situação local proporcionava ao transito de mercadorias :
por consequência, devendo haver reciprocidade de be-
nefícios, era justo que nos assistisse o direito de esco-
lhermos na costa do lago um local que satisfizesse a
idênticas condições da concessão do Chinde, com res-
peito á facilidade de communicações com o mar para
uma liberdade garantida no transito de mercadorias.
Examinando bem a situação da concessão portugueza
no braço sudoeste entre o rio Mlingosi e a povoação
Tchipoza, deduzir-se-ha : que o local é assaz longe da
região portugueza especialmente destinada a servir (a
qual tem por limite natural para Oeste a linha das
160 milhas da costa oriental do lago, onde existe um
bom porto, de nome Mtengula 1 ), e não só isso, mas
também trará grandes dificuldades a vencer para uma
1 É o melhor porto de toda a cesta do lago Nyassa.
«45
serventia da via fluvial, que é o Chirc até Matope, e
depois Chikuaua (via Blantyre), trajecto de saida para
o mar, mais livre de imposições soberanas de outrem»
Pôr taes factos as mercadorias ver-se-bão na dura
contingência de terem de atravessar o território inglez
desde a concessão até Dedza por caminhos impossíveis,
e cfeste ponto servirem-se das estradas carreteiras aber-
tas, ou para Fort-Johnston ou para Chikuaua por Fort-
Melengeni, ficando assim sujeitas ao Transtt regula-
thns ahi em vigor, com o que ficarão deveras onera-
das.
Considerando agora o local da concessão em relação
com as regiões da Angonia e das Maravias, notar-se«
ha que estas colhem melhor vantagem da utilisaçao
do no Zambeze por intermédio das vias terrestres já
abertas ha muito tempo, embora ainda imperfeitas;
sendo preferível ao transito commercial próprio tal sa-
bida, a ter de se servir da concessão do lago por um
desvio manifestamente contraproducente aos interesses
económicos. Como explicação direi, que o transito para
o local da concessão (considerando a Angonia por ser
a região mais próxima d'ella), far-se-hia muito dificul-
tosamente em consequência da differença brusca de ai*
titude entre o planalto da Angonia e o terreno margi-
nal do lago Nyassa, estando o primeiro a i5oo metros
e o segundo a Soo metros, não existindo ainda estrada
aberta, fazendo-se o caminho ao longo da praia do lago
até aos montes Dedza, e effectuando se depois uma su-
bida n'este monte, excessivamente Íngreme e quasi im-
praticável.
O resto do trajecto é fácil de concluir ; resaltando
da simples inspecção da carta geographica a excessiva
morosidade que soffreria o transito de mercadorias com
a duração da navegação no lago até alcançar a barra
do Chire.
Sem duvida, deve-se affirmar que uma concessão no
lago Nyassa só é de grande utilidade para o território
da margem portugueza, mas pára esse fim deve ella
satisfazer ás mesmas condições e fins da concessão in-
gleza do Chinde, isto é, permittir facilidades no des-
246
embarque, armazenagem e transbordo de mercadorias
a ella destinadas e cTella provenientes, o que infeliz-
mente não succede.
Sendo pois de nulla utilidade a concessão no local
em que que foi medida, deve-se, attendendo ás conve-
niências do commercio portuguez, pugnar por uma
transferencia para Fort-Johnston, situação sobrema-
neira mais vantajosa para se estabelecerem as commu-
nicações com a margem oriental do lago.
Para Analisar o assumpto direi ainda ser indispensá-
vel o completar-se a delimitação da fronteira da Zam-
bezia na parte que vae da Angonia ao Zumbo pelo
Norte e creste ultimo ponto até ao Mazóe pelo Sul,
abrangendo as Maravias.
Apresentarei por fim uma causa que no inicio da
minha administração tive de considerar, para bem da
justiça e equidade.
Refiro- me á importação no porto do Chinde, das lan-
chas destinadas á navegação fluvial do Zambeze, que
desembarcavam em peças e quartelladas, para serem
armadas em terra firme.
Como as nossas pautas aduaneiras, com o fim de
estimularem a construcção naval nacional (o que nunca
se conseguiu), impunham elevados direitos, á razão de
12 °/o ad polarenty á importação dos barcos estran-
geiros, os inglezes, ampliando subrepticiamente as ga-
rantias da concessão do Chinde, ha dez annos que se
eximiam ao pagamento dos citados direitos, desembar-
cando os materiaes no terreno concedido, armando ahi
os vapores e lançando-os depois ao rio, para exercerem
navegação livre, sob bandeira ingleza.
De forma que resultava uma flagrante desigualdade
para os importadores portuguezes de idênticas lanchas,
que tendo de armal-as fora do terreno da concessão,
eram onerados os materiaes respectivos com os pesa-
dos direitos alfandegários, em contraposição com a
e&ualdade de trafico a que se destinavam. Levei ao co-
nhecimento da auctoridade superior da província, em
M7
julho e novembro de 1900, a exposta anomalia existente,
sollicitando a sua intervenção para que se regularisasse,
com actos equitativos, sem dúbias interpretações, e
sem subterfúgios, a legislação vigente.
Propuz a isenção de direitos ás embarcações nacio-
naes ou estrangeiras importadas no Zambeze, pois con-
siderava como um dever do paiz proteger os interesses
dos nacionaes ; alem de que não julgava justo que se
onerassem estes com exigências de que os estrangeiros
estavam immunes.
D'esta minha proposta resultava também que, a par
da grande vantagem que para os interesses materíaes
dos importadores nacionaes provinha da acquisição dos
vapores, havia para o paiz o ascendente moral de ficar-
mos possuindo marinha mercante encarregada do tra-
fico cio Zambeze e Chire, o que nos serviria de valioso
auxilio para o nosso prestigio, porquanto d'esta forma
a bandeira portugueza seria vista mais frequentemente
pelo indígena e em maior numero de barcos do que a
mgleza.
Felizmente a minha exposição foi coroada de êxito,
pois o decreto de 24 de agosto de 1901 attendeu á jus-
tiça e equidade, regularisando de vez os direitos dos
importadores.
ANNEXOS
Decreto dó 11 de agosto de 1900
Attendendo ás circumstancias que concorrem no pri-
meiro tenente da Armada José Dionísio Carneiro de
Sousa e Faro, Hei por bem Nomeal-o para o cargo de
Governador do Districto da Zambezia, etc. . .
Decreto de 31 de março de 1902
Exonerado do cargo de Governador do Districto da
Zambezia o primeiro tenente da Armada José Dionísio
Carneiro de Sousa e Faro, tendo servido com zelo e
intelligencia.
a53
Desenvolvimento da rede telegrtplilea do ílstrtcto
da Zambezia até 81 de dezembro de 1901
Linha da faUnam ao Cklidi
Quelimane a Inhassunge (1* -fio)
Inhassunge a Micahune
Micahune a Sombo.
Sombo a Chinde (apoio em postes de
ferro)
Total de kilometros. . . .
Unha da fiuellmane a Teta
Quelimane a Inhassunge (2.° fio)
Inhassunge a Mugurrumba
Mugurrumba a Vicente
Vicente a Chimuara (apoio em postes de
ferro)
Chimuara a Villa Bocage (idem)
Villa Bocage a Mutarara (idem)
Mutarara a Sinjal
Sinial a Ankoasi *
Ankoasi a Bandar -
Bandar a Téte (b)
Total de kilometros*. .-
Linha de Quelimane a lUanga
Quelimane a Inhassunge (3.° fio)
Inhassunge a Mugurrumba (I o fio) ... •
Mugurrumba a Vicente (idem)
Vicente a Chimuara (idem)
Chimuara a Villa Bocage (idem)
Villa Bocage a Netumbe
Netumbe a Chilomo (c) (parte apoia em
postes de ferro)
Chilomo a Chindio (a)
Chindio a Milange
Total de kilometros
A transportar.
24,480
40,000
80,000
11,300
14,180
57,157
63,341
41,460
37,100
38,000
69,311
63,413
48,600
100,331
14,180
57,157
63,342
41,460
37,100
15,000
84,250
57,102
56,158
135,480
542,995
445,849
1:124,314
15 4
Transporte.
Linha de Quelimane ao Bajone
Quelimane a Maquival
Maquival a Macuze (a)
Macuze a Lycungo (a)
Lycungo á Maganja da Costa.
Aíaganja da Costa a Bajone. . .
Total de kilometros.
Linha de Téte ao Zumbo
Téte ao Chicocômo
Chicocômo a Borunde (Cafuca) .
Borunde a ChicÔa
Chicôa a Zumbo
Total de kilometros.
Unha para Picos Namnll, pelo Bortr
Maquival a Villa Cândida (Nameduro) (a)
Villa Cândida a Nhamacurra
Total de kilometros.
Unha directa de Téte a Yllla Bocage
Téte a Massangano
Massangano a Bandar. . .
Mutarara a Villa Bocage.
Total de kilometros.
Ramal
Quelimane a Tangalane
A transportar.
27,800
15*516
27,345
48,560
67,998
63,985
50,334
54,000
160,000
10,117
23,500
44,400
57.720
38,000
1:124,324
187,219
328,319
33,617
140,120
18,450
1:832,049
»55
TrãruvoriBm .....
1:832:049
Linha directa do Chlnde a Tieeite
Chinde a Sombo (2.° fio)
21,300
58,000
41,600
Sombo a Nhamgombe.
Nhamgombe a Vicente
Total de kilometros
120,900
Total dos kilometros de linhas em explo-
ração no anno de 1902 , T ,,.,,-- T - » t . -
1:952,949
395,420
Extensão de linhas construídas que teem
sido apeadas por ordem superior
Extensão de linhas construídas de 1890 a
1902
2:348,359
(a) Estações fechada» por falta de empregados.
(ò) Téte eitá em commnnicaçio com Umtili e Blantyre pela linha transcontinental.
(«) Ghilomo está em eommnnicacao com Blantyre pela linha transcontinental qae liga
á nossa estacão.
Extensão das linhas do disíricto em exploração,
em 1900 (kilometros) r.566
Extensão das linhas em toda a província de An-
gola, em 1900 , 1:616
Differença da província de Angola para o dis-
tricto da Zambezia 5o
»56
TikUi das cittegorias tu úaotMirlos di repartição
dos tele^raphos di Zimbezii e do Chlre
Categoria*
Bciitott*
i i de janeiro
de «6t
tegonrto
deli
de ferereiro
S
n
i
!
s
3
Director
!•• constructor
2.° »
3.»
Chefie .de secretaria e estatística. .--*<.- .,
Chefe da contabilidade e pagadoria
Amanuense de i.» classe
Ditos de 2.*
Fiel do deposito
Ajudante do fiel
l." officiaes
2. 00 officiaes. ....... ^ -•-. — .. .
i. M Aspirantes
J.~ » - *j
Aspirantes auxiliares^. ......
Praticantes
Guarda-fios chefes .. . .
<3trarda-fios de l. â classe.. . . *..~
Ditos • %.• »
Guardas ajudantes . . .;
Co ntinu o
Alumnos
Serventes
Boletineiros. •
Somma.
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1
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158
188
(a) Chefes de circamscripçSo.
Regulamento dos correios do districto
da Zambezia
«7
Dos estabelecimentos postaes
e seu pessoal
Artigo i.° Todas as repartições postaes do districto
serão administradas directamente por conta do gover-
no, estando todos os encarregados ímmediatamente su-
bordinados ao director e aos seus delegados.
Art. 5.° O districto da Zambezia divide-se em cinco
circumscripções postaes com sedes em Quelimane, Chin-
de, Mutarara, Cnilomo e Téte, sendo as estações des-
tes pontos consideradas príncipaes.
Art. 6.° São consideradas secundarias as estações
postaes estabelecidas em Vicente, Maquival, Maganja
da Costa, Villa Bocage, Milange, Anguros, Chicôa,
Zumbo, etc.
§ único. Poderão ser estabelecidas outras estações
secundarias nos pontos onde o governo do districto en-
tenda necessário.
Art. 7«° A área das circumscripções postaes será:
i.* Quelimane, Maquival até ao limite N. do districto.
2. a Chinde, Micahune, Inhamgombe, Vicente, Inhas-
sunge, Sombo.
2ÔO
3. a Mutarara, Villa Bocage, Chimuara até Bandar.
4 # a Chilomo, Netumbe, Milange, Anguros, até ao li-
mite do districto com o território inglez.
5. a Téte, Bandar, Boroma, até ao Zumbo.
Art. 8.° Nos pontos onde houver estações telegra-
phicas servirão estas de estações postaes, e nas locali-
dades onde não houver aquellas repartições, serão o
commandante militar ou a auctoridade administrativa
os incumbidos de tal serviço, recebendo instrucções da
direcção por intermédio dos respectivos chefes da cir-
cumscripção a que pertençam.
Art. 9° Os chefes das circumscripções postaes serão
os das circumscripções telegraphicas estabelecidas nos
pontos mencionados no artigo 5.° d'este regulamento.
Art. io.° As estações postaes principaes terão o se-
guinte possoal :
i . a Quelimane : i chefe da estação, que será o da te-
legraphica.
i amanuense de i. a classe.
i amanuense de 2. a classe.
i carteiro.
i servente.
2. a Chinde : i chefe de estação (o da circumscripção).
i amanuense de i. a classe.
i carteiro.
i servente.
3. a Mutarara : i chefe de estação (o da telegraphica).
4, a Chilomo : i chefe de estação (idem).
5.* Téte : i chefe de estação (idem).
Art. 1 1 .° Pertencerá aos chefes das circumscripções :
i.° Ter sempre em dia a escripturação.
2.° Prestar contas mensalmente á fazenda por inter-
médio da direcção, pela forma que determinar a inspec-
ção de fazenda provincial.
3.° Requisitar em tempo á fazenda, por intermédio
da direcção, as estampilhas e outras formulas de fran-
quia necessárias para fornecimento das estações pos-
taes da sua área, de forma que em todas as estações
haja sempre um deposito correspondente a três mezes.
4. Tomar contas aos chefes das estações da sua cir-
2ÔI
cumscripção, fiscalisar as receitas e exigir o cumpri-
mento aos regulamentos e instrucções em vigor sobre o
serviço.
5.° Propor ao director quaesquer providencias que
se julguem conducentes ao bom desempenho do ser-
viço.
6.° Dar inteiro cumprimento ao presente regulamento
e á legislação em vigor.
Art. i2.° Os chefes das estações postaes estão de-
baixo das ordens dos chefes de circumscripção, cum-
prindo-lhes :
i.° Desempenhar todo o serviço postal em harmonia
com este regulamento, legislação em vigor e instruc-
ções dimanadas dos seus chefes.
2.° Ter sempre em dia toda a escripturação pela for-
ma que superiormente lhe for determinada.
3.° Ter a seu cargo a venda de estampilhas e outras
formulas de franquia.
4. Prestar mensalmente contas ao chefe da circums-
cripção, dos fundos á sua responsabilidade.
5.° Expedir a correspondência acompanhada de fa-
cturas e de contas de aviso quando fôr registada.
6.° Abrir as malas, conferir as facturas e cartas de
aviso e fazer distribuir a correspondência com a máxima
promptidão.
7. Propor ao seu chefe qualquer melhoramento que
entenda conveniente introduzir no serviço.
8.° Fazer pessoalmente os registos da correspondên-
cia.
§ i.° Nas estações principaes de Quelimane e Chin-
de, serão os chefes coadjuvados pelos demais empre-
gados, e a venda de estampilhas será feita pelo ama-
nuense, que prestará contas ao chefe, diariamente, sendo
este o responsável pelos fundos para com o respectivo
chefe da circumscripção.
Art. i3.° Os carteiros coadjuvam os empregados da
estação no serviço de apartagem e carimbagem da cor-
respondência e fazem a distribuição pela forma que lhe
fôr ordenada.
Art. 14. Os serventes teem a seu cargo a limpeza
2Ó2
das estações, desempenhando quaesquer serviços ex-
ternos que lhe forem ordenados.
Expedição de malas
Art. i5.° De cada uma das sedes das circumscripções
postaes serão expedidas malas regulares para todas as
estações nos dias e horas marcadas na tabeliã junta que
faz parte d'este regulamento, podendo essa tabeliã ser
alterada pelo governo sempre que as necessidades do
serviço assim o exijam.
Art. i6.° Será organisada uma corporação de esta-
fetas escolhidos d'entre os cypaes e de numero fixo para
cada circumscripção postal e com distinctivo especial
para cada uma.
Art. 17. Os estafetas de cada circumscripção postal
serão distribuídos pelas estações secundarias, por for-
ma a manter- se regularmente a permutação de corres-
pondência.
Art. 18. Os estafetas irão sempre armados e muni-
ciados, marchando sempre em grupos de dois, pelo
menos, embora a mala a transportar seja de diminuto
peso, afim de se auxiliarem e vigiarem mutuamente no
serviço.
Art. 19. A expedição de malas para o exterior do
districto íar-se-ha exclusivamente pelos correios de Que-
limane e Chinde. Para esse fim todas as estações inte-
riores remetterão toda a correspondência com o referido
destino, em mala separada, mas dentro do sacco da
correspondência (para formar um só volume) destinada
a qualquer d'aquellas estações.
Art. 2o.° As estações onde houver telegrapho accu-
sarão telegraphicamente a recepção de malas á estação
ou estações de proveniência.
Art. 21. A conducção de malas do Chinde para as
linhas de Chilomo e Tete, ou vice- versa, será feita ex-
clusivamente pela via fluvial.
*63
§ único. Na epocha das seccas dos rios Zambeze e
Chire, em que os vapores fluviaes só podem attingir
Villa Bocage no Chire, serão as malas conduzidas
d'estes pontos, por terra, para Chilomo ou Téte.
Art. 22. Sempre que as estações expeçam malas
pelos vapores fluviaes, deverão avisar immediatamente
pelo telegrapho, em circular, as estações do destino,
mencionando o nome do vapor e o numero de saccos
que remetteram para cada estação.
Art. 23.° A conducção de malas para Téte, via ter-
restre, será feita por duas vias: Mutarara-Ankoasi-
Bandar, ou então Chilomo-Chiromo, percorrendo em
seguida o território inglez até Chikuaua, ao encontro
ahi dos estafetas de Téte.
Art. 24. Alem das malas obrigatórias, segundo a ta-
beliã junta, as estações farão expedir a correspondência
que tiverem pelos vapores que navegam no Zambeze
e Chire, tanto nacionaes como extrangeiros, fechando
malas extraordinárias e fazendo logo o aviso de que
trata o n.° 22.
Art. 25. a A expedição de malas para os diversos
pontos do rio Zambeze e Chire, e estações interiores
3ue com estes communiquem, terá sempre como ponto
e partida a estação do Chinde, para onde deve ser
enviada, via Micahune, toda a correspondência de
Quelimane com esse destino.
Art. 26. A expedição de malas para a Africa cen-
tral ingleza e lago Nyassa, será feita por intermédio
das estações de Chilomo e Téte. Sendo pela primeira,
haverá duas vias a seguir : Milange, com permutação
em Zomba (território inglez) ou permutação em Chiromo
(território inglez), na margem direita do Ruo. Sendo
Íela segunda, seguirá de Téte por via Makanga e Chi-
uaua (território inglez) para permutação n'este ponto.
Art. 27. A expedição de malas para a Rhodezia
far-se-ha pela estação de Téte, e via Chiranga, com
permutação em Forte Salisbury.
Art. 28.* A expedição de malas para o território da
companhia de Moçambique será feita, ou por via marí-
tima, partindo de Quelimane ou Chinde, ou por via ter-
264
restre seguindo a Mutarara e d'ahi embocando para
Sena.
Art. 29.° A expedição de malas para o território da
companhia do Nyassa far-se-ha, ou pela estação prin-
cipal de Quelimane, via Nhamacurra (Namuli), ou por
Chilomo, via Milange (Napulo).
Art. 3o.° A expedição ae malas para o território do
districto de Moçambique far-se-ha pela estação princi-
pal de Quelimane, via Maganja-Ligonia a Angoche.
Art. 3i.° O paiz da Angonia, com uma residência em
Mikosokosa, servir-se-ha do correio de Chilomo-Chiro-
mo até Chikuaua, ou do de Téte-Makanga até ao
mesmo ponto.
Art. 32.° A conducção de todas as outras malas será
sempre feita por estafetas de estação para estação.
Art. 33.° A correspondência para a Europa, via Lon-
dres, será enviada pelas estações de Quelimane e Chinde
ao correio de Lourenço Marques, em maços' especiaes
para os diversos paizes, para maior rapidez e economia
de tempo.
Art. 34. A conducção da correspondência, seja de
aje natureza for, d'umas para outras terras, é da ex-
usiva competência do correio. Não se comprehende
n'esta disposição quaesquer manuscriptos ou impressos,
que, não sendo fechados como cartas, podem ser livre-
mente conduzidos por qualquer pessoa extranha ao
correio.
§ único. As pessoas porém que pretenderem conduzir
de uns para outros pontos, cartas, papeis fechados como
cartas, ou processos judiciaes, será isso permittido, com-
tanto que franqueando por meio de estampilhas essas
cartas, processos ou papeis, as apresentem na estação
do correio do ponto d onde partirem, afim de serem
inutilisadas e impressas as competentes marcas do
correio. Não se exceptuam d'estas obrigações as cartas
abertas.
Art. 35.° As pessoas que conduzirem alguns dos
objectos mencionados nos artigos antecedentes, sem
haverem satisfeito da sua parte ao que ali se determina,
ficam sujeitas á multa do sextuplo dos respectivos por-
265
tes, devendo os mesmos objectos ser-lhes apprehendi-
dos e levados á estação do correio mais próxima, para
serem porteados e remettidos ao seu destino.
Permutação de fundos
Art. 36.° A permutação de fundos com o conti-
nente do reino e ilhas adjacentes, por meio de vales,
será desempenhada pelos correios de Quelimane e Chin-
de, podendo comtudo ser aberta a este serviço qual-
quer outra estação principal do districto, quando assim
seja preciso e o governo o determinar.
Art. 37. Poderá ser estabelecida em algumas ou em
todas as circumscripçóes postaes, o serviço interno de
permutação de fundos por meio de vales do correio ou
vales telegraphicos, dentro do districto, logo que se
reconheça a necessidade e conveniência d'um tal ser-
viço e o governo o determinar.
§ único. O serviço de permutação de fundos de que
tratam os artigos antecedentes, será regulado pelo de-
creto de 19 de outubro de 1900, e os vales telegraphi-
cos pelo capitulo i.°, titulo 4. , do regulamento para o
serviço dos correios, approvado por decreto de 10 de
dezembro de 1892.
Art. 38.° O serviço de emissão de vales para o con-
tinente do reino e ilhas adjacentes será desempenhado
em Quelimane e Chinde pela repartição dos correios e
pelo empregado que o governo designar dentro do pes-
soal da direcção.
Art. 39. O serviço interno de permutação de fundos
por intermédio de vales do correio ou telegraphicos
será desempenhado pelos respectivos chefes de cir-
cumscripção.
Art. 40. Os funccionarios encarregados da emissão
de vales do correio, tanto externos como internos, serão
responsáveis para com a fazenda pelos fundos á sua
guarda e pelo bom desempenho d'esse serviço.
266
Disposições geraes
Artigo 41. Em todas as estações postaes haverá es-
tampilhas á venda e outras formulas de franquia, de-
vendo aquellas possuir todos os livros, carimbos, im-
pressos, mobília e aprestos necessários para a execução
do serviço, em conformidade com o regulamento geral
approvado por decreto de 10 de dezembro de 1892, em
vigor no ultramar. Estes artigos serão fornecidos pela
direcção.
Art. 42. Em todas as estações haverá malas de
transporte de correspondência, que serão feitas de lona
encerada, com o nome da estação e da circumscripção
postal a que pertencerem, pintados n'uma das faces.
A bocca dos saccos deverá ser fechada com tranqueta
e cadeado de lettras, ou por meio de sêllo de chumbo
comprimido applicado a uma tampa da mesma lona,
disposta de maneira a evitar a entrada da agua da chuva.
Art. 43. Em todas as estações principaes e nas se-
cundarias em que for reconhecida a necessidade haverá
armários com cacifos numerados e munidos de fecha-
duras differentes para correspondência apartada.
§ único. Estes cacifos serão alugados aos particula-
res mediante o pagamento adiantado de 4#5oo réis
por anno.
Art. 44. Em cada estação haverá um livro de re-
gisto do movimento de malas expedidas, recebidas e
em transito, e um copiador de facturas de malas expe-
didas.
Art. 45. ° As malas serão sempre acompanhadas da
respectiva factura, onde conste toda a correspondência
e sua qualidade, devidamente assignada e datada pelo
chefe da estação.
§ único. As facturas terão numeração especial segui-
da para cada ponto de destino e serão archivadas por
sua ordem, em maços separados, depois de conferidos
pela estação que as recebe, que deverá pôr-lhe no alto
a marca do dia da recepção.
267
Art. 46. ° O horário para todos os serviços será
cumprido pelo pessoal, tendo de responder rigorosa-
mente todo o empregado pelas faltas que se derem
quando não communicadas em tempo competente, ou
não justificadas pelos chefes.
Art. 47. ° As repartições do correio estarão abertas
todos os dias não santificados desde as dez horas da
manhã até ás 4 da tarde, e nos dias de chegada ou ex-
pedição e distribuição, comtanto que esta se possa con-
cluir até á meia noite ; do contrario será a correspon-
dência impreterivelmente distribuída no dia seguinte,
ao romper do sol.
§ único. O horário de todos os serviços pôde ser al-
terado pelo governador quando as exigências do ser-
viço assim o reclamem.
Art. 48. ° A estatística do correio deverá ser feita de
accordo com a convenção postal universal de Was-
hington e em conformidade com as instrucções dadas
pela direcção.
269
Happt do moiimento commerclal e rendimento haiido
ia delegtçto aduaneira de Qnellmane
e soas postos de despacho nos imos de 1891 a 1896
Quelimane
incluindo
os postos
Cninde
Total
(Valores
1891]
(Direitos
1.207:3234987
138:9264236
3:1994500
2354340
1.210:5234487
139:1614576
(Valores
1892]
(Direitos
1.153:6794668
129:8464253
1:1164000
2764309
1.154:7954668
130:0924562
1893
Valores
Direitos
887:4014339
144:2594720
19:3274280
6:8024139
906:7284619
151:0614859
[Valores.......
1894
(Direitos
1.079:4254751
149:8684406
117:8024303
12:2104059
1.197:2284054
162:0784465
1895
Valores
Direitos
1.033:4284159
187:8324835
169:7884409
31:6774093
1.203:2164568
219:5094928
1896
Valores
Direitos
846:7284331
146:3524489
299:4374772
41:8374270
1.146:1664103
188:1894759
V]0
Hippi do movimento commercial e rendimento
e sees postos de despacho
Continuação do
1897
1898
I Valores
Qnelinane
Chinde
Mopêa
2.065:0374065
129:224*940
1.149:644*974
38:010*667
-*-
'Direitos
i Valores
-*-
1.365:237*277
133:853*975
390.364*455
44:141*049
-*-
Direitos
-*-
1899
v aiores ••••••••••••■•
Direitos
1.176:112*020
121:089*429
1:267:859*782
49:141488*
36:426*000
78*441
1900
1901
Valores •
1.410:368*614
122:770*613
1.226:938*786
50:391*587
149:045*800
Direitos
97*120
v aiores ••••••••••••••
Direitos
1.049:190*088
88*288*285
1.245:713*508
55:257*321
94:759*625
54*345
havido na delegação aduaneira de Quelimane
los annos de 1897 a 1901
mappa antecedente
271
Missoogue
Chinanpa
Ghilomo
Téte
Total
7:201 «35
3954982
2:6894500
4674667
-4-
-4-
12:6184550
2:8384350
3.23741914324
170:6374606
4:340*780
337^400
2:8114450
1614826
-4-
-4-
22:6224430
6:9964479
1.785:3764392
185:4904729
87:1064950
2:1054107
2:6464550
59Ò4993
-4-
-4-
11:3894085
4:650497o
2.581:5404387
177:6314833
86:Oi64355
3:7874000
2:2914000
224035
28:0174330
2:£084606
145:7404280
17:1264015
3.048:4684165
196:7024976
86:8314970
2:1824929
2:3724900
1364265
27:1374200
1:5884179
166:5754290
13:44042^0
2.672:5804581
160:9474614
272
Ttbelli dos impostos directos próprios e reidlmeitos
do districto da Ztmbezia,
calculada segando os rendimentos cobrtveis annnalmente
Deiignaçao da receita
Somma
Impostos directos
Contribuições :
Predial e renda de essas
40:563*790
12:557*562
9:543*886
10:520*117
3:010*909
2:051*725
773*160
953*700
140*810
7:917*119
Industrial fixa
Industrial variável
Sêllo
Contribuição de registo
Multas diversas
Emolumentos sanitários e outros
Imposto de palhota. . . . .....
Venda de armas e deposito de
venda de pólvora
Licença para fabrico e venda de
bebidas alcoólicas
Próprios e rendimentos diversos
Foros <■
4:330*177
3:400*000
3:508*590
142:393*267
15:670*420
6:885*578
920*160
12:426*636
170:947*624
10:269*200
10:015*317
ò8:062*768
Rendimento :
Dos correios, incluindo premio
dos vales ultramarinos . . . *.
Do hospital e venda de medica-
mentos
Dos prazos
Do mussôco e cultura dos prazos
Licença para feiras nos prazos. . .
Licença para corte de madeiras. .
Receitas eventuaes e não especi-
ficadas
Rendimento da Alfandega
Rendimento do Arsenal
Rendimento dos Telegraphos
380:766*969
Somma total
468:829*737
iDstrucções para o Arsenal
de Qnelimane
18
Instrucções para o arsenal
de Quelimane
i .° O arsenal de Quelimane terá o seguinte pessoal :
i Inspector, official da armada e capitão dos portos.
i Director technico, machinista naval de 2.* classe.
i Encarregado da caixa, material e sua escriptura-
ção, commissario da armada de 3/ classe.
i Mestre geral das officinas,
i Fiel dos armazéns.
2 Amanuenses.
2. Um conselho administrativo, composto do inspe-
ctor, director technico e encarregado da caixa e mate-
rial, será o exactor da fazenda.
3.° Emquanto não estiverem preenchidos os cargos de
inspector e de encarregado da caixa e material, será
o arsenal superintendido directamente pela secretaria
do Governo ; n'estas circumstancias o director será o
exactor único da fazenda e terá provisoriamente como
auxiliares para a escripturação e fiscalisação um paga*
dor, um fiel d' armazéns e dois amanuenses.
4. O inspector dirige superiormente o estabeleci-
mento, attendendo á sua organisação e modelação *, or-
dena os fabricos conforme as requisições que lhe forem
276
dirigidas; fiscalisa a cobrança das diversas receitas, men-
salmente ; faz effectuar orçamentos prévios para as di-
versas obras a executar, afim de que se requisite para
estas somente o material indispensável para que a
máxima economia presida em todas ellas; admitte e
despede os operários conforme as exigências do serviço
e applica castigos ao pessoal subalterno com perda de
vencimentos até i5 dias.
5.° O director substitue o inspector no seu impedi-
mento ; accumula o seu cargo com o de mestre geral
das officinas e tem por dever gerir o estabelecimento te-
chnicamente, empregando o máximo disvelo e sollici-
tude, tanto na perfeição das obras como na economia
do material e tempo a dispender para a sua execução.
6.° O encarregado da caixa, material e escripturação
tem á sua responsabilidade para com o conselho admi-
nistrativo do arsenal :
a) Todo o material fixo e de consumo existente no
estabelecimento, que constar de inventários e de acqui-
sições posteriores;
b) Todos os fundos da gerência do estabelecimento;
c) A organisação da escripturação geral do estabe-
lecimento segundo preceitos adiante estabelecidos ;
d) O pagamento de todos os ordenados e ferias ao
pessoal e de todos os fornecimentos de material ;
e) A recepção dos débitos ao estabelecimento pro-
venientes de fabricos e obras effectuadas.
7. As acquisições de material para o arsenal serão
feitas sob requisição fundamentada do inspector á se-
cretaria do Governo, com a indicação do preço minimo
do mercado, e estabelecimento fornecedor.
§ único. Emquanto não existir inspector competirá ao
director fazer as requisições.
8.° Os materiaes serão sempre tanto quanto possível
adquiridos em quantidades minimas para consumo
mensal.
§ único. Exceptua-se o caso de se reconhecer que
uma acquisição por grosso, de certa espécie de material,
é muito mais vantajosa para a fazenda, dada a proba-
: bilidade do seu grande e usual consumo.
277
g.° O pagamento ao pessoal indigena será feito quin-
zenalmente e ao europeu será mensal. Para esse fim
escripturar-se-hão folhas separando devidamente o pes-
soal contractado do engajado, e o europeu do indigena.
O pagamento do material será feito mensalmente dentro
do estabelecimento aos diversos fornecedores, que pas-
sarão recibos em duplicado devidamente sellados.
§ único. Nenhuma folha ou conta será paga sem a
ordenação previa do governador.
io.° Organisar-se-ha um livfo caixa onde será escri-
pturado por mezes o Deve e o Haver, com descrimi-
nação das proveniências e applicações, e com referencia
numérica mensal aos diversos documentos justificativos,
precisando-se o saldo devedor e credor que passa de
um para outro mez.
n.°Do livro caixa se extrahirão mensalmente copias,
que, acompanhadas de todos os documentos de receita
e despeza devidamente numerados, serão enviadas á se-
cretaria do Governo.
i2.° Todo o material será receitado e despezado no
livro respectivo, mencionando-se tanto o mez em que foi
adquirido como aquelle em que foi despendido, e bem
assim os saldos que passarem ao mez seguinte.
i3.° Servirão de documentos de receita do material
os duplicados das contas dos fornecedores, os conheci-
mentos que forem passados e as ordens de receita.
14. ° Servirão de documentos de despeza do material
as ordens de despeza semanal do material dos diversos
armazéns, ás quaes se juntarão sempre os vales de
sahida assignados pelo director, respectivos á mesma
semana e para obra determinada.
§ i.° N'estas folhas se descriminará explicitamente a
applicação do material.
§ 2. Servirão também de documentos de despeza de
material e receita da caixa, o duplicado e o original dos
fornecimentos de material e sobresalentes ás diversas
repartições, navios do estado e particulares, superior-
mente auetorisados, e comprovativos de ter sido satis-
feita a importância respectiva devida ao estabelecimento.
i5.° S^rão devidamente escripturados em livro espe-
278
ciai os diversos fabricos efectuados no arsenal, segundo
uma numeração de ordem estabelecida por annos eco-
nómicos ; e em que seja precisamente registado o dia
do começo e da finalisação da obra, a qualidade e
Suantidade do material empregado e seu preço, a mão
'obra e percentagens do rendimento do estabelecimen-
to, bem como a data da auctorisação ; e tudo encerrado
com o custo total da obra concluída.
§ único. D'este livro se extrahirá bimestralmente uma
copia que será enviada* á secretaria do Governo junta-
mente com os originaes das auctorisações do governador
para os diversos fabricos.
i6.° Proceder-se-ha invariavelmente no dia 10 de cada
mez, logo apoz a conclusão dos pagamentos mensaes,
da recepção das quantias devidas e da escripturação res-
pectiva, a um balanço no cofre, ao qual assistirá o con-
selho administrativo do arsenal, formulando-se em se-
guida um balancete, que assignado pelos três será en-
viado ao governador.
§ único. Emquanto não houver inspector o secretario
do Governo substituil-o-ha no conselho.
17. Quando depois de concluída uma obra sobrar
parte do material que para ella foi requisitado, será
arrecadado, dando entrada no deposito por meio d'uma
guia assignada pelo director, a qual servirá de docu-
mento de receita.
§ único. Quando esse material for em pequena quan-
tidade será escripturado em caderno especial com o ti-
tulo de Sobras de material, deixando de ser carregue
no livro Carga geral, e terá a única applicação de be-
neficiar as ooras do Governo effectuadas no estabele-
cimento.
18. Todos os documentos, tanto de conta do mate-
rial como da conta da caixa, serão legalisados com as
assignaturas do inspector do arsenal e do encarregado
da caixa e material.
§ único. Na falta de preenchimento d'estes dois car-
gos deverão figurar as assignaturas do director e pa-
gador.
19. Todas as contas serão conferidas pela secreta-
279
ria do Governo, onde ficarão archivadas logo que es-
teja provada a sua legalidade e exactidão.
2o.° Depois de encerradas as folhas de pagamento e
mais documentos de fornecimentos de material, o que
tudo deverá estar concluído no dia i de cada mez, os
referidos documentos subirão a ordenamento do gover-
nador, apoz o que só serão fornecidos pelo cofre do ar-
senal ao encarregado da caixa os fundos necessários
para os satisfazer.
2i.° Na officina será feito um ponto geral ao pessoal,
por onde constem as faltas dadas (modelo 2), e um pon-
to especial por onde conste em que obras esteve cada
operário empregado (modelo 3).
§ i.° Quando algum servente for occupado em uma
obra com exclusão do serviço geral, será mencionado
em ponto especial.
§ 2. Quando a obra, pelo pouco trabalho requerido
em relação a um ou mais operários^ não os chegar a
occupar meio dia, serão notadas as horas empregadas.
22. O encarregado da caixa e material terá a seu
cargo :
i.° As folhas de pagamento, que fará pelo caderno
do ponto geral ;
2. As contas de manufactura (modelo 4) feitas de-
pois da conclusão de cada obra, servindo-lhe de ele-
mentos os vales do material recebido;
a) Ao custo assim obtido para cada obra serão ad-
dicionados 2 °/o sobre o valor do material empregado e
25 °/o sobre a mão d'obra, a titulo de gastos geraes ;
o) As obras para particulares serão sobrecarregadas
com mais 25 °/o, a titulo de receita para o Estado ;
3.° O livro caixa ;
4. As ordens de despeza de material ;
5.° As ordens de receita de material ;
6.° Os resumos da receita e despeza ;
7. O livro de receita e despeza ou contas correntes.
23.° O rendimento do arsenal, liquido de todas as
despezas, dará entrada, por meio d'uma cuia da secre-
taria do Governo, na repartição de fazenda districtal, a
qual passará o competente recibo de entrada.
Forças irregulares da Zaibezia
Foiças irregulares da Zambezia
Regulamento geral
Artigo i .° Os cypaes de todos os prazos da Zambe-
zia, constituirão 7 companhias de euerra, denominadas
Companhias de Cypaes da Zambe\ia, commandadas
cada uma por um capitão, que terá como adjunctos
um official subalterno e um certo numero de sargentos
julgado indispensável.
Art. 2. As companhias terão as sedes respectivas
nos pontos seguintes :
1.* Companhia, sede em Quelimane; formada pelos
cypaes dos prazos seguintes : Anguaze, Andone, Tan-
galane, Cheringone, Marrai, Carungo, Inhassunge, Pe-
pino, Quelimane do Sal, Maganja áquem Chire, Luabo
e Melambe, Madal, Timbué e Mahindo.
2.* Companhia, sede em Maganja da Costa ; formada
Eelos cypaes dos prazos seguintes : Maganja da Costa,
icungo, Macuze, Nameduro e baixo Borôr ;
3.* Companhia, sede em Namuli; formada pelos cy-
Eaes dos seguintes prazos : região Lomué, Milange de
reste, Mucuba-Muno e Tirre.
4. a Companhia, sede em Milange ; formada pelos cy-
284
'pães dos prazos seguintes: Milange, Alto Borôr, Mas-
singire, Maganja alem Chire até Lupata.
5.* Companhia, sede em Téte ; formada pelos cypaes
de todos os prazos comprehendidos desde a Lupata
para Oeste, abrangendo a Angonia, Makanga, etc, até
ás cataratas de Caborabassa.
6.* Companhia, sede em Chicôa; formada pelos cy-
paes de todos os prazos da margem direita do alto
Zambeze a partir de Caborabassa.
7.* Companhia, sede çm Zumbo ; formada pelos cy-
Eaes de todos os prazos da margem eaquerda, compre-
endendo a Maravia até á fronteira do Oeste.
As sete companhias constituirão uma força de segun-
da linha de 3:5oo cypaes, que formará o effectivo das
forças militares indígenas do districto da Zambezia,
sendo cada unidade composta de 5oo cypaes.
Art. 3.° Os commandantes das companhias serão es-
colhidos d 'entre os officiaes do exercito do reino, ou do
auadro da província, os quaes estarão emcommissão por
ois annos. Os sargentos serão escolhidos do exercito
do reino ou ultramar, que tenham bom comportamento
e provada aptidão para a instrucção militar ; servem
também por dois annos. Os indígenas servem por dois
annos; são voluntários para o serviço militar de cypaes
e são apresentados pelos diversos chefes de povoação,
que por elles se responsabilisarão.
Art. 4. O serviço de cada cypal será sempre equi-
tativo, e durará um período consecutivo de dois annos
seguido de igual período de descanço, ou dispensa tem-
porária do serviço militar.
§ i.° No período de serviço effectivo concede-se a
cada cypal um mez de licença com todos os vencimen-
tos por cada anno, não podendo os arrendatários
n'aquelle espaço de tempo empregal-os em trabalho
algum do prazo.
§ 2. Só no período de dois annos de reserva ou des-
canço, poderão os colonos-cypaes ser empregados pelos
arrendatários em qualquer serviço do prazo, para o que
deixarão aquelles de usar os uniformes, entregando-os
á guarda do agente de auctoridade do mesmo prazo,
2*5
que por seu turno os enviará ao commandante da
companhia.
§ 3.° Um mez antes de terminar este período de
dois annos, os arrendatários dispensal-os-hão do traba-
lho, para os dispor a entrar de novo no serviço de cypal.
Art. 5. b O commandante de cada companhia terá sob
as suas ordens os cypaes dos prazos que foram desi-
gnados para constituírem uma unidade ; desempenhará
as funcções de commandante militar da localidade onde
residir, bem como as de agente d'auctoridade do prazo
a que pertencer a localidade do commando.
Art. 6.° O commandante da companhia terá como
deveres :
a) Dirigir a instrucção militar dos cypaes, que durará
quatro horas diárias ;
b) Ter a seu cargo o armamento e uniformes ;
c) Fiscalisar o fornecimento da alimentação a que o
arrendatário é obrigado;
d) Satisfazer as requisições dos arrendatários com
respeito aos destacamentos necessários á policia de
cada prazo ;
é) Fazer a escripturação da companhia, que lançará
num caderno de modelo especial, espécie de diário que
será encerrado mensalmente, e que pela sua simplici-
dade permitta fácil lançamento de tudo quanto diga res-
peito ao alistamento e movimento do pessoal, seu grau
de instrucção, material de guerra existente, systema,
etc.
Art. 7. Instrucção. — A instrucção militar dos cy-
paes de cada prazo será ministrada na sede do com-
mando da companhia, durante quinze dias em cada
trimestre, segundo a direcção do mesmo official, que
terá para o coadjuvar o numero de sargentos julgado
indispensável.
§ único. Nos prazos em que, pela grande distancia
da sede do commando, fôr impraticável a ida das frac-
ções de cypaes á mesma sede para receberem a ins-
trução respectiva, será para elles destacado do com-
mando um sargento para esse fim, devendo ir munido
de uma guia, que mostrará ao arrrendatario, para este
286
ter conhecimento da commissão que elle vae desempe-
nhar.
Art. 8.° Serão apurados os melhores colonos para o
cargo de cypaes, em dois grupos, effectivo e de reserva,
que se rendem na conformidade do artigo 4. e seus
paragraphos.
Art. 9. A instrucção do cypal será rudimentar, limi-
t ando -se ao strictamente necessário, e que seja de fácil
execução e comprehensão, tanto no manejo d'arma co-
mo nas evoluções de marcha. O tiro ao alvo em car-
reira que deverá haver nas sedes de cada commando é
obrigatório.
Art. io.° Além d'esta instrucção, puramente militar,
serão os cypaes elucidados acerca dos seus deveres
como policias dos prazos ; serão mantidos sempre rigo-
rosamente uniformisados e aceiados, usando como dis-
tinctivo de serviço, além do cinturão, uma chibata de
pelle de hyppopotamo, e a espingarda nas localidades
em que fôr necessário.
Art. ii.° Por cada grupo (ensaca) de 20 cypaes ha-
verá um cabo de cypaes escolhido entre os Seundas, e
que terá como obrigação restricta a apresentação da
sua ensaca sempre aue lhe seja exigido.
§ único. O cabo de cypaes usará as divisas respecti-
vas e durante o período de reserva deverá o arrenda-
tário conceder lhe algumas regalias.
Art. 12. Está a cargo do commandante da compa-
nhia a distribuição dos cypaes para serviço de policia
nos prazos ; e essa distribuição será feita, mantendo-se
como principio : que os cypaes d'um prazo não devem
fazer policia nas terras a que pertencem, mas sim nas
de outros prazos do mesmo agrupamento ou outro
qualquer que mais convenha. Para garantia da regula-
ridade e boa ordem compete aos arrendatários concor-
rerem para que aquella determinação de serviço dima-
ne apenas do commandante da companhia, que tem por
dever attender á justiça e equidade n'essas funcçoes.
Art. i3.° Entre os cypaes se escolherá um grupo
constituído pelos mais intelligentes e desembaraçados,
para o serviço permanente de policia nas villas de Que-
»8 7
Bmane, Chinde e Téte, coadjuvando a policia européa.
$ único. O arrendatário será indemnisado pelo Go-
verno com respeito ao pagamento do mussôco dos co-
lonos cypaes da reserva, que voluntariamente se apre-
sentarem para serviço da policia das villas.
Art. 14. Os cypaes serão apurados entre os mais
robustos e d'elles se fará um alistamento em cada prazo,
com todos os signaes indicativos da sua identidade.
Art. i5.° Os cypaes que durante a effectividade de
serviço se evadirem serão presos e expatriados para
fora da província de Moçambique em acto continuo.
Art. 16. O numero de cypaes effectivos que cada
prazo será obrigado a ter para a policia, manutenção
da ordem, e defeza territorial, será regulado por uma
percentagem entre o numero total da população, nu-
mero de colonos do sexo masculino, sua constituição e
estado de pacificação, sendo esse numero tanto quanto
possível approximado do que cada arrendatário por con-
tracto de arrendamento e obrigado a manter.
Art. 17. Obrigações do arrendatário:
a) Ao disposto no artigo 53.° do regulamento dos pra-
zos de 1892, apenas com a modificação de haver só
duas classes de cypaes, effectivos e de reserva, sendo
só os primeiros isentos do mussôco e do serviço exi-
gido pelo artigo 34.° ;
b) Não permittir aos colonos em geral a propriedade
de espingarda de qualquer natureza ;
§ único. Apenas como remuneração por provada con-
fiança que em aualquer colono deposite o arrendatário,
ou aos chefes de povoações e cabos de guerra, é per-
mittido aquella propriedade, devendo então ser satis-
feita a importância respectiva á licença de porte d'arma;
c) Obriga-se ao disposto no artigo 54. do regulamento
dos prazos com a applicação da alinea b ao seu numero
2. , referindo-se aos colonos só nas condições do seu pa-
ragrapho único, sendo a taxa da licença annual a mesma
de 800 réis -, e como accrescimo ao numero 4. do mesmo
artigo obriga-se a convocar a reunião, não só dos cy-
paes effectivos como dos da reserva ;
d) Obriga-se ao disposto no artigo 55.° do regula-
288
mento dos prazos, com a modificação única de que só
os cypaes ao serviço na sede do commando serão ar-
mados e municiados por conta do Governo ;
e) Os arrendatários deverão impor aos cypaes arma-
dos de espingarda e a quem o governo forneceu mu-
nições para serviço, a obrigação de dar conta d'estas,
explicando a sua applicação; convindo para melhor fisca-
lisação um registo prévio das cargas fornecidas por arma;
f) Obriga-se ao disposto nos artigos 56.°, 57. e 58.° do
regulamento dos prazos, sem restricções, e ás do artigo
59. do mesmo regulamento, accrescentado com a su-
bordinação ás attnbuições conferidas aos commandan-
tes das companhias, a respeito da determinação do ser-
viço d,e cypaes ;
g) É obrigado o arrendatário a prover á alimentação
dos cypaes ao serviço do seu prazo com uma ração
diária de géneros do paiz, em quantidade nunca infe-
rior a um litro de qualquer espécie (poço) e uma por-
ção de peixe ou carne (quissau) por cada um ;
h) Auxiliar o commandante da companhia em tudo
o que diga respeito á determinação do serviço de cy-
paes, conforme o determinado pelo artigo 4. , podendo
reclamar perante o governo do districto de qualquer ir-
regularidade commettida pelo mesmo, afim de ser im-
mediatamente providenciado ;
i) Manter no prazo apenas o numero d' armas que
fôr superiormente determinado, para satisfazer ás exi-
gências do serviço de policia e de deféza do território,
bem como a quantidade de munições julgada corres-
pondente ;
j) Olhar pela conservação dos uniformes dos cypaes
que lhe são fornecidos pelo Governo, e que não este-
jam distribuídos;
k) Attender á conservação do material de guerra que
lhe fôr cedido pelo Governo, para armamento dos cy-
paes, responsabilisando-se pelo seu valor, no caso de
provada incúria no seu tratamento ;
/) Fornecer alojamento ao sargento instructor, quando
elle tenha de ir ao prazo para esse fim, e só durante o
tempo que durar a instrucção ;
289
m) Dispensar o pagamento do mussôco ao colono e
sua mulher, durante o tempo da effectividade de ser-
viço, que é de dois annos.
Art. 18. Compete ao Governo:
a) Fazer ministrar a instrucção militar aos cypaes,
de maneira que elles possam ser úteis para a defeza
territorial ;
b) Fiscalisar por si e pelos seus subordinados, que
serão o fficiaes escolhidos do effectivo do exercito, o
exacto cumprimento das disposições regulamentadas,
respeitantes ao serviço dos cypaes em geral ;
c) Fornecer annualmente um uniforme completo de
modelo especial, a cada cypal, que constará de camisa
e calção de kaki, cartucheira a tiracollo, manta de aba-
far e cofio com francalete ;
d) Fornecer ao arrendatário, mediante o pagamento
adiantado da taxa annual de 5 00 réis, as armas julga-
das necessárias, que lhe forem requisitadas para arma-
mento dos cypaes ;
e) Fazer arrecadar no deposito do material de guerra
as armas de que os arrendatários sejam proprietários
e que forem julgadas supérfluas ás exigências do ser-
viço dos prazos; bem como as munições respectivas;
f)- Promover revistas e exercicios geraes, semestraes,
de todas as forças <le cypaes por companhia nas sedes
das mesmas, dirigidas e passadas pelos commandantes
respectivos ;
%) Organisar o detalhe do serviço de cada compa-
nhia de cypaes em conformidade com as necessidades
urgentes da defeza territorial e policia dos prazos, pre-
cisando a forma da concorrência de cada unidade.
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Rendimento do arsenal de Qoelimane
proveniente de diversos fabricos ahi efectuados
doraote o anno de 1901
Meses
Janeiro
Fevereiro
Março
Abril
Maio
Junho
Julho
Agosto
Setembro
Outubro
Novembro
Dezembro
Somma
Quantias entradas
no cofre
948*186
427*825
233*297
402*732
804*473
227*502
1:879*810
1:210*291
1:262*625
524*730
1:188*314
1:159*415
10:269*200
Quantia»
em debito
648*150
530*331
135*624
39*277
95*010
42*247
101*892
652*511
370*902
540*325
730*271
504*577
4:391*117
Total
1:596*336
958*156
368*921
442*009
899*483
269*749
:981*702
-.862*802
:633*527
: 065*055
:918*585
:663*992
14:660*317
ÍNDICE
Introducçao 5
Secção I - Da Zambezia, Situação politica, Soberania Nacio-
nal, Clima :
Capitulo I — Da Zambezia 1 3
Capitulo II — Situação politica e soberania nacional 3 1
Capitulo III — Do clima • 55
Secção II — Colonisação, Instrucção, Missões, Exploração,
Prazos da Coroa, Situação económica, Agricultura, Com-
mercio, Industria, Navegação :
Capitulo I — Colonisação 6i
Capitulo II — Instrucção publica e missões 71
Capitulo III — Exploração — Prazos da Coroa 77
Capitulo IV — Situação económica . . . . 89
Secção III — Situação financeira, Dividas do districto, Sobras
orçamentaes :
Capitulo I — Da situação financeira. . 1 15
Capitulo II — Dividas do districto da Zambezia 1 5 1
Capitulo III — Sobras do orçamento de 1 900-1 901 i55
Secção IV — Administração em geral, Delimitações dos pra-
zos da Coroa e das fronteiras territoriaes, Concessão por-
tugueza no Nyassa :
Capitulo I — Administração em geral i5g
Capitulo II — Fazenda.. 161
Capitulo III — Obras publicas i63
Capitulo IV — Repartição aduaneira 171
Capitulo V — Serviço de saúde 177
Capitulo VI — Telegraphos 1 83
296
Capituk) VII — Correio.. 191
Capítulo VIII — Arsenal de Quelimane 197
Capitulo IX — Secretaria militar io3
Capitulo X — Capitania dos portos.. 2 15
Capitulo XI — Esquadrilha de policia e fiscalisação no
rio Zambeze ........ 225
Capitulo XII — Justiça 23i
Capitulo XIII — Culto religioso 235
Capitulo XIV — Camarás municipaes 237
Capitulo XV — Delimitações — Fronteiras — Concessão
do Nyassa — Isenção de direitos aduaneiros 241
Annexos :
Decreto nomeando J. D. C. de Sousa e Faro governador
da Zambezia 25 1
Decreto da exoneração 25 1
Mappa do desenvolvimento da rede telegraphica do dis-
tricto da Zambezia até 3 1 de dezembro de 1901 253
Tabeliã das cathegorias dos funccionarios da repartição
dos telegraphos da Zambezia e do Chire 256
Regulamento dos correios do districto da Zambezia 257
Mappa do movimento commercial e rendimento havido
na delegação aduaneira de Quelimane e seus postos de
despacho nos annos de 1891 a 1896 269
Idem nos. annos de 1897 a 1901 270
Tabeliã dos impostos directos próprios e rendimentos do
districto da Zambezia, calculada segundo os rendimen-
tos cobráveis annualmente 272
Instrucções para o arsenal de Quelimane 273
Forças irregulares da Zambezia — Regulamento geral ... 28 1
Mappa demonstrativo da receita real e virtual dos tele-
grammas na rede telegraphica do districto da Zambe-
zia, em 1900, comparada com o rendimento telegra-
phico de toda a província de Angola no referido anno. . 291
Mappa demonstrativo da receita real e virtual dos tele-
grammas na rede telegraphica do districto da Zambe-
zia, em 1901, comparada com a do anno de 1900 292
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